DOSSIÊ: CONDENAÇÕES E ACUSAÇÕES INJUSTAS
Recepção: 13 Maio 2022
Revised document received: 13 Maio Maio Maio Junho Julho 2022
Aprovação: 20 Julho 2022
DOI: https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i2.717
Resumo: A investigação criminal deve ser eficiente na tarefa de identificar autores de crimes e fornecer elementos para o início da ação penal, sem, todavia, violar os direitos dos suspeitos. Os procedimentos policiais adotados atualmente em inquéritos policiais são simplistas, sobretudo em investigações relativas à criminalidade de rua, geralmente direcionadas a obter confissões dos suspeitos e depoimentos de testemunhas. As falhas de procedimento, em geral, surgem com a Polícia, se mantém com o Ministério Público e produzem seus efeitos mais dramáticos com a decisão judicial, especialmente nos casos em que a vítima é convidada para um ato de reconhecimento formal do suspeito. Essa realidade motivou, no Brasil, a mudança do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que passou a exigir o cumprimento fiel das disposições do Código de Processo Penal. O próximo passo na correção de tais erros depende de uma transformação da rotina policial, com a fiscalização do Ministério Público e a rejeição da prova ilícita pelo juiz, por meio da adoção de critérios que imprimam racionalidade ao procedimento policial, por meio da apropriação do conhecimento científico acumulado sobre a dinâmica dos reconhecimentos equivocados.
Palavras-chave: Investigação criminal, Falhas, Reconhecimento formal, Superior Tribunal de Justiça, Mudança de jurisprudência, Novas rotinas policiais, Presunção de inocência, Polícia, Ministério Público, Judiciário.
Abstract: The criminal investigation must be efficient in the task of identifying criminal offenders and providing elements for the prosecution, without, however, violating the rights of those suspects. The police procedures currently adopted in police investigations are oversimplified, especially in investigations related to street crime, which usually focused on obtaining confessions of suspects and witness statements. Failures of police procedure are endorsed by the criminal prosecutor and produce their most dramatic effects with a judicial decision, mainly in the cases in which the victim of the crime is invited to a formal identification of the suspect. This framework motivated, in Brazil, the Superior Court of Justice to overrule an old precedent, in order to, from then on, demand the faithful fulfillment of the rules of the Criminal Procedure Code. The following steps in correcting such errors depend, however, on a transformation of the police procedures, on prosecutors overseeing this police work, and on the adoption of exclusionary rules by the judges. Furthermore, they must rely on scientific knowledge of the dynamics of mistaken identifications.
Keywords: Criminal investigation, failures, formal identification of suspects, jurisprudence overruling, Superior Court of Justice, new procedures by police officers, presumption of innocence, prosecutor, judiciary.
I. INTRODUÇÃO
No contexto da atividade estatal de punir culpados e absolver inocentes, espera-se que as instituições e seus agentes funcionem de tal modo a ensejar um grau de eficiência que corresponda às justas expectativas da população – cuja satisfação permite a coesão e a ordem social – sem, todavia, desatender aos legítimos direitos daqueles que são acusados de violar as leis penais.
A Lei Fundamental de 1988, cuja viga mestra é a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) – que dá ao Estado Democrático de Direito uma dimensão antropocêntrica, em que o homem é um ser com dignidade, um fim e não um meio, um sujeito e não um objeto2 – consagrou um processo penal de cariz democrático, o qual assegura ao acusado o respeito às “regras do jogo”, mediante o devido processo legal. E, para além da ótica exclusivamente processual do due process of law e tendo em vista a instrumentalidade do processo, o direito deve ser compreendido como um sistema de garantias, que realize dupla função: “de um lado, tornar viável a aplicação da pena, e de outro, servir como efetivo instrumento de garantia dos direitos e liberdades individuais, assegurando os indivíduos contra os atos abusivos do Estado”3.
Assim também pensava o saudoso Prof. Rogério Tucci, quando ressaltava, já na primeira edição de sua mais festejada publicação, que o processo penal objetiva dupla finalidade: “por um lado, a tutela da liberdade jurídica do indivíduo, membro da comunidade” e “por outro, o de garantia da sociedade contra a prática de atos penalmente relevantes, praticados pelo ser humano, em detrimento de sua estrutura”4.
Sob essa matriz teleoaxiológica, o Poder Público, para tanto, utiliza seu aparato oficial à procura de um resultado que traduza a realização do direito objetivo (a segunda das funções acima referidas). E essa realização do direito objetivo dá-se, concretamente, pela busca da verdade processual e constitucionalmente válida5, a partir da qual se possa, ao acusado, ou aplicar uma sanção, se considerado culpado e responsável pela prática de um delito, ou declarar sua inocência, quando as evidências não autorizarem o julgamento favorável à pretensão punitiva.
Em diversas palavras, o fim do processo “só pode ser a descoberta da verdade e a realização da justiça”, por meio de uma decisão obtida de modo “processualmente admissível e válido”6. Ainda que com algum sacrifício epistemológico, há de ser feita a escolha, posto que nem sempre compreendida pelo público, entre o possível (no mundo dos fatos) e o aceitável (no mundo do Direito). Deveras, “a investigação e a luta contra a criminalidade devem ser conduzidas de uma certa maneira, de acordo com um rito determinado, com observância de certas regras. A dignidade e a moralidade do instrumento utilizado constituem, de per si, um valor a ser perseguido e que se colocam como limite à liberdade do investigador”7.
O modo de ser do processo, portanto, é que legitima o resultado alcançado – a efetiva prestação jurisdicional – aos olhos de quem sofre o peso do braço punitivo estatal e aos olhos, também, da comunidade. Uma condenação pode ser materialmente justa, porque de um modo ou de outro se reuniram provas suficientes para revelar a culpabilidade do autor em relação ao fato criminoso. Mas poderá se deslegitimar e, então, não cumprir aquilo a que se propõe um Estado Democrático de Direito, se não decorreu de um devido processo legal, sob sua ótica procedimental, com a observância estrita das formas e das normas pertinentes.
Disso já falava, em meados do século XIX, Francesco Carrara:
Não basta que o juízo tenha atingido efetivamente seu fim jurídico, isto é, de conduzir à exata cognição da verdade enquanto seja propriamente condenado o verdadeiro culpado, e condenado somente na medida de seu merecimento. É necessário que o povo creia nisso. Eis o fim político das formas processuais. Quando as formas não forem observadas, a confiança pública na justiça do julgado não é senão a confiança na sapiência e na integridade do homem que julgou, e nem todos podem tê-la; mas quando as formas forem observadas, a confiança pública se apoia racionalmente nessa observância8.
