Resumo: Este trabalho analisa as orientações e atividades propostas para avaliação da leitura e escrita no Programa Alfa e Beto. A pesquisa foi desenvolvida em uma escola de Educação Infantil de uma rede municipal de ensino em PE que adota o Programa Alfa e Beto. O referido programa é baseado em uma perspectiva de alfabetização pautada no método fônico. O procedimento metodológico utilizado no estudo foi a análise documental. Os principais resultados indicam que as orientações aos professores contêm critérios de avaliação que se baseiam na perspectiva classificatória, sem contemplar orientações claras ao professor quanto ao planejamento, instrumentos e considerações sobre o erro do aluno e sobre como lidar com a diversidade da turma. Em relação às atividades propostas para as crianças, estas se configuram como repetitivas e em uma perspectiva de língua enquanto código que precisa ser memorizado para ser automatizado, distanciando-se de uma perspectiva de construção do conhecimento.
Palavras chave: Avaliação da aprendizagem, Avaliação, Educação Infantil, Programa Alfa e Beto, Leitura e escrita.
Abstract: This paper analyzes the guidelines and activities proposed for the evaluation of reading and writing in Alfa and Beto Program. The research was developed in a school of early childhood education in a municipal school in PE Adopting Alfa and Beto Program. This program is based on a literacy perspective guided the phonic method. The approach used in the study was the analysis of documents. The main results indicate that the guidelines for teachers contain evaluation criteria that are based on the classification perspective, without contemplating clear guidance to the teacher in planning, instruments and consideration of the error of the student and how to deal with the diversity of the class. Regarding the proposed activities for the children, these are configured as repetitive and in a language perspective while code that needs to be saved to be automated, distancing himself from a knowledge construction perspective.
Keywords: learning evaluation, Evaluation, Childhood education, Alfa and Beto program, Reading and writing.
Artigo
PROGRAMA ALFA E BETO E A AVALIAÇÃO DA LEITURA E DA ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: QUAIS CONCEPÇÕES ESTÃO PRESENTES NOS DOCUMENTOS?
ALFA AND BETO PROGRAM AND EVALUATION OF READING AND WRITING IN EARLY CHILDHOOD EDUCATION: WHAT CONCEPTIONS ARE PRESENT IN THE DOCUMENTS?
Recepção: 1 Julho 2018
Aprovação: 1 Fevereiro 2020
A Educação Infantil (doravante EI) configura-se como o primeiro nível da Educação Básica (BRASIL, 1996). Nesse contexto, a EI deve ser considerada como um espaço de construção de vários saberes nas diversas áreas do conhecimento, dentre eles a escrita. E para que o processo de ensino e de aprendizagem aconteça de forma efetiva, é imprescindível que este saber seja acompanhado de uma avaliação que considere os avanços das crianças.
Nesse sentido, como motivação para a presente investigação, temos as várias possibilidades de desenvolvimento das práticas avaliativas da leitura e escrita na EI. Além disso, uma de nós atua na EI e a outra nos anos iniciais do Ensino Fundamental (doravante EF), na mesma rede de ensino, na qual foi adotado o Programa Alfa e Beto (PAB) na EI que propõe uma estratégia pedagógica de gerenciamento do ensino da leitura e escrita por meio dos manuais e de atividades de ensino organizadas para serem seguidas pelos professores e crianças. Segundo a perspectiva do programa, esses materiais estruturados têm como base o método fônico de alfabetização e propõem a realização de avaliações sistemáticas sobre a capacidade de leitura e escrita da criança (OLIVEIRA, 2010).
Ao realizarmos o levantamento de pesquisas nos últimos cinco anos que tiveram como foco a avaliação na EI, encontramos apenas alguns trabalhos que tratam da temática (LIMA et al, 2010; RAMOS e CRUZ, 2013; SANTOS, 2014). Em relação às pesquisas que tratam da análise do PAB, o levantamento bibliográfico indicou apenas três estudos que tratam da formação continuada, análise de materiais e relação de poder no PAB, e estes estavam relacionados apenas aos anos inicias e finais do EF (SOUZA e HYPÓLITO, 2011; SILVA e RAMOS, 2011; SCHINEIDER, 2009). Não foram encontradas pesquisas que tratam especificadamente da avaliação da leitura e escrita na EI no PAB.
Desta forma, tendo em vista a escassez de estudos prévios, nosso objeto de pesquisa irá tratar da “avaliação da leitura e escrita na EI com foco no PAB”. Nesse estudo, analisamos as orientações e atividades propostas para avaliação da leitura e escrita no PAB, buscando responder as seguintes perguntas: Quais as orientações quanto à avaliação da leitura e escrita na EI estão presentes nos manuais destinados ao professor no PAB? Quais os critérios para avaliação da leitura e escrita na EI estão implícitos nas atividades propostas pelo PAB para as crianças?
Para isso, (i) analisamos as orientações quanto à avaliação da leitura e escrita na EI presentes nos manuais destinados ao professor no PAB; (ii) categorizamos as atividades de leitura e escrita propostas pelo PAB quanto aos seus critérios avaliativos. Na organização desse artigo, utilizamos como marco teórico estudos que tratam da avaliação da aprendizagem na EI; da relação entre avaliação e leitura e escrita na EI; e, também, refletimos de forma sucinta sobre a perspectiva de avaliação do PAB. Em seguida, apresentamos os resultados da pesquisa desenvolvida.
Segundo Haydt, o termo avaliação começou a surgir a partir da década de 1960. Isto “se deveu principalmente, aos grupos de estudos que foram organizados nos Estados Unidos [...] para elaborar e avaliar novos programas educacionais” (1997, p.9). Com isso, o termo “avaliar” passa a se destacar, principalmente, na esfera da avaliação do currículo e, depois, vai se expandindo para outras áreas como avaliação dos processos de ensino e de aprendizagem. Sobre os diversos conceitos relacionados ao que seria avaliação, a referida autora afirma que “cada definição é o reflexo de uma postura filosófica adotada” (1997, p.11) estando atrelada a diferentes concepções.
Aprofundando esta discussão, Depresbiteris aponta as possíveis relações entre a avaliação da aprendizagem e as abordagens de ensino. Para ela, a avaliação é “parte integrante do ensino aprendizagem” (2009, p.41), porém seus fins estão estritamente ligados à concepção do que significa aprender. Ou seja, a resposta do que se pretende avaliar estará fundamentada em determinada abordagem que o professor, a escola ou sistema educacional entende como a ideal. A referida autora destaca que algumas abordagens visam à memorização de conteúdos (condutivista) e outras exploram a capacidade e a autonomia do aluno para resolver problemas (construtivista). Na primeira abordagem a avaliação estaria centrada no resultado pretendido, por meio de critérios já estabelecidos e se a criança não alcançar esse resultado é vista como incapaz. O foco dessa abordagem é o cumprimento do currículo e não o que a criança pensa.
De acordo com a referida autora, na abordagem construtivista é levada em consideração a forma de pensar da criança para resolver problemas, desde os mais simples aos mais complexos, tendo seu foco no processo de aprendizagem da criança e sendo considerados os seus erros e avanços nesse processo. A avaliação torna-se importante por ser capaz de imprimir significado à aprendizagem da criança e dar subsídios ao professor para diagnosticar os conhecimentos prévios dos alunos. Além disso, nessa perspectiva, o professor é capaz de estimular a resolução de problemas, evitar pré-julgamentos e levar em conta a multiplicidade de critérios avaliativos e os diferentes percursos de cada criança na construção do conhecimento.
