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Received: 11 May 2023
Accepted: 12 July 2023
DOI: https://doi.org/10.29327/210932.11.1-18
Resumo: Intentamos, neste artigo, realizar uma análise que una o olhar linguístico dialógico para a Libras e a sua orientação polifônica na sala de aula de Letras Libras da UFRN campus central. Projetamos fazê-la de uma maneira introdutória, visto a extensão que a ideia de pesquisa/ análise propõe e, assim, recortamos um filete de uma análise desenvolvida no Mestrado do PPgELUFRN. Dessa forma, partimos da concepção de que todo ato discursivo e linguístico é dialógico e nos apoiamos na Análise Dialógica bakhtiniana para justificarmos essa percepção, assim como para embasarmos a ideia de orientação polifônica que perpassa toda a análise. Também fundamentamos nossos estudos nas temáticas linguísticas da Libras, pois analisamos de forma dialógica a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Como resultados esperados, desde a proposição da análise empreendida, acreditamos que há orientação polifônica no fazer pedagógico de professores Surdos e essa característica pode possibilitar melhor ensino-aprendizagem da língua, visto que a ideologia, valoração e significação identificada em cada ato discursivo, em cada enunciado concreto e irrepetível dá ênfase ao entendimento de que a linguagem se efetiva na interação.
Palavras-chave: Análise Dialógica, Polifonia, Libras, Professor Surdo.
Abstract: In this article, we intend to carry out an analysis that unites the dialogic linguistic look at the Brazilian Sign Language and its polyphonic orientation in the classroom of the Brazilian Sign Language (LIBRAS) undergraduate program at the UFRN central campus. We intend to do this in an introductory way, given the extension that the idea of research/analysis proposes. Thus, we cut a thread of an analysis developed in the Master’s degree of PPgEL-UFRN. In this way, we start from the conception that every discursive and linguistic act is dialogical and rely on Bakhtin’s Dialogical Analysis to justify this perception, as well as to base the idea of polyphonic orientation that permeates the entire analysis. We also base our studies on the linguistic themes of the Brazilian Sign Language, as we analyze it in a dialogical way. As expected results, from the proposal of the undertaken analysis, we believe that there is a polyphonic orientation in the pedagogical work of deaf teachers, and this characteristic may enable better teaching and learning of the language, since the ideology, valuation, and meaning identified in each discursive act, and in each concrete and unrepeatable utterance, emphasize the understanding that language is effective in interaction.
Keywords: Dialogic Analysis, Polyphony, Brazilian Sign Language, Deaf Teacher.
INTRODUÇÃO
Neste artigo, como objetivo principal tencionamos analisar se há, no fazer pedagógico de professores Surdos do Ensino Superior em Libras, especificamente no curso de Letras Libras na UFRN campus central, a orientação polifônica e como ela pode estar presente dentro de sala de aula. Para isso, buscamos entender como ocorre a associação da Libras com a teoria de Bakhtin e do círculo (2018)[1] no que tange aos conceitos de dialogismo e a orientação polifônica. Destarte, enfatizamos ainda a concordância com Bakhtin quando ele afirma que “só nos falta a ousadia científica, investigatória, sem a qual não conseguiremos subir nas alturas nem descer às profundezas”. (BAKHTIN, 2017, p. 19), e, nessa análise, nos propomos a ousar.
Como questões de pesquisa temos uma questão norteadora, elencada a seguir: “se a polifonia, pela Análise Discursiva, é uma característica linguística que implica a equipotência, equipolência de vozes, como realiza-se nas aulas de Libras? “e “qual a associação entre o fazer pedagógico de professores Surdos do curso de Letras Libras da UFRN e o dialogismo na Libras?”
Considerando essa questão de estudo e tomando como base os escritos de Mikhail Bakhtin e do Círculo (2013; 2017; 2018) que versam sobre a dialogicidade, polifonia e signo linguístico[2], assim como Casado Alves (2018; 2019; 2020) que expõe leituras pertinentes sobre a análise dialógica e os escritos de Sá (1999; 2007; 2011) e Oliveira (2016) que abordam as questões de culturas surdas, bilinguismo na Libras e ensino de Libras, o objetivo deste estudo é o de analisar, de forma dialógica discursiva, se a orientação polifônica pode estar presente na Libras. É preciso ressaltar que compreendemos que toda língua possui sentidos, vozes, respostas, reações, bem como possui interlocução ativa e responsiva, ou seja, é dialógica. Assim sendo, realizamos essa análise para identificarmos o funcionamento dessa língua com relação à análise dialógica.
