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Sonhos que migram: atrizes e atores brasileiros em Nova York
Migrating Dreams: Brazilian actresses and actors in New York
Suenos que migran: actrices y actores brasilenos en Nueva York
Sociedade e Cultura, vol. 20, núm. 2, pp. 74-94, 2017
Universidade Federal de Goiás

Dossiê

Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos: Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, sendo o trabalho simultaneamente licenciado sob a Creative Commons Attribution License o que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria do trabalho e publicação inicial nesta revista. Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista. Autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado (Veja O Efeito do Acesso Livre).

Recepção: 18 Julho 2017

Aprovação: 14 Setembro 2017

Resumo: Neste artigo trabalhamos com as narrativas de jovens de classemédia brasileira que viajaram para Nova York, nos EstadosUnidos, ao longo da segunda década do século XXI, coma intenção de se especializarem como artistas. Movidas/ospor expectativas de imersão no mercado de entretenimentoestadunidense, migraram com o sonho de tentar uma carreirano exterior. Estamos particularmente interessados em analisara forma como esses sujeitos lidaram com o hiato entre asexpectativas iniciais e as condições materiais experimentadas.Entre o plano de estrelato e sua realização, enfrentam ummercado competitivo, entraves burocráticos e a instantânea“racialização” de seus corpos – especialmente no caso dasmulheres. Elegemos a noção de “quebra de expectativas”– suas consequências e efeitos – como objeto de análise, eprocuramos inspiração no que se convencionou chamar depesquisas “multissituadas”, atentos que estamos como alegoriase sonhos que transitam entre cidades.

Palavras-chave: Artistas, migração, Estados Unidos, sonhos, quebrade expectativa.

Abstract: In this article we work with middle class young adults Brazilians who traveled to New York, inthe United States, with the goal of transforming themselves into artists. Moved by expectationsof immersion in the American entertainment market, they migrate with the intention of tryinga new career abroad. We are particularly interested in analyzing how these subjects dealt withthe gap between the initial expectations and the material conditions experienced. Between thestardom plan and their achievement, they face a competitive market, bureaucratic problemsand the instantaneous “racialization” of their bodies – especially among women. We selectedthe notion of “drop in expectation” – its consequences and effects – as the main object ofanalysis and took as inspiration what has been called, in the bibliography, as “multi-situational”researches, paying attention to how allegories and dreams circulate between the two cities.

Keywords: artists, migration, United States, dreams, drop in expectation..

Resumen: En este artículo trabajamos con las narrativas de jóvenes de clase media brasileña que viajaron aNueva York, Estados Unidos, en los años 2010, con la intención de especializarse como artistas.Motivados por expectativas de inmersión en el mercado de entretenimiento estadounidense,emigraron con el sueño de emprender una carrera en el exterior. Estamos particularmenteinteresados en analizar la forma en que estos sujetos se ocupan de la brecha entre las expectativasiniciales y las condiciones materiales experimentadas. Entre el plano de estrellato y su realización,enfrentan un mercado competitivo, obstáculos burocráticos y la instantánea “racialización” desus cuerpos – especialmente en el caso de las mujeres. Elegimos la noción de “quiebra deexpectativas” – sus consecuencias y efectos – como objeto de análisis y buscamos inspiración enlo que se ha convenido llamar de investigaciones “multi-situadas”, atentos que estamos a cómoalegorías y sueños transitan entre ciudades

Palabras clave: Artistas, migraciones, Los Estados Unidos, sueños, ropimiento de las expectativa.

Processos migratórios costumam ser experimentadospor sujeitos como eventos que instauram rupturas.Constituem-se como pontos de inflexão (no tempo,no espaço e nas ações) que produzem significadosirreversíveis. No interior dessa trajetória, uma série deprojeções povoam os imaginários dos sujeitos envolvidos,e constituem uma espécie de pavimento – ainda que movediço – para os passos que serão então tomados. Aí estão sonhos gestados nainfância, desejos fomentados na adolescência, expectativas cultivadas aos poucos e quese transformam em poderosos combustíveis para a mudança. Contudo, ao pousarem nanova realidade social, esses mesmos personagens enfrentam desafios, deparando-se comproblemas sequer formulados e precisam adequar suas práticas às novas condições.

Neste artigo, trabalhamos com as narrativas de jovens de classe média brasileira – amaioria proveniente da região sudeste do país – que viajaram para Nova York, nos EstadosUnidos, com a firme intenção de se especializarem como atrizes e/ou atores. Movidas/os por expectativas de imersão no mercado de entretenimento estadunidense, migraramno início da segunda década do século XXI para tentar uma carreira no exterior. Comoprimeiro passo, procuravam em geral o aprendizado – ingressando em cursos e faculdadesespecializados. No entanto, aos poucos, passaram a pleitear trabalho no competitivomercado de artistas dos EUA.

Estamos particularmente interessados na análise de como esses sujeitos lidaram como hiato entre as expectativas iniciais e as condições materiais experimentadas. Eleger essaquestão permite acessar, simultaneamente, duas dimensões de suas experiências migratórias:de um lado, o imaginário que ronda artistas e alimenta sonhos de sucesso; de outro, ascondições sociais, econômicas e legais enfrentadas diante desse novo cotidiano. Entre o planode estrelato e sua realização, encontram um mercado competitivo, entraves burocráticos e ainstantânea racialização de seus corpos – especialmente no caso das mulheres.

Ao eleger a noção de “quebra de expectativa” – suas consequências e efeitos –como objeto de análise, procuramos encontrar uma alternativa teórica para lidar comoposição entre micro ou macro análises. A questão passa a ser: como repertórios de sucessoinformam sujeitos em migração e quais seus impactos diante da realidade encontrada?

Para tanto, buscamos inspiração em pesquisas que procuram escapar da polarização entreo local e o global e exploram espaços “entre”. Durante os anos 1990 várias possibilidadesteóricas foram formuladas visando lidar com esse tipo de problema. Nesse contexto,testemunhou-se uma grande proliferação de textos que pretendiam, por sua vez, dialogarcom os novos eventos e circunstâncias que emergiam num mundo dito “globalizado”. Osuposto é que diante desse novo cenário, metodologias mais tradicionais da antropologia –calcadas no modelo malinowskiano de “fazer etnográfico” e na concentração da pesquisaem um único local e em um dado período temporal – teriam se mostrado incapacitadas aestudar e entender fenômenos, como esses, em trânsito2. Desde os anos 1980 duas tradiçõestêm apresentado formulações inéditas para esse tipo de problema: a chamada “teoria daprática” discutiu a relação entre sujeitos e estruturas e a crítica pós-moderna vem refletindosobre as estabilizações tecidas pelas meta teorias3. Em 1995, o antropólogo estadunidense George Marcus elaborou um texto que, de um lado, fazia um balanço dos experimentos antropológicos realizados até aquele momento; de outro, sintetizava as soluções e os rumos possíveis para próximas pesquisas. Marcus (1995) destacou dois modos de lidar como trânsito entre escalas micro e macro na antropologia. Uma das estratégias consiste emexplicar as práticas observadas localmente como situadas em macroteorias; ou seja, comoexemplos do contexto. A outra estratégia, etnografa a “circulação” de atores, objetos ediscursos nos múltiplos pontos do globo. A essa metodologia Marcus chamou de “etnografiamultissituada”; um exercício de mapeamento analítico, cujo objetivo não é a representaçãoholística, um retrato do sistema mundial em sua totalidade, mas o desenho de cadeias,caminhos, conjunções e justaposições. Distanciando-se de pesquisas singularmente situadas,a proposição permitiria seguir pessoas, coisas, metáforas, histórias (narrativas ou alegorias),biografias e conflitos. Vale lembrar, por exemplo, que estudos migratórios têm buscadoassumir tal procedimento de análise, acompanhando um grupo particular de sujeitos.