De acordo com Depresbiteris (2009), o conceito de avaliação sofreu evolução no contexto histórico e, a cada época, vários teóricos da avaliação educacional contribuíram para a perspectiva de avaliação que discutimos hoje, tais como Tyler, Cronbach, Scriven, Stufflebem, Stake. A partir das contribuições desses teóricos, hoje, a avaliação assume várias funções, tais como: diagnóstica ou inicial, formativa ou reguladora e somativa ou integradora, segundo Zabala (1998). Refletindo sobre essas funções, o referido autor defende que “quando o ponto de partida é a singularidade de cada aluno” (1998, p.199) a avaliação deixa de ser estática e passa a ser um processo com várias fases.
A primeira, “avaliação inicial”, permite diagnosticar a especificidade de cada aluno o que orientará a escolha dos critérios avaliativos, conteúdos e tipos de atividades que favorecem a sua aprendizagem. A segunda, avaliação reguladora ou formativa, é a que percebe como a criança está ao longo do processo de ensino-aprendizagem e vai enxergar as necessárias “adaptações e adequações” (ZABALA, 1998, p. 200). Por fim, na última fase, a avaliação caracteriza-se como somativa ou integradora por descrever todo o caminho percorrido pelo aluno, nas duas fases anteriores, e refletir sobre as finalidades da aprendizagem e as intervenções e encaminhamentos a serem feitos. Em síntese, o processo avaliativo tem como foco a aprendizagem da criança, partindo dos critérios avaliativos definidos e perpassa um planejamento flexível capaz de adequar-se a singularidade de cada um, a fim de chegar a um resultado que compreenda, valorize e estabeleça novas propostas de intervenção. Nesse contexto, o planejamento da avaliação assume grande importância e deve contemplar reflexões sobre quem avalia, o que avalia, quando avalia e como registra os resultados.
Segundo Hoffman (2011) o ato de avaliar no sentido de promover cada uma das crianças é a grande responsabilidade do professor ao aprofundar seu olhar para a especificidade e ritmos de aprendizagens, garantindo-lhe um direcionamento quanto a seu processo de aprendizagem. Nesta perspectiva, o erro passa a ser visto como espaço de construção do conhecimento, onde o aluno é compreendido como um ser que age e que busca caminhos para solução de uma atividade proposta ou desafio apresentado. Nesse contexto, as atividades propostas pelo professor podem servir como subsídios essenciais para a observação das “hipóteses construídas pelo aluno” (HOFFMAN, 2008, p.59). Para isso, o registro do processo avaliativo é imprescindível para que o professor possa planejar intervenções e novas formas de acompanhar a aprendizagem da criança, possibilitando a construção de novos saberes por cada uma delas.
Hoffman (1991) destaca que a avaliação na EI é um processo de observação, registro e reflexão acerca do pensamento das crianças, de suas diferenças culturais e de seu desenvolvimento, fomentador do repensar do educador sobre o fazer pedagógico. Portanto, a avaliação na EI deve ser essencialmente contrária a uma concepção de julgamento de resultados e deve pautar-se no acompanhamento das aprendizagens das crianças. Para a referida autora, as principais práticas avaliativas a serem desenvolvidas pelos professores são a observação atenta e curiosa sobre as manifestações das crianças e a reflexão sobre o significado dessas manifestações, em termos de desenvolvimento. Ambas as práticas têm a finalidade de dar continuidade às ações educativas e de atender as necessidades e peculiaridades das crianças na EI.
Aprofundando a discussão, a referida autora (op.cit) aponta que, muitas vezes, as crianças são avaliadas segundo as expectativas e objetivos dos educadores e esses, por sua vez, podem não corresponder às formas próprias com que cada criança responde às situações. Neste sentido, é preciso compreender as atividades espontâneas das crianças para que, aos poucos, os interesses individuais e coletivos possam ser identificados e as mesmas possam interagir dentro de suas atividades, percebendo-se como autora e reconhecendo o educador como o organizador da atividade realizada. Nesse contexto, Ciasca e Mendes (2009) apontam que as alternativas para o desenvolvimento e acompanhamento das atividades das crianças estão relacionadas a diferentes aspectos da realidade física e social da criança e, para isso, a avaliação deve estar, de acordo com a situação, vivenciada por cada uma delas.
Na legislação vigente relacionada à EI, a avaliação é ponto fundamental para o desenvolvimento da aprendizagem da criança por meio de “acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao Ensino Fundamental”, como se apresenta no Art. 31 LDBEN 94/96 (BRASIL, 1996). O Parecer CNE/CEB nº 20/2009 e a Resolução CNE/CEB nº 5/2009 definiram as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil que, também, orienta a prática avaliativa na EI por se tratar de um documento que se destina a reger a organização de currículos, aqui entendidos como conjunto de práticas/experiências compartilhadas no cotidiano das instituições de EI mediantes as quais as crianças vão sendo introduzidas na cultura e “se educando”. Segundo Emenda Constitucional nº 59, de 2009, com a introdução da obrigatoriedade da educação para as crianças de quatro e cinco anos, percebeu-se a “necessidade de novas orientações em alguns aspectos como a organização e o funcionamento da Educação Infantil (carga horária, turno, jornada, enturmação, material pedagógico, avaliação)” (BRASIL, 2009, grifo nosso). O Art. 29 da lei 12.796/ 13 (BRASIL, 2013) destaca que a avaliação estaria mais direcionada ao nível de desenvolvimento da criança do que no seu desempenho como aprendiz. Além disso, o Referencial Curricular Nacional para EI (BRASIL, 1998), apesar de não se configurar como legislação, traz uma visão da avaliação como um conjunto de ações que auxiliam o professor a refletir sobre as condições de aprendizagem oferecidas e a ajustar a sua prática às necessidades apresentadas pela criança.
A perspectiva presente nos documentos mencionados é de que cada criança apresenta uma maneira diferenciada de vivenciar as situações que o mundo lhe oferece, interagindo de modo particular com os objetos e as pessoas à sua volta, e seu desenvolvimento acontece gradativamente onde cada manifestação pode representar uma nova aprendizagem. Para Oliveira (2002) a avaliação na EI implica detectar mudanças em competências das crianças que possam ser atribuídas tanto ao trabalho na creche e pré-escola quanto à articulação com o cotidiano escolar e, para isso, o professor precisa ter conhecimento das singularidades da situação de ensino bem como das habilidades e atitudes das crianças na EI.
Algumas pesquisas apontam possibilidades e reflexões sobre a avaliação na EI. A pesquisa de Lima et al (2010) teve como objetivo identificar quais concepções influenciavam os procedimentos avaliativos de professores que atuam na EI, nas escolas públicas e particulares. Os procedimentos metodológicos utilizados foram: entrevistas com educadores, observações em instituições de EI e análise de documentos do campo da avaliação utilizados na prática docente. Os resultados encontrados, quanto à concepção de avaliação, apontam que as professoras da escola pública percebem a avaliação como instrumento que serve de subsídio para compreender melhor o desenvolvimento das crianças e acompanhá-las, além de possibilitar o planejamento de novas intervenções; já as professoras da escola particular compreendem que a avaliação é um instrumento que possibilita verificar o desempenho das crianças e diagnosticar se elas estão aprendendo os conteúdos trabalhados, além de prepará-las para exames futuros.
