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Elementos para uma história social das ciências sociais americanas: Uma crônica1
Elements for a social history of american social sciences: A chronicle
Revista Tópicos Educacionais, vol. 28, núm. 2, pp. 244-253, 2022
Centro de Educação - CE - Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

TRADUÇÃO


Recepção: 15 Novembro 2022

Aprovação: 15 Novembro 2022

DOI: https://doi.org/10.51359/2448-0215.2022.256667

Resumo: A entrevista com Erving Goffman (1922-1982) a seguir foi realizada em 1980 pelo pesquisador francês Yves Winkin. Atendendo as exigências de Goffman, Winkin realizou esta entrevista sem fazer uso de gravadores, recorrendo principalmente às anotações registradas ao longo do encontro. Winkin apresenta elementos do itinerário intelectual de Goffman, tais como os professores que marcaram sua formação, os problemas relativos ao reconhecimento acadêmico no campo universitário americano e suas contestações contra o rótulo de interacionista simbólico.

Palavras-Chaves: Erving Goffman, Formação intelectual, História das ciências sociais, Sociologia americana.

Abstract: This interview with Erving Goffman (1922-1982) was conducted in 1980 by French researcher Yves Winkin. Complying with Goffman's demands, Winkin conducted this interview without using tape recorders, relying mainly on the notes taken during the meeting. Winkin presents elements of Goffman's intellectual itinerary, such as the professors who marked his formation, the problems related to academic recognition in the American university field, and his challenges against the symbolic interactionist label.

Keywords: Erving Goffman, Intellectual formation, History of social sciences, American Sociology.

1. Introdução acrescentada à entrevista, por Tiago Ribeiro Santos e Ione Ribeiro Valle

O ano de 2022 marca tanto os 100 anos do nascimento de Erving Goffman (Manville, Canadá, 1922), quanto os 40 anos de sua morte (Filadélfia, EUA, 1982). Na contracorrente de macrossociologias, baseadas principalmente em informações estatísticas e grandes apostas teóricas, Goffman elaborou sua sociologia como um maverick, como alguém pensando através de modos diferentes dos convencionais, como um dissidente. A rigor, raros talvez tenham sido os sociólogos da mesma verve que, como ele, forjaram uma obra repleta de conceitos ajustados “sob medida” às interações face a face entre indivíduos. Nesse sentido, uma entrevista com Goffman não poderia ser uma entrevista como as outras, e é isso que Yves Winkin apresenta aqui, tendo de registrar as palavras e os gestos de Goffman sem a ajuda de um gravador, a partir de anotações ao mesmo tempo ágeis e desarticuladas.

Winkin capturou registros do itinerário intelectual de Goffman, dentre os quais está o reconhecimento de Ray Birdwhistell (1918-1994) como um dos professores fundamentais em sua formação. Os problemas relativos ao reconhecimento acadêmico, assim como as contestações ao rótulo de interacionista simbólico, apresentados na sequência, prolongam a entrevista, fazendo do eu de Goffman algo que luta contra a definição de um lugar. De fato, esse lugar talvez não exista senão em seus livros que marcaram uma inconfundível forma de pensamento sociológico na segunda metade do século XX.

No Brasil, nos últimos anos, os livros de Goffman têm sido objeto de recentes traduções (publicadas principalmente pela Editora Vozes). No domínio da Educação, entretanto, permanecem ainda incógnitas as razões que ausentam o sociólogo norte-americano tanto das coleções especializadas quanto dos artigos da área. Efetivamente, raras foram as vezes em que Goffman falou das relações entre professores e alunos. Porém, analisou repetidamente ritos e instituições a partir de noções que, se transpostas à escola e à sala de aula, provavelmente cobririam esses espaços de novas significações empíricas. As noções de “estigma”, “fachada” e “idealização” talvez ajudem a traduzir uma sensibilidade capaz de encontrar no papel de professor, por exemplo, elementos ilustrativos de um atual estado de crise simbólica que obriga os próprios professores à (re)inventarem seus papeis, fazendo face a diferentes situações do dramático cotidiano escolar.

2. Entrevista com Erving Goffman, por Yves Winkin4

Esta entrevista foi realizada no dia 23 de abril de 1980, na Filadélfia, sem gravador de voz. O objetivo da entrevista não era a publicação, mas a coleta de informações para uma pesquisa sobre a sociologia americana dos anos 1950. Erving Goffman sempre recusou as entrevistas jornalísticas e somente aceitou conversar comigo sobre sua carreira e sua obra com a condição de que nenhuma citação fosse extraída da conversa e depois publicada.5 O texto que se lerá é um documento em estado bruto, redigido inicialmente em inglês a partir de anotações feitas ao longo da entrevista. Para respeitar o pedido de Goffman, nenhuma reconstrução estilística foi realizada para a presente publicação, limitando assim a possibilidade de extratos descontextualizados.

