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A EDUCAÇÃO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA ESTÉTICA PRÉ-REFLEXIVA EM MERLEAU-PONTY
Revista Tópicos Educacionais, vol. 26, núm. 1, pp. 137-152, 2020
Centro de Educação - CE - Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

Artigo


Recepção: 1 Janeiro 2020

Aprovação: 1 Maio 2020

DOI: https://doi.org/10.7440/res64.2018.03

Resumo: A educação, por muito tempo, persistiu em recorrer a um método de ensino que se fundamentava basicamente na transmissão de conhecimentos, no qual o docente representava a figura de poder e de conhecimento e o estudante era unicamente um receptor; portanto, a relação estabelecida nessa metodologia era unilateral. Na nossa interpretação, Merleau-Ponty entende isso como uma estrutura invisível que pode se manifestar graças à constituição do logos estético que possibilita perceber e expressar o mundo, de forma direta e original, sem intervalos e sem abismos; portanto, a experiência perceptiva e a vida são envolvidas por essa racionalidade originária. É precisamente nesta compreensão que queremos pensar uma educação orientada na racionalidade que se constitui no logos estético. A partir dessa concepção, surge outra ideia de educação que ilustra o processo da investigação filosófica, partindo de uma questão originária. No entanto, as reflexões acerca do assunto demonstram que, conforme o processo educacional começa a ser reconhecido como uma verdadeira experiência filosófica, o campo do exercício da educação passa a ser ampliado, ou seja, o fazer pedagógico ultrapassa a simples reprodução dos conhecimentos produzidos e perpetuados pela história da filosofia.

Palavras-chave: Educação, Logos estético, Percepção, Merleau-Ponty.

Abstract: For a long time, education persisted in resorting to a teaching method that was basically based on the transmission of knowledge, in which the teacher represented the figure of power and knowledge and the student was only a receiver; therefore, the relationship established in this methodology was unilateral. In our interpretation, Merleau-Ponty understands this as an invisible structure that can manifest itself thanks to the constitution of the aesthetic logos that makes it possible to perceive and express the world in a direct and original way, without intervals and without abysses; therefore, perceptual experience and life are surrounded by this original rationality. It is precisely in this understanding that we want to think of a rationality-oriented education that constitutes the aesthetic logos. From this conception arises another idea of education that illustrates the process of philosophical inquiry, starting from an original question. However, the reflections on the subject show that, as the educational process begins to be recognized as a true philosophical experience, the field of the exercise of education is expanded, that is, the pedagogical practice goes beyond the simple reproduction of the knowledge produced and perpetuated by the history of philosophy.

Keywords: Education, Aesthetic logos, Perception, Merleau-Ponty.

INTRODUÇÃO

Em nossas leituras, percebemos que Merleau-Ponty não trata especificamente da conceituação de uma filosofia, mas sobre seus motivos, até porque, sem levar em conta o caráter pessoal e intencional e o desejo pelo estabelecimento de significados, não há como falar sobre uma formação humana. Desse modo, importa à educação na perspectiva da formação humana considerar, na experiência diária da criança, a possibilidade da intencionalidade operante, enquanto marca da nossa unidade “antepredicativa” com o mundo, para que ela consiga abordar e inventar os significados e conceitos no curso de sua vida. Pois a educação, por muito tempo, persistiu em recorrer a um método de ensino que se fundamentava basicamente na transmissão de conhecimentos, no qual o docente representava a figura de poder e de conhecimento e o estudante era unicamente um receptor; portanto, a relação estabelecida nessa metodologia era unilateral.

A partir de um olhar curioso e de espanto, nasce a percepção, que mira o mundo para, antes mesmo que se faça a pergunta, possa percebê-lo e atribuir-lhe significado, ou seja, se refere a algo livre de conceitos previamente estabelecidos. É precisamente nesta compreensão que queremos pensar uma educação orientada na racionalidade que se constitui no logos estético. Aqui, entende-se que a fonte dos significados que condicionam a elaboração das questões e das respostas é esta relação pré-reflexiva com o mundo, que deve se pautar na não exigência da adequação entre objeto e conceito como elo. O olhar da infância é esse olhar livre para estabelecer significados do artista. Mesmo naquilo que sempre existiu no cotidiano é possível encontrar coisas novas, mas é preciso dispensar-lhe atenção para evidenciá-lo e focá-lo. A forma como o sujeito concede atenção para aquilo que lhe atrai, algo que sempre esteve ali, mas que antes não havia chamado atenção, é o estado de abertura para o mundo. O movimento para inaugurar a atenção para determinada coisa é conduzido pela intencionalidade. Já o olhar da criança e o do artista é aquele que se espanta e se volta para a novidade. Com isso percebemos é possível propor uma nova forma de racionalidade para nutrir a formação humana.