Para isso, consideramos esta análise como de cunho exploratório, visto que, como cita Gil (2010, p. 27):
As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores.
Também utilizamos o levantamento bibliográfico (GIL, 2010. p. 28) a fim de entender como transcorre o uso da orientação polifônica na Libras, para averiguarmos o que já tinha sido escrito tanto sobre a polifonia quanto sobre a Linguística da Libras, documental, visto que analisamos um material didático e de campo, visto que houve aplicação de um questionário para os professores Surdos (ANEXO I), recolhimento de materiais didáticos utilizados no fazer pedagógico desses professores (PS1 e PS2), assim como contato direto com os participantes de pesquisa. Reiteramos que todos os dados utilizados neste artigo estão sob responsabilidade da pesquisadora titular da pesquisa, assim como autorizados mediante o CAAE[3] 56844122.0.0000.5537 do CEP4.
Estudamos sobre o que já foi produzido sobre o assunto nas plataformas Sucupira, Capes, Google acadêmico, periódicos nacionais e internacionais (Qualis A e B) a fim de compreendermos como ocorre essa associação entre a polifonia e a Libras. No entanto, percebemos que não há nenhuma pesquisa recente na qual se analise a polifonia na Libras. Assim, pelo que percebemos, essa ainda é uma associação não explorada em pesquisas na área da Linguística Aplicada.
Quanto aos resultados, acreditamos que será de grande relevância para os estudos acadêmicos da Libras e posteriores análises, visto que trará um esclarecimento dialógico discursivo acerca da Libras, como também levantará questões relevantes que ainda não foram publicadas enquanto pesquisas realizadas.
ORIENTAÇÃO POLIFÔNICA: UMA DISCUSSÃO DIALÓGICA
Discorrer, dialógica discursivamente, sobre orientação polifônica, é emergir diretamente nos estudos do Círculo de Bakhtin, visto que ao falar sobre o romance polifônico de Dostoiévski ele define a polifonia como “as múltiplas vozes” (BAKHTIN, 2018, p. 11) que representam um discurso de um vasto universo com suas pluralidades, “em um diálogo sem fim, no qual vozes do passado se cruzam com vozes do presente e fazem seus ecos se propagarem no sentido do futuro” (BAKHTIN, 2018, p. 12). Ou seja, ao se reportar à análise dos romances de Dostoiévski, a partir da filosofia da linguagem, Bakhtin elabora um conceito que não se faz usual apenas para a literatura, visto que desde a criação dos termos monolinguismo, dialogismo e polifonia
Aplica ao processo de construção do romance monológico o conceito de reificação, usado por Marx para analisar, no sistema de produção capitalista, a relação entre produção da mercadoria e seu produtor, na qual a produção submete de fora o homem a uma metamorfose que o reduz a coisa, a objeto do processo, a mero reprodutor de papéis (BEZERRA, 2021.p.192).
