Resumo: Esse artigo apresenta uma investigação a partir de uma intervenção pedagógica no Ensino de Ciências mediado pelas tecnologias digitais. A intervenção foi desenvolvida com estudantes do nono ano de uma escola pública por meio de interações e atividades no espaço digital Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências, tendo como base metodológica o Círculo Integrador. Com metodologia qualitativa, as análises dos questionários individuais e relato coletivo trazem como resultados: autonomia e protagonismo dos estudantes; desenvolvimento de suas habilidades tecnológicas, de pesquisa, e de articulação dos conteúdos ao seu contexto; e colaboração e investigação no Ensino de Ciências.
Palavras-chave: Ensino de Ciências, Tecnologias Digitais, Ambiente Virtual de Aprendizagem.
Abstract: This article presents an investigation based on a pedagogical intervention in Science Teaching mediated by digital technologies. The intervention was developed with ninth grade students of a public school through interactions and activities in the digital space Interactive Learning and Science Dissemination Environment, based on the Integrating Circle methodologically. With a qualitative methodology, the analysis of the individual questionnaires and the collective report bring the following results: students' autonomy and protagonism; development of their technological skills, research, and articulation of contents to their context; and collaboration and research in Science Teaching.
Keywords: Science teaching, Digital Technologies, Virtual learning environment.
Resumen: Este artículo presenta una investigación basada en una intervención pedagógica en la Enseñanza de las Ciencias mediada por tecnologías digitales. La intervención se desarrolló con estudiantes de noveno grado de una escuela pública a través de interacciones y actividades en el espacio digital Ambiente de Aprendizaje Interactivo y Divulgación de la Ciencia, basado metodológicamente en el Círculo Integrador. Utilizando una metodología cualitativa, el análisis de los cuestionarios individuales y el informe colectivo arrojan los siguientes resultados: autonomía y protagonismo de los estudiantes; desarrollo de sus habilidades tecnológicas, de investigación y articulación de contenidos a su contexto; y la colaboración e investigación en la Didáctica de las Ciencias.
Palabras clave: Enseñanza de las ciencias, Tecnologías digitales, Ambiente de aprendizaje virtual.
Artigos do fluxo
Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências produto educacional e espaço de diálogo e pesquisa
Interactive environment for learning and display of sciences: educational product and space for dialogue and research
Ambiente interactivo para el aprendizaje y exhibición de las ciencias: producto educativo y espacio para el diálogo y la investigación

Recepción: 26 Abril 2022
Aprobación: 01 Mayo 2022
Esse artigo apresenta parte de uma investigação realizada no âmbito de um Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências, a qual foi desenvolvida por meio de intervenção pedagógica com estudantes de 3 turmas de nono ano de uma Escola Pública de Dom Pedrito, no Rio Grande do Sul, na disciplina de Ciências da Natureza com a unidade temática “vida e evolução” e o objeto do conhecimento “preservação da biodiversidade” (BRASIL, 2018). A prática pedagógica Círculo Integrador (CHAGAS; MORAES, 2019) foi a base metodológica da intervenção, a qual aconteceu por meio de interações e atividades em um espaço digital, denominado como Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências (AIADC) (CHAGAS, 2021), criado e desenvolvido como produto desta pesquisa.
A ação docente por meio da prática pedagógica Círculo Integrador permite que as interações entre estudantes e professores sejam complementares ao processo de construção do conhecimento. Esta prática tem como foco principal o trabalho colaborativo, para isso é desenvolvida com a organização de dois grupos de estudo: Grupo de Estudo Problematizador (GEP) e Grupo de Estudo Cogitador (GEC). Outro elemento importante para o desenvolvimento do Círculo Integrador é a “situação significativa” esta, é o princípio - o tema que irá fomentar o diálogo entre os grupos de estudo, mediados pelo professor. A situação significativa é elencada pelos estudantes a partir de narrativas trazidas pelos mesmos, são experiências vividas em que percebam associações com o Ensino de Ciências.