É importante aqui chamar a atenção para o que Hacklin, no seu texto The Possibilities of Merleau-Pontian Phenomenology in Analyses of Contemporary Art (2012, p. 14, tradução nossa) ressalta ao afirmar que a relação entre filosofia e arte é importante para o estabelecimento de uma troca entre os campos de saberes e para que se crie uma forma inovadora de diálogo intersubjetivo. Merleau-Ponty pontua que este diálogo acontece antes mesmo de que seja feita uma tematização científica e rigorosa, portanto, defende que qualquer ser pensante já o faz. Na nossa interpretação, a criança, que é um ser pensante capaz de perceber e expressar seus significados e que detêm o dom de se espantar e admirar com o mundo, pode compreendê-lo antes que seja capaz de abordá-lo de forma sistemática.

FENOMENOLOGIA E EDUCAÇÃO

Portanto, para se pensar a formação humana se exige que, consoante ao momento da tematização do mundo, ocorra a ação de se construir uma educação, conforme Merleau-Ponty, fugindo da simples repetição de conhecimentos previamente estabelecidos. Também é necessário que esse processo abra a possibilidade para discutir os conceitos anteriormente instaurados, de modo que seja possível desconstruí-los e ressignificá-los. Não é correto simplificar a construção de significados a uma sequência de argumentos realizados unicamente para dar conta de questões postas e respondidas por filósofos, o ideal é compreender que essa construção se relaciona com a forma de estar no mundo. Nesse exercício filosófico, é necessário que haja uma aproximação ao mundo assim como aqueles que desejam expressá-lo através da linguagem artística; no entanto, como uma obra incompleta, sem conceitos definidos e cores preestabelecidas. Antes de perguntar sobre significados do mundo para outro ser pensante, é preciso perguntar para si mesmo, da mesma forma que o professor precisa voltar para as coisas sobre as quais discorre em suas aulas em um estado de atração para que consiga provocar curiosidade e espanto em seus alunos.

Gilmore (2006, p. 292) em seu texto Between Philosophy and Art, afirma que, assim como a arte, a filosofia recorre à sua linguagem para retomar o mundo, estabelecendo relações entre o significado e o significante. O que permite que a filosofia exista e permaneça é a infindável tensão entre aquilo que já está pensado e o impensado, entre o dito e o que ainda será posto. Ou seja, o que fundamenta a filosofia é pensar repetidamente tentando não reproduzir o que já foi colocado pelas demais teorias da história da filosofia e buscando encontrar novas respostas. Na interpretação de Gilmore (2006, p. 293), o que se vê, então, é o sentido originário como nossa forma de estar no mundo anteriormente aos distanciamentos e objetivações, ou seja, é a própria infância, sendo que, somente através da permanência do vínculo com este momento originário, torna-se possível fazer filosofia. A partir disso, enfatizamos que:

(...) a infância representa a possibilidade de estabelecer sentidos diferenciados, de mostrar o novo, conformado uma base de significações implícitas que dão sentido à vida adulta, possibilitando as reflexões pelo irrefletido, o fundo de silêncio, que fornece sentido às falas, e o fundo perceptivo, que permite gerar a percepção (MACHADO, 2010, p. 71).

Primeiramente, quando se falamos, em formação humana, levamos em conta a forma pela qual a própria educação e o fazer filosófico podem ser compreendidos a partir dos escritos de Merleau-Ponty, recorrendo à sua noção de fenomenologia e à crítica que o próprio autor tece à tradição filosófica para reconstruir o caminho do conhecimento, o que pode ser interpretado como uma maneira de reinterpretar e reformular a própria filosofia enquanto exercício de filosofar. À luz deste, a formação humana pode ser interpretada a partir da noção de logos do mundo estético, que é composta a partir das noções de intencionalidade, percepção, fenomenologia, linguagem e atenção. Convencionalmente, a investigação filosófica segue um método linear em busca de um conceito, que se baseia em um tema previamente colocado para alcançar um significado também já constituído.