A entrevista aborda primeiramente os seus anos de formação em Toronto [Canadá], sendo um de seus professores o antropólogo Ray Birdwhistell, criador da “quinésica”, estudo da comunicação pelo corpo e pelos gestos.

Goffman inicia em seguida dizendo que é muito difícil, 25 anos depois, compreender em que medida Birdwhistell era inovador para a sua época, em Toronto. Birdwhistell explicava e demonstrava fisicamente como alguém segurava um cigarro de maneira “popular” ou “burguesa”. Para Goffman, isso significou que um conjunto completamente novo de comportamentos podia ser analisado de um ponto de vista social. Birdwhistell inseria seus dados de observação na tradição dita “cultura e personalidade” e nas teorias de William Lloyd Warner [1898-1970]. Todavia, não era isso o que mais importava. O que realmente importa era ele ter decodificado o terreno. Ao lado das suas observações, não havia nada do artigo de Marcel Mauss.6 E não se pode criticá-lo pelo fato de ter se inspirado em Warner. Na época, meados de 1945-50, a análise de Warner era bastante inovadora. Quando Birdwhistell publicou seus trabalhos em 1970, a criatividade estava perdida. Mas foi apenas nessa época que a sociolinguística começou a legitimar seus trabalhos realizados 25 anos antes. “Meu amigo (Paul) Ekman [1934-] o critica, mas ele não o compreende. Minha banca de tese também não o compreendia, e eu tive uma dificuldade imensa para explicar-lhes essas histórias (de comportamento) que eles compreendiam somente em termos de relações sociais”.

A quinésica vai muito longe em matéria de linguística. Birdwhistell se interessou num certo momento pela etologia (talvez esta pudesse ter sido uma melhor direção de pesquisa). Ele deveria ter se baseado apenas no método linguístico. Mas ele realmente queria criar uma linguística corporal. (Ora) o corpo não é criativo, generativo como a linguagem. Não se pode dizer que ele é uma linguagem. Atualmente Birdwhistell deu um passo atrás e se curvou sobre uma reflexão metodológica.

A entrevista segue assim para uma transição não registrada nas minhas anotações, sobre a carreira de Birdwhistell, de Margaret Mead [1901-1978], de Gregory Bateson [1904-1980].

A carreira de Birdwhistell deve ser comparada à de Bateson. Quando chegou aos Estados Unidos, Bateson não conseguiu encontrar trabalho. Ele era um bom antropólogo (Naven7 é realmente um bom livro), mas ele não foi recebido como tal. Ele precisou ir para onde havia dinheiro, ou seja, a psiquiatria e suas áreas anexas. Foi a mesma coisa com Birdwhistell. Embora viesse de um lugar plenamente legitimado, a Universidade de Chicago, ele não foi aceito como antropólogo por seus pares (Sol Tax [1907-1995], John Murray [1898-1975]) e teve que se voltar às audiências de trabalhadores sociais, compensando com análises bastante técnicas. Sempre lhe faltou uma audiência crítica de estudantes em nível de doutorado. Ele conseguiu agradar a um público, mas não aos seus colegas. E ele permaneceu na periferia. Margaret Mead teve a mesma carreira. Entre o momento da publicação de seus trabalhos sólidos e o momento em que foi aceita pela Universidade, passaram-se duas gerações. Bateson agora também é reconhecido, mas, como Mead, duas gerações após seu trabalho antropológico. Nos três casos, constituiu-se uma aliança de “vovôs” e de “bebês” contra as “crianças”.

Atualmente, a comunicação não verbal se estendeu consideravelmente, mas esse é um trabalho legítimo apenas para alguns psicólogos sociais. Birdwhistell não é portanto reconhecido como o decano da disciplina. Ele é reconhecido como tal apenas por uma porção mínima de pessoas. Ele foi protegido ao longo de sua carreira por algumas pessoas publicamente poderosas, que sabiam como conseguir dinheiro, como Margaret Mead, mas que estavam, como ela mesma, na periferia de sua disciplina, tendo que se relacionar com outras áreas para serem ouvidas. Ainda hoje, mesmo que tenha se estabilizado obtendo uma vaga na (Universidade da) Pensilvânia, Birdwhistell está fora de seu campo, uma vez que está na comunicação (na Escola de Annenberg). O departamento de antropologia jamais o convidou para se tornar professor associado entre eles ou algo do gênero. Seu grupo de referência permanece composto por psiquiatras e trabalhadores sociais.