Dessa forma, a perspectiva bakhtiniana não traz esses conceitos limitando-os aos romances de Dostoiévski, mas abrange toda a língua enquanto discursiva e política, assim como à filosofia da linguagem, pois entende que todo discurso é atravessado de vozes remetendo à “diversidade de personalidades, pontos de vista, posições ideológicas, religiosas, antirreligiosas, nobreza, vilania, gostos, mania, taras, fraquezas, excentricidades, brandura, violência, timidez, exibicionismo [...]” (BAKHTIN, 2018, p. 11). À vista disso, a orientação polifônica ocorre no entrecruzamento entre diálogos, nas releituras independentes, na apropriação discursiva e aí sim o sujeito passa a ser um verdadeiro “ideólogo” (BAKHTIN, 2015, p. 87). Assim, percebemos que para além da literatura, os estudos do Círculo de Bakhtin compreendem também uma análise linguística que entende a linguagem como múltipla, heterogênea, diversificada, polifônica, como também dialógica, visto que possui “atividade dinâmica entre Eu e o Outro” (GEGe, 2013), ou seja, eu só me constituo em relação ao Outro que me vê, que me responde, que dialoga comigo, mesmo que esse “Outro” seja meu próprio “Eu”, sendo ainda assim, uma relação de diálogo e de constituição, tanto linguística quanto socialmente, ou seja, a orientação polifônica está no ato da linguagem. A relação do dialogismo com a polifonia é explicitada claramente por Bezerra (2021, p. 194)
A esse tratamento reificante do homem contrapõe-se o dialogismo, procedimento que constrói a imagem do homem num processo de comunicação interativa, no qual eu me vejo e me reconheço através do outro, na imagem que o outro faz de mim. Aí o autor visa a conhecer o homem em sua verdadeira essência como um outro “eu” único, infinito e inacabável; não se propõe conhecer a si mesmo, conhecer seu próprio eu, propõe-se conhecer o outro, o “eu” estranho. Dostoiévski considera que não pode compreender, conhecer e afirmar seu próprio “eu” (o “eu para mim”) sem o outro; sem o outro “eu” e sem o reconhecimento e a afirmação do meu “eu” pelo outro (o “Eu para o outro). Por sua natureza, o “eu” não pode ser solitário, um “eu” sozinho, pois só pode ter vida real em um universo povoado por uma multiplicidade de sujeitos independentes e isônomos. Eu me projeto no outro que também se projeta em mim, nossa comunicação dialógica requer que meu reflexo se projete nele e o dele em mim, que afirmemos um para o outro a existência de duas multiplicidades de “eu”, de duas multiplicidades de infinitos que convivem e dialogam em pé de igualdade. O que caracteriza a polifonia é a posição do autor como regente do grande coro de vozes que participam do processo dialógico. Mas esse regente é dotado de um ativismo especial, rege vozes que ele cria ou recria, mas deixa que se manifestem com autonomia e revelem no homem um outro “eu para si” infinito e inacabável. Trata-se de uma “mudança radical da posição do autor em relação às pessoas representadas, que de pessoas coisificadas se transformam em individualidades (BEZERRA, 2021.p.194).
Dessa forma, é no processo do dialogismo que encontramos a polifonia, como uma possível característica, existente em alguns atos enunciativos. E é nessa multiplicidade de vozes no discurso, ênfases, concordâncias ou não no discurso do Outro, ideologias discursivas, retomada de vozes e revozeamentos, seja pelo ato de dizer/sinalizar, ou nas expressões não manuais emitidas no discurso na Libras que encontramos o dialogismo e excepcionalmente em algumas aulas de Libras, a orientação polifônica. Por isso, nos propomos a identificar essa orientação polifônica em materiais didáticos de aulas de Libras.
Para Bakhtin, o autor polifônico nunca deixará de colocar em suas obras o seu ponto de vista, seus valores, em que acredita. Esse autor polifônico, que em PPD (2013) Bakhtin classifica como sendo Dostoiévski, tem uma mudança radical na posição autoral e é nessa mudança que a obra terá unidade, pois, para o próprio Bakhtin, uma obra sem certa unidade seria deficiente. Essa unidade, como já mencionado, é de “ordem superior” (BAKHTIN, 2018). Contra os hábitos monológicos enraizados pela cultura da época, em PPD a análise bakhtiniana intencionava superar essa tradição do pensamento monológico dos confrontos de Hegel e Marx, que para o pensamento bakhtiniano em suma, em sua essência eram monológicos. Nesse aspecto monológico, diz Bakhtin, os “pensamentos, asserções e proposições separados que podem por si sós ser verdadeiros ou falsos, dependendo de sua relação com o sujeito e independentemente do veículo a que pertencem” (PPD, 2013, p.93) e é nesse monolinguismo que Bakhtin faz menção dos pensamentos separados que produzem a sistematicidade e um modelo de verdade.
No entanto, esse modelo de verdade é tido como único quando não se tem a eventividade, pois para Bakhtin em PPD (2018) há no evento a particularidade, não- finalização e a abertura a possibilidades múltiplas e imprevistas. Assim sendo, o uso desta orientação polifônica ocorre justamente em como o discurso é apresentado, entendendo que cada sujeito possui vozes dialógicas únicas, pensadas, repensadas, elaboradas para o uso em um tempo e um espaço composicional específico.
Dessarte, não é apenas a língua (Libras) enquanto estrutura, enquanto parâmetros pré-estabelecidos e regras a serem executadas, mas também é sobre os atos dialógicos, ideológicos, únicos e irrepetíveis que estão postos na Libras e são equipotentes e é nessa equipotência que está a orientação polifônica.