A partir dessa concepção, surge outra ideia de educação que ilustra o processo da investigação filosófica, partindo de uma questão originária. No entanto, as reflexões acerca do assunto demonstram que, conforme o processo educacional começa a ser reconhecido como uma verdadeira experiência filosófica, o campo do exercício da educação passa a ser ampliado, ou seja, o fazer pedagógico ultrapassa a simples reprodução dos conhecimentos produzidos e perpetuados pela história da filosofia. De forma ampla, os procedimentos empregados no desenvolvimento do fazer pedagógico correspondem ao conteúdo e à forma e a especificidade conceitual é aquilo que diferencia essa área das demais, desde a origem dos problemas, da investigação até a elaboração conceitual.

Encontramos no artigo L'insertion dans l'être : la question de l'éducation dans la philosophie de Maurice Merleau-Ponty escrito por Moreau (2005, p. 16), o respaldo teórico para fundamentar o nosso posicionamento, pois concordamos com o autor quando ele afirma que nos estudos de Merleau-Ponty, para o exercício de filosofar, esse momento é fundamental, pois antecede a elaboração do problema, portanto, a educação precisa se voltar para este ponto, que marca o nascer do logos estético e do conhecimento, ou seja, o já mencionado momento originário de nascimento e da expressão dos significados.

A partir do texto de Moreau (2005, p. 17), podemos trabalhar com a ideia de que não há meios para falar sobre a educação sem levar em conta que a busca e a atribuição de significados apresenta um caráter pessoal e intencional. O entendimento sobre a intencionalidade permite que se diferencie a “intelecção” clássica, aquela restringida pela procura da “verdade imutável”, da “compreensão”, característica da fenomenologia. No processo de aprendizagem, encontra-se a intencionalidade que foca nos fenômenos em seu todo. Merleau-Ponty, ancorado no conceito de estrutura, o qual empresta da Gestalt, argumenta que existem lacunas no fenômeno percebido, lacunas estas que não podem ser vistas meramente como falta de atenção ou de percepção. Segundo Moreau (2005, p. 19):

(...) o teórico, diferente do que indicam as concepções tradicionais, explica que, primeiramente, a atenção precisa criar um horizonte, um campo de percepção, o que demonstra que não basta destacar informações que já estão dadas, mas que é necessário que essas informações sejam ressignificadas. Os objetos e os vazios entre eles compõem o nosso campo perceptivo, e aquilo que notamos é o conjunto, por isso que, muitas vezes, percebemos as ambiguidades, as confusões, o que, após uma percepção mais analítica, pode ser visto em suas diferenças e semelhanças, até porque só é possível observar as proximidades e distâncias entre os elementos e concretizar comparações com a percepção do todo.

Portanto, a experiência perceptiva cumpre a função de iniciar o conhecimento, ou seja, ser a primeira aproximação com o objeto, e as confrontações e justificativas virão com a atitude analítica, que permitirá que os elementos sejam organizados. Pode-se afirmar que a fenomenologia não irá explicar, mas, sim, descrever. Assim como a filosofia, que precede o início do conhecimento, a linguagem precede e excede as explicações do mundo. Podemos constatar isso ao observar o desenho feito por uma criança, pois, quando olha para o mundo, a criança não precisa recorrer a um modelo ou princípio de representação, por exemplo as regras teóricas do desenho; ao contrário, ela somente apresenta a sua visão sobre a realidade. É possível comparar a descrição na fenomenologia com a elaboração do desenho de uma criança, ou seja, ele traz consigo tudo o que nos envolve e o expressa em um ato de criação, antes mesmo de se transformar em tema ou de se concretizar na percepção culturalmente estabelecida. No texto de Rojas e Baruki-Fonseca (2009, p. 10), encontramos elementos para compreender as inúmeras possibilidades na aquisição do saber relacionado ao desenho infantil, pois seu sentido insinua movimento. São sentidos perceptivos que extravasam os pensamentos, os sentimentos, as emoções e os desejos do pequeno Ser. Os movimentos são guiados criativamente pelas mãos, inspirando a imaginação dos pequenos para criar, recriar, construir, transformar traços, riscos, rabiscos, linhas a desdobrar diferentes formas, seguindo sempre o movimento da mão.