São fundamentos da prática pedagógica Círculo Integrador: a valorização do contexto dos estudantes; a abordagem problematizadora, dialética e democrática; e o incentivo ao trabalho coletivo, tendo como base os referenciais de Freire (1996) e Delizoicov (2009). O Círculo Integrador tem como objetivo que o estudante consiga: compreender e associar conceitos científicos ao seu contexto; elaborar perguntas e hipóteses relacionadas ao conteúdo trabalhado; reconhecer-se como sujeito integrante e ativo no processo de construção do conhecimento; reconhecer a interdependência entre seres humanos e dimensões ambientais, sociais e educacionais. Devido a necessidade do desenvolvimento de atividades no ensino remoto em virtude da pandemia do COVID-19, as ações de ensino e pesquisa ocorreram com interações por meio do Google Meet, de grupo no WhatsApp e no Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências.
Nesse artigo apresentamos os resultados da pesquisa referente ao Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências, tal ambiente é o produto educacional dessa investigação e espaço de diálogo e pesquisa no ensino de ciências. Na próxima seção trazemos pressupostos acerca do Ensino de Ciências mediado pelas tecnologias digitais, fundamentando a criação do ambiente interativo que possibilitou a intervenção de estudantes e professor. Na seção seguinte explicamos o desenvolvimento da intervenção pedagógica no AIADC. Posteriormente apresentamos os fundamentos conceituais que orientaram as experiências de ensino no AIADC, e compartilhamos nossas intencionalidades quanto aos aspectos: afetivos, tecnológicos, da linguagem e pedagógicos correlacionados com a prática pedagógica Círculo Integrador. Em seguida compartilhamos os caminhos metodológicos e a análise da experiência do AIADC, para então tecer as considerações que mostram as potencialidades do trabalho colaborativo e investigativo no Ensino de Ciências mediado pelas tecnologias digitais.
Nessa seção, tecemos diálogos com autores que nos levaram a refletir diante da complexidade que o processo educativo atual exige: o ensino e a aprendizagem mediados pelas tecnologias digitais. Tais reflexões contribuíram para pensarmos de forma sistêmica e ampliaram nossa visão no processo educativo correlacionando a realidade e a construção do conhecimento, na criação e desenvolvimento do Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências.
Ao aplicar a intervenção por meio da prática pedagógica Círculo Integrador foi necessário criar formas de interação entre estudantes e a professora-pesquisadora1 na modalidade de ensino remoto emergencial, com isso, foi preciso colocar em prática as habilidades docentes adquiridas com o uso das tecnologias digitais, conforme orienta a competência geral docente nº 5, da Base Nacional Comum para Formação de Professores da Educação Básica, que diz sobre a necessidade de:
Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas docentes, como recurso pedagógico e como ferramenta de formação, para comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e potencializar as aprendizagens (BRASIL, 2019; p.13).
Assim, consideramos que a produção de materiais didáticos digitais implica em acompanhar as transições e transformações que ocorrem no cenário educacional correlacionadas com aspectos tecnológicos, sociais, ambientais, econômicos e políticos. Neste caso, o comprometimento com a educação está imbricado ao desenvolvimento profissional docente, assim como potencializa por meio das tecnologias digitais as experiências de aprendizagens dos estudantes e em orientá-los à uma atitude participativa e investigativa. O Ensino de Ciências por meio de tecnologias digitais e atividades investigativas permite que a apropriação do conhecimento científico pelo estudante esteja ligada a criação de situações em que esse conhecimento possa ser aplicado na solução de problemas:
No campo das Ciências, o tema que dá origem a uma pesquisa ou investigação geralmente assume a forma de uma questão ou pergunta, cuja resposta não pode ser obtida mediante um rápido apelo à memória ou por meio de uma consulta rápida e direta a uma fonte de informação facilmente acessível (PAULA, 2017, p.95).
Ressaltamos que o tema que dá origem ao processo de investigação precisa ser de interesse dos estudantes, é necessário que saibam o porquê estão procurando respostas e que essas respostas sejam o resultado dos conhecimentos construídos a partir da base teórica. Para elaborar o planejamento da intervenção pedagógica com o Círculo Integrador algumas questões foram propostas: Como buscar uma ação-dialógica estudante/estudante e estudante/professor através dos recursos digitais? Como o professor pode se tornar efetivamente presente no processo de aprendizagem do estudante?
