Secciones
Referencias
Resumen
Servicios
Descargas
HTML
ePub
PDF
Buscar
Fuente


SANTA DICA E TIA NEIVA: DUAS LÍDERES RELIGIOSAS DO BRASIL CENTRAL REVISITADAS EM PERSPECTIVA DECOLONIAL
Santa Dica y Tía Neiva: dos líderes religiosas del centro de Brasil revisitadas en una perspectiva decolonial
Santa Dica and Tia Neiva: Two Religious Leaders from Central Brazil Revisited in a Decolonial Perspective
Ciencias Sociales y Religión / Ciências Sociais e Religião, vol. 25, e023009, 2023
Universidade Estadual de Campinas

Article


Recepção: 14 Janeiro 2023

Aprovação: 13 Julho 2023

Resumo: O presente artigo objetiva identificar aspectos decoloniais nos exercícios das líderes religiosas Santa Dica e Tia Neiva. Ambas desempenharam suas atividades numa ambiência comum: o planalto central brasileiro do século XX. Nossa leitura palmilha, a partir da revisão de literatura, os fenômenos religiosos que constituíram a República dos Anjos e o Vale do Amanhecer, e relê as lideranças de tais movimentos religiosos à luz das teorias decoloniais. A pesquisa questiona dois aspectos tidos como lugar-comum no que tange à colonialidade eurocentrada, a saber: o papel social das mulheres e a hegemonia quase absoluta do catolicismo. Os resultados encontrados apontam na direção de relações de gênero mais fluidas, nas quais algumas mulheres subalternizadas exerceram lideranças ímpares. Ademais, identificam, para além do catolicismo popular, expressões religiosas holísticas e marcadamente híbridas.

Palavras-chave: Espiritualismo, Religiosidade goiana, Hibridismo religioso, Liderança religiosa feminina.

Resumen: Este artículo tiene como objetivo identificar aspectos decoloniales en los ejercicios de los líderes religiosos Santa Dica y Tía Neiva. Ambos desarrollaron sus actividades en un entorno común: la meseta central brasileña del siglo XX. Nuestra lectura explora, a partir de la revisión de la literatura, los fenómenos religiosos que constituyeron la República de los Ángeles y el Vale do Amanhecer, y relee a los líderes de tales movimientos religiosos a la luz de las teorías decoloniales. La investigación cuestiona dos aspectos comunes de la colonialidad eurocéntrica, a saber: el papel social de la mujer y la hegemonía casi absoluta del catolicismo. Los resultados encontrados apuntan hacia relaciones de género más fluidas, en las que algunas mujeres subalternas ejercían un liderazgo único. Además, identifican, además del catolicismo popular, expresiones religiosas holísticas y marcadamente híbridas.

Palabras clave: Espiritualismo, Religiosidad de Goiás, Hibridez religiosa, Liderazgo religioso femenino.

Abstract: This article aims to identify decolonial aspects in the exercises of religious leaders Santa Dica and Tia Neiva. Both carried out their activities in a common environment: the central Brazilian plateau of the 20th century. Our reading explores, from the literature review, the religious phenomena that constituted the Republic of Angels and the Vale do Amanhecer, and rereads the leaders of such religious movements in the light of decolonial theories. The research questions two commonplace aspects with regard to Eurocentric coloniality, namely: the social role of women and the hegemony of Catholicism. The results found point towards more fluid gender relations, in which some subaltern women exercised unique leaderships. Furthermore, they identify, in addition to popular Catholicism, holistic and markedly hybrid religious expressions.

Keywords: Spiritualism, Goiás religiosity, Religious hybridity, Female religious leadership.

Introdução

Entre as tradições religiosas monoteístas antigas e com grande número de adeptos que subsistiram ao tempo, nenhuma reconhece uma mulher como fundadora.1 Entre as mais recentes e/ou não monoteístas, no entanto, existem fundadoras reconhecidas – em alguns casos trata-se de reformadoras que, conforme a classificação de Thomas O’Dea (1969), divergiram de algum grupo majoritário. Dentre essas é possível mencionar: 1) Ann Lee, também chamada Mãe Ana (1736-1784), fundadora da Sociedade Unida dos Crentes na Segunda Aparição de Cristo (Shakers), nos Estados Unidos da América; 2) Miki Nakayama (1798-1887), fundadora da Tenrikyo, no Japão; 3) Nao Deguchi (1836-1918), também japonesa, fundadora da Oomoto; 4) Mary Baker Eddy (1821-1910), estadunidense, fundadora do movimento religioso ciência cristã, em 1866; 5) Helena Blavatsky (1831-1891), reconhecida por ter fundado, junto a dois homens, em 1875, na cidade de Nova York, a teosofa; 6) Tamara Siuda (1969-), responsável por reavivar, nos Estudos Unidos, a crença nos deuses do Egito antigo, denominada kemetismo; 7) as irmãs Fox – Margareth Fox (1833-1893) e Katherine Fox (1837-1892) – que, nos Estados Unidos, desempenharam um importante papel para a concepção do espiritismo moderno; 8) Ellen Gould White (1827-1915), reconhecida como cofundadora da Igreja Adventista do Sétimo Dia; e, por fim, 9) as mães de Santo responsáveis pelo surgimento do Candomblé na estado da Bahia (Landes, 2002).

Esses exemplos – que certamente escondem muitas outras experiências religiosas menos conhecidas – apontam para a desigualdade evidente entre o número de homens e de mulheres que, no decorrer da história, foram consideradas responsáveis, na perspectiva de Otto (1985), por dar corpo a uma experiência religiosa e, em alguns casos, transformá-la numa religião institucionalizada. O presente artigo observa fatos ocorridos no Brasil central que se firmam como contrapontos a tal realidade. O cerrado brasileiro, de modo bastante particular, viu surgir, durante o século XX, dois movimentos religiosos encabeçados por mulheres: a República dos Anjos e o Vale do Amanhecer. O primeiro, liderado por Santa Dica, que é como ficou conhecida Benedicta Cypriano Gomes, uma camponesa natural do município de Pirenópolis, no interior do estado de Goiás. O segundo, idealizado por Tia Neiva, alcunha de Neiva Chaves Zelaya, pernambucana e caminhoneira que iniciou sua atividade como líder religiosa em Planaltina, no Distrito Federal.