A confusão do desenho infantil não é obrigatoriamente decorrente de uma confusão das coisas diante de sua visão; a criança não olha desse modo o que desenha. Muitas vezes seu desenho espontâneo é a reprodução de sua visão interior das coisas, da pouca atenção que presta à precisão do contorno das coisas. Seu desenho exprime globalmente, portanto, a sua percepção. O que nos circunscreve é percebido por um olhar atento, curioso. Perceber é muito mais que imaginar e, antes de qualquer tipo de julgamento, exige que se saiba interpretar a vida não aparente das coisas e o sentido inerente ao texto sensível. A partir da elaboração do problema, o tempo de imanência do sentido será interrompido pela análise reflexiva, ou seja, a consciência reflexiva o fará constituir o mundo.

No entanto, vale ressaltar que existem características distintas entre a percepção na criança e no adulto. Segundo Machado:

(...) a teoria do conhecimento sensível sofre consequências significativas pelos estudos sobre consciência no tema da Gestalt, isso porque eles defendem que não é por meio do caos que se inicia a experiência infantil, e sim por um mundo que já apresenta uma estrutura unicamente lacunar (MACHADO, 2010, p. 75).

Em outras palavras, significa dizer que regiões determinadas compõem a percepção infantil, o que não ocorre na fase adulta, com a percepção mais definida. Então, a consciência infantil se assemelha à do adulto, mas está incompleta. Moreau (2005, p. 26) questiona que é um equívoco entender esse fato como negativo, haja vista que a origem dos significados, bem como a sua relevância, está, justamente, no inacabamento e, por isso, o equilíbrio da criança não é igual ao do adulto. Concordamos com Moreau e avançamos na nossa interpretação de que a percepção se apresenta como uma atitude, uma conduta que define suas trocas, suas ligações e sua atenção para o mundo e para a realidade. Pelo fato de ser uma percepção que precede a ciência e as demais experiências e, por isso, as torna possíveis, ou seja, por fazer nascer um mundo, um horizonte que a cerca, define-se essa percepção como originária.

Na arte, no conhecimento e na linguagem acontecerá a mesma relação descrita no desenho. A infância que faz brotar o sentido é constituída pela fenomenologia, ou seja, um silêncio que possibilita que o mundo se expresse. No artigo A fenomenologia na prática educativa: uma leitura da arte no desenho infantil como linguagem, colhemos dados importantes que nos fazem avançar na nossa discussão:

Na análise da infância, pode-se partir do indeterminado e alcançar o determinado, o que indica o próprio processo do pensamento. O gesto criador, base do exercício de filosofar, pode ser entendida como a inauguração do sentido e instauração do pensamento, ou seja, para criar é preciso pensar. É natural na criança estar sempre buscando significados, ação que pode ser facilitada pela filosofia, área que ajuda a estabelecer uma relação com o mundo e com a sua significação (ROJAS; BARUKI-FONSECA, 2009, p. 2).

Não basta compreender a criança como um ser pensante, ou seja, que pode filosofar; também é necessário entender esse sujeito como uma subjetividade aberta ao mundo e que, por meio de suas experiências, enxerga infinitas possibilidades de expressão nesse mundo. Propomos que no processo educativo devemos entender que o momento do primeiro está presente antes e depois, ou seja, no início do processo de significação e, também, no final, em um movimento fenomenológico que estabelece os motivos que levam aos significados e à constituição de conceitos. Chega-se à inauguração do processo de aprendizagem quando se volta para as especificidades da percepção infantil, abordando o sentido bruto de um mundo que nos chama atenção, que nos causa espanto. Inclusive, na origem da filosofia, está o espanto. Quando a criança pergunta e questiona, ela demonstra sua admiração e curiosidade acerca do que a circunda, do mundo. Para Ferraz (2008, p. 296, tradução nossa), em seu texto Perception et culture chez Merleau-Ponty, a fenomenologia de Merleau-Ponty nasce do esforço do autor em refazer o caminho desta pergunta, que fundamenta a filosofia. Ele caminha no sentido de um pensar originante, que, como abordado anteriormente, nasce de um fundo silencioso, pelo qual se pode formular significados. Portanto, já na base que funda o ser, o pensar se transforma na elaboração de conceitos. Podemos exemplificar isso com a afirmação de Ferraz, que diz que

Entende-se a filosofia como uma forma de estar inserido nesse mundo, de percebê-lo, e, em sua proposta, por meio de um exercício de subjetividade, buscar o encaminhamento da objetividade da história da filosofia. Isso porque, essencialmente, o ato de perguntar precisa ser um movimento interior que incentiva o encantamento e o espanto com o mundo, o que marca o exercício da filosofia. Também é necessário que ele preceda a ação de colocar o mundo em questão, à tematização. Surge, então, a procura por significados (FERRAZ, 2008, p. 297, tradução nossa).