A POLIFONIA: QUESTÕES DE IMISCIBILIDADE, INCONCLUSIBILIDADE TEMÁTICA, INDEPENDÊNCIA E A EQUIPOLÊNCIA DE VOZES NAS VOZES/ SINALIZAÇÕES EM LIBRAS
Após observar o corpus de análise[4], percebemos em quais momentos as aulas, os materiais didáticos e os relatos dos professores Surdos podem ter orientações polifônicas ou não e em quais aspectos essas relações polifônicas decorrem de suas respectivas formações e experiências educacionais e linguísticas adquiridas ao longo da vida. Em primeira análise, consideramos o percurso histórico de cada docente participante da pesquisa e, depois, como esse percurso faz parte da prática docente de cada um. Após isso, trouxemos a metáfora do autor, personagem e herói da sala de aula, corroborando a segunda categoria de pesquisa. Em seguida, analisamos as aulas gravadas e, após isso, as relações estabelecidas nos materiais didáticos que favoreceram a entoação polifônica em sala de aula. Concomitante a isso, identificamos os traços polifônicos em toda a análise.
Primeiramente, em resposta à pergunta 8 (oito) do questionário enviado (“Relate de forma escrita ou em vídeo Libras sua história até a UFRN, faça um breve relato de como foi seu caminho até ser professor da UFRN”), PS1 responde a esse questionamento em um vídeo em Libras, como transcrito no Quadro 20.

Olá. Então, meu ensino básico foi todo em escola Inclusiva. Mas não era tão inclusiva assim. Não existia intérprete de Libras na minha escola. Quem me auxiliava nesse sentido era minha irmã. Ela é ouvinte, crescemos juntas. Assim, da primeira série do ensino fundamental I até o ensino médio, tive ajuda da minha irmã ouvinte na escola. Nós não usávamos a Libras, não conhecíamos a língua. Eu fazia leitura labial do que minha irmã falava. Após terminar o ensino médio, ingressei na faculdade, no curso de graduação em Sistema da Informação, na área de computação, um curso com duração de 4 anos. E assim como na escola, era um ambiente onde só existiam pessoas ouvintes, eu era a única surda e não tinha intérprete de Libras. Algum tempo depois, comecei a trabalhar na UnP e só comecei a ter contato com surdos e aprender Libras com 25 anos de idade. Passado um tempo, fiz um curso de especialização em Libras, com duração de um ano e meio. Ao terminar esse curso. Ingressei como aluna no curso de graduação em Letras-Libras, da UFRN, com duração de 4 anos. Com tudo o que passei até aqui, posso afirmar que conhecer a Libras foi um verdadeiro divisor de água no meu desenvolvimento pessoal e profissional. Através dessa língua consigo perceber o mundo e me expressar através dela. Me sinto mais confortável sinalizando do que falando, embora ainda uso a oralização como recurso em alguns contextos, como o familiar, já que são todos ouvintes não usuários de Libras. É isso.
Fonte: dados da pesquisaTendo em vista a resposta dada ao questionamento, podemos dizer que a trajetória pessoal educacional de PS1 não possibilitou de maneira inclusiva que o desempenho acadêmico, como sujeito Surdo, fosse satisfatória, visto que PS1 não teve acesso a uma escola bilíngue nem a modelos de “ser professor” que possibilitasse esse acesso. Como PS1 conta, ela estudou em uma “escola inclusiva” que “não era tão inclusiva assim”, ou seja, a comunicação que havia entre PS1 e Outros era apenas com a sua irmã, visto que realizava a leitura labial. PS1 explica que não utiliza a Libras, nem ao menos se conhecia essa língua. Dessa forma, não havia comunicação sendo desenvolvida, nem relações sociais sendo estabelecidas entre Outros, senão com sua irmã, ou seja, havia sempre um discurso homofônico (ROMAN, 1992) sendo produzido, com apenas uma entonação, uma melodia, a percepção de mundo delimitada. Dessa forma, o corpo polifônico e grotesco (BAKHTIN, 2010) de PS1 era percebido apenas por sua irmã e o uso da Libras como língua não era nem previsível para PS1, considerando as diferenças que possuía em relação às suas vivências puramente com Ouvintes.