Eu argumento que Birdwhistell fez parte, como Goffman, do grupo dos participantes nas prestigiosos conferências Macy8 sobre os processos de grupo, realizadas em Princeton de 1954 e 1958.

Para Goffman, fazer parte das conferências Macy não significa que se pertence ao sistema. As pessoas que vão a conferências interdisciplinares, como as de Macy, ou a conferências de semiótica, como a de 19629, são cães errantes que têm problemas de legitimidade na sua própria disciplina. São desviantes, cowboys, freaks, como Bateson e Mead, que precisam falar para pessoas que não pertencem a sua própria disciplina a fim de obter algum respeito. Birdwhistell sempre foi considerado como um charlatão, porque ele não falava com seus colegas, mas com públicos diversos. “Tente identificar uma nota de rodapé sobre o seu trabalho nas revistas de linguística e de antropologia; (não existe). Compare com os artigos de Emanuel Schegloff [1937-] sobre a análise de conversação. Não existe um artigo sobre este assunto que não faça referência aos seus trabalhos. Schegloff está estabelecido no campo. Nesse sentido, eu sempre fui bastante convencional. Eu sempre ocupei postos situados no fluxo central da disciplina”.

Depois de algumas observações sobre a importância da psicanálise nas ciências humanas dos anos 1950, a entrevista flui em direção à atitude de Goffman a respeito da noção de “comunicação”.

Goffman reconhece ter feito alusão a Birdwhistell no prefácio de Strategic Interaction ao se referir aos pesquisadores que fazem uma equação entre “comunicação” e “comportamento social”10. Falar do vestuário como se fosse uma linguagem ou da linguagem vestimentária deriva do discurso jornalístico: o vestuário não é generativo (contrariamente à linguagem). Goffman estima que “comunicação” no sentido amplo mistura os problemas e ele prefere “comportamento de exposição” (display behavior). Mas mesmo o termo display é confuso porque os etologistas parecem utilizá-lo às vezes como sinônimo de “expressão”, quando deveriam limitá-lo a um sentido técnico.

Para Goffman, o debate sobre a intencionalidade é blábláblá acadêmico. Mesmo quando falamos, não o fazemos intencionalmente, ou ao menos raramente. Quando se mostra uma intenção, é porque se quer mostrar outra coisa: se é então mal-intencionado.

A entrevista volta a pontos de história da sociologia americana, particularmente sobre a origem do “interacionismo simbólico”.

Goffman insiste na ideia de que não existe “interacionismo simbólico”. Os estudantes formados por Everett Cherrington Hughes [1897-1983], Warner, Herbert Blumer [1900-1987], etc. se consideravam sociólogos das profissões ou das relações industriais (occupational or industrial sociologists). Eles foram chamados de “interacionistas simbólicos” por “pessoas como você” (Goffman se dirige a mim com um pouco de irritação na voz). “O interacionismo simbólico” não tem realidade; é somente um rótulo (label) que conseguiu se impor. “Pessoas como você” criam um movimento onde existem apenas indivíduos. Como Alvin Ward Gouldner [1920-1980] com seu livro Coming Crises.11 Ele estava a mil léguas da verdade: tanto tempo que você não viverá a história de interior, você poderá somente se enganar. Sempre haverá pessoas para rir do seu trabalho porque elas terão conhecido o interior, como se passou realmente. De todo modo, em dez anos, tudo isso terá sido esquecido. “O que você faz, portanto, não é uma história intelectual, mas uma catalogação intelectual (intelectual pigeonholing)”. (Procuro explicar a Goffman que devo, em um primeiro momento, organizar uma massa de dados muito díspares, usando expressões cômodas como “interacionismo simbólico”). Ele me responde que, nesse caso, seria melhor eu escrever um artigo sobre o fenômeno da rotulação sociológica. Ele me dá o exemplo da “sociologia do desvio”: a palavra desviante substituiu termos como viciado (drug-addict) que caíram em desuso. No caso da etnometodologia é uma outra história, pois o grupo em torno de Harold Garfinkel [1917-2011] (Harvey Sacks [1935-1975], Schegloff, David Sudnow [1938-1965], etc.) estava decidido a seguir adiante sem uma denominação particular. O termo “etnometodologia” foi criado mais tarde (“e não acredite em Garfinkel quando ele conta como criou a palavra – é bobagem!”). A expressão “interacionismo simbólico” teria iniciado um movimento, uma escola, um jornal, etc. Na verdade, é justamente o inverso.

Volta-se então às rotulações nas quais se tentou situá-lo.