Interessa, ou deveria interessar, à comunidade saber não apenas que o culpado por uma infração penal foi punido, mas que a inflição da pena, na medida da culpabilidade do sancionado, decorreu de um processo no qual hajam sido observadas as “regras do jogo”, sem favorecimentos indevidos, sem atropelos, sem excessos nem arbitrariedades. E que as provas sobre as quais se assentou o juízo de condenação foram epistemologicamente idôneas, suficientes e devidamente valoradas, mediante justificativa racional, pelo juiz competente.
É preciso, para tanto, que não só a atividade jurisdicional se revista de tal legitimação procedimental (calha lembrar Calamandrei, quando diz que a justiça necessita “não somente de ser, mas de parecer justa”9); é mandatório que todos os demais órgãos que integram o sistema de justiça criminal assim se pautem no desempenho de suas funções.
Dito isso, a pergunta que motiva o centro dos argumentos deste escrito é: Como devem policiais, promotores de justiça e juízes, no desempenho de suas funções, agir para que a investigação criminal possa se desenvolver de modo a respeitar as garantias fundamentais do indivíduo e ao mesmo tempo fornecer prova idônea e válida para a futura ação penal?
Este é, cabe a ênfase, o ponto a ser desenvolvido neste estudo: a percepção de que toda a atividade persecutória e judicial do Estado, em qualquer esfera (jurisdicional ou administrativa) e em qualquer dimensão temporal ou espacial, deve revestir-se da preocupação de expressar o ponto ótimo da qualidade do serviço público nesse doloroso campo de limitação ou de supressão da liberdade humana.10
II. A DINÂMICA DAS INVESTIGAÇÕES POLICIAIS
Sobre a atividade instrutória em juízo muito já se falou e escreveu. O mesmo não se pode dizer do que se realiza, em nome do Estado, no âmbito da investigação policial, ou, para ser mais abrangente, da investigação criminal, em que se investiga o cometimento de um crime, para identificar seu autor e fornecer ao titular da ação penal os elementos informativos suficientes e necessários para, se assim entender, propor a ação penal.
Essa atividade inicial se dá quase sempre, no Brasil, em uma delegacia, espaço próprio da Polícia Civil, visto que, ao contrário do que se verifica em outros países, o Ministério Público brasileiro – como órgão a quem se incumbe, com exclusividade, o exercício da ação penal pública – opera de modo burocrático e passivo, ainda que, eventualmente, possa acompanhar, ou ele próprio empreender, o trabalho investigativo, o que geralmente se nota ocorrer em casos de macrocriminalidade, nos quais há empenho institucional mais nítido, mercê, inclusive, da criação de grupos especializados, que recebem o nome de Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado).
Certo é que, no tocante ao grosso da criminalidade de rua – crimes violentos, patrimoniais, ou contra a vida, e os relacionados ao tráfico de drogas –, o trabalho investigativo é invariavelmente feito pela Polícia Civil, com a particularidade de que, nos delitos de mercancia ilícita de drogas, as provas que selam o destino do inquérito policial e da futura ação penal costumam ser os depoimentos prestados por policiais militares que, quase sempre, foram os agentes públicos a efetuar a prisão em flagrante-delito dos suspeitos.11
Dito de outro modo, à parte os crimes relacionados ao tráfico de drogas – em que pequenos traficantes e usuários de substâncias psicoativas são presos em operações de rotina das guarnições da Polícia Militar –, quase tudo que se produz, em nível de formação de provas dos crimes em geral, para futuro uso na ação penal, sai do interior de uma unidade da Polícia Civil.
E, sendo ainda mais específico – até porque é disso que iremos tratar doravante –, a prova do crime de roubo, nas hipóteses em que não se haja flagrado e prendido o seu autor, consiste, eminentemente, em um ato a que o Código de Processo Penal denomina “reconhecimento formal de pessoa”, tal qual positivado no art. 226 daquele diploma legal.
Isso ocorre porque, quando ao crime não sucede uma prisão em flagrante, o trabalho de investigação se direciona a tentar identificar o autor da ação, contando com o auxílio da vítima, quer por declarações, quer por descrição do assaltante, para elaboração de um retrato falado, quer, ainda, por identificação de um suspeito que a Polícia lhe apresente como tal.
Por vezes, logo após o evento, a vítima descreve o assaltante para a guarnição da PM e esta, em diligências nas imediações, logra prender alguém com características supostamente similares, sendo o suspeito imediatamente trazido ao local onde se encontra a vítima – quando esta própria não acompanha os policiais – para que confirme tratar-se da pessoa que a abordou.
Quando isso ocorre e o produto do roubo ou algo que ligue o suspeito ao delito é encontrado em seu poder, dificilmente se colocará em dúvida o ato de reconhecimento – informal, saliente-se – realizado pela vítima. Em situações assim, nem seria necessário um ato formal na delegacia, porque já se deu o apontamento direto do autor do crime, logo após sua ocorrência, pela pessoa lesada, o que se amolda, talvez com algum esforço argumentativo, ao que dispõe o art. 302 do CPP.
Decerto que se poderão levantar questionamentos sobre a confiabilidade de tal identificação – insisto não se tratar de ato de reconhecimento formal –, mas, pela experiência de foro, dificilmente se desacreditará a versão acusatória apoiada em uma situação assim, máxime quando flagrado o suspeito na posse de instrumento ou produto do roubo, ou quando confessa seu cometimento.
Bem diversa será a situação em que, não identificado o autor do roubo logo após sua ocorrência, a Polícia Civil convida a vítima para, horas, dias, semanas ou meses depois do crime, realizar um ato de reconhecimento formal do suposto autor do crime.
Nesse caso, a crônica judiciária, alimentada por relatos reproduzidos em ações penais e em habeas corpus, exibe uma riqueza de situações – das mais imponderáveis e absurdas, para dizer o mínimo – de violação frontal ao determinado na lei processual no que diz respeito a esse meio de prova.