Esse conhecimento anterior ao pensamento pode se demonstrar como um caminho que auxilie no trabalho de realização do processo educativo, porque ele é o transbordamento de significações quando é excesso e não falta. Então, a partir dele, tanto o professor quanto os estudantes se colocam como observadores do mundo, de si, do outro e dos pensadores da filosofia. É necessário que se compreenda a origem da relação entre o significado constituído e os demais significados possíveis de serem atribuídos para trabalhar com o conhecimento anterior ao pensamento, ou seja, é preciso entender a relação entre a escrita e a leitura e o corpo-próprio.

COMPREENDENDO A EDUCAÇÃO A PARTIR DA PERCEPÇÃO INFANTIL EM MERLEAU-PONTY

Na infância, é na percepção entre o corpo e a própria criança, e entre o corpo e o mundo, que se inicia a construção de si e do outro. De acordo com Merleau- Ponty, em seu texto Psychologie et pédagogie de l’enfant (2001, p. 185), para a criança o mundo concebido pela inteligência é posterior ao mundo percebido. E é de forma sensível e independente de uma elaboração lógica e racional, que surge a percepção da criança, portanto ela percebe o objeto em sua forma antes mesmo que um pensamento sobre o que vê e toca seja construído. Segundo Bimbenet afirma em seu texto Les pensées barbares du premier age: Merleau-Ponty et la psychologie de l’enfant, para a criança a percepção passa a ser o local de captação do sentido de outrem e da realidade. A vivência infantil é importante para Merleau-Ponty, pois que ela retrata melhor nossa condição, quer dizer, consiste em um momento perceptivo inicial (BIMBENET, 2002, p. 58).

Para a criança, as coisas existem com seu corpo, enquanto um sujeito encarnado, mas a vida nas coisas não apresenta relação com a construção dos objetos científicos. Portanto, não há como entender por um ato de interpretação intelectual os gestos dos outros, ao passo que não é no sentido comum de suas experiências que a comunicação entre as consciências está fundada. Portanto, para Merleau-Ponty é necessário que se reconheça o movimento pelo qual o sujeito se insere e se une ao mundo como irredutível, acontecendo antes mesmo da elaboração e definição intelectual do sentido. A investigação da psicologia infantil é essencial para o projeto filosófico merleaupontyano, uma vez que consiste na fé, isto é, na crença ou na convicção esvaziada de razão que atravessa os pensamentos infantis, de modo que o realismo da percepção adulta é caracterizado por Merleau-Ponty enquanto fé (BIMBENET, 2002, p. 58).

Entende-se que a infância tem corpos estendidos que trazem os outros, então o corpo da criança tem o mundo como sua continuação. Não existem fronteiras na relação entre o corpo e o território da criança, ou seja, concomitantemente, sou eu, o outro e o ar que me envolve. Merleau-Ponty afirma que a criança acaba se confundindo com os outros e com as coisas porque está totalmente voltada para eles. Ela entende a realidade exatamente como aquilo que só para ela existe por conta de sua exclusiva atenção para o mundo exterior. Por meio da experiência perceptiva e dos sentidos, a criança habita o mundo, atenta aos cheiros e sons. Bimbenet nos esclarece que:

Previamente a qualquer extrapolação de caráter objetivista está a experiência primária, mediante a qual as características exteriores do espaço natural e os processos fisiológicos provocados descobrem, a partir daí, seu significado. A experiência infantil se refere ao momento da vida em que convergem, enquanto espontânea redução (dada realmente, e não somente engendrada pelo discurso filosófico), o regresso cronológico ao pretérito do pensamento objetivo e o regresso fenomenológico às coisas mesmas (BIMBENET, 2002, p. 59).