A autoria e criação de uma estratégia pedagógica que atenda ao contexto atual sinaliza o posicionamento do professor em que algo diferente aconteça em sua aula, ao mesmo tempo propicia que os estudantes sejam protagonistas e aliem suas habilidades tecnológicas ao processo de aprendizagem (KOCH; MACHADO, 2017), sendo assim a estratégia escolhida foi a criação de um ambiente virtual de aprendizagem, considerado como:
[...] um sistema cognitivo que se constrói na interação entre sujeitos-sujeitos e sujeitos- objetos, transformam-se na medida em que as interações vão ocorrendo, que os sujeitos entram em atividade cognitiva. (...) Não existem fronteiras rígidas do que é meio, objeto e sujeito, pois um ambiente virtual de aprendizagem, sob a perspectiva construtivista, se constitui, sobretudo pelas relações que nele ocorrem (LAURINO-MAÇADA, 2001, p.44).
No AIADC alguns dos objetos de aprendizagem utilizados foram produzidos pela professora- pesquisadora como: áudios, slides animados (formato de vídeo), tutoriais, imagens e textos; outros foram selecionados em diferentes plataformas de acordo com a intencionalidade pedagógica e o objetivo da aula. Com base na produção e reutilização dos objetos de aprendizagem compreendemos que um Objeto de Aprendizagem pode ser definido como recurso: “que pode ser reusado para apoiar a aprendizagem. O termo objeto educacional (learning object) geralmente aplica-se a materiais educacionais projetados e construídos em pequenos conjuntos com vistas a maximizar as situações de aprendizagem” (FABRE; TAMUSIUNAS; TAROUCO, 2003, p. 02).
Assim, os objetos de aprendizagem selecionados e reutilizados para auxiliar no processo educacional consistiram em imagens, vídeos, jogos interativos, reportagens, contos e revistas digitais; materiais esses que serviram como fonte de pesquisa aos estudantes. Cada um dos materiais didáticos digitais possui orientação, convidando o estudante a seguir em frente em seu estudo, resolvendo a atividade proposta. Com isso, o estudante experimentou o letramento digital, ou seja, não foi só saber usar as tecnologias, mas sim construir o conhecimento partindo da experiência praticada com as tecnologias. O AIADC foi organizado em seis páginas de navegação, com conteúdo, espaços de interação e de difusão (https://sinarachagas69.wixsite.com/circulointegrador), como mostra a figura 1 e o quadro 1.


Conforme o Quadro 1 e a Figura 1 o Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências está organizado em seis páginas: Apresentação; os passos da prática pedagógica CI: A escuta do professor (primeiro passo); A construção dos saberes (segundo passo); A intersecção dos saberes (terceiro passo); Fontes de pesquisa; Grupos interativos. A página, fonte de pesquisa, contém materiais didáticos digitais nos quais os estudantes podem pesquisar para construir sua aprendizagem. Estes materiais aparecem em diferentes linguagens, como vídeos; links de diferentes sites para aprofundamento do conteúdo; link com matéria de jornal destacando atualidades sobre assuntos debatidos em aula; revistas digitais. Na página Grupos Interativos, encontram-se os espaços para a interação entre os estudantes e a professora, como: Sua experiência; Grupo de Estudo Cogitador e Grupo de Estudo Problematizador. O AIADC pode ser acessado no seguinte endereço eletrônico: (https://sinarachagas69.wixsite.com/circulointegrador). O objetivo em utilizar o AIADC foi criar um espaço para desenvolver a prática pedagógica Círculo Integrador no ensino remoto emergencial, utilizando recursos digitais como objetos virtuais de aprendizagens, e materiais didáticos digitais produzidos pela professora/pesquisadora.
Nessa seção apresentamos a organização do Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências a partir da prática pedagógica Círculo Integrador. Organizados em três quadros, estão sistematizadas as principais atividades desenvolvidas a partir da proposta, material didático e comunicação do aprendido da prática pedagógica Círculo Integrador. Também compartilhamos nessa seção imagens de cada uma das páginas. Através da figura 2 demonstramos a proposta da professora (https://sinarachagas69.wixsite.com/circulointegrador/apresentacao) e o espaço de interação dos estudantes (https://sinarachagas69.wixsite.com/circulointegrador/groups) para compartilhar suas experiências e posteriormente escolher a situação significativa (passo 1 Círculo Integrador).