O fato de duas mulheres fundarem movimentos religiosos diferentes e expressivos numa região comum e em um espaço de tempo não tão distante é curioso por si só. Aliás, sobre o aspecto topográfico, vale recordar as pesquisas de Siqueira (2002), (2003) acerca da proliferação de novas religiosidades no entorno de Brasília – como são os casos da Cidade Eclética e da Cidade da Fraternidade. Por isso, no bloco textual subsequente traremos à baila notas características da religiosidade predominante no referido locus. Em seguida, debruçar-nos-emos sobre as biografias de Dica e Neiva, a fim de possibilitar uma compreensão suficiente acerca da leitura decolonial, firmada em consonância às pesquisas de Lugones (2008) e Mignolo (2003), que empreendemos sobre os exercícios de tais mulheres. Desde o prisma da antropologia da religião, empregamos os postulados teóricos de Canclini (2003) para analisar o hibridismo que fecundou a existência dos movimentos religiosos estudados.

Recorte topográfico e cultural: o cerrado do planalto central

Sobre o contexto religioso do Brasil central nos séculos XIX e XX, há que se ressaltar que a religiosidade popular esteve bastante permeada pela ação de benzedeiras, curandeiros e outros atores religiosos que, conforme a classificação de Weber (1991), poderiam ser associados à função de magos, embora estivessem atrelados às mundividências próprias do catolicismo popular. Suess (1979) afirma que a formação do catolicismo popular no Brasil variou bastante de região para região e, conforme sua análise, quanto mais as expressões estavam afastadas dos centros urbanos, mais as variações eram evidentes. Sobre o centro-oeste brasileiro, Azevedo e Lemos (2019: 111) lembram que uma olhada rápida sobre festas (dos reis, dos santos, das cavalhadas, do fogaréu), as rezas (novenas, tríduos, benzimentos, votos, promessas) e os personagens (parteiras, benzedores, curandeiros, padres, pais de santo...) são suficientes para evidenciar a pluralidade de experiências religiosas que coabitavam a região.

Tal característica, ao contrário do que possa parecer atualmente, não ficou no passado.2Nogueira, Versonito e Tristão (2012) verificam, por exemplo, na cidade de Mara Rosa, no norte do estado de Goiás, processos de transformação da prática do benzimento em vistas de sua sobrevivência na cidade. Outra prova da atualidade dessa característica religiosa no centro-oeste3 pode ser conferida na série produzida pela plataforma de streaming Netflix, intitulada “João de Deus: cura e crime”. No primeiro capítulo da série de quatro episódios, uma das mulheres que tentam explicar o fenômeno religioso em torno do médium e curador que, por décadas, esteve radicado na cidade de Abadiânia (GO), afirma o seguinte:

Goiás era um local de chamado catolicismo devocional. Aquele catolicismo antigo do Brasil. De tipo barroco, que você tem uma relação direta e pessoal com os santos. Então, você amarra o santo Antônio de cabeça para baixo, faz o pedido: “Eu só vou te tirar daí se você atender”. Esse tipo de coisa. E a família do seu João é extremamente católica. Como ele, até hoje, se declara católico; devoto de santa Rita de Cássia. A mãe do seu João era super católica. Mas, aparentemente, via Nossa Senhora. E cortava baralho: lia a sorte. Mas, o pai dele era raizeiro. Que que é ser raizeiro? É o cara que recolhe plantas e que faz a chamada garrafada. Garrafada é um remédio natural em garrafas. Por isso, quando eu falo pra vocês “faz parte da cultura brasileira”, é a forma que eu vejo esse caldo de muitas tradições, muitos procedimentos de cura, muita liberdade de criar novas formas de... sabe, de se relacionar com o mundo. É Brasil na veia. (João de Deus: cura e crime. Temporada 1, Ep. 1, 2021).

As cidades de Abadiânia e Pirenópolis estão a somente 50 km de distância. Abadiânia e Planaltina, a 170 km. O contexto é, evidentemente, bastante similar. A religiosidade é fortemente marcada pelo catolicismo popular (cf. Martins Filho, 2020; Pinto & Silva 2022) e pelo espiritismo, entre outras possíveis origens, e caminha pari passu ao curandeirismo. É sob esse paradigma que Dica, na segunda década do século XX, e Neiva, na década de 1960, desenvolveram suas experiências sagradas. A primeira, mais ligada, sobretudo no período inicial, ao curandeirismo. A segunda, vinculada a práticas próprias de organizações religiosas, como ritos, mitos e estamento dos membros em ordens para a prestação dos serviços sagrados (O’Dea, 1969).

A seguir, apresentamos, sumariamente, as biografias de Benedicta e Neiva a fim de que, relatando suas histórias, possamos vislumbrar as características mais evidentes dos movimentos religiosos que elas encabeçaram.

“Hagiografia” de Dica

“Hagiografia”, como é sabido, diz respeito à biografia de um santo ou santa. Empregamos, neste caso, o termo entre aspas devido à alcunha concedida a Dica por parte dos padres redentoristas do Santuário do Divino Pai Eterno em Trindade (GO), que a chamaram “Santa” com intenção irônica e depreciativa ao combaterem sua atividade religiosa (Rezende, 2023). O termo, no entanto, passou a ser associado frequentemente ao nome de Dica. O que reunimos aqui pode ser nomeado “hagiografia” unicamente por considerar o adjetivo “santa” anteposto a seu nome próprio. Todo modo, vale recordar o estudo de Certeau (2000) acerca das hagiografias, posto que elas não reivindicam a enunciação de uma descrição fiel ao real, mas, ao contrário, prestam-se ao papel de evidenciar como a história está aberta aos poderes sagrados.