Neste texto, em diálogo direto com as estimulantes formulações de Marcus, faremoso esforço de seguir não pessoas, mas sim, uma alegoria: o “sonho” de sucesso. Melhordizendo, como tal narrativa está sendo mobilizada, atualizada e experimentada por esses/as artistas. Importante salientar que, em suas falas, a cidade de Nova York aparece comosinônimo de prestígio na busca desse tipo de especialização profissional. E é justamenteesse imaginário que anima tais sujeitos a tentar a saída via a migração. O objetivo éinvestigar como repertórios forjados em circunstâncias e localidades específicas passama transitar de forma transnacional mobilizando sujeitos a agirem em diálogo com taisnarrativas, sonhos e expectativas.

A escolha desses intérpretes como objeto privilegiado de análise não foi acidental.Na arte de representação, histórias e técnicas forjadas em locais, os mais variados, sãoatualizadas constantemente nos corpos de artistas. Ao assumir que podem interpretardiferentes papéis nos EUA, atrizes e atores brasileiras/os estão, no limite, supondo que:1) suas habilidades artísticas lhes facultam expressar personagens também em outrasrealidades culturais; e 2) os repertórios sociais entre Brasil e EUA não são tão distantes aponto de impedirem o ofício – nesses termos, histórias de amor, ódio, traição e assim pordiante, seriam, por definição, “universais”.

Na prática, o desafio foi perseguir, a partir de falas e ações, as expectativas queesses sujeitos possuíam. Ouvindo as gravações das entrevistas repetidas vezes anotamosentonações e silêncios. Prestamos particular atenção à seleção das palavras, à organizaçãodas frases e à orquestração do pensamento. O ajuste do olhar para o uso dos termos esuas pequenas inflexões propiciou investigar como artistas formulavam suas trajetórias:narravam, entre outros, sonhos iniciais em contraste com as condições de trabalho e vidaexperimentadas na nova cidade.

O texto se divide em quatro partes. Na primeira, apresentamos, de forma breve, o perfil dessas/ es artistas e os motivos que forneceram o combustível para a viagem. Em seguida, trabalhamos a dimensão temporal que atravessa esse conjunto de narrativas - o processo migratório é experimentado como um evento definidor da trajetória que marca um antes e um depois na carreira e na vida dos sujeitos aqui abordados. Lidamos então com as questões burocráticas experimentadas; os vistos de entrada criam, por exemplo, um empecilho legal - e muitas vezes não planejado - para essas pessoas. Por último, apontamos como esses sujeitos acabam por se "descobrir racialmente" nos EUA. Não raro, por lá são classificados como "latinas/os" e segmentados num tipo específico de papel.

Atrizes e atores do Brasil em Nova York – quem são?

Embora a migração de atrizes e atores para os EUA pareça um ato anômalo e muitoexcepcional, é preciso salientar que a iniciativa ganhou maior dimensão no início dasegunda década do século XXI. A título de exemplo, em 2012, o canal Multishow datelevisão a cabo brasileira, produziu um reality show chamado “Dançando na Broadway”.Seis jovens atores e atrizes brasileiras/os, mas residentes em Nova York, competiampara saber quem seria a/o artista mais preparada/o para ingressar no mercado do teatromusical daquela cena artística. A cada dia, participantes apresentavam uma música e umacoreografia para um júri composto de profissionais do teatro local. No final de cadaepisódio, era escolhido/a um vencedor ou uma vencedora. Foram filmados 14 episódiosde 30 minutos, todos transmitidos entre 27 de Julho e 16 de Novembro de 2012, nassextas-feiras, às 21h30.

Quando tomamos conhecimento do programa, nos idos de 2015, Bernardo haviarecém começado sua pesquisa de doutorado sobre o trânsito de repertórios teatrais entreNova York e São Paulo. Ficamos intrigados com a coincidência e com o que aquelenovo programa poderia sinalizar: um fluxo significativo de artistas imigrantes brasileirosnos EUA capaz de justificar a produção de um reality show a ser exibido em horárionobre das sextas à noite. Decidimos então assuntar mais a questão. Foi nesse contextotambém que resolvemos enfrentar a literatura antropológica mais recente, que vem sedebruçando sobre o tema das migrações. O material é tão vasto como diverso. Há estudosque abordam as maneiras como migrantes brasileiras/os se inseriram no setor de serviçosdomésticos e trabalhos informais em países estrangeiros (Assis, 2011; Margolis, 2009;Martins Jr, 2012; Ribeiro, 1999; Sales, 1999). Outros, ainda, tratam dos modos como asmulheres são introduzidas na indústria do sexo (Mayorga, 2006; Piscitelli, 2007a, 2007b;Maia, 2009). Há uma bibliografia que estuda a correlação entre sexualidade, gênero eraça, posicionando a circulação de mulheres em um contexto de fluxos transnacionais depessoas e mercados (Piscitelli, 2007b; Cabezas, 2010; Togni, 2015). Há também aqueles quetomaram como tema as formas como sujeitos construíam seu dia a dia fora do Brasil como intuito de refletir sobre a importância dos fluxos migratórios em contextos variados,sem resumi-los a deslocamentos econômicos ou caracterizá-los, apenas e exclusivamente,como “migrantes econômicos” (Rezende, 2009; Dias, 2009; Dias; Martins Jr, 2013).

Muitas dessas reflexões contribuíram para pensar sobre as rotas de atrizes e atoresentre cidades. Contudo, essa forma de migração é distinta daquela tradicionalmenteestudada pela literatura, na qual brasileiras e brasileiros, embora muitas vezes oriundos deextratos médios urbanos, estão dispostos a cumprir atividades de pouco prestígio social.

Por exemplo, para restringir a análise aos EUA, os estudos de Assis (2011), Margolis(2009), Ribeiro (1999) e Sales (1999) indicam como brasileiras/os se inserem no setor deserviços domésticos e trabalhos informais desse país.

Para definir as particularidades sociais dessas/es imigrantes, propusemos um diálogocom o estudo de Igor José de Renó Machado (2006) sobre brasileiros em Portugal. Oantropólogo lista oito eixos de clivagem que, combinados, afetariam a experiência demigrantes. São eles: 1) classe; 2) temporalidade da imigração; 3) gênero e sexualidade; 4)ascendência; 5) cor/raça; 6) ocupação no mercado de trabalho; 7) origem regional no paísde origem; e 8) religião. Fazemos aqui, então, uma breve reflexão tentando levar em contaalguns desses eixos para a análise.