Ramos e Cruz (2013) pesquisaram as concepções de avaliação da aprendizagem na EI de professoras que atuam com crianças de 4 anos de idade, alunos de escola pública e particular, a fim de identificar essas concepções e se estas condizem às perspectivas de uma avaliação que favoreça às aprendizagens e como essa avaliação é realizada. A metodologia utilizada foi a entrevista semiestruturada e a análise documental do Referencial Curricular para EI. Os resultados indicam que a concepção de avaliação de cinco participantes, dentre as seis, apresentou-se em uma perspectiva formativa que deve ser realizada de forma contínua ao longo do processo. Apesar disso, as autoras apontam que os dados indicam uma predominância da avaliação do conteúdo e do comportamento das crianças, tendo como foco a observação da realização das atividades, sem o estabelecimento de critérios avaliativos claros.
Santos (2014) analisou o processo de avaliação na EI, visando saber como as professoras de uma escola privada em Campina Grande realizam a avaliação em suas práticas pedagógicas. Como metodologia, usou a abordagem qualitativa por meio de um estudo de caso que teve como procedimentos de coleta: a pesquisa documental, a pesquisa bibliográfica e a pesquisa de campo com observação e aplicação de questionários a um grupo de quatro professoras da EI. Os resultados indicam, em relação à concepção de avaliação, que 50% das professoras compreendem avaliação como sendo um processo, apesar de algumas a perceberem como método (25%) e outras como critério para organização do planejamento (25%). Ao tratar da importância da avaliação na EI, 50% delas afirmam ter relevância para registrar as qualidades e os progressos das crianças e 50% estão divididas entre ser um processo contínuo e servir de parâmetros para o planejamento. Em relação aos instrumentos avaliativos utilizados para avaliar as crianças, as professoras se dividem: 50% utilizam portfólio e registros diários, enquanto as demais utilizam a observação do brincar e de atividades escritas. Ao tratar dos critérios de avaliação, as respostas giram em torno de registro de observações, do construtivismo e do lúdico; não há definição clara quanto ao que seria avaliado. Quanto às contribuições da avaliação na EI para o desenvolvimento da criança, duas das professoras afirmam que auxiliam na elaboração do planejamento; uma afirma fornecer um caminho para a aprendizagem e a outra não soube responder. Por fim, ao falar dos pontos priorizados no momento de avaliar, 25% dizem serem os conteúdos trabalhados, 25% afirmam ser a criança como um todo e 50% dizem serem as habilidades motoras.
Inicialmente destacamos que a relação entre o ensino da leitura e escrita e a avaliação na EI está intimamente vinculada ao processo de alfabetização das crianças no país. Além disso, compreendemos que há diferentes posições e um debate acirrado entre diferentes grupos em relação à sistematização de conhecimentos/aprendizagens no contexto da Educação Infantil, especialmente conhecimentos relativos à leitura e escrita, considerando-se as especificidades da EI como etapa educacional que abrange o atendimento institucional às crianças de zero a cinco anos (seis anos incompletos) com suas singularidades. Neste sentido, Brandão e Leal (2010) apontam que, historicamente, foram se constituindo três caminhos ao lidarmos com o ensino da leitura e da escrita na EI.
O primeiro está pautado na “obrigação da alfabetização” e, nesse sentido, a defesa é de que a criança já conclua a EI dominando certas associações grafofônicas, copiando letras, palavras e pequenos textos, lendo e escrevendo palavras e frases. Nessa perspectiva, o trabalho na EI está associado à ideia de que a aquisição da leitura e escrita corresponde à aquisição de um código. O segundo caminho, chamado de “o letramento sem letras”, é caracterizado pela ênfase dada apenas a outros tipos de linguagem na EI, banindo-se a linguagem escrita do trabalho com as crianças. Segundo as referidas autoras, essa é uma concepção equivocada por vários motivos: pela visão que se tem de escola; pela falta de criatividade e espontaneidade pela reprodução de práticas repetitivas e vazias de significados; pelas crianças serem consideradas como seres passivos. O terceiro caminho, denominado “ler e escrever com significado na EI”, é o que as autoras defendem como necessário para o trabalho nessa etapa, considerando essencial o planejamento de situações e práticas de leitura e escrita na EI, sem desconsiderar as necessidades e interesses das crianças, defendendo que a linguagem escrita poderá ser desenvolvida ao lado de tantas outras linguagens. Para elas, o ensino não precisa ser uma palavra proibida na EI, as crianças, por menores que sejam, sempre poderão aprender no que se refere à escrita. Tal concepção é sob nosso ponto de vista a mais adequada ao lidarmos com o ensino da leitura e da escrita na EI, por entendermos que as crianças conseguem interagir com a língua oral e escrita de forma dinâmica e construtiva na formulação do conhecimento.
Aprofundando a temática, destacamos que, na década de 1970, as políticas educacionais voltadas à educação de crianças de 0 a 6 anos defendiam a educação compensatória com vistas a reduzir os índices elevados de repetência e evasão na 1ª série do Ensino Fundamental na rede pública de ensino (KRAMER, 2006). Era necessário, nas etapas anteriores à educação formal - na chamada pré-escola -, compensar as carências culturais, deficiências linguísticas e defasagens afetivas das crianças provenientes das camadas populares. Apesar de as práticas de ensino e avaliação da leitura e da escrita apontadas estarem presentes nas salas de EI, a partir dos anos de 1970 e, principalmente, nas décadas de 1980 e 1990 (quando a EI abrangia a faixa etária de zero a seis anos), a discussão sobre o ensino da leitura e escrita na EI estava sendo construída em uma perspectiva significativa, com repercussão na proposição de documentos de referência para propostas curriculares na etapa tais como o RCNEI e as DCNEI, já citados anteriormente, em função de avanços nos campos da linguagem (oral e escrita), da psicologia (da aprendizagem), da psicolinguística e sociolinguística.
Nesse contexto, segundo Kramer (op. cit.), exigia-se que as crianças apresentassem uma prontidão para o início do processo de alfabetização. Essa prontidão estava relacionada ao desenvolvimento de habilidades perceptivas e motoras e, na maioria das vezes, era desenvolvida na Educação Infantil. O trabalho com a EI, portanto, deveria evitar qualquer contato direto com a leitura e a escrita. Segundo Brandão e Leal (2010), além dessas noções serem criticadas por vários pesquisadores, outros profissionais também apontavam a baixa qualidade dos exercícios preparatórios, repetitivos e vazios de significados para as crianças. Ou seja, no discurso da “maturidade para alfabetização”, o ensino estava condicionado a um desabrochar natural que deveria acontecer em torno dos seis anos de idade. Nesta perspectiva, acreditava-se que a criança não teria interesse em ler e escrever e que forçá-las a tal poderia ser prejudicial, visto que elas não estavam prontas para o desenvolvimento de tais habilidades.
Albuquerque e Morais (2007) destacam que estas práticas de alfabetização se caracterizam como tradicionais nas quais predominam o uso dos métodos sintéticos (alfabéticos, fônicos e silábicos) e/ou analíticos (global, sentencial, palavração) que, em seu conjunto, defendem que a escrita alfabética é um código e que as aprendizagens acontecem pela memorização ou associação entre letras e sons. Dentre esses métodos, destacamos o método fônico porque é ele que embasa o PAB. Segundo os referidos autores, o método fônico tem como objetivo o desenvolvimento da consciência fonológica através da repetição de sons e da transcrição desses sons em forma de letras, avaliando a capacidade de a criança reconhecer e transcrever fonemas (consciência fonêmica). Além disso, desconsidera o ponto de vista da criança, julgando que, para aprender a escrever, é preciso apenas traçar letras legíveis, discriminar letras e decorar sons.