Nessa interpretação de mundo, o imaginário e o real se misturam. O espaço onírico em que a criança vive embaralha a realidade com os sonhos e pesadelos, portanto, o sonho se torna uma conduta simbólica que, na dialética infantil, ocupa lugar de importância (MERLEAU-PONTY, 2001, p. 227). Na infância, não se pode reduzir o mundo como um mero espaço no qual as coisas estão presentes, mas, sim, um lugar que vive e se experimenta. A criança crê que somente em seu quarto e em sua cama pode acontecer o sonho, que só para aqueles que dormem é visível; portanto, assim como suas percepções, ela debita seus sonhos ao mundo, este lugar que é livre das experiências. Como tudo é envolvido pelo mundo, e não apenas um conjunto de objetos que são relacionados por causalidade, entende-se que ele mescla os fantasmas instantâneos e individuais aos objetos verdadeiros (MERLEAU-PONTY, 2011, p. 456).

Na criança se constitui um corpo que ultrapassa a imaginação e a realidade, assumindo diversas formas sem que em nenhuma delas haja uma pausa definitiva. No entender de Merleau-Ponty (2001, p. 221), diferente do adulto, a criança vive em uma zona de ambiguidade, um ambiente híbrido, e não em um mundo de dois polos. No corpo da criança existe a criança mesma, o outro e o mundo. A infância possibilita infinitas formas de ser, onde, por exemplo, os continentes não apresentam fronteiras no mundo da criança e suas vivências não evocam valores de representação. O mundo infantil está neste espaço de corpos continuados no outro e de fruição, o que significa que a própria experiência de ser é a criança. Com sua potência perceptiva, ela é inserida no espetáculo da mundanidade pela não compreensão dos limites do imaginário e do real. A riqueza desta experiência está no fato de que a criança está livre de intelecção quando vive sua percepção, ou seja, está em um estágio de pura percepção, o que faz a sua formação de consciência emocional do mundo.

A criança aproveita o mundo com os olhos, seu corpo, para habitar o desconhecido, ou seja, para cada objeto seu olhar se torna uma morada. Esse indivíduo exercita sua vida no encontro com o outro, sendo que todos os encontros são potencializados pela imaginação fértil. O objeto se torna espelho por seus olhos e a criança o transforma em saber corporificado, ocupando seu espaço imaginário. Segundo Merleau-Ponty (2011, p. 99),

(...) adentrar em um universo de seres que se revelam é o ato de ver. Olhar um objeto é se inserir nele e compreender todas as coisas que para ele se voltam conforme a face que mostram para esse objeto. No entanto, essas coisas permanecem abertas para meu olhar a partir do momento em que eu também as vejo, ou seja, entende-se que todos os objetos são espelhos para outros.

A construção das brincadeiras, dos desenhos e das sonoridades da infância passa a ter como matéria afetiva o mundo vivido. Em um espaço expressivo, se estabelece o corpo da criança, no qual sentidos podem ser fornecidos e recebidos. Nos dizeres de Merleau-Ponty (2011, p. 198), muito embora o corpo seja um eminente espaço expressivo, ele não o é entre todos os outros, como um corpo constituído. Ou seja, o corpo origina todos os outros, em um movimento de expressão que delineia e oferece lugar às significações, permitindo que elas existam como coisas.

Compreender o corpo como um lugar de expressividade faz com que ele se relacione e se identifique com a obra de arte, porque nos dois não há como dividir aquilo que revela do que é. Cabe salientar aqui as palavras de Renault (2004, p. 272), que afirma que o corpo é uma obra de arte na medida em que sua unidade não é autoevidente, mas ocorre pela interação de suas dimensões. A unificação dessas dimensões pode ser entendida a partir da experiência do toque, que tem uma virtude paradigmática em Merleau-Ponty. Disso podemos concluir que o espaço expressivo e sensível do corpo é ampliado quando uma criança recorre às vivências que permitam a investigação de objetos artísticos para firmar uma relação com a arte.

O corpo da criança é ocupado pela arte como parte que pulsa o mundo, que proporciona prazer estético. Além disso, as variações perceptivas do olhar são alargadas. Ao percorrer o corpo da criança, o espaço expressivo da obra de arte edifica outros sentidos para si mesmo, para o outro e para as coisas. O corpo que se constitui na infância é transformado em território estético pela experiência.