“Eu fui formado por Hughes e A representação do eu na vida cotidiana é realmente uma psicologia sócio-estrutural no estilo de Hughes. Meus amigos de Chicago e eu tínhamos formado uma espécie de grupo solidário. Eu estava muito próximo de Fred Davis [1925-1993], por exemplo. Chamaram a todos nós de ‘interacionistas simbólicos’. Suponho, portanto, que eu pertença ao ‘interacionismo simbólico’ – mas, lembre-se, esse é apenas um rótulo!”.

Eu lhe disse que geralmente ele era descrito como um homem solitário no mundo universitário; e então ele faz alusão a um grupo de ajuda mútua.

Goffman me conta que nos anos 1950 ocorreu uma grande disputa entre a sociologia de trabalho de campo (fieldwork sociology) e a sociologia “dura” (quantitativa). Os únicos sociólogos que conseguiam trabalho nas universidades foram os “duros” de Harvard, Columbia e Chicago, de tendência survey. Os sociólogos de campo, notadamente os de Chicago agrupados em torno de Hughes, foram excluídos do mercado de trabalho. Hughes não tinha nenhum poder; ele permaneceu como professor-assistente durante dez anos. “Eu consegui em Berkerley a única vaga disponível no mercado à época numa área doce (soft) da sociologia. Era como empregar um Negro ou uma mulher nos dias de hoje. Eu estava posicionado portanto no centro da sociologia doce e muito periférico em relação às forças dominantes da sociologia. Mais tarde, quando o campo se flexibilizou, os sociólogos doces começaram a ser aceitos em posições mais centrais (E o senhor se tornou duplamente central? – “Sim, é isso”). Contudo, durante vários anos, foi muito duro para esses sociólogos. Donald Meltzer [1922-2004], o melhor dos estudantes de Hughes, permaneceu vários anos ensinando num pequeno colégio; ele teve que se lançar na edição de manuais didáticos (readers), etc. Goffman não tinha filho na época. Seu pai o ajudou financeiramente até a idade de trinta anos. Mas, seus colegas, que não vinham de uma classe média como ele, mas sobretudo de um grupo de baixa classe média, precisavam se autofinanciar, seja com uma bolsa, seja com um trabalho. Eles assumiram consequentemente qualquer coisa e em qualquer lugar. Goffman conseguiu permanecer em Chicago como pesquisador (após seu doutorado), partindo mais tarde ao National Institute of Mental Health para realizar três anos de pesquisa pura. Ele então conseguiu a melhor vaga disponível, em Berkeley. Ele e seus colegas estavam na disciplina (ao contrário de Birdwhistell que estava fora da sua), mas fora da base de poder, que estava em Harvard e Columbia. Eles eram aceitos em revistas científicas, podiam ensinar (eles usavam materiais provenientes das pesquisas de Hughes sobre as profissões), mas não tinham dinheiro, não participavam de grandes colóquios, não dispunham de postos prestigiosos. Foi somente quando o sistema da Universidade da Califórnia se ampliou que todos os seus amigos puderam encontrar bons trabalhos como “interacionistas simbólicos”. Hoje, Goffman organiza colóquios com subvenções da Fundação Wenner-Gren12 (dito de maneira implícita, ele está no poder).

A entrevista continuaria sobre o papel de Hughes como mentor, sobre suas leituras na Universidade de Chicago, sobre o seu trabalho no National Institute of Mental Health. Enquanto conversamos, instalados num dos sofás de jardim no seu terraço, o sol começa a me bater no rosto cada vez que levanto os olhos na sua direção, entre duas anotações no meu caderno. Goffman propõe trocar de lugar comigo. Eu recuso de maneira educada. Ele insiste. Ele entra em casa e volta com um pequeno chapéu, sem aba, colocando-o na cabeça. Trocamos então de lugares. O restante da entrevista consistiu, então, para mim, em tentar de conter um sorriso irreprimível diante do espetáculo, afetuoso e gentil, que me oferece Erving Goffman, “Benjamin Franklin, professor of sociology”, brincando de esconde-esconde com o sol de um final de tarde de primavera.