Nessa perspectiva avaliam-se, inicialmente, as habilidades psiconeurológicas ou perceptivo-motoras e, em seguida, a aprendizagem do código alfabético e a memorização de unidades antes estudadas. Esse processo avaliativo tem o intuito de medir e classificar a aprendizagem dos alunos por meio de atividades que exigem a leitura e a escrita de letras e sílabas, além da repetição e memorização das mesmas. Para Morais (2012), a consciência fonológica vai além da capacidade de discriminação de fonemas (consciência fonêmica), ela consiste na capacidade de refletir conscientemente sobre as unidades sonoras da língua (fonemas, sílabas e rimas), destacando ainda que, por si só, ela não assegura uma compreensão das propriedades e convenções do Sistema de Escrita Alfabética (SEA). Ou seja, para a criança se alfabetizar, não se trata de aprender a isolar segmentos sonoros e memorizar as letras.
Na década de 80, foram feitas várias críticas às práticas tradicionais de ensino da leitura e da escrita nessa perspectiva, porque estas geravam retenção na primeira série, produzindo um grande fracasso escolar. As crianças que não conseguiam construir esse conhecimento eram consideradas crianças com “déficit cultural” ou não tinham desenvolvido as habilidades necessárias, eram considerados incapazes. Os métodos tradicionais de alfabetização passaram a ser criticados à luz das novas teorias que influenciaram os estudos sobre alfabetização, dentre eles a Teoria da Psicogênese da Escrita, pautada por Ferreiro e Teberosky (1984). As referidas autoras postulam que SEA é um sistema notacional e não um código. Nesse contexto, as crianças elaboram hipóteses sobre “o que nota” e “como nota” a escrita, passando por etapas de reflexão sobre a língua (pré-silábica, silábica, silábica alfabética e alfabética) e, nessas etapas, cometeriam erros construtivos que demostram como ela está pensando.
A partir dessa nova perspectiva, segundo Albuquerque e Morais (2007), a concepção de avaliação na alfabetização é repensada. Passa-se a considerar todo o processo evolutivo da criança, durante o ano escolar, considerando tanto os avanços na construção do conhecimento como os erros como indicadores de suas tentativas de aprendizagens. Nesse contexto, a avaliação assume diversas finalidades, sendo necessária a identificação dos conhecimentos já construídos pelas crianças e a tomada de decisão sobre a necessidade ou não de retomar certos itens já ensinados. A forma como se avalia nessa perspectiva também muda de configuração, passando a ser processual por meio da observação e registro das conquistas dos alunos. No lugar das provas escritas ou das lições repetitivas, outros instrumentos têm sido utilizados, tais como os cadernos de registros dos alunos e os portfólios.
Bragagnolo e Dickel (2005), ao analisarem publicações divulgadas nos meios acadêmicos entre os anos de 2000 e 2003, perceberam a escassez de trabalhos que tratam da questão da alfabetização na EI. Rompendo com uma possível cisão entre EI e EF, as referidas autoras reiteram a importância de “compreender o processo de alfabetização como um período amplo, durante o qual a criança, imersa no ambiente cultural, pensa sobre a escrita e, auxiliada muitas vezes por intervenções de qualidade, no espaço escolar ou não, inicia seu processo de alfabetização” (2005, p. 14). Nesse sentido, consideramos de extrema relevância investigar a concepção de avaliação presente no ensino da leitura e da escrita na EI por também ser uma área pouco investigada.
O Instituto Alfa e Beto é uma Organização não Governamental (ONG) criada em 2006. A Proposta de ensino no PAB (OLIVEIRA, 2010) para a EI está fundamentada em três dimensões:
(i) desenvolver a criança nas competências de autocontrole, auto regulação e da linguagem;(ii) apresentar rigor na análise exaustiva das diferentes facetas do desenvolvimento infantil e dos estímulos adequados às diversas etapas da infância;(iii) buscar pela coerência na integração entre as necessidades e requisitos do desenvolvimento e na apresentação de estímulos e condições adequadas para promovê-los (p. 2-3).
O currículo para a EI no PAB, segundo Oliveira (2012), foi organizado com base em teorias e propostas curriculares estrangeiras, tais como o “Programa Perry-Scope, o Programa da Core Curriculum Foundation (EUA) e dos Programas de EI da Inglaterra e da França” (2012, p.12). As áreas do conhecimento presentes na proposta da EI foram preceituadas em sete domínios: pessoal e social, linguagem, lógico-matemática, psicomotricidade, artes e conhecimento do mundo (ciências e estudos sociais). Esses domínios estão distribuídos em trinta e nove conteúdos que comportam cerca de 200 expectativas de aprendizagem que devem ser avaliadas ao longo do ano letivo na EI. O PAB pressupõe que esse currículo subsidie as atividades destinadas às crianças e que seja coerente e não fragmentado. O autor defende ainda que a avaliação voltada para EI deve estar referenciada no programa de ensino, ou seja, os métodos avaliativos devem estar coerentes com as expectativas de aprendizagens pensadas para cada conteúdo (op. cit.).
A pesquisa desenvolvida por Schineider (2009) destaca alguns elementos desse programa que apontam para a concepção de leitura e escrita presentes no material. A referida autora realizou um estudo a partir da análise de materiais didáticos de programas implantados no Rio Grande do Sul voltados para a alfabetização no EF. Dentre eles, o PAB também foi objeto de investigação. A autora buscou compreender como seria a implementação dos programas de intervenção pedagógica nas escolas públicas do estado. A metodologia utilizada foi análise documental e entrevista. Quanto ao material didático voltado para os alunos do PAB, a autora aponta que, apesar de sua amplitude, eles apresentam de forma simples os textos que tratam sobre o fonema. Ela destaca ainda a grande “compilação” das diversas tipologias textuais para que sejam trabalhadas com os alunos sem um norte orientador ao professor. Os resultados indicam, ainda, que os discursos com que os materiais são fundamentados se revestem de teorias científicas, sem serem devidamente explicitadas, configurando-se como verdades absolutas que devem ser seguidas.
Não foram encontramos trabalhos publicados que buscassem analisar as orientações e os critérios avaliativos presentes nas atividades de leitura e escrita voltadas às crianças na EI e nos materiais para o professor do PAB. Este é, portanto, nosso foco neste artigo.
Para analisarmos as orientações e atividades propostas para avaliação da leitura e escrita no PAB, desenvolvemos um estudo em uma escola da rede pública municipal de Carpina - Pernambuco, que atende exclusivamente às crianças da EI e está conveniada com o PAB, adotado pelo município. Além disso, os professores da referida escola são orientados a desenvolver as práticas de ensino e de avaliação pautadas pelas prescrições contidas no referido programa.
Utilizamos como procedimentos metodológicos a análise documental dos materiais de orientação para a prática do professor e das atividades propostas para os alunos, a fim de (i) analisar as orientações quanto à avaliação da leitura e escrita na EI presentes nos manuais destinados ao professor no PAB e de (ii) categorizar as atividades de leitura e escrita propostas pelo PAB quanto aos seus critérios avaliativos. Em relação à escolha dos materiais de orientação ao professor, optamos pelo Manual de Orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) e pela Agenda do Professor (OLIVEIRA et al, 2013) por serem materiais de consulta e de uso diário dos professores. Em relação à escolha das atividades propostas para os alunos, analisamos os Cadernos de Atividades da Pré-escola II (módulos I e II) (OLIVEIRA et al, 2011), os Livros de Grafismos e Caligrafia (letras e formas) (MACIEL, 2008) e o Manual de Consciência Fonêmica (OLIVEIRA, 2013), destinados às crianças de cinco anos, por se tratarem de sugestões e propostas de atividades diárias que envolvem o ensino e a avaliação da leitura e escrita das crianças do Pré-II (Segunda etapa da EI).