Conforme Merleau-Ponty (2012, p. 139) afirma em La prose du monde, pode-se comparar o campo de significações que abre cada obra para estudos posteriores ao campo de significações iniciado por um corpo em sua relação com o mundo. Podemos aprofundar a compreensão dessa relação a partir do que escreve Quinn (2008, p. 19), quando afirma que na obra de arte podemos encontrar as origens do significado não cognitivo, convocando o espectador à distância da razão já constituída. Por outro lado, encontramos também no texto de Hacklin (2012, p. 26, tradução nossa) a afirmação de que entre comparar o corpo humano e a obra de arte, Merleau-Ponty chama a atenção para certo tipo de indivisibilidade e dependência. Os aspectos materiais de um poema não podem ser extraídos do seu significado, eles são interdependentes de maneira semelhante ao corpo e seu estilo de comportamento e intenção formam totalidades indivisíveis.

Quando a criança desenha, ela expressa sua relação com o outro e com o mundo em sua grafia. Não é na representação que se estrutura seu desenho, que é uma forma dela manifestar a relação com o mundo que a circunda. Portanto, o desenho é a própria criança e a sua percepção das coisas é expressa por este aspecto polimorfo. Na nossa opinião, Merleau-Ponty encontra no desenho infantil a melhor expressão da percepção do mundo pela criança. Isso porque ele não é uma mera reprodução ou cópia daquilo que ela vê, ou sua intelecção, mas serve como um espelho real de sua afetividade.

O encontro com o outro é ansiado pelo espaço de experimentação e observação da criança. Por ser inesgotável e aberto, este mundo da criança se mostra como um espaço para o afeto, o que o torna semelhante ao espaço que a pintura moderna vive, ou seja, um espaço que, ao coração, é sensível, como descreve. Essa semelhança é abordada por Merleau-Ponty (2001, p. 198), que diz que, por ser uma criação artística radical, a arte moderna se aproxima da forma de expressão infantil, que ultrapassa as expressões convencionais.

Sobre isso, é fundamental que o artista tenha coragem, porque é necessário que ele olhe para todas as coisas que o cercam como se fosse a primeira vez que as estivesse vendo; ou seja, ele precisa ver o mundo como se fosse uma criança para que possa se expressar de forma original.

O corpo da criança é constituído pela expressão. Para a criança, desenhar é uma forma de dar significados ao mundo, e o desenho é construído com base nos sentidos e na liberdade. Quando se expressa em desenho, a criança se transforma em corpo intimamente relacionado com as linhas e contornos do desenho. Em outras palavras, o corpo da criança passa a se traduzir em desenho, se expressando através dos seus contornos. Portanto, Merleau-Ponty (2001, p. 199) pontua que

(...) nunca se pode encarar o desenho da criança como uma simples imitação, mas, sim, como uma expressão do mundo. Ele acrescenta que é necessário que se entenda plenamente a palavra “expressão”, como a união da coisa percebida com quem a percebe. Finaliza afirmando que nenhum desenho se parece com coisas, eles as exprimem.

O desenho feito pela criança, demonstra os sentidos de uma experiência, um testemunho do instante vivido. Relacionando seu corpo com a grafia, a criança faz, da finitude da vida, traços de beleza. Nos dizeres de Merleau-Ponty (2012, p. 237), o objetivo é conseguir marcar o contato com o mundo e aquilo que faz nosso olhar vibrar no papel. Assim, não se pode mais ler o desenho como anteriormente, ou seja, não se deve contemplar o desenho a fim de encontrar o prazer de compreender o mundo. Ele passará a despertar o arranjo que foi instalado no corpo e no mundo, marcando a finitude e conduzindo ao entendimento de um objeto sobre o qual só era possível ver a sua exterioridade, o que o encobria. Concordamos com Moreau (2005, p. 29) quando ele chama a atenção para o fato de que

Dessa forma, na intima relação com o mundo é que surge o significado e o sentido do corpo da criança. Ele transita os espaços híbridos da imaginação e do real, e, no encontro com o outro, se expressa e transforma em desenhos os afetos. A essência da vida é descoberta enquanto a estrutura para a criança ser-no-mundo é construída.

Podemos interpretar as palavras de Moreau a partir do que escreve Saison (1996, p. 141) em De la nostalgie à l ’art: voir de tout son corps, pois com o olhar aberto, tanto a criança como o artista vê o mundo e o transforma em poesia, sendo que, até alcançar a vida adulta, a vivência da infância tem a experiência de perceber o mundo e criar sentidos e significados como âncora. A criança se transforma em um adulto por meio da criação de si por si mesma, através do exercício da vida.