No quadro 2 são apresentadas as ações educativas do passo 1 do Círculo Integrador “A escuta do professor”, no qual ocorre a abordagem inicial às Ciências da Natureza, investigação das primeiras percepções e a narrativa das situações significativas pelos estudantes.

No passo 1 as atividades pedagógicas foram planejadas com o intuito de que os estudantes pudessem interagir no AIADC por meio dos grupos interativos. Assim, dentre as atividades propostas, foram convidados a relatar uma experiência vivida em que eles identificassem conexão com as Ciências da Natureza. Com base nos relatos das experiências, uma delas foi escolhida pelos estudantes como uma situação significativa, a fim de correlacionar com a unidade temática e o objeto do conhecimento. Sendo assim a situação significativa elencada pelos estudantes foi “ plantio de laranjeira”.
No quadro 3 apresentamos a página “construção dos saberes” (passo 2), quando ocorre o início do estudo com base na situação significativa “plantio de laranjeira” e o objeto do conhecimento “preservação da biodiversidade”; a formação do Grupo de Estudo Cogitador e do Grupo de Estudo Problematizador; e o planejamento das próximas atividades. Nesta página os estudantes fazem uso de sua autonomia para navegar, pesquisar e formular suas reflexões a partir das provocações e orientações para as atividades encontradas na página, concomitantemente ocorrem as interações entre estudantes e a professora-pesquisadora no grupo Círculo Integrador no WhatsApp.

Nesse passo, os estudantes participaram efetivamente das ações planejadas pela professora-pesquisadora. Partindo da situação significativa: “plantio de laranjeira”, as conexões com o objeto do conhecimento ocorreram por meio do Tema Contemporâneo Transversal “meio ambiente”, e das interações entre o Grupo de Estudo Problematizador e o Grupo de Estudo Cogitador. O planejamento das atividades pedagógicas e a ação docente nesse passo são simultâneas e acompanham a construção do conhecimento desenvolvido pelos estudantes.
Neste sentido, a página 3 do AIADC, contendo o passo 2 do Círculo Integrador “a construção dos saberes”, foi surgindo no AIADC à medida que a aprendizagem dos estudantes foi sendo efetivada. Esta página contém e apresenta a sequência do processo de construção do conhecimento com participação ativa dos estudantes. Na figura 3 podemos observar no passo 2 do Círculo Integrador (https://sinarachagas69.wixsite.com/circulointegrador/p%C3%A1gina-2), a forma como a situação significativa escolhida foi desencadeadora de outros conhecimentos de ciências:

No quadro 4, apresentamos a página “intersecção dos saberes” (passo 3), na qual acontece a socialização dos conhecimentos construídos pelos estudantes. As atividades, as reflexões, as aprendizagens, o resultado das problematizações e diálogos ocorridos no GEC e no GEP em torno da situação significativa “plantio de laranjeira”.

No passo 3 ocorre a apresentação e socialização das aprendizagens dos estudantes, demonstradas na página 4 do AIADC. Para que os trabalhos dos estudantes pudessem ser apresentados no AIADC foi necessário que a professora-pesquisadora fizesse a postagem no AIADC a partir dos materiais enviados pelos estudantes, no aplicativo WhatsApp. À medida que desenvolviam as atividades propostas os estudantes enviavam o resultado para a professora e assim ocorria a mediação e orientação docente. O envio dos resultados era por imagem da atividade realizada no caderno e por meio dos recursos digitais como: slides salvos em formato de Word e PDF, e áudios. Os materiais foram postados respeitando-se a autoria e originalidade do trabalho.
Com base nas devolutivas dos estudantes, a página 4 do AIADC contendo o passo 3 “a intersecção dos saberes” foi sendo alimentada no ambiente virtual, para isso utilizamos os recursos digitais do próprio site Wix.com como as galerias de imagens em diversos formatos, figuras, textos e áudios produzidos pelos estudantes, esta página contém ainda a sistematização dos conteúdos estudados por meio de um mapa conceitual, organizado pela professora-pesquisadora, a partir das interações entre o GEP e GEC. Na figura 4 apresentamos o passo 3 do Círculo Integrador “ intersecção dos saberes” (https://sinarachagas69.wixsite.com/circulointegrador/p%C3%A1gina-3) em que se observa o mapa conceitual.

O Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências, como produto educacional, pode ser considerado referência para outros professores e estudantes acerca de como é desenvolvida a prática pedagógica Círculo Integrador. No Ambiente podem ser acessados materiais didáticos selecionados e disponibilizados para pesquisa e consulta com relação aos conteúdos desenvolvidos na prática Círculo Integrador, além das atividades propostas e dos resultados, respostas e materiais criados pelos próprios estudantes. Com a orientação da professora- pesquisadora, os estudantes aprenderam e ensinaram na ação dialógica, pesquisaram, refletiram e escreveram sobre suas pesquisas; se comunicaram por áudio, texto e imagens, usaram de criatividade e autonomia na escolha da linguagem a utilizar.
Este estudo apresenta resultados de uma pesquisa de natureza qualitativa correlacionados à abordagem dos dados coletados no desenvolvimento dele. Com esta pesquisa aprofundamos e demos origem a novos conhecimentos em relação ao fenômeno estudado a partir da interpretação e análise de forma crítica, de modo a relacionar os conceitos com fatores relevantes ao contexto natural onde ocorreram os estudos. De acordo com Godoy (1995; p. 07) “[...] quando a nossa preocupação for a compreensão da teia de relações sociais e culturais que se estabelecem no interior das organizações, o trabalho qualitativo pode oferecer interessantes e relevantes dados”. Neste caso a interpretação dos dados levantados teve um caráter qualitativo/ subjetivo, pois não enumeramos, quantificamos ou empregamos uso de dados estatísticos, mas sim interpretamos os dados coletados a partir da relação que se estabelece entre as pesquisadoras, o ambiente natural, a situação estudada e os sujeitos que participaram da pesquisa.
De acordo com Godoy (1995) a pesquisa qualitativa considera algumas características básicas, as quais foram atendidas no desenvolvimento desta investigação, conforme descrevemos a seguir:
a) “A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como instrumento fundamental” (GODOY, 1995, p. 06): nesta característica destacou-se o estudo e análise do mundo empírico no contexto de estudo, dando importância ao papel da pesquisadora no contato direto e prolongado com o ambiente natural e a situação de estudo.
b) “A pesquisa qualitativa é descritiva” (GODOY, 1995, p. 06): importante ressaltar aqui, a forma como ocorreram as análises da coleta de dados, sejam dos relatos singulares, do relato coletivo, do questionário, ou do material produzido durante o processo do estudo. Considerou-se que todos os dados da realidade relativos ao fenômeno precisaram ser examinados, existindo um caráter valorativo quanto ao processo do estudo e não somente com o resultado ou produto.
c) “O significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida são a preocupação essencial do investigador” (GODOY, 1995, p. 06). Existiu a preocupação da pesquisadora em compreender a situação de estudo a partir da perspectiva dos sujeitos participantes da pesquisa.
d) “Pesquisadores utilizam o enfoque indutivo na análise de seus dados” (GODOY, 1995, p. 06). Não existiu preocupação em comprovar dados ou hipóteses, já que não partiram previamente de hipóteses, mas sim, partem de questões amplas que vão se tornando específicas no decorrer do estudo.
Para análise desta investigação utilizamos como base os relatos dos estudantes tendo como instrumentos de pesquisa, um questionário individual e o relato coletivo. O questionário continha as seguintes questões: “Quais as relações do conteúdo trabalhado com a sua vida? Conta como foi aprender por meio das tecnologias? De que maneira o material didático utilizado nas aulas ajudou na sua compreensão sobre o conteúdo de ciências?”. Tais questões foram respondidas pelos estudantes de forma singular no grupo Círculo Integrador pelo aplicativo do WhatsApp, ao final das atividades. Para o relato coletivo utilizamos como recurso o Google Meet, os estudantes interagiram entre si, mediante a seguinte pergunta aberta: Quais atividades realizadas no Círculo Integrador que te ajudaram a entender o conteúdo de Ciências?