Os dados obtidos foram analisados qualitativamente com base na análise de conteúdos (BARDIN, 1977) por meio de um trabalho de categorização e interpretação dos resultados e relacionados aos teóricos que fundamentam nosso trabalho. Na apreciação dos dados obtidos na análise documental do Manual de Orientação e da Agenda do Professor, investigamos: a relação entre ensino e avaliação; a proposta de planejamento e registro da avaliação; os instrumentos avaliativos propostos e a concepção de erro que perpassa cada documento. Já na análise das atividades de leitura e escrita destinadas às crianças, categorizamos: os critérios avaliativos implícitos; se estavam pautadas em propostas voltadas para a revisão e avaliação de conhecimentos já construídos; se o conhecimento prévio do aluno era considerado; se o erro era considerado parte do processo de ensino/aprendizagem e se propõem um processo de reflexão pelo aluno na sua resolução. Os principais resultados serão apresentados a seguir.
O Manual de Orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) e a Agenda do Pré-escolar (OLIVEIRA et al, 2013) são documentos norteadores da prática de avaliação da leitura e escrita nos níveis do Pré-I (crianças de 4 anos) e Pré-II (crianças de 5 anos) no PAB. Para aprofundarmos a análise da concepção de avaliação presente nesses documentos do PAB, utilizamos as categorias: relação entre ensino e avaliação, planejamento e registro da avaliação, instrumentos avaliativos, concepção de erro.
No que se refere à relação entre ensino e avaliação, a Agenda do Professor (OLIVEIRA et al, 2013) não traz orientações teóricas e práticas para auxiliar ao professor em relação a esse aspecto, apenas solicita o registro do que foi ensinado e da legenda em relação ao atendimento ou não das habilidades ensinadas. Já o Manual de Orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) aponta que o foco da aprendizagem está no desenvolvimento cerebral e dependeria de “uma alternância entre curiosidade e habituação” por parte da criança (p. 35). Para isso, o PAB defende que “a pré-escola deve priorizar o desenvolvimento cognitivo e, especialmente, o desenvolvimento da linguagem” (p. 23) tendo como alicerce dois pilares: o primeiro é ser um “programa completo de ensino, com lista de competências e habilidades que toda criança deve adquirir como parte de seu processo de desenvolvimento” (p. 28), antes do ingresso ao EF, para que esta venha a ter sucesso na sua trajetória escolar no futuro; o segundo é oferecer “um conjunto de materiais que ajudam o professor a desenvolver as expectativas estabelecidas” (p. 28) por meio de competências/habilidades comuns às duas faixas etárias (4 e 5 anos) com níveis de desempenhos diferenciados.
O referido Manual (op. cit) ainda aponta que o Livro de Atividades (OLIVEIRA et al 2011) está organizado em semanas e, por um lado, anuncia que cabe à escola organizar seu trabalho de “maneira flexível” (2011, p. 29) e, por outro, expressa que “do ponto de vista de aquisição de competências, é desejável seguir a ordem das fichas do Livro de Atividades, porque há uma sequencia que prevê desafios de dificuldade crescente” (2011, p. 29). Com isso, pressupõe que o processo avaliativo resultará em etapas bem marcadas e permitirá a escola comunicar-se com os pais sobre o que as crianças “irão aprender ao longo de cada etapa” (p. 29). Segundo o autor do Manual, qualquer que seja a forma de trabalho da escola, é fundamental que a “criança adquira as competências previstas no programa de ensino” (2011, p. 29).
Em relação à orientação quanto ao planejamento e registro da avaliação, o Manual de Orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) não propõe estratégias para o planejamento e registro da avaliação das aprendizagens das crianças. O referido documento apenas anuncia que cabe ao “educador fazer a calibração e estabelecer as pontes entre a situação onde se encontra a criança, alvos de aprendizagem, e o desenvolvimento que se espera das crianças” (2010, p. 24) e determinar que decisões sobre “enturmação” das crianças devem ser consideradas. Para isso, apenas indica que cabe ao professor mostrar como se faz a atividade, guiar a criança a fazer o certo (corrigindo, direcionando, retomando) e proporcionar a repetição até que ela tenha autonomia na atividade. Nesse documento é encontrada apenas a indicação da necessidade de que o registro do resultado da avaliação seja feito pelo professor de forma contínua, sem apresentar definições sobre o quê, como e para quê será registrado.
Ao apresentar uma proposta de planejamento e registro da avaliação, a Agenda do Professor (OLIVEIRA et al, 2013) traz como seu objetivo “ajudar o professor organizar o trabalho [...] bem como acompanhar de perto a vida de cada criança que participa do Programa Alfa e Beto Pré-escola” (2013, p. 5). Na agenda, há o espaço para o planejamento e registro das atividades para os casos especiais em que o professor deverá registrar “as habilidades ou competências que serão revistas por meio de atividades com a turma inteira, com grupos de criança e com crianças individualmente” (2013, p. 20); para isso, ele deve: estabelecer incentivos para desafiar crianças, preparar cada atividade cuidadosamente e rever o plano diário de atividades previstas em função do que ocorreu no dia anterior e se organizar para aplicá-las de forma produtiva. Além disso, apesar de propor uma Ficha de Acompanhamento Individual cujo objetivo é “auxiliar a observação e avaliação do desenvolvimento das crianças, possibilitando maior objetividade e clareza” (2013, p. 14), esse documento se restringe a conceder um pequeno espaço para o registro de informações para fins de gerenciamento pedagógico, tais como anotação da frequência e das competências atingidas ou não, para acompanhamento, controle e avaliação da criança. Para isso, segundo o referido documento, caberia ao professor “uma vez ao mês, ao longo de uma semana escolhida [...], avaliar cinco crianças por dia e fazer os registros” (2013, p. 14) para que possa visualizar claramente como as crianças estão “diante das competências e habilidades propostas no currículo” (2013, p. 15). Destacamos, porém, que esse registro seria apenas para classificar o nível de aprendizagem dos alunos e não para registrar o que sabem ou precisam saber.
Em relação aos instrumentos avaliativos, O Manual de Orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) aponta que eles devem ser densos (do ponto de vista da aprendizagem), consistentes, distintos, porém com características semelhantes, para que possam oferecer “a criança diferentes perspectivas e modos de enfrentar uma mesma tarefa” (2010, p. 40); contudo, não há indicação de quais seriam esses instrumentos. A mesma falta de delimitação é encontrada na Agenda do Professor (OLIVEIRA et al, 2013). Esse documento propõe que o professor lide com a diversidade de aprendizagem na turma através de “medidas para ajustar o ritmo do ensino das crianças ao programa de ensino, tais como: recuperação intensiva para nivelar as crianças nas habilidades em que estão com maior dificuldade, revisão do programa previsto para a unidade” (2010, p. 6). Assim, além de propagar a ideia da necessidade de ensino padronizado e de avaliação como critério nivelador, tanto o Manual como a Agenda do Professor não disponibilizam orientações sobre quais instrumentos usar para avaliar as crianças.