Na tentativa de considerar os dados mais fáveis possível, as informações reunidas e narradas a seguir contam com aqueles disponíveis nas seguintes fontes: o livro resultante da pesquisa de mestrado em sociologia de Lauro de Vasconcellos (1991); a tese em geografia, de Curado (2011); o artigo da historiadora Meire de Carvalho (1999); a dissertação em expressões culturais do Cerrado, de Honesto (2020); a dissertação em história, de Gomes Filho (2012); a dissertação em ciências da religião, de Silva (2005); e a biografia produzida por Waldetes Rezende (2011). Há que se comunicar, no entanto, que, entre as fontes assumidas, existem contradições quanto a datas, números de pessoas, compreensões sobre os fenômenos sobrenaturais, interpretações acerca das influências religiosas e outros componentes do cronograma histórico vivido por Benedicta Cypriano Gomes. Aqui, assumimos os dados mais comuns entre as fontes consultadas.

Dica nasceu em 1903, no município de Pirenópolis. Por volta dos sete anos de idade, caiu enferma e perdeu todos os sinais vitais. No entanto, durante o costumeiro banho do defunto que os familiares faziam, notaram que seu corpo suava frio. Em razão disso, mantiveram o velório por três dias, até que ela “ressuscitou”. O fato foi considerado milagre pelo povo da região, que começou a visitá-la para pedir bênçãos e curas. O fluxo de fiéis deu origem a uma vila formada por uma legião de crentes. Ali, Dica instituiu o uso coletivo da terra, aboliu o uso do dinheiro, realizava curas, rezava missas, batizava,4 promovia casamentos, crismava e dava conselhos. Como em outros movimentos messiânicos (Canudos, Caldeirão, Contestado, Muckers, etc.), a líder esperava a vinda de Cristo, que libertaria o povo da pobreza e curaria todas as doenças. Enquanto ele não chegasse, era preciso distribuir a terra entre todos, já que era propriedade de Deus.

Dica tinha audiências com um conselho de guias ou anjos e agia conforme suas orientações. Assim, delimitou uma área em torno de sua propriedade à qual denominou “República dos Anjos”, de cujo povoado – Lagolândia – era o centro, isto é, a cidade sagrada que seria inteira salva quando Cristo voltasse. O rio do Peixe, que margeia o local, passou a ser chamado “Jordão”. A santa formou em torno de si um verdadeiro exército. Em 1925, esse exército foi convidado pela secretaria de segurança pública de Goiás a combater contra a Coluna Prestes que estava se aproximando de Vila Boa (atual Cidade de Goiás). A aparição de Dica na capital do estado, no entanto, chamou muita atenção, o que despertou contrariedade no governo. Há relatos de que, dispensada com seu exército, regressando a Lagolândia, ela teria se encontrado com Luiz Carlos Prestes e incentivado a marcha dele (cf. Lima, 1979: 426; Carvalho, 1998: 7).

Meses depois, em 14 de outubro de 1925, o governo de Goiás, temendo que o evento de Canudos se repetisse no estado, enviou um destacamento que sitiou e combateu contra o povoado. A luta, que registrou um número incerto de mortes (entre 3 e 16), ficou conhecida como o “dia do fogo”. Diz-se que as balas disparadas contra Dica se enrolavam nos cabelos dela e caíam no chão sem feri-la. Logo depois, a religiosa foi presa por alguns meses na antiga capital do estado, Vila Boa, e, quando solta, foi proibida de retornar a Lagolândia. Mudou-se, então, para o Rio de Janeiro. Nesse período, Dica recebeu apoio da Liga Espírita do Brasil, foi retratada por Tarsila do Amaral e casou-se com o jornalista Mário Mendes, com quem teve cinco filhos. Em 1927, Dica retornou a Lagolândia e, em 1934, conseguiu eleger seu marido como prefeito de Pirenópolis.

Durante a revolução de 1930, Dica participou do movimento que conduziu Pedro Ludovico Teixeira ao governo do estado de Goiás, desbancando a família Caiado dessa posição. Na Revolução Constitucionalista de 1932, o exército de Dica, com 150 homens patenteados com a insígnia do Exército Brasileiro, foi à guerra em apoio aos legalistas de São Paulo. Nenhum de seus homens morreu na batalha, e isso foi entendido como mais um milagre. Na ocasião, trabalhando como enfermeira no hospital de campanha, Dica teria conhecido o médico que depois se tornaria o presidente da República, Juscelino Kubistchek, com quem manteria amizade e de quem teria, inclusive, curado uma filha anos depois. Em 1934, a líder foi novamente presa e seu movimento definitivamente encerrado. Quando deixou a prisão, passou a atender doentes em sua casa. Por influência de Dica, o deputado Jarbas Jayme conseguiu aprovar um projeto de lei estadual que emancipou o distrito de Lagolândia, em 25 de maio de 1964. Três anos depois, em 10 de outubro de 1967, o município foi extinto por resolução do Senado Federal. Depois da extinção do município,

Dica mudou-se para Goiânia, onde morreu em 9 de novembro de 1970. Seu corpo foi sepultado na praça central de Lagolândia.

Biografia de Neiva

A biografia de Tia Neiva, de história bastante mais recente que a de Dica, está descrita na tese de doutorado em história de Reis (2008) e na dissertação em sociologia de Pontes (2021). Além disso, a história do Vale do Amanhecer (VDA) foi contada no “Inventário nacional de referências culturais” da Superintendência do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico (IPHAN) no Distrito Federal, em 2010, que produziu um relatório de 280 páginas sobre ele (cf. Siqueira, Reis, Leite & Ramassone, 2010). A própria Tia Neiva escreveu também uma autobiografia (Zelaya, 1992). Os dados biográficos que seguem assumem tais fontes.