A lei em questão é o Código de Processo Penal, que dedica três sucintos artigos ao ato do reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226, 227 e 228). Em relação ao reconhecimento de pessoas, o art. 226 estabelece que o ato deverá ocorrer da seguinte forma: a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever o indivíduo que deva ser reconhecido (art. 226, I); a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la (art. 226, II); se houver razão para recear que a pessoa chamada para realizar o ato, por intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa a ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela (art. 226, III); do ato de reconhecimento lavrar-se-á termo pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais (art. 226, IV).
III. ALGUNS CASOS DE ERROS JUDICIÁRIOS RELACIONADOS À PROVA DE RECONHECIMENTO FORMAL
A despeito da clareza do que preceitua tal comando normativo – especialmente quanto à exigência de que a vítima deva, antes de iniciar o ato, fornecer as características da pessoa a ser reconhecida, bem como quanto à previsão de que sejam alinhados, ao lado do suspeito, outras pessoas a ele semelhantes –, são frequentes os casos de realização do ato sem a observância de tais formalidades.12
De fato, motivado pela mudança de jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça, a partir da decisão proferida pela Sexta Turma no julgamento do Habeas Corpus n. 598.886-SC (Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe 18/12/2020), realizou-se levantamento com os dados oficiais dos processos, especialmente os de habeas corpus e de recursos em habeas corpus que tramitaram no Superior Tribunal de Justiça no período de 27/10/2020 a 19/12/2021, entre decisões colegiadas e monocráticas dos dez ministros que integram as duas turmas criminais da Terceira Seção, do que resultou a identificação de 89 concessões da ordem postulada, tendo como base a constatação de falha, vício ou inexistência do ato de reconhecimento formal do acusado.13
Nesse universo, houve casos de reconhecimentos feitos presencialmente – é dizer, com o suspeito detido na delegacia e apontado pela vítima do roubo (no levantamento em apenas 13 casos, dos 89 catalogados, o reconhecimento foi feito presencialmente) – ou a partir de fotografia(s) do suspeito, estampada(s) em álbum de suspeitos da própria unidade policial ou simplesmente extraídas de redes sociais e exibidas à vítima.
Cito, a título de exemplo, alguns casos reproduzidos nesse levantamento:
No RHC n. 133.408/SC (DJe 18/12/2020), de relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, não ficou demonstrado que o reconhecimento fotográfico realizado na fase do inquérito policial fora corroborado por outros elementos de prova amealhados no feito. Os acusados estavam com rostos parcialmente cobertos, sem que fosse possível ver totalmente suas faces, apenas detalhes de cor de pele, olhos, compleição física.
No HC n. 630.949/SP (DJe 29/3/2021), de minha relatoria, identificaram-se diversas irregularidades no auto de reconhecimento. Além disso, o ofendido deixou claro que foram apresentados outros indivíduos por foto, mas, para o reconhecimento pessoal, o acusado foi exibido sozinho. Previamente ao reconhecimento pessoal, foram mostradas à vítima várias fotos, entre as quais estaria, segundo a autoridade policial, a do indivíduo envolvido no roubo, sugestionando, portanto, que ao menos uma pessoa deveria ser reconhecida como indivíduo que participou do delito e buscando, na verdade, já uma pré-identificação do autor do fato. Ou seja, a vítima não recebeu expressamente a opção de não apontar ninguém no reconhecimento pessoal que foi realizado depois da exibição das fotografias.
O AgRg no AREsp n. 1.722.914/DF (DJe 28/4/2021), de relatoria da Ministra Laurita Vaz, trouxe hipótese na qual a vítima reconheceu o agravante apenas na fase investigativa, depois de lhe serem mostradas as fotos constantes de álbum fotográfico e porque o conheceria das redes sociais. O ofendido disse que reconheceu o acusado pela “touca” que usava no dia do delito, inclusive porque teria ele uma foto nas redes sociais em que portava a mesma peça de vestuário. Contudo, a vítima afirmou haver se lembrado do agravante em razão das características de seu rosto, que seriam bem peculiares (rosto seco e nariz achatado). Disse, ainda, que o reconheceu pelas tatuagens no braço; entretanto, ao mesmo tempo, afirmou que este estava com blusa de mangas compridas no momento da prática delitiva, o que se mostra incompatível, a menos que as instâncias ordinárias houvessem explicitado o motivo pelo qual seria possível esse reconhecimento, o que não ocorreu.
No HC n. 648.232/SP (DJe 21/5/2021), de relatoria do Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF1), o réu foi reconhecido através de uma viseira aberta de seu capacete, acessório que usava no momento do fato. Destaca-se, da sentença absolutória, que a vítima, certamente dificultada pela visibilidade e pelo uso de capacete, não foi nada assertiva no reconhecimento pessoal em juízo.
No julgamento do HC n. 652.284/SC (DJe 3/5/2021), o Ministro Reynaldo Soares da Fonseca registrou que “o reconhecimento fotográfico serve como prova apenas inicial e deve ser ratificado por reconhecimento presencial, assim que possível”.
A esses casos somam-se os já mencionados no HC n. 598.886/SC, relativamente a processos em que se ilustrou algo presente com relativa frequência na crônica judiciária, conforme breve narrativa ali feita do que ocorreu com os acusados Vinícius Romão de Souza, André Luiz Medeiros Biazucci Cardoso, Luiz Carlos Justino, Douglas Moreira, Antonio Claudio Barbosa de Castro e Lucas Moreira de Souza.14
Em arremate, faço menção a evento que se poderia chamar de a mais clara amostra do tipo de investigação que se tem produzido com base em prova como tal: no Ceará, em inquérito no qual investiga a Chacina da Sapiranga, que deixou cinco mortos em Fortaleza – CE, a Polícia Civil incluiu em reconhecimento fotográfico uma foto do ator americano Michael B. Jordan. Como dito por Janaina Matida e William Cecconello:
O fato de que uma foto de um ator hollywoodiano tenha tido sua imagem exibida em investigação no Ceará escancara a total ausência de critérios para a inclusão/exclusão da fotografia de alguém em álbum de suspeitos bem como a falta de transparência quanto à procedência/origem delas, pois é inegável que a imagem foi conseguida na internet, sem que se impusesse qualquer freio à utilização da imagem daquela pessoa.15
Ainda sobre o levantamento realizado com dados da Seção Criminal do Superior Tribunal de Justiça, a data do crime relativo a cada processo examinado permite concluir, considerando que o ato de reconhecimento não tenha ocorrido muito tempo depois, que a quase totalidade dos casos julgados no sentido da desconformidade do ato com o modelo normativo refere-se a fatos acontecidos antes da decisão proferida no HC n. 598.886-SC. Isso leva à ilação de que, após a mudança da orientação jurisprudencial ocorrida com o julgamento desse habeas corpus – acórdão publicado em 27/10/2020 –, não foi significativo o número de impetrações em que se reconheceu tal ilegalidade.