Em relação à concepção de erro, o Manual de orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) define que, para garantir a qualidade da educação, é preciso estabelecer o currículo e as atividades, bem como as competências e as habilidades de forma idêntica ao que é proposto pelas instituições de vanguarda externas ao Brasil, considerando que há diferentes maneiras de lidar com a criança e com a educação e que ambos são processos distintos, mas “os alvos e conteúdos são semelhantes” (2010, p. 20). Para isso, indicam que as crianças que não conseguem atingir o esperado devem fazer fichas individuais em que treinam o que foi ensinado e, através dessa prática, o professor poderá orientar seu trabalho pelas necessidades das crianças e da turma, organizando metas a curto e longo prazo para ajudar aquelas que não alcançam êxito em determinadas áreas, bem como favorecer o desenvolvimento de outras que demonstrem avanços na consolidação de algumas habilidades. Ou seja, segundo o PAB “no tempo e na dosagem certa” (2010, p. 22) os encaminhamentos dados permitirão que a criança atinja ao máximo o seu potencial. Essa perspectiva aponta para uma concepção de erro como incapacidade de atingir ao alvo e não como espaço de construção do conhecimento.
O Manual de Orientações ao Professor (OLIVEIRA, 2010) para a Pré-escola descreve os critérios de avaliação propostos pelo PAB para todas as áreas do conhecimento. A área de leitura e escrita, foco de nossa pesquisa, é denominada de “Linguagem, Leitura e Escrita” (LIN). Esta área é composta por sete subáreas que avaliam habilidades diferenciadas e contemplam os quatro eixos da Língua Portuguesa. As habilidades agrupadas nas subáreas I, II e III estão relacionadas aos eixos da leitura, oralidade e produção textual e as agrupadas nas subáreas IV, V, VI e VII relacionam-se ao eixo da análise linguística.
Na subárea I são avaliadas doze habilidades relacionadas à Linguagem, Expressão Oral e Vocabulário. Muitas dessas habilidades propostas pelo PAB estão relacionadas ao uso e funções da Língua em situações pouco significativas; à produção espontânea de palavras, frases e textos sem, necessariamente, relacionarem-se à produção de um gênero oral e/ou escrito; excessiva preocupação com a repetição de padrões expostos na leitura e reprodução de coisas já lidas. Além disso, em vários momentos, as habilidades não anunciam critérios claros que indiquem o que será analisado no seu desenvolvimento e como isto será avaliado. Os critérios avaliativos em destaque exemplificam essas situações.
1.1 Ouvir e usar a linguagem oral e escrita inclusive durante as brincadeiras;1.2 Manter atenção ativa, com respostas, perguntas ou ações relevantes ao que ouve;1.3 Ouvir com satisfação e participar de histórias, poemas, rimas e canções;1.9 Recontar narrativas na sequência correta usando o padrão linguístico das histórias;1.10 ler algumas palavras usuais e frases simples. (OLIVEIRA, 2010, p. 54).
Na subárea II são avaliadas seis habilidades relacionadas à Familiaridade com livros e textos. A análise dessas habilidades indicou, por um lado, que os critérios avaliativos implícitos são voltados para identificar apenas aspectos relacionados à estrutura dos textos e da organização dos livros, sem propor uma reflexão sobre os gêneros textuais orais e escritos. Por outro lado, alguns critérios propostos não foram materializados em nenhuma das atividades, tais como: “2.2 Identificar a direção da escrita (esquerda para direita, de cima para baixo) e 2.3 Identificar segmentação de palavras (palavras e espaços)” (OLIVEIRA, 2010, p. 55).
Na subárea III, que trata da Leitura e Compreensão Oral, observa-se que todas as habilidades propostas (seis habilidades) estimulam a capacidade de reflexão por parte da criança e, em sua maioria, avaliam a sua capacidade de contar ou recontar histórias como souber e identificar diferentes gêneros textuais. No entanto, muitas das habilidades propostas não viabilizam a delimitação de critérios avaliativos por apresentarem-se abstratas, conforme indica a habilidade 3.5 “Distinguir texto de ficção de texto realista” (OLIVEIRA, 2010, p. 55).
As subáreas IV, V, VI e VII estão relacionadas ao eixo da Análise Linguística. Na subárea IV, que trata da Consciência Fonológica, a maioria dos quatro critérios avaliativos propostos está direcionada à identificação dos sons que compõem as palavras sem, contudo, deixar explícito se está tratando dos sons das letras, sílabas, rimas, conforme vemos nos exemplos: “4.1 Ouvir e dizer o som inicial e final da palavra; 4.4 Explorar e experimentar com sons palavras e textos” (OLIVEIRA, 2010, p. 56). Na subárea V, são apresentados seis critérios avaliativos relacionados à Consciência Fonêmica que, em sua maioria, verificam se a criança é capaz de:
5.1 Produzir rimas;5.2 Segmentar palavras em sílabas;5.3 Fazer síntese das sílabas;5.4 Fazer síntese do primeiro fonema com o resto;5. 5 Analisar fonemas de palavras de duas sílabas;5.6 Identificar som inicial e final das palavras; (OLIVEIRA, 2010, p. 56).
Em relação a esses critérios avaliativos, destacamos que: (i) o PAB trata a consciência fonêmica como uma capacidade diferenciada da consciência fonológica quando, na nossa concepção, com base em Morais (2012), aquela seria uma habilidade vinculada a esta; (ii) os critérios 5.1 e 5.2 não foram avaliados nas atividades propostas às crianças; (iii) e, além disso, entendemos que a consciência fonêmica é uma das habilidades a serem desenvolvidas por sujeitos alfabetizados e não seria adequado avaliar crianças na EI com base nela.
Na subárea VI, que trata da Decodificação, os cinco critérios avaliativos implícitos nas habilidades propostas pelo PAB analisam se as crianças são capazes de identificar e copiar letras, memorizar e reproduzir palavras já treinadas, memorizar os sons das letras e reproduzi-los de forma sequenciada, dentre outros. Já na subárea VII que investiga a Escrita e Ortografia, os critérios avaliativos se propõem a verificar a capacidade de a criança escrever “de cor” ou espontaneamente o nome próprio e de seus familiares, as letras e palavras. Além disso, há indicação de que será avaliada a participação das crianças na elaboração de textos escritos para diferentes finalidades. Como veremos mais adiante, os critérios propostos nesta subárea foram materializados nas atividades propostas para as crianças em atividades que tinham como foco apenas o treino das habilidades motoras, sem destaque para o processo reflexivo na construção das palavras propostas.
No geral, destacamos que as subáreas que tratam dos eixos da Língua Portuguesa vinculados à oralidade, leitura e produção textual, muitas vezes, não deixam claro o que de fato será avaliado, além disso, os critérios avaliativos propostos para o eixo da análise linguística não possibilitam a verificação da compreensão da escrita alfabética pela criança, sendo avaliado apenas o que a criança é capaz de reproduzir com base nos sons e formas das letras e palavras memorizadas e treinadas. Ou seja, o PAB assume um trabalho de alfabetização com crianças de cinco anos em uma perspectiva associacionista de ensino.
Por fim, a análise dos critérios avaliativos implícitos nas habilidades presentes no Manual do Professor do PAB para a leitura e escrita na EI indicou que 63,8% desses estão relacionados à avaliação de habilidades que envolvem memorização e reprodução de conhecimentos, além de não estarem bem delimitados, apresentando-se de forma abstrata. Os outros 36,2%, apesar de avaliarem aspectos relacionados à capacidade de reflexão e produção de conhecimentos, na sua maioria são critérios avaliativos que não tratam de conhecimentos específicos relacionados à reflexão sobre o SEA, e sim, de habilidades de produção oral espontânea de fonemas, palavras e textos.