Trazemos para esse artigo a análise de duas das dimensões identificadas na pesquisa, quais sejam: material didático e tecnologias digitais, as quais estão diretamente relacionadas com o Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências. Os relatos dos estudantes foram transcritos na íntegra, nas dimensões abaixo mencionadas, e foram gerados no passo 3 do Círculo Integrador.
1. Dimensão Material Didático
Observamos a aceitação e acesso por parte destes aos materiais didáticos produzidos e publicados no AIADC ou no aplicativo do WhatsApp. Criar e selecionar os materiais didáticos para o Ensino de Ciências nesta intervenção exigiu atenção em alguns aspectos como: tempo de duração dos vídeos; e linguagem dos materiais. Este aspecto contribuiu para que estudantes e professora- pesquisadora compartilhassem conhecimentos, além de possibilitar uma compreensão estruturada e ordenada de modelos e teorias das Ciências (PAULA, 2017). Destacamos alguns relatos dos estudantes para esta dimensão:
Estudante 1: “Todo o material didático que foi disponibilizado no site e no grupo teve uma suma e grande importância nos meus trabalhos, porque foram a fonte da maioria das minhas pesquisas”.
Estudante 2: “Me ajudou muito pois pude estudar de diferentes formas”
Estudante 3: “O material didático conseguiu me facilitar a aprendizagem de uma forma inexplicável, porque tudo foi feito de forma calma, me ajudando bastante”.
Estudante 4: “Me ajudou mais a entender sobre o conteúdo trabalhado, me disponibilizando fontes de pesquisa e compreendimento no site e nas atividades trabalhadas”.
O uso de materiais didáticos permitiu que os estudantes compreendessem conceitos abstratos das teorias das Ciências e ao mesmo tempo conseguissem, por meio deles, modificar seu trato com a realidade, com os outros e consigo mesmo (PAULA, 2017).
2. Dimensão Tecnologias Digitais
Nesta dimensão, ressaltamos o contexto de ensino remoto emergencial em função da pandemia do COVID-19. Em decorrência deste fato, o uso das tecnologias na intervenção tornou-se o único meio de comunicação e interação com os estudantes participantes.
Consideramos as tecnologias uma aliada na ação docente, pois tecnologias isoladas podem não representar efetividade na prática pedagógica, mas quando acompanhadas de uma abordagem coordenada pela ação docente passam a integrar um processo educacional. Esta inovação constitui uma ruptura de paradigma, pois, é necessário superar desafios, encontrar formas de contornar situações estruturais ligadas às determinações institucionais de ensino, transpor metodologias e práticas pedagógicas destinadas ao espaço físico para o espaço virtual (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020).
O uso das tecnologias nesta intervenção não representou meramente uma ferramenta de comunicação, antes sim, significou: “[...] forças ambientais que, cada vez mais, afetam a nossa auto concepção (quem somos), as nossas interações (como socializamos), como ensinamos e como aprendemos, enfim, a nossa concepção de realidade e as nossas interações com a realidade” (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020, p.25). Os autores citados nesta análise contribuíram para que pudéssemos compreender as dificuldades encontradas e criar mecanismos para resolvê-las. No decorrer da intervenção procuramos criar atividades interativas através de jogos, orientações pedagógicas para a pesquisa e associar conhecimentos científicos e tecnológicos à realidade dos estudantes. Na sequência apresentamos relatos de estudantes quanto a sua percepção de aprender com as tecnologias.
Estudante 3: “Aprender por meio da tecnologia é algo extremamente mágico, porque fazer as pesquisas em sites confiáveis tendo meets explicativos e conversas pelo WhatsApp foi muito divertido, além de podermos conquistar novos aprendizados”.
Estudante 2: “Foi difícil no começo mas depois começou a ser muito fácil e muito divertido”.
Estudante 1: “Adquirir conhecimento através da tecnologia é uma experiência nova e diferente, mas agradável e divertida”.
Estudante 4: “Foi ótimo pois, me disponibilizou melhor compreensão sobre o conteúdo trabalhado e fontes de pesquisa variadas”.