O dado pode ser animador, se pudermos extrair a conclusão de que tem havido alguma ressonância, nas instâncias ordinárias – como se deveria esperar que houvesse –, da nova diretriz do MSTJ, mesmo que se tenha notícia de um caso ou outro em que a autoridade judicial ainda decreta prisão ou até condena o acusado diante de um conjunto probatório que se resume tão somente ao ato de reconhecimento formal viciado.
Digna de registro, a propósito, foi a expedição, em 7 de janeiro de 2022, pela Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, do Aviso 2ªVP 01/2022, por meio do qual o Desembargador Marcus Basílio recomenda aos magistrados fluminenses que reavaliem, com urgência, “as decisões em que a prisão preventiva do acusado foi decretada tão somente com base no reconhecimento fotográfico operado sem a observância do disposto no art. 266 do CPP”, medida alvissareira e indicativa de uma compreensão, por parte da cúpula daquele importante tribunal, acerca da necessidade de mudança da orientação que até então prevalecia.16
Cabe, aqui, importante registro: como já dito, os tribunais, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, mantinham uma linha de decisão invariavelmente tolerante com os vícios do ato de reconhecimento de que resultavam prisões e condenações de réus acusados do cometimento de roubo.
No voto proferido na relatoria do HC n. 598.886-SC, fez-se questão de destacar esse detalhe:
Por sua vez, precedentes dos Tribunais, inclusive desta Corte Superior e também de minha relatoria, tem tolerado essas irregularidades, sob o argumento de que o art. 226 do CPP constitui “mera recomendação”, não ensejando nulidade da prova eventual descumprimento dos requisitos formais ali previstos. [...] Não obstante essa orientação jurisprudencial, proponho sejamos capazes de abandonar essa interpretação, mercê da qual se convalida, de algum modo, o reconhecimento – tanto pessoal quanto fotográfico – feito em desacordo com o modelo legal, ainda que sem valor probante pleno, e que pode estar dando lastro a condenações temerárias.
É assustador – e constrangedor – imaginar quantas pessoas podem ter sido presas e cumprido pena no passado em razão dessa tolerância cômoda à admissão de tal tipo de procedimento policial, cujos vícios eram considerados irrelevantes, pois, afinal, dizíamos que o art. 226 do CPP constituía “apenas uma recomendação”.
Por isso, é de fundamental importância que se consolide essa nova jurisprudência, em todos os graus de jurisdição; mais do que isso, urge que as próprias corporações policiais se conscientizem da necessidade de modificar suas rotinas para evitar novos erros judiciários.
Nesse sentido se empenha Grupo de Trabalho, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, integrado por mais de 40 profissionais, acadêmicos e pesquisadores de diversas origens, do qual se esperam alguns produtos que irão contribuir para a minimização dos riscos de erros judiciários causados por falhas no processo de reconhecimento de pessoas.17
IV. A NECESSIDADE DE MELHORIA DA QUALIDADE DA ATIVIDADE INVESTIGATIVA
Nosso Código de Processo Penal acaba de completar 80 anos de existência, e, não obstante as reformas legislativas que lhe foram modificando os institutos e os procedimentos, visando à sua modernização, conserva ainda o ranço inquisitorial e autoritário de sua origem.
Como tive ocasião de anotar em apresentação a obra coletiva:
Certo é que vivíamos, no primeiro quartel do século XX, sob a influência de governos e líderes políticos de viés autoritário, de que resultava a sedimentação de ideias centradas no predomínio do Estado, com a anulação do indivíduo em prol do bem-estar social, a Era de Extremos referida por HOBSBAWM e estereotipada no Brasil especialmente pela bipolarização política que marcou a década de 30 do Século XX, tendo, de um lado, a Ação Integralista Brasileira, de influência fascista e, de outro, a Aliança Nacional Libertadora, vinculada aos ideias do comunismo.
Na trilha do movimento europeu, a ditadura de Getúlio Vargas construiu um Estado corporativo, baseado numa concepção hierárquica e orgânica da sociedade. Nessa ambiência política, infensa a ares democráticos, é outorgado o Código de Processo Penal de 1941, que bebeu na fonte do homólogo código italiano, declaradamente voltado para a conservação e defesa do Estado, característica do então regime fascista ali vigente.
Daí soar natural a assertiva do fautor do Código de Processo Penal de 1941, o Ministro da Justiça Francisco Campos, para quem “o interesse da administração da justiça não pode continuar a ser sacrificado por obsoletos escrúpulos formalísticos [...]”, sendo mister forjar-se um procedimento apto a permitir “maior eficiência e energia da ação repressiva do Estado contra os que delinquem” (Exposição de Motivos).
Semelhante carga ideológica e estatizante da versão original do nosso atual Código começa a ruir com a democratização do Brasil, nomeadamente com a promulgação da Carta Política de 1988, momento em que, definitivamente e com um século de atraso, o nacional deixa de ser súdito e passa a ostentar o título de cidadão, com uma miríade de direitos individuais reconhecidos no Bill of Rights (art. 5º) da Carta de 1988, não por acaso conhecida, desde a referência feita por um de seus próceres, o Deputado Constituinte Ulisses Guimarães, como a Constituição Cidadã.18
Pois bem, já se vão mais de três décadas desde a implantação da nova ordem constitucional e parece ainda estarmos, em alguns segmentos, impregnados de certos hábitos e visões de mundo que grassavam nesse modelo que forjou nossa cultura jurídica nos séculos passados. Como também já anotei,
O pensamento jurídico dominante na Justiça Criminal brasileira – tanto no mundo das normas e da Academia (law on the books) quanto no mundo dos fatos e do Fórum (law in action) – ainda se prende a valores, costumes, rotinas e normas características de uma formação jurídica de origem lusitana. Estamos a falar, portanto, de “permanências histórico-culturais do direito ibérico de um modo geral e do direito português, de modo particular” (NEDER, 2000, 13), as quais deixaram muitas marcas em nosso Código de Processo Penal, principalmente na divisão dos papéis desempenhados pelos sujeitos processuais responsáveis pela persecução penal, ao longo dos 300 anos de regime colonial, quase 70 de regime monárquico (imperial) e 100 anos de regime republicano, até o advento da Constituição de 1988.