Lacerda (2013) afirma que, após o Decreto Nº 5.626/2005, projetos vêm sendo construídos a fim de possibilitar, de fato, a inclusão na sala de aula desde os primeiros anos educacionais. Entre esses projetos, há ações como: aluno Surdo em sala de aula comum com a presença do intérprete de Libras; instrutor Surdo e sala de AEE em sala de recursos multifuncionais; escolas bilíngues que atendem somente Surdos; e escolas comuns que possibilitam as perspectivas da educação bilíngue.
Vale ressaltar que, antes mesmo do Decreto Nº 5.626/2005 e da Lei N° 10.436/2002 (Lei da Libras), já se tinha conhecimento sobre a Libras no Brasil. No entanto, as atitudes e a implementação de políticas linguísticas que favorecessem acesso educacional à Libras estão sendo efetivadas tardiamente. Dessa forma, pelo grau de escolaridade de PS1, a falta de políticas linguísticas ao seu tempo de formação inicial foi desfavorável para o desenvolvimento da Libras como L1 ou L2.
Assim, o bilinguismo como prática social e as identidades performadas desse sujeito passam a ser deixadas à parte em sua educação inicial e média, o que pode interferir significativamente nas visões de mundo que esse sujeito construiu no decorrer de sua vida (QUADROS, 2019). Lacerda (2013, p. 67) afirma que “O número de alunos Surdos matriculados em classes de ouvintes nas escolas regulares é crescente (MELETTI; BUENO, 2010), e nelas tais alunos são chamados “surdos incluídos”, como é o caso de PS1, participante desta pesquisa, que em escola de Ouvintes era única Surda e fazia leitura labial para entender o Português falado, mas não tinha possibilidade de contato algum com a Libras, ou com atendimento especializado. Essa situação corrobora o que discute Souza (1998 apud FERNANDES, 2003), que elenca os motivos para que o bilinguismo não ocorra de forma plena[5].
Podemos perceber, pelo cotejamento de dados, indícios que demonstram PS1, em grande parte de sua vida, sendo “Surda incluída”, pelas suas respostas ao questionário em Língua Portuguesa, exceto quando enviamos perguntas de cunho pessoal. Dessa forma, percebemos que a atuação de PS1 nas duas línguas se difere, nesse caso, provavelmente pela apropriação tardia que PS1 teve da Libras. Ademais, PS1 teve aquisição tardia da Libras, apenas depois da graduação em Sistema da Informação (curso de 4 anos sem intérprete) como aponta no Quadro 21.

Algum tempo depois, comecei a trabalhar na UnP e só comecei a ter contato com surdos e aprender Libras com 25 anos de idade.
Fonte: dados da pesquisaTendo em vista que essa formação superior se deu toda em Língua Portuguesa e que PS1 teve de realizar leitura labial em todas as aulas e se esforçar mais do que os alunos ouvintes, percebemos que os direitos linguísticos do sujeito Surdo ainda não estavam plenamente em vigor, ou ainda não estavam sendo implementados de fato pelas instituições em que PS1 estudava.
Apesar disso, podemos perceber que o espaço de participação social de PS1 foi ampliado e vemos as orientações polifônicas adentrando seus discursos e seu corpo, visto que suas vivências foram ganhando outras percepções, seu convívio social deixa de ser só sua irmã e passa a ser outras pessoas em um curso de graduação. Com isso, outros corpos passam a fazer parte das experiências linguísticas de PS1, e elas passam a experienciar a língua e a utilização corporal para se comunicar (pudemos perceber sua proficiência e relação direta com a Libras nas aulas gravadas que ela disponibilizou). Dessa forma, ainda que PS1 pratique a oralização, suas relações dialógicas vão se tornando polifônicas (BAKHTIN, 2018), assim como seu corpo grotesco (BAKHTIN, 2010) dentro de seu espaço de vivências.
Percebemos, então, que foi a partir do contato com Surdos com o trabalho na instituição UnP que PS1 passa a ter contato com a Libras e com outros Surdos alfabetizados (PS1 não menciona se, anteriormente, já tinha tido contato com Surdos), o que pode ter influenciado, sobremaneira, seus modos de ser professora Surda atualmente, fazendo uma prática diferente das que outrora viveu.