Diante da realidade que vivenciamos, transpusemos para o espaço online nossas ações docentes, transferimos conjuntamente nossos objetivos educacionais, nossas emoções, nossa vontade de ensinar, nosso querer fazer. Desta forma, vimos nas tecnologias uma oportunidade de abertura, de incluir, flexibilizar, bem como uma personalização dos percursos de aprendizagem (MOREIRA; SCHELEMMER, 2020).
Para criar e planejar as interações e os recursos tecnológicos utilizados nessa intervenção, observamos primeiramente o contexto-realidade dos estudantes participantes, realizamos uma consulta prévia com a diretora e a professora da escola parceiras nessa pesquisa. A partir daí, articulamos nossas intencionalidades aos aspectos: afetivos, da linguagem, tecnológicos e pedagógicos propostos por Moura et al. (2015) ao dialogarem sobre produção de material e interações por meios digitais.
1. Aspecto afetivo: foi destacado na ação-dialógica, na aceitação do outro, nas ações coletivas. Este aspecto ficou perceptível quando os estudantes contaram suas experiências, organizaram-se em grupos de estudo e em suas interações durante as atividades.
2. Aspecto tecnológico: Foi importante saber identificar qual recurso indicado para determinada finalidade, ou seja, saber que o recurso utilizado no processo de ensino teria o alcance necessário ao objeto de estudo.
3. Aspecto da linguagem: Foi considerado nas diferentes abordagens de conteúdo, seja audiovisual; textual, por imagens, por problematizações. Consideramos a intencionalidade pedagógica nessas diversas formas, o material didático precisou favorecer a compreensão, valorizar o emocionar, as interações de forma que o estudante se sentisse convidado a participar e interagir nas atividades pedagógicas.
4. Aspecto pedagógico: Compreendeu os aspectos afetivos, tecnológicos e da linguagem, contudo foi o aspecto pedagógico que respondeu pela compreensão, abordagem e a operacionalidade entre todos eles.
Percebemos o quanto é complexo pensar e planejar as ações pedagógicas para a produção de material didático digital e para interação por meio das tecnologias digitais, mas ao mesmo tempo é gratificante saber que aspectos ligados a uma formação humanizadora podem fazer parte e a diferença nas ações docentes.
Pensando nos recursos tecnológicos disponíveis e que permitissem que os estudantes tivessem acesso, optamos pela plataforma Wix.com por perceber que o site teria recursos para criar espaços de diálogo, recursos para criar espaço para compartilhamento de material didático e as produções dos estudantes, sem que os estudantes necessitassem de espaço de memória no celular para baixar materiais ou um novo aplicativo.
O Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências (AIADC) é considerado um dos produtos educacionais resultantes desta pesquisa, sua construção contou com a primeira parte do planejamento elaborado pela professora-pesquisadora que corresponde ao passo 1 da prática pedagógica Círculo Integrador “A escuta do(a) professor(a)”. A partir deste passo 1, sua construção foi realizada progressivamente em conjunto com os estudantes de acordo com as necessidades da intervenção, ou seja, o estudo em desenvolvimento determinou cada intencionalidade para a produção e a construção de um espaço ou postagem de material didático digital, assim as páginas foram tomando forma e apresentando a sequência das aulas bem como a sequência das aprendizagens decorrentes dessas aulas.
O uso de tecnologias digitais contribuiu para fazer a aproximação entre professora- pesquisadora e estudantes, essa afirmativa não se refere somente a este período de ensino remoto emergencial, mas sim compreendemos que há uma tendência a permanecer no contexto diário das escolas a fim de contribuir com o processo educativo, desde que o professor esteja engajado nessa possibilidade de inovar, mesmo com pequenas ações. As ações no ambiente digital recriam formas de leitura e escrita, de aprender, de pesquisar, de interagir e o ambiente criado para esta intervenção, o AIADC, comporta três elementos que denotam essas ações: o espaço-contexto; espaço-suporte e o espaço-intuito, conceitos propostos por Moura et al. (2020).