Os resultados da análise das atividades propostas para as crianças foram organizadas em três blocos para melhor compreensão dos critérios avaliativos presentes em cada uma delas: atividades presentes nos Cadernos Meu livro de Atividades (OLIVEIRA et al, 2011), atividades presentes nos Cadernos de Grafismo e Letras (MACIEL, 2008) e atividades sugeridas no Manual de Consciência fonêmica (OLIVEIRA, 2013).
Nos Cadernos denominados Meu Livro de Atividades (OLIVEIRA et al, 2011), volume I e II, são propostas 569 atividades para as crianças realizarem ao longo de um ano letivo. Dentre essas atividades, 201 estão relacionadas à área de Língua Portuguesa; 126 a Conhecimento de Si e do Mundo; 167 a Matemática; 45 a Ciências e 30 ao Desenvolvimento Motor. Destacamos que o maior quantitativo de atividades está relacionado às três primeiras áreas e que, em alguns casos, as atividades tinham mais de um comando e abrangiam mais de uma área do conhecimento: (i) atividades que abrangiam a leitura e a escrita, porém o programa não as identifica como sendo de linguagem (p. 357) e (ii) atividades que identificamos como sendo de outras áreas, porém o programa propõe critérios como sendo apenas de Linguagem (p. 399). A Tabela 1 destaca os aspectos a serem avaliados em cada atividade presente no Meu Livro de Atividades, volumes I e II.

A análise da Tabela 1 indica que 6,4% das atividades traziam como critério avaliativo a capacidade de a criança reconhecer a ordem alfabética. Todas as atividades analisadas eram descontextualizadas, tornando-se atividades mecânicas e sem sentido, conforme exemplo a seguir.

Em relação à avaliação da habilidade de as crianças identificarem letras, foram encontradas 10,9% das atividades que correspondiam a esses critérios avaliativos, principalmente dentre as atividades do Módulo I. Isso indica que o PAB pressupõe que todas as crianças, ao término do módulo I, já são capazes de identificar todas as letras do alfabeto. Além disso, apesar de considerarmos importante o desenvolvimento dessa habilidade entre as crianças em fase pré-escolar para que se familiarizem com as letras que são usadas na escrita, destacamos que as atividades propostas não eram apresentadas de forma significativa e se destinavam apenas à identificação de letras soltas, por meio de um processo de “acerto e erro”, conforme apresentado a seguir.

Algumas atividades eram voltadas para avaliar as habilidades das crianças em cobrir (1%) e copiar letras (4,5%). Outras atividades avaliavam as habilidades de a criança escrever letras ditadas (3%) e comparar os tipos de letras (0,5%). Em todas as atividades, observamos que os comandos eram descontextualizados e privilegiavam a capacidade de a criança reproduzir o que fora ensinado anteriormente, sem promover uma atitude reflexiva sobre as propriedades e convenções da escrita alfabética (MORAIS, 2012). Os exemplos a seguir são ilustrativos da perspectiva avaliativa presente nessas atividades.




Cerca de (2%) das atividades avaliavam a escrita da letra inicial do nome das figuras. Essas atividades envolvem tanto a escrita de vogais como de consoantes, só que, para isso, é preciso que as crianças identifiquem os fonemas. Entendemos, com base em Morais (2012), que essa atividade é de difícil resolução para as crianças que ainda não estão alfabetizadas, conforme exemplo:

Outro tipo de critério avaliativo encontrado foi a habilidade de as crianças identificarem os fonemas em qualquer lugar da palavra (11%). Entendemos que a consciência fonêmica faz parte da consciência fonológica e é uma habilidade importante no processo de alfabetização; contudo, concordamos com Morais (2012) que esta é uma habilidade a ser desenvolvida por crianças já alfabetizadas. Atividades que avaliam esta habilidade na EI, provavelmente, não consideram que a criança passe por um processo evolutivo até chegar a se alfabetizar e que é preciso respeitar esse processo. Segue exemplo.

A habilidade de identificar sons em qualquer lugar da palavra é encontrada em diversas atividades e com diversos graus de dificuldades (12%) e são avaliadas variadas habilidades: identificar o fonema em diversos lugares da palavra (p. 318); identificar o fonema e colocar a letra correspondente (p. 319); ainda há atividades em que o seu comando não está bem definido e tratam os fonemas e as sílabas como se fossem sinônimos (p. 38), não definindo o que será avaliado na atividade. Seguem os exemplos mencionados.



Nas atividades propostas para as crianças também foram avaliadas as habilidades de identificar rimas com (4%) e sem (5%) correspondência escrita. Destacamos a importância dessas atividades para as crianças em fase inicial de alfabetização por possibilitar a reflexão sobre partes da palavra, conforme defende Morais (2012). Ver exemplos a seguir.


Em relação às atividades que tinham como foco a avaliação das habilidades de leitura de palavras, as propostas não pressupunham uma atitude reflexiva e problematizadora por parte das crianças e eram organizadas em atividades: de identificação de monossílabos (p. 202), de reconhecimento de palavras através de trilhas (p. 418) e, por fim, que solicitavam o acompanhamento pela criança da leitura das palavras pelo professor e a identificação das imagens correspondentes (p. 445). Seguem exemplos citados.



A maior quantidade de atividades propostas (16,9%) está voltada para a escrita espontânea de palavras. Consideramos a importância desse tipo de atividade, porém destacamos que várias delas não trazem comandos claros, impossibilitando identificar qual seria o seu critério avaliativo. Em relação a este aspecto, uma das atividades solicita “Desenhe uma mensagem para a bruxa e assine o seu nome no final. Escreva outras palavrinhas que você queira” (OLIVEIRA et al, 2011, p.20). A atividade em destaque apresenta tanto uma confusão no comando, pois ora solicita que o aluno escreva, ora relaciona-se a sua escrita como sendo um desenho, indicando a concepção de que, para escrever uma mensagem, poderia apenas “registrar palavras soltas no papel” sem finalidade, destinatário, estrutura textual etc.
Para avaliar a habilidade de escrita coletiva de palavras com a ajuda do adulto, o PAB propôs apenas uma atividade (0,5%). Esta se apresenta como uma escrita coletiva onde as crianças escreveriam junto com a professora uma palavra, conforme apresentado no exemplo a seguir:

As propostas que tinham como critério avaliativo explorar as habilidades de copiar palavras e frases totalizaram, respectivamente, 3,5% e 0,5%. Essas atividades também não eram apresentadas de forma significativa e contextualizada e não estimulavam à reflexão sobre as propriedades e convenções do SEA, como podemos ver nos exemplos em destaque a seguir.


Cerca de 12,4% das atividades traziam critérios avaliativos voltados para produção de texto não verbal por meio do reconto de histórias lidas ou contadas pelo professor. Em sua maioria, os comandos não são claros quanto à definição do tipo e função dos textos, destinatários e situação de produção dos gêneros orais. Em muitos casos, foi solicitado que a criança recontasse exatamente a mesma história ouvida, assemelhando-se mais à situação de reprodução, o que indica uma concepção classificatória de avaliação da aprendizagem e distanciamento do conceito de alfabetizar letrando. Além disso, em apenas dois momentos foi solicitada a produção de textos verbais pelas crianças e, da mesma forma, eram situações em que as crianças apenas iriam escrever algo sem nenhuma orientação quanto ao planejamento e momento de produção do texto.