No caso de artistas que viajam para se tornar profissionais do teatro, a maior ambiçãosão os postos ocupados pelos próprios cidadãos americanos: os holofotes, a atenção eos aplausos. Esses sujeitos não operam com o tripé “trabalhar/acumular/retornar”,identificado por Dias e Martins Jr. (2013). As ambições parecem conversar com umagramática diversa que envolve sonho, estudo, trabalho e sucesso. Diferentemente dasbrasileiras e dos brasileiros presentes no texto de Margolis (1994; 2009)4, na etnografia enas entrevistas, a invisibilidade não parece ser uma posição desejável. Entrar no mercadode entretenimento é ambicionar visibilidade. Pleiteando espaço, essas/es artistas precisamoperar um novo patamar no jogo de representações: alguns/mas tinham a ambição de poderdesempenhar qualquer papel e evidenciar a extensão de sua capacidade interpretativa; jáoutras/os, percebiam-se marcadas/os por sua origem – classificadas/os como brasileiras/os ou latinas/os –, o que limitava a variedade das personagens que poderiam executar.Produtores chamam a atenção para as dificuldades que o sotaque cria, diretores de castinginsistem em selecionar as atrizes brasileiras para representar somente personagens definidascomo “latinas sensuais”.

Ao mesmo tempo, essas pessoas dispõem de uma posição econômica e social bastanteprivilegiada, como declara Oscar:

Eu não sei se é fato, mas aqui em Nova York tem dois núcleos de brasileirosque são diferentes [...]. O pessoal das artes, que se conhece. É o pessoal quetem grana e que quer morar aqui e que os pais bancam. E o pessoal queveio ilegal e que vive outra vida. Que veio para fugir do Brasil. [...] Eles sãopreocupados em construir a vida deles aqui. [...] Eu tenho convicção de quesou privilegiado, eu conheço pessoas que fizeram faculdade aqui, que nãosão ricos, que que tiveram outro tipo de educação. Mesmo em Nova York euestou dentro de uma bolha seletiva. Outros brasileiros talvez tenham outraexperiência com isso (Oscar, 27 anos, 2015)5.

O jovem ator nomeia como “pessoal das artes” o grupo que experimenta uma trajetóriasimilar a sua – com “grana”, “ajuda financeira dos pais” e que buscavam “educação”. Osdemais, “preocupados em construir uma vida”, são classificados como “pessoal que veioilegal”6. Em seus termos, o primeiro grupo representa um seleto conjunto de intérpretesque pertence, na sua grande maioria, aos extratos médios urbanos de grandes centrosmetropolitanos do Brasil. Ingressaram nos Estados Unidos com um visto de estudantecom o objetivo de frequentar um curso de teatro no país, ambicionando qualificar-se nastécnicas de interpretação, dança e canto. Nota-se como de início já dominam o inglêscomo idioma. Apenas posteriormente estendem a estadia e batalham pela obtenção dovisto de trabalho ou mesmo o green card7. Dentre as/os entrevistadas/os, chama a atençãoo fato de ninguém se arrepender da mudança e das escolhas de vida que as/os levarama esse destino. Muitas delas/les já se conheciam, mas não necessariamente conviviam oueram amigas e amigos.

No total, foram seis mulheres e cinco homens entrevistadas/os. O número podeser sinal de uma quantidade restrita de intérpretes brasileiros residentes em Manhattanou, ainda, a evidência da seleção de um grupo específico e razoavelmente homogêneo.Consideramos que as duas hipóteses não são excludentes. Aliás, tal registro não pode serdestacado do contexto econômico e político do país nesse momento8, como também ofato de que esse tipo de migração é, em si, privilégio de estratos econômicos médios ealtos que podem investir (em dólar) na carreira de suas/seus filhas/os. Trata-se, inclusivede uma carreira que, segundo as/os próprias/os entrevistadas/os, não assegura estabilidadefinanceira a quem a persegue. Notável o suporte material que a maioria obteve dos pais;salvo três, todos os demais dependiam – em maior ou menor grau – financeiramenteda família para pagar algumas contas. Valiam-se dessas suas relações, sobretudo, para ofinanciamento dos cursos e o aluguel na cidade. Somente com esses recursos econômicose disponibilidade de tempo esses sujeitos conseguiriam superar as burocracias legais eassegurar o prolongamento de sua estadia.

Importante salientar que entre essas/es artistas, a migração aparece como um projetoindividual. A viagem é feita de maneira solitária, sem a supervisão ou a companhia de familiares. O motivo, segundo eles, é um “sonho”. Para realizá-lo, inscrevem-se em umcurso de teatro e fazem o esforço para finalizá-lo. Embora a família ofereça suportefinanceiro, esses sujeitos constroem o discurso valorizando seu investimento pessoal –entendem-se como indivíduos que ambicionam superar barreiras e fronteiras para alcançaruma posição privilegiada em um centro hegemônico cultural e economicamente. É,portanto, uma migração distinta daquelas estudadas por Fusco (2007) ou Assis (2011)nas quais as/os migrantes dispõem de uma “rede solidária” para ajudá-los, e que oferecesuporte afetivo e, por vezes, financeiro para migrantes em novas terras. Já no caso dessas/esartistas entrevistadas/os, elas/eles não dispunham da mesma situação; os cursos de teatroem que se inscreveram apareciam como os principais catalizadores de suas relações desociabilidade. Reclamações sobre solidão eram comuns.

Quanto à seleção de pessoas para a entrevista, Bernardo entrou em contato com umaconhecida dele que havia se mudado para Nova York para fazer um curso de teatro. Emuma conversa informal – ela pediu para não ser uma entrevista – contou um pouco de suavida e passou e-mail e endereço das redes sociais de artistas brasileiras/os que conhecia.Entramos em contato com essas pessoas e marcamos os encontros. Na medida em querealizávamos as conversas, novas sugestões emergiam. A rede se ampliou e entrevistamospraticamente todos os sujeitos indicados – salvo aqueles que não responderam oudesmarcaram as conversas.

Dentre as pessoas selecionadas, a mais nova possuía 18 anos no momento da entrevistae a mais velha 35. A maior parte – sete – possuía entre 20 e 30 anos. Somente uma moravahá mais de 15 anos na cidade. Todas as demais haviam entrado no país nos últimos 5 anos,e apenas uma delas residia há menos de um ano em terras estrangeiras (justamente o maisjovem, de 18 anos). Aquelas/es que haviam migrado há mais de cinco anos, concluíramseus cursos de especialização (que duram, em média 2 a 3 anos) e insistiram no mercadonova-iorquino para obter trabalho e garantir o visto de permanência. Talvez a ausência depessoas acima de 35 anos revele que há um limite etário na perseguição desse “sonho”.Dentre os sujeitos que afirmaram não depender financeiramente dos pais em nenhumaspecto estão, justamente, um homem de 35 anos e uma mulher de 29. Oriundos, inclusive,de famílias que possuem recursos financeiros mais escassos.

Desses migrantes, somente dois não eram provenientes da região Sudeste do país(um era de Porto Alegre e outro de Brasília). Do total, sete haviam nascido no Estado deSão Paulo; mais da metade. Destacamos, ainda, que as origens não correspondiam àquelasestudadas por Assis (1999) e Fusco (2007) – a saber, o fluxo de naturais de GovernadorValadares (MG) e Criciúma (SC) para os EUA.

No que diz respeito à experiência escolar, um deles ingressou no ensino superior;três não terminaram os cursos que começaram; dois completaram um curso de cinemaem escolas particulares no Brasil; três finalizaram cursos que não estavam relacionadosà esfera artística; e três ingressaram em departamentos universitários nos EUA, todosligados às artes (uma em cinema e outros dois em Musical Theater).