O espaço-contexto especificou o contexto, ou seja, a realidade em que se dá a intervenção pedagógica. Caracterizado pela situação atípica em que ocorre a suspensão do ensino presencial em decorrência da pandemia do COVID-19, pelas atividades desenvolvidas no ensino fundamental, no componente de Ciências da Natureza com estudantes de três turmas diferentes, representando uma heterogeneidade atendida nas ações educacionais, aqui o desafio foi trabalharmos no sentido de contribuir com a ação dialógica entre estudantes de diferentes turmas e o seu engajamento com a prática pedagógica Círculo Integrador.
O espaço-suporte ficou caracterizado pelos mecanismos utilizados para que as ações fossem efetivadas. Foi preciso pensar qual o espaço-suporte seria utilizado para conseguir atender um dos principais fundamentos do Círculo Integrador: a ação dialógica. Consideramos o espaço- suporte no AIADC, os objetos de aprendizagem, os dispositivos eletrônicos utilizados como: celular, computador, tablet. Também se inclui como espaço-suporte, o aplicativo WhatsApp, escolhido por ser um aplicativo leve, que os (as) estudantes já tinham instalado em seu celular e por permitir uma comunicação mais rápida, dinâmica com possibilidade de envio de material didático também nesse espaço. De acordo com Cunha, Santos e Santos (2021), esse aplicativo tem se destacado no ensino por facilitar e agilizar a comunicação, além de possibilitar que materiais de diferentes linguagens sejam compartilhados. O Google Meet, outro espaço-suporte, foi utilizado para os encontros síncronos, já previstos na carga horária da disciplina e também como plataforma já utilizada pela escola e pela turma.
O espaço-intuito especificou qual a finalidade do uso das tecnologias digitais, nesta pesquisa consistiu na validação da prática pedagógica Círculo Integrador, também considerada produto educacional e em alcançar os objetivos do Ensino de Ciências em uma perspectiva emancipatória por meio de interações estudantes-estudantes; estudantes-materiais e estudantes- professora-pesquisadora.
O desenvolvimento desta intervenção pedagógica em um período pandêmico, gerou incertezas, apresentou desafios, porém conduziu-nos à reflexão sobre o contexto educacional atual. Partindo destas reflexões o planejamento e desenvolvimento pedagógico foi pautado pelo contexto dos estudantes, tanto no que se refere ao ponto de partida: a situação significativa relatada e escolhida por eles, quanto no que se refere às possibilidades e limitações do uso das tecnologias digitais em suas residências. Por meio de abordagens contextualizadas e problematizadoras do ensino de ciências desenvolvemos atividades que incentivaram o trabalho coletivo e a interação possibilitando que os estudantes se reconhecessem como sujeitos integrantes e ativos no processo de construção do conhecimento; e ainda reconhecerem a interdependência entre seres humanos e dimensões ambientais, sociais e educacionais.
Ao criarmos o AIADC geramos uma conexão com os estudantes, participantes da pesquisa, para tanto foi preciso pensar sobre a produção do material didático a ser utilizado, sobre a seleção dos objetos virtuais de aprendizagem, sobre o tipo de linguagem que pudesse dar sentido e significado ao processo de ensino. Utilizar um ambiente virtual como sala de aula permitiu ao estudante operar os recursos digitais, seguindo as orientações para cada atividade proposta e ainda possibilitou que os estudantes tivessem autonomia e fossem protagonistas ao aliar suas habilidades tecnológicas ao processo de aprendizagem, sentiram-se encorajados à pesquisa, a refletir e associar os conteúdos trabalhados ao seu contexto. A prática pedagógica do Círculo Integrador permitiu que a interação entre os estudantes e os grupos ocorresse em um processo de diálogo e parceria, e o AIADC propiciou a conectividade, rapidez, fluidez, apropriação de recursos e mídias.
Nesse artigo apresentamos os resultados da pesquisa referentes ao Ambiente Interativo de Aprendizagem e Difusão de Ciências, assim nomeado pois possibilita a interação entre estudantes, no qual o conhecimento é construído juntamente com a professora-pesquisadora, além de ser o espaço onde são compartilhadas as aprendizagens dos estudantes. É interativo, considerando que os estudantes podem dialogar através dos grupos, é de aprendizagem, pois, comporta atividades pedagógicas, material didático e material produzido pelos estudantes, e é de difusão, ao permitir a publicação e o acesso das produções na disciplina de Ciências da Natureza.