Identificamos, assim, traços polifônicos no que diz respeito à trajetória de vida pessoal de PS1. Esses traços que emergem nesse primeiro momento são vozes ideológicas que ecoaram em um discurso não monológico, que corporificaram uma verdade dialógica (MORSON; EMERSON, 2008). Nesse cenário, apesar de os discursos das políticas educacionais regulamentarem o acesso da pessoa Surda a ambientes sociais tendo acessibilidade comunicativa, a prática é bem diferenciada. Trata-se de uma voz dissonante que, embora ecoe muito alto, não mudou a voz, nem o corpo de PS1, que resistiu e enfrentou as dificuldades em sua formação. Ou seja, sua trajetória não foi delimitada por atores que costumam moldar vidas e histórias (com políticas não democráticas) no decorrer dos anos e fazer essas histórias monológicas, acabadas e dependentes. A voz/sinalização de PS1, construída e desenvolvida somente a partir dos seus 25 anos, não foi paralisada pela imposição de uma maioria ouvinte, ou seja, sua identidade e cultura foram performadas (LANE, 1992; LADD, 2013). A voz de PS1 transpôs essas barreiras e se tornou independente e inconclusa (FABRÍCIO, 2017).
Ao chegar à UNP, com a contemplação de outras vozes como a sua, modos de comunicar parecidos e mais confortáveis, outros corpos grotescos e polifônicos, PS1 entra em um grande diálogo, que já havia sido estabelecido por outros Sujeitos Surdos, mas até então era desconhecido por PS1. Esse grande diálogo implica um discurso não monológico, ou seja, dialógico em essência e nem sempre concordante em si, mas repleto de novas possibilidades e ideologias diferentes, outros olhares e percepções para o mundo de PS1, outro modo de comunicar. Um como autor e outro (PS1) como herói que possui consciência própria.
Esse encontro entre pares possibilitou que PS1 continuasse com sua formação, apesar da falsa “inclusão” que perpetuou durante 25 anos de sua vida e propôs o apagamento de seu corpo, de sua língua. Tendo em vista um olhar mais abrangente, percebemos que, mesmo que as políticas públicas já tenham sido instituídas há mais de 10 anos, ainda temos muitos déficits em relação ao atendimento em Libras, dessa forma, muitas instituições, privadas e públicas, não dispõem de tradutor/intérprete de Libras. Além disso, muitos Surdos matriculados em escolas regulares não possuem contato direto com Outros Surdos ou com Atendimento Especializado de qualidade, tanto no quadro público quanto no privado. As vozes e os corpos grotescos (BAKHTIN, 2010) que fazem parte desse grande diálogo, muitas vezes, são desconhecidos e apagados por quem teria o poder de participar. Por isso, em sua maioria, não ganham cunho dialógico e polifônico (BAKHTIN, 2018), tornam-se corpos de fronteiras, tidos como os que fogem do que é tradicional (ESCOSTEGUY, 2010). Sobre as experiências de PS1, ela acrescenta o que apresentamos no Quadro 22.

Com tudo o que passei até aqui, posso afirmar que conhecer a Libras foi um verdadeiro divisor de água no meu desenvolvimento pessoal e profissional. Através dessa língua consigo perceber o mundo e me expressar através dela. Me sinto mais confortável sinalizando do que falando, embora ainda uso a oralização como recurso em alguns contextos, como o familiar, já que são todos ouvintes não usuários de Libras. É isso.
Fonte: dados da pesquisaFazendo-se perceber discursos que emergem desse excerto, podemos afirmar que, embora PS1 tenha passado parte da vida (até os 25 anos) sem conhecer a Libras, ao manter contato com seus pares, ela estabeleceu afirmações culturais e sociais que outrora não tinha. Dessa forma, o ser Surdo, utilizar a Libras como língua principal e se sentir mais confortável com essa utilização é o que faz com que as perspectivas outrora já fixadas sobre a linguagem sejam modificadas. Nesse caso, a relação contínua com a Língua Portuguesa pôde ser alterada pela comunicação majoritária em Libras. Por conseguinte, a oralização passa a ser utilizada em momentos específicos, como em família em que todos são Ouvintes, mas, inferimos que a Libras começa a mudar não só a forma linguística de comunicação mas também aspectos sociais e identitários do sujeito.