A análise da relação entre os critérios avaliativos presentes no Manual de Orientação do Professor (OLIVEIRA, 2010) e a sua materialização nas atividades dos Cadernos (OLIVEIRA et al, 2011) indicam que alguns deles, apesar de aparecem no referido Manual, não foram efetivados nas atividades propostas, tais como avaliar a habilidade de a criança produzir rimas, segmentar palavras em sílabas e escrever seu nome, o nome dos familiares, da professora. Em relação a esse último aspecto a ser avaliado, verificamos que o nome da criança deveria apenas ser escrito no cabeçalho de cada atividade e sem reflexão.
Em relação aos Cadernos de Grafismo e Caligrafia (MACIEL, 2008), foram analisadas 116 atividades e todas tinham como critério avaliativo verificar a capacidade de a criança cobrir letras e formas pontilhadas, ligar imagens, traçar caminhos fazendo linhas retas ou curvas e reproduzir letras e palavras apresentadas, conforme exemplo a seguir.
A avaliação da criança, nesse contexto, dá-se pela realização da atividade na forma correta: cobrir correto, seguir a linha/tracejado, repetir o que foi proposto. Nesses cadernos, há uma ficha de acompanhamento individual das atividades em que é solicitado o registro dos dias e das páginas em que as crianças realizam as atividades; contudo, não há orientação para a retomada das atividades.
Segundo o Manual de orientação do professor (OLIVEIRA, 2010), os Cadernos de Grafismo e Caligrafia (MACIEL, 2008) possibilitam à criança ingressar ao mundo das “letras maiúsculas”. Para o referido autor, o “desenvolvimento motor é mais notável e que o controle progressivo da postura, dos membros, das mãos, dos dedos, coordenação viso motora são habilidades essenciais para as atividades da escrita” (p.27), pois com esse desenvolvimento a criança aprenderia “a postura adequada para escrever e desenhar, [...] a pegar no lápis, a respeitar limites de página e linha” (p.26); ou seja, o princípio básico seria “ensinar os movimentos em sala de aula e promover a prática guiada ou supervisionada em casa, onde a criança poderá treinar o que aprendeu” (op. cit.). Entretanto, destacamos que, apesar de essas habilidades motoras serem importantes para que a escrita seja legível, a apropriação da escrita alfabética envolve a compreensão de propriedades e convenções sobre o SEA e se caracterizaria como um processo cognitivo e não motor (MORAIS, 2012).
Por fim, o Manual de Consciência Fonêmica (OLIVEIRA, 2013) traz 368 propostas de atividades baseadas no método fônico de ensino no qual é verificado se a criança é capaz de discriminar fonemas e se pressupõe que ela se alfabetizaria pela memorização de fonemas e junção deles para formação das sílabas e palavras por meio da repetição, fixação e reprodução de fonemas.
Na introdução, o referido manual apresenta a importância da consciência fonêmica para o processo de ensino e aprendizagem na alfabetização e indicações de como ensinar o “som” das letras para as crianças. Logo após, traz atividades preparatórias para o treino dos fonemas, atividades de exploração do fonema propriamente ditas e orientações quanto à duração e forma de realização dessas atividades. Por fim, apresenta algumas atividades de revisão dos fonemas estudados e recuperação das competências que o aluno ainda não adquiriu. A seguir, apresentamos umas dessas atividades de revisão propostas pelo referido manual.
A análise mais detalhada dessas atividades de revisão indicou que estas têm como objetivo apenas reforçar as competências que o aluno já adquiriu e, para isso, o professor deve rever algumas habilidades já trabalhadas identificando se a criança fixou ou não o conteúdo. Nas orientações sobre como realizar atividades de revisão e recuperação, o PAB pressupõe que, se o professor seguir rigorosamente as instruções do referido Manual com competência, alegria e envolvimento, pode esperar que, ao final do uso da obra, todos os alunos tenham adquirido habilidades fundamentais, as quais ele distribui em:
TODOS OS SEUS ALUNOS TERÃO adquirido: Consciência fonêmica: capacidade para identificar os fonemas em diversas posições da palavra; Domínio do princípio alfabético: conhecer as letras, seus nomes e sua correspondência com pelo menos um fonema; Motivação para aprender a ler e escrever. MUITOS DE SEUS ALUNOS terão aprendido: A fazer análise e síntese de fonemas. ALGUNS DE SEUS ALUNOS serão capazes: De fazer leitura automática de palavras familiares, com base na sua competência de decodificar. (OLIVEIRA, 2013, p.12).
Percebemos, portanto, que tanto a forma de registro dessa atividade de revisão como os encaminhamentos necessários para lidar com aquele aluno que não atinge o esperado indicam uma perspectiva de avaliação classificatória.
Destacamos que o nosso estudo, que teve como objetivo analisar as orientações e atividades propostas para avaliação da leitura e escrita no PAB, apontou alguns resultados relevantes sobre a concepção de avaliação da leitura e escrita do PAB.
No que se refere aos materiais destinados aos professores, o Manual traz orientações sobre como trabalhar em sala de aula, porém essas informações se resumem ao direcionamento das atividades e dos textos a serem estudados e o que se pretendem alcançar em cada atividade. Não há informações claras sobre como será a avaliação e o registro do processo avaliativo da criança durante todo percurso escolar. Além disso, a agenda do professor, apesar de ser um instrumento de uso diário para o registro das informações sobre o desempenho da criança, se restringe apenas a classificar as crianças, não sendo apresentados encaminhamentos ou sugestões para que o professor lide com o erro do aluno ou promova o acompanhamento e o registro do processo de aprendizagem. Desta forma, tanto o Manual como a agenda do professor não contribuem para que o docente tenha autonomia no processo de avaliação da criança bem como não dá subsídios para que desenvolva uma prática pautada na avaliação formativa da aprendizagem.
Quanto às propostas de atividades sobre a leitura e a escrita para as crianças, observa-se a ênfase dada ao método fônico de alfabetização com o uso de atividades de memorização e repetição. As crianças são avaliadas pelo acerto nas atividades e não há indicações de como se trabalhar as aprendizagens a partir do erro das crianças; nessa perspectiva, terá êxito a criança que conseguir realizar atividade corretamente como propõe o PAB.
Salientamos, assim, que as atividades não proporcionam que as crianças construam hipóteses sobre como se escreve e também não propiciam que as mesmas pensem em diferentes formatos de resolução dos problemas encontrados. A falta de estímulo ao trabalho coletivo ou em dupla bem como a ausência de orientações ao docente quanto ao tratamento da heterogeneidade de aprendizagens, em meio aos erros cometidos pelas crianças na resolução das atividades, pressupõe um processo de ensino, aprendizagem e avaliação que não considera os percursos diferenciados.
Ressaltamos, portanto, a importância dessa pesquisa para podermos refletir quais as concepções de avaliação e de ensino da leitura e da escrita que permeiam o PAB e como essas concepções podem influenciar ou não a inserção dessas crianças no mundo letrado. Com os resultados da presente investigação, desejamos que novas pesquisas ainda se dediquem a analisar o papel do professor da EI inserido nesse contexto de ensino e de avaliação do PAB e as contribuições (ou não) dessas práticas avaliativas na EI para o processo de aprendizagem da leitura e da escrita das crianças que usam o PAB como material didático de ensino.



