Neiva Seixas Chaves nasceu em 30 de outubro de 1925, na cidade de Propriá (PE). Filha de topógrafo, na adolescência mudou-se, com a família, para o município de Jaraguá (GO). Em 1943, aos 18 anos de idade, casou-se com Raul Alonso Zelaya, um argentino entusiasta das políticas de integração nacional, de quem assumiu o sobrenome. Casada, passou a viver na cidade de Ceres (GO), onde o agrônomo que se tornaria amigo da família Zelaya, Bernardo Saião, era administrador da Colônia Agrícola Nacional de Goiás. Teve quatro filhos. Aos 24 anos ficou viúva. Abriu, então, um estúdio de fotografia, mas a química necessária para a revelação das fotos prejudicou seus pulmões. Trocou a casa na cidade por um sítio, porém não tinha forças suficientes para manter-se com o trabalho braçal. Permutou a chácara por um caminhão e habilitou-se como a primeira mulher motorista profssional de veículos de grande porte no Brasil. Mudou-se para Anápolis (GO) e atuou como caminhoneira até ter seu meio de trabalho roubado. Transferiu-se para Goiânia, passando a trabalhar como motorista de ônibus coletivo urbano.

Em 1957, foi convidada pelo antigo amigo, Bernardo Sayão, a trabalhar na construção da nova capital federal, Brasília. Neiva transportava trabalhadores e materiais de construção. Até esse período, com 33 anos de idade, conforme sua autobiografia (Zelaya, 1992), não havia indício de mediunidade e se declarava católica. Mas, no final daquele ano, começou a ter visões. Procurou, inclusive, ajuda médica, mas só encontrou explicações no espiritismo kardecista, que passou a frequentar. No entanto, logo iniciou uma doutrina própria, conforme a orientação de uma entidade chamada “Pai Seta Branca”. Essa entidade, que passará a ter papel fundamental na vida de Neiva, teria encarnado inúmeras vezes na Terra (como são Francisco de Assis, como um índio tupinambá e outros).

Em 1959, Neiva deixou seu emprego de motorista e o barraco onde residia no Núcleo Bandeirante (DF) e migrou para Alexânia (GO) para fundar, junto com Maria de Oliveira (Mãe Neném), a União Espiritualista Seta Branca. No pequeno terreno à beira da estrada, além dos membros do grupo, viviam, para serem cuidadas, 40 crianças abandonadas pelos pais. A união durou até 1964, quando Neiva e Neném se separaram. Neiva, já com um grupo maior de seguidores, se estabelece em Taguatinga (DF) e registra sua nova ordem religiosa com o nome de Obras Sociais da Ordem Espiritualista Cristã, que em breve passaria a se chamar Vale do Amanhecer.

Em 1965, a tuberculose faz com que Neiva fique três meses internada em Belo Horizonte para se recuperar. No mesmo ano, conhece o professor Mário Sassi, com quem se casa novamente. Em 1969, eles instalam o VDA em Planaltina (DF). A partir de então, ela dedicou-se à elaboração da cosmologia do VDA, com base no espiritismo kardecista e em rearranjos provenientes de outras vertentes religiosas, conforme a orientação de Pai Seta Branca. Neiva morreu aos 60 anos de idade, em 15 de novembro de 1985, devido a complicações pulmonares. Os templos do VDA continuam multiplicando-se significativamente pelo Brasil e pelo mundo afora.

Sincretismo e hibridismo cultural e religioso: uma chave de leitura

Sincretismo e hibridismo seriam conceitos mais ou menos intercambiáveis, não fosse o fato destacado por Bourdieu (2008) acerca do poder simbólico que reveste as palavras. O significado simbólico que cada palavra porta em si mesma inclui as cargas ideológicas que evidenciam – implícita ou explicitamente – as relações sociais que elas admitem e descrevem. É por isso que Bourdieu afirma não existirem palavras neutras e, consequentemente, que a preferência por um conceito ou outro não diz respeito apenas a um jogo de palavras, mas sim a opções sobre a leitura que cada sujeito pretende fazer ou faz sobre a realidade. Entre sincretismo e hibridismo, Engler (2011) identifica que o emprego do primeiro ocorre nove vezes mais que o segundo em escritos acadêmicos. Além disso, que o uso do conceito hibridismo está, sobretudo, atrelado às produções de pesquisadores vinculados ao paradigma pós-colonial. Há, contudo, inúmeras acepções que repousam sobre ambos os conceitos. A seguir explanaremos, de modo bastante sintético, como cada um deles é admitido na seara das ciências da religião a fim de dar a conhecer as razões que motivam nossa opção conceitual.

Assunção (2005), Mary (2000) e Ferreira (1999) relacionam de modos similares a ideia de sincretismo a uma mistura confusa de crenças ou doutrinas heterogêneas. A compreensão comum considera que essa mistura guarda traços do processo de colonização por meio do qual os colonizadores impuseram suas culturas e crenças e os colonizados foram forçados a aceitá-las. Há, também, no perímetro do conceito, uma semântica que supõe a existência de religiões e culturas puras, tradicionais, que seriam superiores às mais recentes e às produzidas por meio de bricolagens muito evidentes. A bricolagem evidente denotaria, neste caso, certa impureza do fenômeno religioso em questão. Isso desvalorizaria a religião desde o crivo do “tradicionalismo”, espécie de invólucro de uma suposta essência sagrada originária e imutável que teria subsistido às transformações históricas ocorridas no decorrer dos séculos. Repousa, portanto, sobre a ideia de sincretismo, conotações de inautenticidade e, em decorrência disso, o adjetivo “sincrético” tornou-se uma qualificação sempre aplicável à religião do outro, nunca à própria. Logo, restou como um conceito rejeitado no Brasil por líderes religiosos, intelectuais e militantes que recusam o mito da democracia racial e os binarismos hierarquizantes (Shohat & Stam, 2006; Hall, 2009) próprios do pensamento eurocentrado (corpo x espírito, bom x mau, razão x emoção, cultura x natureza, macho x fêmea, sagrado x profano, erudito x popular, urbano x rural, etc.).