Em verdade, do Brasil, por tudo o que ocorreu em seus três séculos de domínio português, pouco se podia esperar. Colonização predatória, ausência de brasilidade dos que transitaram ou se instalaram em nosso território, aversão ao trabalho por parte dos detentores do capital e das terras, sacralização da educação dos habitantes, inexistência de investimento na cultura e nas ciências são alguns dos fatores que atrasaram a inclusão do país no concerto das nações contemporâneas.19
Sobre o tema, Luiz Eduardo Soares observa que “a arquitetura institucional da segurança pública, que a sociedade brasileira herdou da ditadura e permaneceu intocada nesses trinta anos de vigência da Constituição Cidadã, impediu a democratização da área e sua modernização”, o que contrasta “com o dinamismo acelerado que vem caracterizando o país no último quarto de século”. Conclui, assim, que “a transição democrática não se estendeu ao campo da segurança pública”.20
De fato, se examinarmos os procedimentos adotados em inquéritos policiais, não iremos notar nada de substancialmente diferente em relação ao que sempre se fez, nomeadamente em investigações por crimes de rua.
É dizer, a lógica que prevalece nas investigações é a usual, direcionada a obter confissões e depoimentos de testemunhas. E, especialmente no caso dos crimes de roubo, a diligência fundamental, que assegura a tranquilidade à autoridade policial – “desvendei a autoria” – é o ato de reconhecimento do investigado.
No sistema das provas legais, vigente em boa parte da Idade Média, estabeleciam-se prévia e abstratamente algumas regras para a avaliação da prova. Havia tabelas, em que se atribuía uma espécie de valor ou tarifa a cada meio de prova, daí também ser conhecido como sistema das provas tarifadas. Dessa época vêm aforismos, ainda influentes em seus desdobramentos práticos, como é o caso da antiga regra segundo a qual confessio est regina probationum (a confissão é a rainha das provas). E, em nome dessa regra probatória, os maiores abusos e crimes foram cometidos e justificados, sem considerar os prejuízos causados à qualidade das investigações em geral, visto que se deixava de buscar outras fontes de prova mais idôneas e seguras quando se obtinha a confissão do suspeito.
O reconhecimento formal do suspeito tem, mutatis mutandis, a mesma função da confissão: permitir à autoridade policial considerar encerrada a tarefa de investigar a autoria delitiva e, por conseguinte, considerar provado o crime, em seus aspectos objetivo e subjetivo. É o que ele precisa para concluir o inquérito e enviá-lo ao representante do Ministério Público. Este, por sua vez, não se constrange, em boa parte dos casos, de acusar alguém com base tão somente em um reconhecimento formal, quase sempre levado a cabo sem a mínima observância do que determina a lei. A denúncia é oferecida, o acusado, provavelmente, já estará preso – com base também nessa prova isolada – e o processo caminhará até a instrução, na qual, mesmo com a ausência de confissão do réu, e sem que se perquira sobre o procedimento adotado no momento do reconhecimento na delegacia, o juiz, à luz da confirmação, pela vítima, de que reconheceu mesmo o imputado na fase inquisitorial, o condena às penas do crime de roubo.
Esse é o usual script retratado nos muitos processos que têm chegado ao Superior Tribunal de Justiça, em habeas corpus impetrados, muitas vezes, anos depois da condenação, animados pela mudança de rumos da jurisprudência dessa Corte. Nota-se, como assere Janaína Matida, que “sob a retórica do combate à criminalidade e à impunidade, o reconhecimento sem apreço às formalidades se consolidou como rotina nas delegacias de polícia Brasil afora, logo chanceladas por promotores e magistrados nas etapas que se seguem ao inquérito criminal.”21
Em outro texto, a mesma autora (na companhia de William Cecconello) foi mais enfática:
condenações injustas são produto de uma cadeia de irregularidades cometidas por uns, aproveitadas e chanceladas por outros. Cuidar seriamente de evitar condenações injustas demandará um giro comportamental que, entre outras coisas, deverá conduzir ao abandono da lógica das investigações a jato que se contentam com verdadeiros vazios probatórios. É preciso rumar para o desenvolvimento de uma investigação epistemicamente orientada que não ofereça injustificado protagonismo a uma única prova, muito menos quando é irregularmente produzida.22
Insta reforçar que, conquanto a responsabilidade maior seja do magistrado que chancela essa prova e a considera idônea e suficiente para a condenação (ou para a prisão cautelar), mesmo à falta de outras que robusteçam a versão acusatória, a falha se dá porque a autoridade policial, que produziu a prova, e o Ministério Público, que a usou como lastro para acusar o réu e/ou requerer sua prisão e condenação, deixaram de seguir o comando normativo. Ou seja, o erro não é meramente judicial (ou judiciário); é um erro que nasce com o delegado de polícia (ou, eventualmente, antes, com os policiais militares), se mantém com o promotor de justiça e se densifica e produz seus efeitos mais duradouros e dramáticos com a pena do magistrado.23
Esse erro sistêmico depende, para ser extirpado (ou, ao menos, minimizado), de uma mudança da rotina policial, mediante a forte atuação fiscalizadora do Ministério Público – de quem se espera não apenas a função de receber, passivamente, as provas produzidas pela Polícia, o que vou explorar adiante – e a rejeição da prova pelo juiz competente. Em uma palavra, é preciso rever os “costumes persecutórios” e o automatismo com que se tratam esta e outras questões relativas à investigação criminal, inclusive, se for o caso, abandonando-se o “conforto dos entendimentos pacificados” no âmbito jurisprudencial.24
V. NOVAS ROTINAS INVESTIGATIVAS PELA POLÍCIA CIVIL
No voto proferido no já referido Habeas Corpus n. 598.886/SC, destacou-se um item para exortar os órgãos de persecução penal – e o próprio Poder Judiciário – a imprimirem racionalidade a esse procedimento policial, de sorte a se apropriarem de “técnicas pautadas nos avanços científicos para que se promovam os ajustes necessários a evitar que os reconhecimentos equivocados sigam produzindo condenações de inocentes” (Innocence Project Brasil – Prova de reconhecimento e erro judiciário. São Paulo. 1. ed., jun./2020, p. 3).