Existem ainda outras diferenças referentes ao tratamento que esses indivíduosreceberam nos EUA, a forma como foram percebidas/os, a maneira como se posicionavame as frustrações a respeito dos limites de seus corpos – marcados por “raça” e gênero.Embora possam ser agrupadas sob o guarda-chuva “pessoal das artes”, essas mesmaspessoas ouviram (ou não) diferentes comentários a respeitos de sua nacionalidade e deseus corpos. No trânsito entre as cidades de origem e Nova York, algumas diferenças sefizeram presentes e outras continuaram silenciadas, vamos a elas9.

Entre a expectativa e a materialidade: o tempo

Relatos migratórios mobilizam recursos temporais em abundância. São projeçõesde futuro, retóricas com justificativas do presente indicando motivos no passado,traços de nostalgia da cidade natal e assim por diante. Nesta sessão, investigamos comointerlocutoras/es contavam suas biografias, atentos para a dimensão temporal. Notamoso zelo despendido para equilibrar o hiato entre as expectativas forjadas no Brasil e asexperiências em Nova York10.

Com seis anos eu assisti Cats11, sentada na sala. Eu falei para minha mãe queeu precisava mudar para Nova York. Minha mãe até deu uma entrevista paraum jornal [...]. E essa história eu não lembrava, ai eu lembrei quando eu li;quando ela contou. Eu tinha seis anos, eu estava assistindo Cats e eu vireipara minha mãe e eu disse: ‘mãe, eu preciso ir para Nova York’. E ai ela disse‘que isso menina?’ [...]. Aí eu respondi ‘Não mãe, é que eu preciso ir para láporque eu preciso ser essa gatinha’. Que era a gata branca que é a bailarina. Eaí ela me colocou no jazz porque eu queria ser bailarina. E aí desde pequenaeu falo que quero ser magalina (sic). E por isso que minha mãe me chama de‘magalina’ até hoje (Anita, 29 anos, 2015).

Anita é atriz e mora nos EUA desde 2011. Na época, residia no Harlem, dividindoo apartamento com o namorado. Nascida no interior de Minas Gerais, mudou-se paraa capital paulista depois de completar o ensino médio, e foi cursar arquitetura em umafaculdade particular. Ingressou então em uma escola de teatro para profissionalização ecomeçou a trabalhar em peças musicais na cidade.

Na entrevista, narrou como seu projeto era antigo, remontava à infância, à umamemória longínqua e em parte esquecida. Foi a mãe quem contou a versão da “gata” parauma jornalista, em 2012; uma matéria que realizava um balanço sobre a carreira da atriz.Impossível confirmar a veracidade do fato. Mas ela pouco importa, os efeitos e significadosda narrativa são, em si, importantes para essa reflexão. Talvez o objetivo da mãe, ao lhe contar o evento, fosse criar uma continuidade na trajetória da filha, produzindo assim uma narrativade sucesso: o sonho infantil de ir para Nova York e se tornar bailarina teria se realizado.

Mais à frente na entrevista, Anita explicitou qual foi o evento decisivo para começarseu projeto migratório. Durante o ensaio de uma grande peça de teatro profissional, em 2010, o diretor americano – responsável pela produção – lhe disse: “– você tinha que estarlá”. “– Foi um dia que eu apresentei ele para minha mãe. Minha mãe foi ao ensaio e aí elefalou para minha mãe, em inglês, que eu deveria estar aqui porque eles estavam fazendoaudição. Minha mãe falou ‘o que que ele está falando?’. Eu falei, ‘mãe, ele tá falandoque eu tinha que estar lá’ e ela ‘ele vai te levar?’. E aí eu falei para ele: ‘– minha mãe estáperguntando se você vai me levar’ e ele respondeu ‘–se você estivesse lá’”. A partir dessemomento, Anita começou a juntar dinheiro para a viagem. Um ano depois, embarcoupara Nova York e vive na cidade desde então.

Inquietos com os usos da temporalidade nessas narrativas, decidimos – comoprocedimento metodológico – grifar somente as passagens nas quais a atriz fazia referênciaao passado, ao presente e ao futuro. Sob esse filtro, as tessituras temporais cosidas por Anitaadquiriram relevância. Se colocarmos os acontecimentos evocados por ela em ordemcronológica notaremos uma coerência histórica nas suas escolhas. Primeiro, o seu desejoinfantil de morar em Nova York para fazer a gatinha de Cats, depois o convite do diretoramericano e, por último, a vida na grande cidade. Podemos, por outro lado, atentar paraa cronologia de seu próprio relato: a sugestão do diretor americano, em 2010, antecedeua lembrança da mãe de Anita, em 2012 – a história da “magalina” foi recordada somenteum ano depois da atriz chegar em Nova York, em 2011. Sem ambicionar escolher umasequência em detrimento da outra, ambas evidenciam como o esforço para retomar aopassado produz uma potente explicação.

A fala de Anita constitui uma espécie de biografia pregressa, uma justificativa presentee uma projeção futura. A própria estrutura de entrevista parece indicar a criação deuma unicidade, uma trajetória contínua, conforme pondera Schwarcz (2013). Vale a pena,porém, questionar a tendência a construir uma biografia pautada na mera causalidadesequencial – segundo Bourdieu (1996), sujeitos costumam atribuir sentido coerente àssuas ações e escolhas. No caso de Anita, parecia importante oferecer um relato biográficoem sequência alinhada de acontecimentos encadeados. A substância motivadora que lhealimentava era um “sonho” de dançar. Essa expectativa operava ora como combustívelpara as ações, ora como cola que aglutinava em sequência os fatos que justificavam a vidae as condições que tinha em Nova York.

Quando chegou, a atriz acreditava conseguir facilmente um emprego na Broadway,“achava que as pessoas iam ficar loucas por mim”. As expectativas sobre seu futuro erambastante altas. “Eu vim para Nova York achando que ia ser tudo muito incrível, tudomuito fácil, porque: ‘Nova York é o lugar, Nova York é fantástico’. Eu achei que eu ia estarsuper trabalhando porque as pessoas que eu conheci que vieram para cá ganharam muitodinheiro”. A fantasia de vida e sucesso na cidade catalisou suas economias, inspirações eresultou em uma migração.

Pode-se dizer que um discurso sobre sucesso em Nova York foi atualizado no corpode Anita. A atriz projetava para o futuro uma série de sinais sobre a cidade que haviaacumulado anteriormente. Segundo a socióloga Barbara Adam (2004), a capacidade deprojeção do futuro tem papel tão importante quanto a execução da reconstrução de umpassado. Sujeitos atuam como profetas e projetistas de suas próprias trajetórias: planejamférias, marcam encontros, imaginam planos para o ano seguinte e afins. Em suas projeções,Anita “colonizava seu futuro”12, isto é, tentava apaziguar possíveis angústias e incertezas.Ao comparar sua trajetória com as de outras pessoas que “ganharam muito dinheiro” emNova York ela convocava o “sonho” – o desconhecido – para seu domínio; transformavao risco em matéria passível de ser administrada.