O conceito de hibridismo, por sua vez, foi sugerido por Canclini (2003), e se refere ao modo pelo qual aspectos culturais ou fragmentos desses aspectos se separam de seus contextos originários e se recombinam com outros ou partes de outros, configurando, assim, novas práticas culturais. Kern (2004) recorda que o tema do hibridismo despertou o interesse de Darwin, que pesquisou – no âmbito das ciências naturais – os seres estéreis e anômalos resultantes do cruzamento de espécies diferentes e incompatíveis. Contudo, foi Canclini quem reivindicou o emprego do conceito para o estudo sobre as culturas, especialmente as surgidas na América depois do projeto de colonização europeia, sob os óculos teóricos do multiculturalismo (Oliveira, 2015). Hibridismo foi forjado, então, como um conceito libertário, criativo, próprio para a análise de sociedades multiculturais (atualmente prefere-se “interculturais”). É nesse sentido que Bhabha (2013) sustenta que a hibridez subverte a autoridade da cultura colonial, já que relativiza as hierarquizações admitidas desde a perspectiva sincrética. Engler (2011) entende que a adoção do conceito de hibridismo é fundamental para o estudo desde uma perspectiva teórica pós-colonial das religiões às quais ele, na esteira de Hall (2009), intitula “diaspóricas”. Isso porque, segundo ele, o conceito hibridismo enfatiza uma mistura cultural mais ampla que aquela assumida pela ideia de sincretismo, para a qual a ênfase está posta, de modo focal, na mescla dos elementos religiosos.

O que está em jogo na disputa conceitual, portanto, é o modo como a suposta cultura original de um grupo étnico e as culturas de outros em diásporas foram assimiladas no contexto latino-americano. O termo hibridismo considera que as diferentes culturas se implicam mutuamente, compondo-se e recompondo-se de modo não somente hierárquico, uni ou bilateral, mas de modo a gerar outras práticas culturais. É sob esta perspectiva teórica que nos propomos a refletir sobre os fenômenos religiosos fundados por Dica e Neiva no planalto central brasileiro. Essas duas mulheres deram corpo a movimentos religiosos não hegemônicos e, embora parecidos a outros movimentos religiosos existentes na região, são dotados de especificidades ímpares. Não temos conhecimento de nenhum outro exército autônomo, a serviço do Estado, liderado por uma mulher religiosa na história do Brasil além daquele de Dica. Tampouco se sabe de outra médium que tenha reunido mitos religiosos de tão variadas procedências e criado uma expressão religiosa profundamente ritualística como aquela de Neiva. Sob essa ótica buscamos, a seguir, sublinhar aspectos decoloniais possíveis de serem observados tanto no contexto da República dos Anjos quanto no Vale do Amanhecer.

Dica e Neiva sob óculos decoloniais

A discussão que fazemos aqui encontra suas primeiras raízes em estudos como o de Lugones (2008), que examina, a partir de um feminismo decolonial, as relações entre a colonialidade e a violência sofrida pelas mulheres. Marinho e Simoni (2021), na esteira epistemológica de Lugones, identificam saberes afros que subsistiram ao tempo e, transmitidos de geração em geração, podem ser identificados como elementos constitutivos das espiritualidades africanas presentes nos terreiros contemporâneos existentes no estado de Goiás. Mignolo (2003), sublinhou a existência de um pensamento fronteiriço, liminar, que, segundo ele, faz resistência às ideologias da modernidade. A saber: o cristianismo, o liberalismo, o marxismo, o conservadorismo, o racismo, o patriarcado e o colonialismo. Marinho e Simoni (2021) sustentam que os rearranjos marcados pela hibridação cultural e religiosa no contexto afro-ameríndio garantiram sempre uma resistência que protegia da extinção os saberes e os costumes subalternizados.

É sob essa égide que investigamos as potencialidades desenvolvidas por Dica e Neiva no âmbito das religiosidades. Para levar a cabo tal empreita fez-se necessário, portanto, revisitar os eventos protagonizados por Dica e Neiva à luz da contextualização histórica. Ambas são provenientes de vertentes do catolicismo. Dica, embora combatida pelos padres redentoristas, realizava sacramentos católicos. Neiva, embora tenha se identificado com o espiritismo kardecista, não renegou suas origens católicas. Inclusive recebeu, em 1985, uma benção apostólica do Papa João Paulo II,5 por intermédio do padre João Vicente César, antropólogo estudioso do VDA e amigo dela.

Há que se enfatizar, portanto, que não há nas expressões religiosas de Dica e Neiva elementos que indiquem haver supervalorização de uma matriz religiosa sobre outra. Dica, por exemplo, só viria a ter contato com correntes espíritas oficiais quando esteve exilada no Rio de Janeiro. Sua mediunidade, originalmente, não tem vínculos com o kardecismo. Todo modo, as duas foram sempre guiadas por entidades espirituais extramundanas,6 que deram a Dica elementos míticos para demarcar e reivindicar a posse de uma terra considerada sagrada, e a Neiva a revelação dos saberes dos espíritos e das antigas civilizações – tanto indígenas do continente americano (Pai Seta Branca teria sido também um cacique Inca), quanto das civilizações de outros continentes. Os movimentos religiosos encabeçados por elas não tiveram jamais uma preocupação com raízes religiosas puras, com grupos específicos de fiéis ou coisas similares. O movimento de Dica era composto por camponeses empobrecidos e analfabetos. Na organização hierárquica do VDA, todos, homens e mulheres de qualquer classe social, são admitidos.