Fez-se alusão, inter alia, a Machado e Barilli, que asseriram:
A academia já foi capaz de produzir inúmeras pesquisas sobre as mazelas do sistema de persecução penal, inclusive das nefastas práticas policiais quanto às falsas identificações pessoais. Faltam, agora, estratégias concretas que, acolhidas pelo poder público, possibilitem a devida instrução e correta implementação de protocolos técnicos de reconhecimento pessoal nos diferentes âmbitos da Justiça criminal brasileira.25
A observação de ambos os professores é correta e precisa: é farta hoje a literatura sobre a exigência de se imprimir racionalidade à atividade probatória, com a criação de standards que, seguidos, poderão conferir mais idoneidade e segurança às provas produzidas em ações penais.
Reclama-se uma dimensão epistêmica na produção dos elementos de conhecimento sobre os fatos em torno dos quais gira a atividade probatória, de tal sorte a assegurar que se obtenham “todos os meios lícitos relevantes e razoavelmente disponíveis aos sujeitos processuais”, quanto à “melhor prova razoavelmente disponível sobre os pontos fáticos controvertidos”.26
Cabe avançar para a concretização do discurso acadêmico. E a iniciativa para a devida conformidade dessa prova ao modelo legal deve partir também das próprias Polícias (civil e federal).
Em 2014, a Academia Nacional de Ciências norte-americana convocou um painel de especialistas para investigar o problema da identificação de testemunhas oculares, a partir de evidências crescentes de registros científicos (baseados em testes de DNA) de condenações de inocentes. Concluíram que tais disfuncionalidades decorrem de uma pletora de erros, que vão desde a ingenuidade científica e o viés investigativo até o desrespeito do Ministério Público e a ignorância judicial, bem como uma tendência humana natural de confiar no que as pessoas dizem. Por fim, ofereceram algumas sugestões de reforma de tais procedimentos:
[...] Essas recomendações foram: (1) treinar todos os policiais sobre as variáveis que podem afetar a identificação de testemunhas oculares; (2) adotar procedimentos “cegos” de alinhamento e matriz de fotos (como ter o procedimento administrado por um policial que não está envolvido na investigação subjacente; (3) fornecer aos oficiais que administram os procedimentos instruções padronizadas para oitiva de testemunhas destinadas a evitar sugestividade e contaminação; (4) documentar o nível de confiança declarado da testemunha no momento da identificação; e (5) filmar processo de identificação de testemunhas.27
Até que essas mudanças não ocorram voluntariamente no âmbito das próprias polícias, cumpre ao Ministério Público exercer efetivamente a função de controle externo da atividade policial, dada sua ínsita função de custos iuris, a qual deflui do desenho constitucional de suas missões, com destaque para a “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 127, caput), bem assim da sua específica função de “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos [inclusive, é claro, dos que ele próprio exerce] ... promovendo as medidas necessárias a sua garantia” (art. 129, II).
Não é desnecessário lembrar, outrossim, como bem frisa Figueiredo Dias, que
interessando à comunidade jurídica não só a punição de todos os culpados mas também – sobretudo dentro de um verdadeiro Estado de Direito – a punição só dos que sejam culpados, segue-se daí que ao Ministério Público, como órgão de administração de justiça, há de competir trazer à luz não só tudo aquilo que possa demonstrar a culpa do arguido, mas também todos os indícios de sua inocência ou da sua menor culpa.28
Arremata o mestre lusitano que, mesmo sob o ponto de vista prático, não faz sentido extirpar do Parquet esse dever de objetividade, pois graças a ele resulta um “muito menor número de processos penais infundados ou mal fundados” com os quais os tribunais terão de ocupar-se.29
O Poder Judiciário, a seu turno, tem a responsabilidade de proteger os direitos do acusado contra incursões arbitrárias ou ilegais por parte dos órgãos de persecução.
Mais ainda, é preciso que se tenha a coragem de, doravante, não mais validar qualquer reconhecimento – pessoal ou fotográfico – em desconformidade com o art. 226 do CPP.
Na precisa assertiva de Antônio Vieira, “[...] a prevenção de erros e, especialmente, de condenações errôneas, passa por uma importante mudança de atitude em relação ao reconhecimento de pessoas, passando da postura – comum até então – de confiança exagerada e percepção de suficiência na prova de identificação para uma atitude de ceticismo epistêmico”.30
Nessa perspectiva, ao julgar o Habeas Corpus n. 712.781 (Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 15/3/2022, DJe 22/3/2022), fez-se o seguinte registro, em voto acolhido à unanimidade perante a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça:
Sob outra perspectiva, devem as agências estatais de investigação e persecução penal envidar esforços para rever hábitos e acomodações funcionais, de sorte a “utilizar instrumentos para maximizar as probabilidades de acerto na decisão probatória, em particular aqueles que visam a promover a formação de um conjunto probatório o mais rico possível, quantitativa e qualitativamente”.
(Ferrer-Beltrán, op. cit., p. 255).
Impõe compreender-se que a atuação dos agentes públicos responsáveis pela preservação da ordem e pela apuração de crimes deve se dar em um marco de respeito às instituições, às leis e aos direitos fundamentais. Ou seja, quando se fala de segurança pública, esta não se pode limitar à luta contra a criminalidade; deve incluir também a criação de um ambiente propício e adequado para a convivência pacífica das pessoas e respeito institucional a quem se vê na situação de acusado e, antes disso, de suspeito.
Convém lembrar que as prescrições legais relativas às provas cumprem não apenas uma função epistêmica, i.e., de conferir fiabilidade e segurança ao conteúdo da prova produzida, mas também uma função de limitar o exercício do poder dos órgãos encarregados de obter a prova para uso em processo criminal, vis-à-vis os direitos inerentes à condição de suspeito, investigado ou acusado.
Nesse sentido, é sempre oportuna a lição de Perfécto Ibañez, que divisa na exigência de cumprimento das prescrições legais relativas à prova uma função implícita, que é a de induzir os agentes estatais à observância dessas normas, o que se perfaz com a declaração de nulidade dos atos praticados de forma ilegal. E acrescenta:
De que esto se haga con rigor depende, en buena parte, la regularidad de ulteriores actuationes; como la irregularidad endémica de muchas de las que habitualmente se producen entre nosotros, depende de la escasa relevancia y alcance que – en general por razones defensistas que no acostumbran a explicitarse – suele atribuirse a algún género de incumplimientos.