Após as primeiras experiências ela acabou, porém, por reavaliar sua estada: “NovaYork tem mais ou menos 300.000 Anitas. [...] Mentira gente. Mentiram para mim [...]”.O impacto experimentado não diz respeito somente ao deslocamento espacial e àsnovas condições em que se encontrava, mas também à percepção de que seus cálculos eespeculações sobre Nova York estavam, de alguma forma, desterradas. Embora seu sonhoconstituísse a força de combustão, as condições materiais se impuseram e reordenam suasexpectativas e decisões. A promessa da cidade dos sonhos, ou dos sonhos na cidade, foipercebida emocionalmente com altas doses de mentira e dor.

Nos primeiros anos de estada, a atriz precisou dividir o quarto com um amigoseu, que também atuava como ator. “É muito caro morar aqui”, afirmou. “É muito carofazer aula, que é o que eu vim fazer”. Matriculada em um curso de pós-graduação dedança para estudantes internacionais, a meta de Anita era se especializar como bailarina.O dinheiro guardado pagava o curso e a passagem de ida, o restante precisaria arrecadartrabalhando. Após constatar a existência de outras “300.000 Anitas”, decidiu fazer testes.Também investiu em aulas de canto para melhorar o tom de sua voz.

O presente lhe exigia respostas rápidas e eficazes e, ao mesmo tempo, precisava serfruído de forma prazerosa. Em sua narrativa pessoal, Anita salienta como batalhara paraconseguir estar em um local considerado prestigioso. Sacrifícios, infortúnios e dificuldadeseram justificáveis. A retórica revela um tom de fiscalização da felicidade, como se fosse“obrigada” a desfrutar com absoluta satisfação a cidade e a vida que escolhera. Não porcoincidência, Anita deixou clara sua angústia: “Toda vez que eu fico desesperada eu penso‘que que eu tô fazendo aqui, porque que eu vim para cá, cara? Eu já tinha tanta coisalá [no Brasil]’”. No país de origem, vinha trabalhando com diretores e produtoras deteatro, reconhecidos, embora não tivesse alcançado uma posição de destaque nas peças.Mesmo assim, ao que tudo indica, imaginava para si um caminho ascendente na carreira.Em seguida, completou em tom de esperança: “Parece que eu desci um degrau, mas essedegrau que eu desci é só para eu subir mais três”.

Ao evocar a vida pregressa, de maneira levemente nostálgica, Anita questiona suaexperiência migratória. Segundo a pesquisadora Svetlana Boym (2001), é possível sentir nostalgia diante das expectativas que se constrói sobre o futuro. Isto é, segundo ela, épossível que uma pessoa sinta nostalgia do passado não como ele foi, mas sim, da formacomo ele poderia ter sido. A nosso ver, Anita parece experimentar três tipos de nostalgia:de um lado, sentia falta da posição que ocupava na época em que saiu do país; de outro,imaginava um caminho ascendente em São Paulo, idealizando a cidade do passado comoo local que poderia alavancar a carreira, caso tivesse ficado; e, por último, de forma menosevidente, parecia melancólica em relação às fantasias e potencialidades que o futuro lhereservava – antes da viagem. Nova York era, em sonho, muito mais promissora do queaquela que encontrou ao chegar.

Nesta sessão, exploramos a narrativa de uma única atriz a fim de investigar diversasnuances de seu discurso. Ao atentar para sua retórica temporal, pretendemos grifar como naexperiência migratória, passado, presente e futuro são manuseados a fim de orquestrar umatrajetória de si. Isso não impede, porém, a ambivalência de conviver com a frustração e ador. Entre um plano inicial e sua confirmação final há um empenho discursivo que buscamanter o projeto migratório de pé. Na próxima parte, analisamos como as travas burocráticasacabam sendo decisivas no destino dessas/esses artistas. Recorremos aqui a uma narrativamais plural, mobilizando o discurso de diversas pessoas envolvidas nesse tipo de cena.

Entre a fantasia e a burocracia: os vistosPrestes

Prestes a viajar, Vitor não parecia tão otimista quanto Anita. Sabia que “iria começardo zero”. “Eu estava simplesmente deixando de lado toda a minha carreira que já estavaem um patamar bacana. E eu já sabia. Mas aqui descobri que era começar do zero, mascomeçar do zero com coisas contra”. Em 2015, data da entrevista, o ator completou 31anos. Natural de uma grande cidade do interior de São Paulo, o pai de Vitor é advogadoe contador, e a mãe trabalhou como professora e, depois, tornou-se psicóloga. Com vastacarreira no Brasil, o ator trabalhou com importantes companhias teatrais em São Paulo etambém fez papéis de destaque em uma emissora de TV que produzia novelas. Segundoele, recebeu uma “ducha de água fria” ao chegar.

Em quase todas as entrevistas realizadas, os vistos para permanência e trabalhono local eram mencionados como fatores de incerteza, dificuldade e angústia. Váriaspessoas entrevistadas contavam, com detalhes, quais os tipos de visto que tinham e quaisseriam aqueles que planejavam pleitear quando a validade expirasse. Explicavam como,inicialmente, contentavam-se apenas com visto de estudante, mas que as ambiçõesmudavam na medida em que adequavam suas projeções13. Vitor comentava, por exemplo,sobre suas altas expectativas: iria estudar primeiro e depois pleitear o OPT (OptionalPractical Training), um visto que permite o/a não cidadão/ã americano/a trabalhar por umano no país após ter se formado em algum curso. Com esse documento em mãos, o rapaz planejava fazer testes e, aos poucos, obter papéis, contatos e outras oportunidades afins.“Na minha expectativa, eu ia chegar aqui como brasileiro, estudar, me aprimorar. E teroportunidades e poder concorrer igualmente com os americanos e com os estrangeirosaqui. Mas a primeira coisa que foi frustrante... quando eu cheguei me falaram, o diretor deum escritório de desenvolvimento profissional: ‘artista estrangeiro, se não tem o green card,não consegue trabalhar’”. A metáfora da ducha sinaliza o esmorecimento da expectativainicial. As fantasias parecem ter, por contraste, outra temperatura: são quentes e compropriedades combustivas.

Com essa informação em mãos, o jovem ator decidiu continuar no país até finalizaro estudo. Nutria ainda uma esperança; além do green card haveria uma segunda alternativa:o O1. Um visto de trabalho exclusivamente para trabalhadores com “habilidadesextraordinárias” nas áreas de ciências, artes, educação, negócios, atletismo ou “feitosextraordinários” na produção de televisão e filmes. Para obtê-lo, ainda conforme Vitor,um agente especializado em artistas precisaria patrociná-lo; isto é, declarar ao governoestadunidense que gostaria de contratar o artista por sua capacidade, tornando-seresponsável por sua pessoa. Entretanto, as grandes emissoras não costumam contrataratores nesse tipo de situação, haveria riscos legais indesejados no processo. O cenário nãoera, portanto, muito promissor, mas Vitor não queria desistir. Luan tampouco.

Com 35 anos em 2015, Luan trabalhava há alguns anos no mercado teatral de São Paulo.Embora tenha nascido em Porto Alegre, mudou-se ainda adolescente para a capital paulistacom a intensão de se formar como ator e permanecer na cidade. Migrou para Nova Yorkem 2014 e, na época da entrevista, fazia escola de inglês para dispor do visto de estudante.Quando perguntado sobre se a empreitada da viagem teria valido a pena, ele respondeu:“Sempre vale, eu acho que estou só no começo. Ainda não aconteceu o que eu quero. Euestou só no começo. Meu visto de trabalho vai sair. Aos poucos eu estou construindo essatrajetória que eu acho que vai longe. Eu quero que vá. Eu espero que vá (risos)”.