De modo geral, as lideranças de movimentos messiânicos no Brasil foram assassinadas.7 Dica é uma exceção.8 Seu poder de liderança influenciou o estado de Goiás em muitos aspectos: combateu contra a coluna Prestes, atuou ativamente na revolução de 1930 e na revolução constitucionalista de 1932, elegeu o marido prefeito de Pirenópolis e articulou a emancipação de Lagolândia na Assembleia Legislativa do estado. Enquanto a existência do exército de seus seguidores foi admitida, ela liderou-os sob um discurso essencialmente religioso. O dom da cura que lhe fora atribuído conferia-lhe o tom de sacralidade. Neiva assemelha-se a Dica no que tange os aspectos da cura e na clarividência, em seu caso, sobre vidas pregressas e sobre o futuro. Tia Neiva tornou-se figura conhecida nacionalmente ainda cedo. Diz-se que o cantor Caetano Veloso teria composto a canção Um índio depois de visitar Tia Neiva e ter um contato visual impactante com a imagem de Pai Seta Branca.9 Em 1979, o Fantástico, programa semanal de sucesso da TV Globo, já apresentava o VDA como o maior centro espiritualista da América do Sul.10 Tudo isso aponta para a relevância das lideranças de Dica e Neiva, o que evidencia outra faceta das mulheres no Brasil central que não a submissão aos patriarcalismos e a reserva aos espaços privados. A existência e a atuação de tais mulheres postulam-se, portanto, como um questionamento à concretude das imposições colonialistas hierarquizantes sobre a religiosidade e a organização político-social da região durante o século XX.

Conforme os estudos de Rezende (2023), Dica enfrentou os coronéis e latifundiários ao tornar-se, ela mesma, madrinha de numerosos habitantes da região, ao instituir o uso coletivo da terra e ao proibir o trabalho aos sábados e domingos, o que diminuiu a mão de obra braçal dos fazendeiros da região de Lagolândia. Dica enfrentou também o poder dos púlpitos do catolicismo oficial, personificado pelos padres redentoristas, que eram responsáveis por anunciar a vontade oficial do sagrado reconhecido. Enfrentou ainda a fúria do Estado, por meio das Forças Armadas e do tribunal. Além disso, a santa teria enfrentado outrossim o próprio marido, que tentou vendê-la algumas vezes, até que ela decidiu deixá-lo. A resistência e a sagacidade de Dica evidenciam uma face da história de Goiás quase nunca contada acerca do protagonismo das mulheres.

É verdade que os estudos de Landes (2002) demonstram, na Bahia de meados do século XX, o reconhecimento a Ialorixás como Mãe Olga do Alaqueto, Mãe Aninha, Mãe Senhora e Mãe Menininha do Gantois. De modo similar, as pesquisas realizadas por Brandão (2007), em Minas Gerais na segunda metade do século passado, já sublinhavam o empoderamento de mulheres enquanto agentes da religião popular. Todo modo, em nenhum destes casos deu-se a inauguração de um movimento religioso tão potente – sob prismas políticos, sociais e econômicos – quando aquele de Dica em Goiás. Revisitar a República do Anjos com óculos decoloniais nos permite evidenciar a subversão de pelo menos dois binarismos hierarquizantes, a saber: o urbano versus o rural, e o homem que ocupa o espaço público versus a mulher que ocupa o espaço doméstico. Nestes caso, seria comum que o subalternizado ocupasse sempre o segundo lugar. Dica, todavia, não se conformou ao rural nem ao doméstico, e tampouco à condição subalternizada imposta às mulheres.

Para averiguar a atuação de Neiva no âmbito religioso com os mesmos óculos decoloniais é preciso recordar que a cruz católica acompanhou pari passu as bandeiras dos colonizadores. No Brasil, o catolicismo chegou por duas vias e com modelos diferentes: 1) aquele oficial pregado pelos padres Jesuítas, Franciscanos, Dominicanos e outros da primeira hora; e 2) aquele popular, praticado pelos migrantes, sobretudo portugueses, muito marcado pela devoção aos santos. Assim, é marca característica da colonização eurocentrada professar a fé católica, mesmo quando as práticas e crenças religiosas efetivamente não encontrassem respaldo na cosmovisão própria do catolicismo.

Nesse sentido, a atuação de Neiva é subversiva na medida em que destaca a hibridez – criando uma corrente religiosa absolutamente particular – e relativiza as hierarquias nos sistemas religiosos desconsiderando o binarismo puro x impuro. Cabe ressaltar que a inclusão de extraterrestres no esquema sagrado do VDA revela, por si, uma espiritualidade macro holística. Ao mesmo tempo, a potência das entidades sagradas indígenas pode transparecer uma herança ancestral ocultada à primeira vista, mas preservada por meio dos esquemas de resistência destacados por Marinho e Simoni (2021) e que garantiram a não dissipação dos saberes e costumes subalternizados. Diante do exposto, é possível afirmar então que, embora o contexto fosse marcadamente patriarcalista e católico, Dica e Neiva foram capazes de inaugurar e liderar expressões religiosas novas, nas quais não é possível identificar maiores engessamentos provenientes da matriz religiosa eurocentrada.

Considerações finais

O presente artigo, ao revisitar, ancorado na perspectiva decolonial, as práticas religiosas inauguradoras de Dica e Neiva, repensa algumas teorias sobre a formação e constituição do campo religioso no Brasil, especificamente aquelas que se referem, ou que afirmam certa preeminência do chamado “catolicismo popular” na constituição religiosa do país. Embora as referidas líderes pareçam, em alguma medida, vinculadas a algumas práticas católicas, de fato, suas lavras constituem-se no campo do espiritualismo holístico.