(IBÁÑEZ, Perfecto Andrés. La función de las garantías en la actividad probatoria. In: La restricción de los derechos fundamentales de la persona en el proceso penal. Madri: 1993, p. 242-242).Essa nova linha jurisprudencial implica, certamente, desconstituição de decisões e anulação de processos, com possível incremento do número de culpados beneficiados (nos casos em que, tendo sido efetivamente autores de um roubo, forem beneficiados pelo reconhecimento da invalidade da prova formada em seu desfavor). Mas implica, em direção contrária, a soltura e a absolvição de pessoas injustamente processadas, porque inocentes, e a evitação de novos erros judiciários, minimizando, assim, o percentual de casos de condenações injustas e ilegais. É a opção pela diretriz de que nenhum inocente pode ser punido, mesmo que isso implique a não punição de alguns culpados. 31.
VI. A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA JÁ NA FASE INVESTIGATIVA COMO PREMISSA PARA O APERFEIÇOAMENTO DA PROVA PRODUZIDA
Na compreensão do significado e do alcance da presunção de inocência, quer como princípio-motriz, quer como derivação do favor rei, sobreleva reconhecer que sua mais forte injunção se verifica na vertente de regra de tratamento.
Sob tal angulação, o princípio da presunção de inocência exige que o investigado ou acusado seja tratado com respeito à sua pessoa e à sua dignidade e que não seja equiparado àquele sobre quem já pesa uma condenação definitiva. Mais ainda, o estado de inocência assegura ao investigado ou réu a “lealdade do procedimento penal”, desde seu nascedouro. Assim, todos os que de algum modo intervêm no inquérito e no processo (juízes, membros do Ministério Público, policiais, servidores) se obrigam a ter uma “correção de comportamento”, vinculados aos limites e à forma da lei, relativamente ao sujeito passivo da persecução penal32, de sorte a impedir o Poder Público “de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário (HC n. 115.613, Relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 25/6/2013, DJe-155, 13/8/2014).
Ainda há muito a caminhar, não apenas em países sem tradição democrática, mas também em nações centrais, onde são férteis os exemplos de anacronismos punitivos, autoritarismos de agentes públicos, desumanidades no cumprimento de penas e uma ainda surpreendente falta de claro repúdio social a práticas não mais compatíveis com uma sociedade que se pretende “fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias” (Preâmbulo da Constituição do Brasil, de 1988).
Decerto que a postura da sociedade em relação ao modo de ser do processo penal tem a ver com a maneira autoritária ou respeitosa com que o Estado, por suas agências punitivas e seu Poder Judiciário, conduz a relação processual no que concerne ao tratamento dispensado ao acusado. “Diz-me como tratas o arguido, dir-te-ei o processo penal que tens e o Estado que o instituiu”, como alerta Figueiredo Dias33, bem expressa essa dupla possibilidade.
Nessa perspectiva, e ante a percepção de que a porta de entrada do sistema de justiça criminal é a unidade policial, é preciso que os Estados democráticos hodiernos se deem conta de que a proteção dos cidadãos por parte dos agentes da ordem deve se dar em um marco de respeito às instituições, às leis e, também, aos direitos fundamentais. Ou seja, quando se fala de segurança pública, esta não se pode limitar à luta contra a criminalidade; deve incluir também a criação de um ambiente propício e adequado para a convivência pacífica das pessoas e respeito institucional a quem se vê na situação de acusado e, antes disso, de suspeito.34
Carnelutti, em uma de suas fecundas lições, expressou a compreensão de que “o castigo, infelizmente, não começa com a condenação, senão que começou muito antes, com o debate, a instrução, os atos preliminares, inclusive com a primeira suspeita que recai sobre o imputado.”35
Assim, o zelo com que se houver a autoridade policial ao conduzir as investigações determinará não apenas a validade da prova obtida – afinal, como metaforicamente lembra Jordi Ferrer-Beltrán, “sem bons ingredientes não haverá forma de fazer um bom prato”36 – mas a própria legitimidade da atuação policial e sua conformidade ao modelo constitucional, assentado em valores e princípios como o da dignidade da pessoa humana e o da presunção de não culpabilidade, malferidos quando o suspeito já é tratado como um culpado e se lhe subtrai o direito a que toda prova eventualmente produzida em seu desfavor passe pelo teste da racionalidade e da idoneidade epistêmica.
A propósito, Thiago R. Oliveira, André Zanetic e Ariadne Natal anotam que as instituições de segurança e justiça costumam adotar uma estratégia de impor o respeito à lei por meio da dissuasão, maximizando a certeza e a severidade da pena pelos crimes praticados. Nesses sistemas – em que se inclui o modelo brasileiro – o policiamento valoriza indicadores da “eficácia policial” apresentados como números de apreensões e prisões, em detrimento de questões como vitimização, percepção da população a respeito de medo, insegurança ou mesmo a qualidade do tratamento dos policiais.
Por certo, afirmam os pesquisadores, que os países assim configurados conseguem alguma eficácia no papel de estimular o respeito à lei, mas outros caminhos poderiam levar a um resultado melhor. Apoiados na teoria da justiça procedimental, desenvolvida originalmente por Tom Tyler e testada por uma série de pesquisas realizadas em diversos países, o que melhor estimula a obediência da população às normas relaciona-se à legitimidade da autoridade, ou seja, “envolve o modo como seus agentes se comportam durante os encontros com os cidadãos: sendo tratados com respeito e imparcialidade e reconhecendo decisões tomadas com alta qualidade, os indivíduos tendem a perceber a autoridade como legítima.”
Vale a menção a alguns segmentos do texto:
Outrossim, Tyler argumenta que o julgamento que as pessoas fazem a respeito da forma como as leis são aplicadas e como a autoridade age no cotidiano são elementos fundamentais para assegurar a legitimidade. É o que ele chama de “justeza procedimental” (procedural justice, no original), um conceito que faz referência à qualidade do processo decisório e do tratamento interpessoal, levando em conta a existência dos seguintes elementos: a) participação nas decisões, ou seja, se as pessoas envolvidas são ouvidas e seus pontos de vista considerados; b) neutralidade, que envolve decisões objetivas baseadas em fatos, sem viés pessoal, discriminação ou favorecimento de grupos específicos; c) transparência com relação aos procedimentos e decisões tomadas; d) qualidade do tratamento interpessoal, o que envolve, educação, dignidade, respeito e cortesia; e) confiança nas intenções das autoridades e que suas decisões levam em consideração, o bem-estar e a necessidade daqueles que são afetados.