A frase final revela como o ator anuncia uma projeção – “acho” –, salta para um desejo– “quero” – e termina com uma esperança que vem acompanhada com uma espécie depedido – “espero”. Seu projeto de futuro envolvia, porém, a estabilização de sua situaçãoburocrática. O próximo passo seria obter o desejado O1. Para tal, Luan contratou umadvogado, e ao longo de 6 meses levantou documentos que comprovassem ao governo dosEUA que: primeiro, era ator; segundo, tinha uma “carreira sólida”; e terceiro, teria algo a“oferecer aos americanos”. “Não basta ser ator e querer trabalhar nos Estados Unidos. Não,você tem que provar que os americanos precisam de você e que o que você tem nenhumoutro americano pode oferecer”. O processo foi complexo. Luan precisou recolher cartas decidadãos americanos declarando o desejo de empregá-lo; teve que anexar um cronogramade trabalho e dispor de referências de conhecidos do Brasil que haviam trabalhado comele. Precisava que essas cartas de recomendação declarassem atestados do tipo: “o Luané um cara incrível porque ele faz isso, faz aquilo, faz aquilo outro. Ele é um exemplo deprofissional... enfim”. Era imperativo também incluir em seu portfólio todo o material deimprensa na qual estariam grifados as citações ao seu nome. Na época de nossa entrevista, fazia uma semana que ele enviara todo o material, e em três meses receberia a resposta.Enquanto isso, Joana, uma colega de trabalho, já dispunha do O1.

A atriz tinha 21 anos quando se mudou para Nova York. Na época da entrevista,Joana estava com 25. Pretendia fazer um curso profissionalizante de teatro de 2 anos, masacabou permanecendo na cidade após o término do programa, com a firme intençãode seguir trabalhando na área. Com o OPT em mãos e ciente de que ele tinha prazo devalidade de um ano, decidiu manter-se por mais tempo na cidade. Como era jovem, nãodispunha de um vasto currículo – como Luan, por exemplo –, precisou correr com aburocracia. “Tinha que fazer o máximo de atuação possível, para aplicar para o O1. Então,nesse 1 ano de OPT eu fiz muita coisa (risos)”. Na entrevista, a atriz listou alguns deseus trabalhos: foram dois musicais em pequenos teatros com menos de 100 lugares, oitostraight play14, foi figurante em filmes e trabalhou como atriz em uma companhia de peçasinfantis. Poucas vezes recebeu por seu trabalho. Mas não parecia se importar muito; afinal,a meta não era ganhar dinheiro, mas antes engrossar o currículo de modo a obter o O1e permanecer no país. Joana lotou um portfólio com cerca de 400 páginas, desembolsouUS$ 3000,00 para pagar um advogado e obteve o almejado visto. Pelos próximos trêsanos estaria tranquila. Depois desse período, seriam três as opções que ela teria, então,pela frente: aplicar para o green card – segundo seus cálculos ainda impossível –, casar comalguém – o que estava fora de cogitação – ou renovar o O1. Quando obteve o O1 pelaprimeira vez, passou escolher quais os trabalhos efetivamente queria fazer.

Mas nem todos conseguem algum tipo de visto. Oscar, mencionado no início doartigo, disse ter “bobeado”. Após finalizar o curso de teatro de dois anos, percebeu que oprazo para solicitar o OPT havia passado. Como não queria ficar “ilegal” no país, decidiuretornar ao Brasil. “Nos Estados Unidos eles colocam muitas barreiras, só quem quer ficarfica. Eu acho que faço parte do grupo para quem não é tão importante ficar”, declarou.Segundo ele, algumas pessoas faziam tanta questão de ficar em Nova York, e morar forado Brasil, que o teatro era o que menos importava. Esse não era seu caso. Além disso, seuspais não teriam como bancar mais sua estadia; o mais sensato era voltar. Realizar “bicos”e trabalhar com outras atividades fora da esfera teatral também não faziam parte de seuspropósitos.

Diferente de uma parcela de migrantes – para quem o visto é um documentomuitas vezes distante do horizonte de possibilidades – as/os artistas entrevistadas/os oconsideravam fundamental para sua manutenção no país e a execução de seus trabalhos.Por isso mesmo, dedicavam-se à coleta de documentos, esmeravam-se na contratação deadvogados e nas justificativas para obterem a autorização oficial. Suas narrativas detalhadasevidenciam, pois, como a dimensão burocrática mobilizava suas vidas. As falas de Vitor eLuan são especialmente indicativas dos óbices encontrados para obter visto: o documentose transforma em uma barreira, para alguns, intransponível. E não é para menos. O vistoexige os seguintes requisitos: recursos financeiros consideráveis – muitas vezes dos pais –; artimanhas burocráticas – a contratação de advogados –; tempo para recolher documentose aguardar a resposta; e a sujeição a trabalhos pouco prestigiosos ou até mesmo nãoremunerados (como no caso de Joana). O argumento “meritocrático”, mobilizadopor Vitor durante a entrevista – que dizia que com oportunidades “poderia concorrerigualmente com americanos” –, se desfez ao constatar que nenhuma expectativa resistiaaos ataques severos da legislação estadunidense. Mas não só, outras condições nos EUAatravessavam as fantasias cultivadas ainda no Brasil.

Entre uma personagem e a contratação: gênero e “raça”

No mercado do entretenimento, a aparência fenotípica é determinante na seleçãodos papéis. Durante as entrevistas ficou evidente como boa parte dos entrevistados e dasentrevistadas não calculavam que seriam “racializadas/os”15 na sua experiência migratória.A surpresa dava início a outra frustração:

Quando descobrem que eu sou brasileira eles falam: ‘então você vai interpretara latina sexy, certo?’ Se você é a brasileira, você vai ser a gostosa da peça. Porexemplo, eu estou trabalhando com dois agentes. E se você vai em umaaudição com um agente a primeira coisa que eles perguntam é: ‘qual o seutipo’ ‘what’s your type?’. ‘Você é a girl next door, você é a sexy, você é a brava,o que que você é’? ‘Cara, não sei. Eu sou Joana, atriz, pronta para qualquercoisa que você me jogar. Mas se for pensar eu tenho facilidade com cenasmais fortes eu posso ser brava muito fácil’. ‘Mas você tem sotaque, de ondevocê é?’ ‘Brasil’. ‘Ah, OK. Então você definitivamente pode interpretar alatina sexy’” (Joana, 25 anos, 2015).

No relato acima, a nacionalidade da atriz foi rapidamente sequestrada e transformadaem sinônimo de figura erótica. O sotaque marcou a jovem de forma decisiva. O certoé que nos Estados Unidos peças de teatro e filmes mobilizam convenções estéticas –historicamente construídas – que compõem repertórios sobre como “interpretar alatinidade”. No livro Latin Numbers (2015), o pesquisador Brian Herrera reconstrói como,ao longo do século XX, performances “latinas” se transformaram num expediente atravésdo qual se podia ensaiar a racialização de certas pessoas e grupos e, ao fazê-lo, contribuíasepara consolidar uma normativa “branco-americana”.