Ademais, ao assumirmos o conceito de “hibridismo” e não o de “sincretismo”, evidenciamos nossa opção teórica e política sobre a temática. A partir desta escolha, afirmamos que é possível reinterpretar as relações e concepções de gênero estabelecidas no entorno dessas mulheres, enfatizando a atuação delas como fundadoras e líderes de movimentos religiosos. Ao invés de subalternidade, os dois casos analisados permitem perceber que em algumas circunstâncias extraordinárias, como nos movimentos religiosos milenaristas, as relações de gênero têm sido mais fluidas. Afinal, a noção de gênero encampada pelas mulheres que ousaram se projetar para além do espaço doméstico em tempos pretéritos nos quais o machismo era regra aceita, é um indício de que entre algumas mulheres o papel de gênero binário (reprodutora, bela, recatada e do lar – em contraposição ao homem provedor, viril, racional), com maior inserção entre as mulheres brancas burguesas, não pode ser tomado necessariamente como universal entre as mulheres subalternizadas, caso da camponesa e da caminhoneira sobre as quais discorremos.

Concluímos, portanto, que o cerrado do planalto central no século XX não foi exclusivamente católico como muitas vezes se presume. Aliás, é preciso enfatizar que assumir algumas experiências religiosas como variações sincréticas do catolicismo popular acaba por mascarar novas expressões religiosas resultantes do processo de hibridação e, assim, sustenta uma leitura da realidade consonante aos intentos coloniais. Revistar a República dos Anjos e o Vale do Amanhecer permitiu que enxergássemos neles sementes daquilo que, atualmente, nomeamos paradigma pós-colonial.

De fato, este estudo evidenciou uma obviedade: nem só de homens se forjam religiões. Entretanto, essa obviedade permitiu perceber que onde o hibridismo é admitido as mulheres têm mais vez, mais voz, mais poder, mais autonomia e podem exercer sua criatividade e liderança de um modo tal que conseguem afrontar, apoiar ou amedrontar vários poderes instituídos. Embora em décadas diferentes e com teologias e percepções cosmológicas distintas, Dica e Neiva revelam diacríticos quase nunca enfatizados sobre a religiosidade goiana: o espiritismo – ou, dito de outro modo, a compreensão holística da espiritualidade: o espiritualismo – e a fundação de movimentos religiosos por mulheres.

Referências bibliográficas

ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Brazilian popular culture or the curse and blessings of cultural hybridism. In: Bulletin of Latin American Research, v.24, n.2, pp. 157-166, 2005.

AZEVEDO, Gilson Xavier; LEMOS, Carolina Teles. Catolicismo e religiosidade popular no contexto do centro-oeste. In: Protestantismo em Revista, v.45, n.2, pp. 111-123, 2019.

BHABHA, Homi Kharshedji. O Local da Cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2013.

BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas linguísticas. São Paulo: EDUSP, 2008.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Os deuses do povo: um estudo sobre a religião popular. Uberlândia: EDUFU, 2007.

CANCLINI, Néstor García. As culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, 2003.

CARVALHO, Maria Meire. As mulheres na Coluna Prestes: resgate de uma memória. Monografia (Especialização em História). Goiânia: UCG, 1998.

CARVALHO, Maria Meire. Santa Dica e o movimento social no campo: Goiás dos anos 20 aos anos 60. In: Temporis (Ação), v. 1, n. 3, pp. 60-70, 1999.

CERTEAU, Michel de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000.

CHAUL, Nasr Fayad. A identidade cultural do Goiano. In: Ciência e Cultura, v.63, n.3, pp. 42-43, 2011.

CURADO, João Guilherme da Trindade. Lagolândia – paisagens de festa e de fé: uma comunidade percebida pelas festividades. Tese (Doutorado em Geografia). Goiânia: UFG-IESA, 2011.

JOÃO DE DEUS: CURA E CRIME, Netflix. Direção: Maurício Dias; Tatiana Villela. Documentário. Brasil, 2021.

ENGLER, Steven. A Umbanda e a Glocalização. In: Debates do NER, v.12, n.20, pp. 11-44, 2011.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio séc. XX: o dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

GOMES FILHO, Robson Rodrigues. O movimento de “santa Dica” e a Ordem Redentorista em Goiás (1923- 1925). Dissertação (Mestrado em História) Ouro Preto: UFOP-ICHS. 2012.

HALL, Stuart. Da diáspora: identidade e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.

HONESTO, Éder. Do exílio a símbolo cultural: a construção do ícone “Santa Dica” em Goiás. Dissertação (Mestrado em Territórios e expressões culturais no Cerrado). Anápolis: UEG-CSH, 2020.

KERN, Daniela. O conceito de hibridismo ontem e hoje: ruptura e contato. In: Métis, v.3, n.6, pp. 53-70, 2004.

LANDES, Ruth. A cidade das mulheres. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2002.

LIMA, Lourenço Moreira. A Coluna Prestes. São Paulo: Alfa Ômega, 1979.

LUGONES, María. Colonialidad y género: hacia un feminismo descolonial. In: MIGNOLO, Walter (org.). Género y descolonialidad. Buenos Aires: Del Signo, 2008.

MARINHO, Thais Alves; SIMONI, Rosinalda Corrêa da Silva. Decolonialidade e Mulheres Negras em Goiás: do afrocatolicismo aos feminismos de terreiros. In: Numen, v.24, n.1, pp. 23-52, 2021.

MARY, André. Le bricolage africain des héros chrétiens. Paris: CERF, 2000.

MARTINS FILHO, José Reinaldo Felipe. Música e identidade no catolicismo popular: um estudo sobre a Folia de Reis e a Romaria ao Divino Pai Eterno em Goiás. São Paulo: Edições Terceira Via, 2020.

MIGNOLO, Walter. Historias locales/disenos globales: colonialidad, conocimientos subalternos y pensamiento fronterizo. Madrid: Akal, 2003.