(Sunshine e Tyler, 2003; Tyler, 2004, 2009).
[...] O modelo de Tyler contrapõe essencialmente os meios e os fins do trabalho policial. De acordo com esse autor, o que faz com que a população confira legitimidade à instituição policial não é uma avaliação positiva do trabalho realizado pelos policiais, isto é, não é a eficácia policial; mas a avaliação positiva do tratamento recebido pelos oficiais. Havendo justeza nos procedimentos cotidianos e nas interações entre cidadãos e policiais, maior a percepção de legitimidade.37
De fato, sem que haja uma postura de respeito ao indivíduo, inclusive o que se apresenta como suspeito de um crime, não há avanços a assinalar na área da segurança pública e do sistema de justiça criminal como um todo.
Isso não significa desconsiderar os indícios que levem à possível responsabilização penal do suspeito, muito menos significa negligenciar os meios probatórios e investigativos postos à disposição da polícia para o esclarecimento da autoria delitiva. Em verdade, o que se espera de todo e qualquer agente público que potencial ou atualmente interfere na liberdade de alguém é um comportamento de respeito às normas e, acima de tudo, civilidade no trato com os envolvidos em um fato criminoso, nada mais do que isso.38
Sublinhe-se, ainda, que a tão apregoada presunção de inocência não diz respeito apenas à atividade judicial ou processual, pois incide em qualquer dimensão funcional do Estado quando um de seus agentes se depara com a atribuição de uma possível acusação contra alguém. Desde o policial militar, passando pelas autoridades policiais e pelo representante do Ministério Público, todos, sem exceção, devem tratar o suspeito ou acusado, até que se prove o contrário, como inocente.
Perfecto Ibáñez obtempera que “a vigência do princípio da presunção de inocência, com todas as suas implicações, é o que impede que o processo penal seja um mero rito formal de castigo”, tanto sob a vertente da regra de tratamento do acusado – “primeiramente assumida como reação às atrocidades da justiça do ancien régime, com a massiva utilização da tortura” – como, “sobretudo, em sua qualidade de regra de julgamento”, caracterizada à necessidade de que a aplicação do ius puniendi seja “associada à prévia determinação de uma verdade fáctica de qualidade, seguindo um curso processual que, inescusavelmente, deverá decorrer dentro de um exigente marco de garantias jurídicas”. E esse direito a que se presuma sua inocência “unicamente poderá decair na presença de prova condenatória suficiente para superá-la, mas se, e apenas se lícita ou regularmente adquirida. Portanto, depois de que isso já tenha sido produzido. Nunca antes.”39
Mesmo para quem, como Jordi Nieva Fenoll, considera não incidir a presunção de inocência na atividade pré-processual – porque “la policia no parte de la presunción de inocência en sus investigaciones” e, assim, “tiene de utilizar la sospecha como motor de sus actuaciones, porque de lo contrario no las realizaria” – e ainda que, em compensação, sustente a ausência de valor probatório, para um juízo de condenação, do material investigativo e até pericial feito na fase anterior ao processo judicial, não admite, por óbvio, tratamento divorciado do modelo normativo e desrespeitoso aos direitos de quem ainda não é culpado.40
Isso violaria não apenas a presunção de não culpabilidade – sob a vertente, ao menos, da regra de tratamento – como, antes, a própria dignidade da pessoa humana, que, entre nós, não custa rememorar, é fundamento da República (art. 1º, III, da Constituição de 1988) e princípio fundante de toda a atividade estatal, mormente a persecutória.
Nessa perspectiva, o processo penal, conforme lição da saudosa professora Ada P. Grinover,
não pode ser entendido, apenas, como instrumento de persecução do réu. O processo penal se faz também – e até primacialmente – para a garantia do acusado. [...] Por isso é que no Estado de direito o processo penal não pode deixar de representar tutela da liberdade pessoal; e no tocante à persecução criminal deve constituir-se na antítese do despotismo, abandonando todo e qualquer aviltamento da personalidade humana. O processo é uma expressão de civilização e de cultura e consequentemente se submete aos limites impostos pelo reconhecimento dos valores da dignidade do homem.41
VII. CONCLUSÃO
Urge, portanto, que as polícias modifiquem seus procedimentos investigatórios, de sorte a conferir maior confiabilidade epistêmica aos elementos informativos e provas produzidas na fase do inquérito policial; e que o Ministério Público cumpra seu papel de fiscal do direito, exercendo maior controle sobre a qualidade da investigação policial.
Mas não é só. A mudança de rumos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça produziu uma nova orientação para toda a investigação criminal assentada na prova do reconhecimento formal de pessoas suspeitas de crimes, mas os efeitos desse overruling somente se tornarão reais e irreversíveis se os juízes e tribunais do país forem mais rigorosos na avaliação dessa prova, repudiando o material probatório que não esteja em conformidade com o modelo normativo.
Somente assim se evitará a reedição de casos como os mencionados ao longo do texto, que certamente representam uma ínfima parte do que já ocorreu e continua a ocorrer com um universo de pessoas submetidas a esse tipo de procedimento investigatório. É premente, portanto, a cessação desses abusos, quotidianamente noticiados nas mídias e na crônica judiciária. A dor, o desespero, as privações, as perdas materiais e morais causadas por uma prisão injusta são irreparáveis.42
O exemplo de Ângelo Gustavo Pereira Nobre, produtor cultural que ficou preso por um ano, acusado da prática de um crime de roubo ocorrido em 2014, reproduz a situação de tantas outras vítimas do falho reconhecimento fotográfico. Após ser solto, soltou um desabafo, que representa o sofrimento de todos os que passaram por similar situação:43
Depois desse tempo todo que passei lá dentro e vendo o que está acontecendo com esses outros jovens, como João, Jeferson, Raoni e Alberto, me dá um nó na garganta e questiono: isso nunca vai acabar? Nós, jovens negros, estaremos sempre correndo o risco de sermos privados da nossa liberdade a qualquer momento? De qualquer jeito? Isso nunca vai acabar? Somos nós que temos que criar provas para provar nossa inocência e não o Estado? Por quê?!!
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Notas
Autor notes
Editor-in-chief: 1 (VGV)
Associated-editor: 2 (MDe KF)
reviewers: 2
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Declaração de interesses