Pode-se dizer que as expectativas de diretores e produtores a respeito do corpode Joana estão em diálogo com o que Piscitelli (2007a, p. 23) chamou de “convençõesde erotização”. Atributos como o sotaque, os cabelos, as silhuetas e os traços faciais sãopercebidos de tal maneira que acionam, muitas vezes, repostas eróticas por parte deestrangeiros. Nesse caso, os agentes prescindiram dos traços fisionômicos; o fato de ser uma mulher brasileira, e ter sotaque, eram assumidos como elementos que conferiam aJoana uma essência sensual.

A atriz continua em seu relato: “[por exemplo] tem três papéis, uma é a menina quetem que seduzir não sei quem. ‘Ah, Joana is for that’, ‘Ué, por quê?’ ‘Porque você tem oseu charme brasileiro, você sabe como fazer isso’”. Como mulher, sua nacionalidade foiprojetada em termos “raciais” – essencializados e substancializados – cujos significadosrevelariam um estoque de “erotismo inerente”. No entanto, o aparente elogio a suasensualidade é recebido por ela com altas doses de incômodo. Segundo Joana, taisclassificações estariam em desacordo com sua personalidade – “Se você olhar para mim,eu não sou a ‘sexy latina’. Eu sou uma menina ‘x’, sou uma teenager”.

No Brasil ela se percebia e era percebida como branca. Uma combinação de fatorespode explicar essa autorrepresentação. De um lado, a posição social que ocupava –participar dos estratos econômicos mais elevados, morar em grandes centros urbanose em uma família detentora de capital econômico, cultural e social – garantia a ela umcerto embraquecimento. Além disso, na classificação informal de pigmentos no Brasil,suas características fenotípicas – cabelos lisos, nariz mais afinado – adicionavam maiselementos na percepção de que ela era definitivamente “branca”16.

Dessa forma, a racialização experimentada nos EUA era entendida como umarestrição e um rebaixamento. Diferente do Brasil, ela não poderia transitar da formacomo estava acostumada. Por outro lado, as classificações a ela atribuídas soavam comouma séria limitação às suas potencialidades interpretativas. Afinal de contas, a atriz sentiase“pronta para qualquer coisa” – poderia ser brava, fazer cenas fortes e outras variações.Se no Brasil o leque de personagens disponíveis parecia ser amplo, já nos EUA Joananotou que os papéis disponíveis para as latinas costumavam ser secundários e menosprestigiosos. Ao invés de alargar seu horizonte, como parecia ser o plano inicial, viu, assim,um claro encurtamento nas suas escolhas. Anita, por sua vez, relatou experiência diferente:

Desde o Brasil eu nunca tive uma classificação certa. Não certa... Umaclassificação só. No Hairspray17 eu era cover de todas as meninas. No Hairspraytinha elenco branco e elenco negro e eu era cover de todas elas. Então, àsvezes no mesmo espetáculo, eu começava como uma menina branca, nomeio eu tirava a maquiagem, colocava um make escuro e virava negra, depoisvirava branca no mesmo espetáculo. Tiveram alguns espetáculos que eu fizbranca e negra no mesmo espetáculo. Então aqui [nos EUA], eu não soubranca, isso é uma certeza, não sou “caucasian”. Mas eu posso ser negra, euposso ser indiana, posso ser latina. Tudo depende do cabelo. Depende daperuca. Se eu tenho uma peruca enrolada eu sou negra, se eu tenho umaperuca lisa eu sou indiana ou latina. Então quando eu chego, sempre temum pescoço para o lado [com uma expressão de indagação]: ‘o que ela é?’.

Quando eu falava que eu era negra no Brasil as pessoas falavam, ‘você não énegra’ (Anita, 25 anos, 2015).

No Brasil, a “cor” de Anita não parecia lhe impor limites; muito pelo contrário, podiafazer parte de um elenco tanto “branco” quando “negro”. Para ela, “cor” representavaum contínuo estado de negociação (Schwarcz, 1998). Ao contrário de Joana, mesmo nosEUA, Anita parece experimentar alguma fluidez nas classificações: ser “caucasiana” não fazparte de suas possibilidades, entretanto, “dependendo da peruca”, ela poderia transitar emum lugar ou em outro18. Matéria disponível ao manejo, o cabelo ou a peruca podem serformas de produção de representações estéticas variadas (Figueiredo, 2002; Mizrahi, 2015).A plasticidade dos cabelos permite um leque de possibilidades para as apresentações que,longe de serem fixas, são manobradas por sujeitos, especialmente por mulheres.

Assim, Anita não descreveu sua racialização nos EUA como sinônimo de restrição.Mesmo no Brasil, nessa complicada régua da “cor social” ela parecia negociar e burlar(dentro de limites, certamente) as classificações sociais a ela exteriormente atribuídas.O deslocamento migratório não acrescentou um novo tipo de empecilho. Muito pelocontrário, ela estabeleceu um paralelismo entre o país de origem e o país receptor: emambos as experiências em termos de gênero e “raça” eram de alguma maneira similares.

Durante toda a entrevista, Vitor não relatou qualquer circunstância em que tenhase sentido estigmatizado por ser brasileiro ou mesmo identificado como “latino”.Autoclassificado como “branco”, ao longo da conversa também destacou como seuscolegas do teatro o chamavam de “galã” – referência ao fato de que fora protagonista numanovela e, portanto, dispunha de atributos físicos que eram com frequência associados àbeleza, como os olhos azuis, a pele clara e os cabelos escuros. Durante a entrevista eleexplicou que, além do visto, outro obstáculo enfrentado era o seu sotaque. Segundoele, para fazer qualquer personagem americano é preciso não ter sotaque: “Eu já estoucom sotaque bem americanizado e não teria problema para fazer um papel americano,acho que daria para fazer, já, mas é difícil”. Dentre seus investimentos, dedicou tempo erecursos às aulas particulares, sempre com o objetivo de diminuir seu sotaque e expressõesmuito presas ao português. Destacou, ainda, que precisava atentar para a cadência da fala;colocar as palavras corretamente; além de ter conhecimento do sotaque de outras regiõesdos EUA e até acentos de outras épocas da história.

Curiosamente, o ator explicou que retirava seu sustento em Nova York trabalhandocomo voice over19. Em uma ocasião, ele dublou a voz do jogador de futebol Neymar parauma campanha na Copa de 2014. Quando falava em inglês, seu sotaque estava justificado– afinal Neymar é brasileiro. Além disso, fez a voz de personagens de outros jogos como“Clash of Clans” e “Harry Potter”. Nas duas ocasiões, Vitor gravou o áudio em português,no exterior, para um produto que seria vendido no Brasil. Emprestando sua voz paradiferentes personagens e campanhas, o corpo de Vitor não estava, porém, em evidência.Sua voz estava dissociada de seu corpo e assim ele encontrou um nicho de mercadobastante singular no qual seu sotaque deixava de ser um problema. Ao mesmo tempo, oprestígio de seu trabalho sofreu uma inflexão – de protagonista de novela a voice over.