NOGUEIRA, Léo Carrer; VERSONITO, Malheiro Suelen; TRISTÃO, Bruno Das Dores. O dom de benzer: a sobrevivência dos rituais de benzeção nas sociedades urbanas – o caso do Município de Mara Rosa, Goiás, Brasil. In: Élisée, v.1, n.2, pp. 167-182, 2012.

O’DEA, Thomas F. Sociologia da religião. São Paulo: Pioneira, 1969.

OLIVEIRA, Irene Dias. Religião e as teias do multiculturalismo. São Paulo: Fonte Editorial, 2015.

OTTO, Rudolf. O Sagrado: um estudo do elemento não-racional na ideia do divino e sua relação com o racional. São Bernardo do Campo: Imprensa Metodista, 1985.

PONTES, Jonael Lima. Sacerdotisa da Novacap: a trajetória mágica de Tia Neiva e modernização do Centro-Oeste. Dissertação (Mestrado em Sociologia). Fortaleza: UFC. 2021.

PINTO, Ana Kelly Ferreira Souto; SILVA, Daniel Carvalho. Identidade e espiritualidade goiana na arte de Nazareno Confaloni. In: ECCO, Clóvis; MARTINS FILHO, José Reinaldo Felipe (orgs.). EspiritualidadeS: múltiplos olhares. Porto Alegre: Editora Fi, 2022.

REIS, Marcelo Rodrigues. Tia Neiva: a trajetória de uma líder religiosa e sua obra, o Vale do Amanhecer (1925-2008). Tese (Doutorado em História). Brasília: UnB, 2008.

REZENDE, Tânia Ferreira. Tensionamento geo-ontoepistêmico-linguístico entre o patriarcado e a espiritualidade da mulher negra. In: Revista Mosaico, v.16, n.1, pp. 57-71, 2023.

REZENDE, Waldetes Aparecida. Santa Dica: história e encantamentos. Goiânia: Kelps, 2011.

SHOHAT, Ella; STAM, Robert. Crítica da imagem eurocêntrica. São Paulo: Cosac Naify, 2006.

SILVA, Jeane das Graças Araújo. Santa Dica ou Reduto dos Anjos: uma visão psico-social. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) - UCG. Goiânia. 2005.

SIQUEIRA, Deis. Novas religiosidades na capital do Brasil. In: Tempo social, v.14, n.1, pp. 177-197, 2002.

SIQUEIRA, Deis. As novas religiosidades no Ocidente: Brasília, cidade mística. Brasília: UNB, 2003.

SIQUEIRA, Deis; REIS, Marcelo; LEITE, Jairo Zelaya; RAMASSONE, Rodrigo M. Vale do Amanhecer: Inventário Nacional de Referências Culturais. Brasília: Superintendência do IPHAN no Distrito Federal, 2010.

SUESS, Guenter Paulo. Catolicismo popular no Brasil. São Paulo: Loyola, 1979.

TELES LEMOS, Carolina. Religião no Centro-Oeste: entre a tradição e a modernidade. In: Sociedade e Cultura, v.9, n.1, pp. 51-54, 2006.

VASCONCELLOS, Lauro. Santa Dica: encantamento do mundo ou coisa do povo. Goiânia: Cegraf/UFG, 1991.

WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília: UnB, 1991.

ZELAYA, Neiva. Tia Neiva: autobiografia missionária. Brasília: Vale do Amanhecer, 1992.

Notas

1 Assumimos aqui o conceito de fundador conforme descrito por Thomas O’Dea (1969). O sociólogo estadunidense defende que as organizações religiosas se desenvolvem sempre a partir de experiências carismáticas pessoais, associadas, posteriormente, a certo discipulado. Afirma ainda que essa experiência inicial tende a ser rotinizada de modo a garantir a evolução daquilo que, por meio da institucionalização cultual, intelectual e organizacional, se tornará, posteriormente, uma religião. Nesse sentido, a forte influência de Cadija (555-619), esposa de Maomé, sobre os primórdios do islamismo, bem como as de Maria Madalena e de Maria mãe de Jesus (Séc. I) sobre o cristianismo, interpõem-se como um ponto de contradição à hegemonia masculina no papel de fundadores únicos das grandes expressões religiosas. Outro modelo de contraponto pode ser encontrado em fundações internas às grandes religiões, como o caso da Obra de Maria – movimento religioso difundido, no seio do catolicismo, em 182 países –, fundado por Chiara Lubich (1920-2008).
2 O historiador goiano Nars Chaul (2011) afirma que a identidade goiana transita entre passado e presente, tradicional e moderno, antigo e contemporâneo.
3 Teles Lemos (2006) constata em suas pesquisas a mesma mescla entre elementos do mundo rural e do urbano que, em Goiás, são evidências dos pontos de contato entre o que é reconhecido como proveniente da tradição ou oriundo da modernidade.
4 Sendo ela mesma a madrinha de todos aqueles que batizava, o que lhe rendeu também a alcunha de “Madrinha” Dica (Rezende, 2023).
6 Neiva fala de extraterrestres, no mesmo sentido com que designamos supostos seres de outros planetas.
7 Jacobina Mentz, líder dos Muckers, morta em 02/08/1874; Antônio Conselheiro, líder em Canudos, morto em 22/09/1897; José Maria de Santo Agostinho líder no Contestado, morto em 22/10/1912.
8 Ao lado do beato José Loureço, líder no Caldeirão, que morreu de peste bubônica.
10 Disponível em: < https://globoplay.globo.com/v/1048165/ > (Acessado em: 19/04/2023).

Autor notes

* Doutorando em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail: dancarvalho90@gmail.com. ORCID iD: < https://orcid.org/0000-0002-8700-4113 >.


Buscar:
Ir a la Página
IR
Visualizador XML-JATS4R. Desarrollado por