Notas

1 Tradução de Tiago Ribeiro Santos e Ione Ribeiro Valle. Texto original: WINKIN, Yves. Entretien avec Erving Goffman. Actes de la Recherche en Sciences Sociales. Numéro thématique Le savoir-voir, 1984, n. 54, p. 85-87. Disponível: https://www.persee.fr/doc/arss_0335-5322_1984_num_54_1_2228. Os tradutores agradecem à Revista Actes de la Recherche en Sciences Sociales e, especialmente, à secretária de redação, Sylvie Prin, pela atenciosa assistência no processo de autorização da entrevista.
4 Professor emérito da Universidade de Liége (Bélgica) e professor honorário do Conservatório Nacional de Artes e Ofícios (França).
5 Sob a pressão da American Sociological Association, que acabara de elegê-lo presidente, ele aceitou se encontrar em 1980 com o jornalista inglês Peter David, do Times Higher Education Supplement (The Reluctant Self-Presentation of Erving Goffman, THES, 19.9.1980, p. 7). A entrevista foi dada não na forma de um diálogo, mas de um resumo, no qual aparecem apenas três breves citações ipsis litteris. Peter David explica de maneira muito delicada a atitude de Goffman a esse respeito: “Seria tentador minimizar a aversão de Goffman pela publicidade, considerando-a como uma idiossincrasia inexplicável, ancorada numa timidez crônica ou numa forma de arrogância às avessas. Goffman, entretanto, não é um homem ostensivamente tímido e sua sociologia menos ainda. (...) E ele também não é um homem arrogante. Na conversa, Goffman parece sinceramente reservado, não no plano afetivo, porque acreditaria que a modéstia seria particularmente virtuosa, mas no plano intelectual, porque não se considera – a si mesmo, com sua personalidade e suas emoções de pessoa privada – como uma explicação aplicável à sua sociologia. Ele gostaria que suas publicações falassem e fossem julgadas por si mesmas. Elas contêm a melhor e a mais clara das apresentações de suas ideias. Se elas não obtivessem sucesso, seu fracasso não poderia ser atenuado por nenhuma outra palavra pronunciada ulteriormente e conservada sem rigor (na forma de uma entrevista publicada)”.
6 Goffman provavelmente se refere aqui ao conhecido artigo de Marcel Mauss: As técnicas do corpo. In: Sociologia e antropologia. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.
7 BATESON, Gregory. Naven: um exame dos problemas sugeridos por um retrato compósito da cultura de uma tribo da Nova Guiné, desenhado a partir de três perspectivas. São Paulo: Edusp, 2008. [N.T.]
8 A organização filantrópica, intitulada Josiah Macy Foundation, se dedicou a problemas do sistema nervoso, tendo promovido o encontro de importantes cientistas da época em um amplo leque de áreas de especialização. O objetivo era discutir causalidade circular e feedback em sistemas biológicos e sociais (Circular Causal and Feedback Mechanisms in Biological and Social Systems). [N.T.]
9 Goffman faz alusão ao colóquio organizado por Thomas Sebeok [1920-2001] em 1962 na Universidade de Indiana (cf. SEBEOK, HAYES, BATESON (eds.). Approaches to Semiotics. La Haye : Mouton, 1964).
10 Goffman escreve no Prefácio: “(...) Esse conceito (comunicação) foi uma das noções mais promissoras das ciências sociais. Ao longo dos últimos quinze anos, cada geração de pesquisadores aplicou-a em novas áreas com novas esperanças. Mas se a comunicação frequentemente foi oferecida como uma panaceia universal, ela raramente apresentou resultados. Por isso o termo se aplica de maneira central e evidente – os canais socialmente organizados de transmissão da informação – tendo recebido muita pouca atenção etnográfica sistemática. E a descoberta de que a comunicação poderia ser utilizada num amplo sentido para cobrir o fenômeno da interação face a face se revelou quase desastrosa: a comunicação entre duas pessoas em presença uma da outra é efetivamente uma forma de interação ou de conduta face a face, mas ela jamais seria somente e nem sempre uma forma de comunicação” (GOFFMAN. Strategic Interaction. Philadelphia: University of Pennsylvania Presse, 1969, p. ix).
11 GOULDNER, Alvin. The Coming Crisis of Western Sociology. New York: Basic Books, 1970.
12 As Fundações Wenner-Gren (The Wenner-Gren Center Foundation for Scientific Research, The Axel Wenner-Gren Foundation for International Exchange of Scientists e The Foundation Wenner-Grenska Samfundet) apoiam por meio de financiamentos, intercâmbios científicos internacionais. [N.T.]

Autor notes

2 Professora Titular do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pósdoutorado pela École des Hautes Études en Sciences Sociales - Paris (2014) e Doutorado em Ciências da Educação pela Université René Descartes - Paris V Sorbonne (2001); E-mail: ione.valle@ufsc.br; https://orcid.org/0000-0001-7496-3959
3 Professor-pesquisador em regime contratual e de dedicação exclusiva na Université de Lorraine, Nancy, França. Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); E-mail: tiago.ribeiro-santos@univlorraine.fr; https://orcid.org/0000-0002-0941-167X


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