Como se vê, chegar nos EUA é, para boa parte dos entrevistados – sobretudo asmulheres entrevistadas – notar-se racializada. Para Joana, quando estava no Brasil a “cor”da pele, a “raça”, não se consolidava como sinal diacrítico marcante, já em Nova Yorkviu-se classificada em termos com os quais não se identificava. Para os homens, como é ocaso de Vitor, o deslocamento entre cidades (e países) também não afetou sua situação. Aposição de migrante brasileiro é menos racializada, sexualizada e marcada por gênero doque a posição das mulheres brasileiras. Não queremos dizer que gênero vem à reboquede “raça”, mas apenas sinalizar como fica evidente como não se pode desconsiderar quehomens e mulheres experimentam de maneira diversa as suas marcas de racialização.

No segmento de entretenimento, essas/es artistas exercem funções nas quais o corponão é somente relevante, mas determinante. A título de comparação, os relatos colhidospor Dias (2009) revelam como migrantes brasileiros em Londres exerciam funções nasquais a aparência pessoal não tinha relevância de primeira ordem – a maquiagem nãoera determinante, os cabelos eram cobertos e as pessoas trajavam uniforme de modo ahomogeneizar as silhuetas de trabalhadores. Durante nossas entrevistas, interlocutoras/esrecorriam diversas vezes à categoria “perfil” para explicar a relação entre um(a) artista euma personagem. Sem uma definição precisa, o que se destaca é a combinação de algunssinais diacríticos: o formato corporal (altura, peso e silhueta), a cor da pele e cabelo,os traços do rosto, o timbre sonoro e até a personalidade são fatores que, combinados,produzem um “perfil”. A relevância do corpo é de primeira ordem para esses sujeitos.

Ao tratar de atrizes e atores brasileiros nos Estados Unidos, podemos lançar luzespara compreender as políticas de representação em vigor no mercado de entretenimentodesse país. O estudo, acreditamos, oferece um acesso privilegiado para as investigaçõessobre algumas formas de ser brasileira/o nos EUA – tanto do ponto de vista dos sujeitos,quanto do ponto de vista da indústria de entretenimento. Nas trajetórias e discursos queapresentam essas mulheres e homens migrantes vivenciam como o mercado teatral efílmico dos EUA aloca brasileiras/os em um sistema de imaginação. Ao mesmo tempo, esses mesmos sujeitos negociam e burlam restrições, produzindo e tencionando fronteirassobre os estereótipos que informam os produtores estadunidenses.

Últimas considerações

O trânsito de artistas entre esses países permitiu investigar como expectativas desucesso trafegam e criam práticas. É curioso notar de que maneira tal recrutamentoopera de forma diferente quando comparado as brasileiras e os brasileiros que se dedicama trabalhos considerados “subalternos”. Como vimos, entre artistas brasileiras/os, estásempre em jogo uma dupla tensão: de um lado, uma espécie de sedução; de outro, umanegação. Anita escuta, como uma melodia, o diretor americano lhe oferecer um trabalhoem Nova York. Seu imaginário é então povoado por muitas projeções. Entretanto, logo emseguida, as condições materiais de competição, a racialização e os entraves na burocraciaacabam por se impor tal qual aduanas restritivas.

É possível, pois, atentar para a pluralidade de experiências desses sujeitos migrantes.Embora soem homogêneas, analisá-las em conjunto não implica perder de vista dimensõesmais microscópicas, que contribuem para pensar como sistemas de classificação, discursosde sedução e impedimentos legais agem no processo de migração e muitas vezes ocondicionam.

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Notas

1 Este artigo dá prosseguimento às reflexões apresentadas porBernardo Fonseca Machado no 40º Encontro Anual da ANPOCSde 2016 sob o nome “Brazilian Actresses’ – gênero,‘raça’ e sexualidade de atrizes brasileiras nos EUA”. Com novomaterial, também aprofundamos determinadas discussões jáiniciadas e reformulamos outras.
2 Exemplos de textos decisivos dessa época são Appadurai (1996) e Strathern (1991).
3 Para saber mais sobre “teoria da prática”, conferir Ortner (2011) e sobre a crítica à meta teorias,Marcus e Clifford (2016).
4 Nos dois estudos realizados por Maxine Margolis – em 1994 e 2009 – brasileiras e brasileiros costumavamconsiderar sua vida nos EUA como temporária, negando a própria categoria imigrantes.Dada a natureza transitória e incerta de sua residência, tentavam se manter invisíveis e, por isso eramdifíceis de serem contabilizados por dados oficiais do Estados Unidos.
5 Os nomes de artistas mencionados no artigo são fictícios.
6 Os estudos recentes sobre migração são cautelosos no que diz respeito a palavra “ilegal”. Normalmenteaparece nas falas de sujeitos, mas não como categoria analítica. “Ilegalidade” é um termocunhado dentro do arsenal gramatical jurídico que formata uma determinada condição com oEstado. Assumi-la como categoria analítica em um trabalho antropológico limita as potencialidadesde interpretação que podem ser lançadas aos sujeitos e suas práticas. Para saber mais sobre as implicaçõesepistemológicas, políticas e éticas da categoria, conferir De Genova (2002).
7 Tipo de visto concedido pelas autoridades dos Estados Unidos. O nome oficial é United StatesPermanent Resident Card (Cartão de Residência Permanente nos Estados Unidos). Diferentementedos outros tipos de vistos, o green card assegura mais direitos ao migrante que o possui, não expira eclassifica o sujeito que o possui como residente permanente.
8 Entre setembro e dezembro de 2015 – período no qual a maior parte das entrevistas ocorreu – oReal desvalorizou-se consideravelmente em relação ao Dólar. Sobretudo a partir de julho de 2015,a moeda nacional saltou do patamar de R$3,00 por dólar para o patamar de R$3,75 por dólar.
9 Por motivo de limite de espaço, não abordaremos todas as trajetórias estudadas.
10 Estamos aqui inspirado nas sugestões de Sales (1999) que se dedica a uma leitura atenta para as dimensõestemporais de migrantes.
11 Musical produzido por Cameron Mackintosh em 1981 em Londres.
12 Termo cunhado por Adam (2004).
13 Tal como salientam Dias e Martins Jr. (2013), há um constante processo de reformulação dos projetosmigratórios de sujeitos de modo que o prolongamento da permanência é uma alternativasempre presente. Avalia-se reiteradamente o tempo de estadia e a possibilidade do retorno.
14 Classificação na língua inglesa para espetáculos teatrais que usam palavras ditas ao invés de músicaou dança para contar uma história.
15 A discussão sobre o uso de “raça” e “cor” é espinhosa e repleta de interpretações diferentes. Sobreo debate, verificar, entre outros, Fry (1996), Schwarcz (1998), Sansone (2007), Guimarães (2008) eMoutinho (2004).
16 Para saber mais sobre o assunto, conferir Norvell (2001).
17 No Brasil, Anita participou da montagem do musical Hairspray, em 2010, em São Paulo. Na ocasião,ela fazia parte do coro e trabalhava como substituta (cover) para caso alguma atriz faltasse nosdias do espetáculo.
18 Beserra (2005) também sugere que a integração diferenciada de migrantes brasileiros/as nos EstadosUnidos desafia o mito da rigidez do sistema racial deste país. Ela sinaliza, embora não aprofunde,a ideia de que de acordo com a posição social econômica e o tom da pele, indivíduos ocupam lugaresdiferentes nos EUA. Uma recente bibliografia sobre o sistema classificatório racial produzidanos EUA indicia como não há “rigidez” nas formas de percepção, especialmente com a entrada detantos “latinos” no país. Vide Lee e Bean, 2007.


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