Acreditamos que existe uma experiência de linguagem na vivência do mundo durante o processo de caminhar da infância à vida adulta. Tal fato encontra respaldo teórico nas palavras de Moreau (2005, p. 29), quando afirma que a vivência do mundo aparece como um ensaio, múltiplas formas que são construídas em brincadeiras de falar, em que a inserção da criança no espaço é exercitada, bem como nas quais ocorrem a procura pelo encontro com o outro. Percebe-se como um constante chamado ao outro esse movimento da criança à fala. No outro, ela reconhece a si mesma. É possível experimentar o mundo através da experimentação da linguagem. A língua se mostra como uma brincadeira de se encontrar, de existir. A percepção e a apreensão de sentidos são ampliadas na infância quando o outro é visto e ouvido. Nesse caminho, falar mostra-se como uma forma de viver no mundo. O entendimento sobre o espaço e sobre as relações vai sendo alargado conforme a criança vai desenvolvendo melhor as palavras. A consciência é constituída pela linguagem como forma de expressão, portanto a coexistência com o meio aumenta quando se aprende a falar.

Para descobrir a palavra, é preciso transformá-la diversas vezes. A linguagem, tal qual o desenho, é uma expressão de percepção do mundo, porque falar é caminhar rumo ao outro. A criança se deleita ao confirmar os significados das palavras, por isso costuma repeti-las. Segundo Merleau-Ponty, Piaget afirma que por meio da repetição, a criança exercita a linguagem como uma forma de expressar a vida imaginária (MERLEAU-PONTY, 2001, p. 39). Por meio da experimentação da linguagem, se constrói os significados. Quando a criança experimenta a fala, ela amplia seu espaço de experimentação e aumenta a possibilidade de encontro com os outros. Portanto, ao brincar com as sonoridades e com as palavras, a criança vai ocupando o território do viver e se constituindo para chegar à vida adulta.

Podemos perceber que a linguagem se configura como um ato de transcender, porque ela supera as significações que o sujeito já dispõe, ao passo que ele escolhe como usar as palavras que o rodeiam. Por isso mesmo, a linguagem se constitui, não como uma forma que define o pensamento, mas uma ferramenta para conquistar o eu a partir do encontro com o outro. Segundo Moreau (2005, p. 31),

(...) na infância, o mundo é o território do encontro, da vida e dos afetos. No espetáculo que é ser-no-mundo, a criança se transforma naquilo que a circunda, em folha, em cheiros, etc. Todas as experiências são acolhidas por seu corpo-mundo, sendo a criança capaz de conversar e nomear as coisas. Pode-se dizer que a infância trata-se de um espaço permeável dos sentidos, ao passo que a reflexão oculta pela qual se abre nossa finitude ao mundo e ao ser é dada pelas formas de expressão da criança.

A partir disso, fica clara a razão pela qual abordamos anteriormente a relação entre corpo e arte, pois acreditamos que o corpo como espaço de significado e expressão se aproxima da arte. Encontramos a confirmação da nossa afirmação no que escreve Hacklin (2012, p. 26, tradução nossa). Para a autora, um quadro, uma peça, uma poesia, entre outras formas artísticas, são seres nos quais não é possível diferenciar o expresso da expressão, e dos quais, somente por contato direto, pode-se acessar o sentido. Essas obras refletem seus significados sem deixar seu lugar espacial e temporal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dessa perspectiva é que percebemos em Merleau-Ponty uma aproximação entre a criação artística e o corpo, que é um emaranhado de significações, pois não são apenas as relações entre corpo visual e corpo tátil e as relações entre os segmentos do nosso corpo que são contempladas, até porque quem mantém os elementos dos corpos juntos, que os toca e que os vê, somos nós mesmos.

Podemos perceber, então, que a partir dos estudos sobre o corpo, tal como interpretamos nas obras de Merleau-Ponty, há a possibilidade de afirmar que, por conta da semelhança entre o corpo e o objeto artístico, a arte pode ser compreendida como um meio adequado para que o desenvolvimento expressivo do corpo seja investigado. Tanto no corpo, quanto na obra de arte, não se pode separar o que se quer exprimir de seu meio de expressão. A percepção infantil, caracterizada por seu estado de originalidade, permite que registos artísticos ligados à percepção primeira sejam criados; por isso, o desenho da criança é uma forma de exprimir o mundo, e um meio possível para se construir uma educação que seja comprometida com a formação humana.

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