PS1, portanto, torna-se autora de seu próprio fazer linguístico, desempenhando dois papéis que outrora seriam díspares e agora fazem parte do grande diálogo interior desse Sujeito. Esses corpos da linguagem, grotescos (BAKHTIN, 2010), que são modificados quanto a suas formas de linguagem, passam a ser polifônicos (BAKHTIN, 2018) a partir de Outros corpos que se vinculam e o transformam. Essa relação é muito intensa, visto que, em um período da vida, PS1 faz uso da oralização para conseguir a comunicação e esse meio possibilitou a comunicação entre Surdo-Ouvinte, mesmo com mais dificuldades. Atualmente, a Libras marca outra realidade vivida por PS1. Dessa forma, ela experiencia Outras identidades e Outras Culturas, como ela afirma no Quadro 23.

Através dessa língua consigo perceber o mundo e me expressar através dela.
Fonte: dados da pesquisaOu seja, PS1 começa a ter poder de criação, de interação, de conhecimento muito maior do que quando utilizava a oralização, mas de forma nenhuma deixa de trazer significados à oralização, pois fez/faz parte da comunicação em seu seio familiar que é ouvinte. Com isso, ela equipara essas duas vozes internas que fazem parte de si, mas de forma dialógica, ativa, responsiva e responsável em seu ato discursivo (BAKHTIN, 2018).
Quanto ao PS2, não obtivemos respostas claras sobre esse percurso de vida desde os primeiros contatos com a Libras até os dias atuais. Entendemos, então, que PS2 ou não quis comentar sobre sua trajetória pessoal, ou não propomos a questão de maneira compreensível para ele[6]. Já no que tange às questões metodológicas de ensino, PS2 afirma o que está posto no Quadro 24.

A respeito do perfil dos meus alunos, leciono tanto para pessoas surdas como ouvintes também. Na minha disciplina, quando tratamos sobre a produção de material didático para ensino de Libras na educação básica ou no ensino superior, geralmente divido a turma em grupos e faço todo um trabalho de orientação acadêmica com o objetivo de motivar a criatividade dos alunos, para que eles elaborem estratégias de como desenvolver e utilizar determinado material didático de acordo com o perfil de seus alunos (sejam eles crianças, jovens ou adultos). A escrita de sinais, por exemplo, como utilizar isso na elaboração de um material didático para crianças?! Depois das orientações, os grupos apresentam o que elaboraram para a turma.
Fonte: dados da pesquisaCom base nesse excerto, identificamos que esse professor se mostra mais aberto às questões metodológicas do que a suas experiências pessoais acadêmicas. PS2 traz relações polifônicas em sua prática pedagógica e, consequentemente, em seu discurso, visto que promove a criatividade e vozes dos alunos sendo eles Surdos ou Ouvintes. Ele rege esse coro de vozes do alunado de forma a considerar e significar as vozes desse processo acadêmico. Na prática, ele não coloca sua voz na condição de superior e soberana sobre os alunos, mas entende que sua prática pedagógica só pode ser bem-sucedida se perceber as vozes do alunado, se conseguir incentivá-los a pensar de forma independente e única, diferenciando-se entre si.
Ademais, PS2, com o uso de softwares como o SingWriting (disponibilizado na Figura 16, em Qr Code), possibilita que a prática sobre o assunto seja dinâmica, corporal (mesmo remotamente) e realizada por cada aluno conforme seu interesse. Isso traz uma referência de pessoalidade para a sala de aula, assim como de subjetividade. Apesar disso, percebe-se que, ao possibilitar essa independência, PS2 atinge seus objetivos de ensino-aprendizagem, o que a torna polifônica.

Na polifonia, a equipolência de vozes é o que se destaca. Nesse processo, compreendemos que todo discurso é dialógico, segundo Bakhtin (2013), mas nem todo discurso, nem toda prática pedagógica poderá ser polifônica. Ainda sobre esse tema, destacamos a voz de PS2 no Quadro 25.

faço todo um trabalho de orientação acadêmica com o objetivo de motivar a criatividade dos alunos, para que eles elaborem estratégias de como desenvolver e utilizar determinado material didático de acordo com o perfil de seus alunos (sejam eles crianças, jovens ou adultos).
Fonte: dados da pesquisaPS2 não impõe a sua voz como sendo majoritária, apesar de ser autor de sua aula, ele torna as vozes dos seus alunos equiparadas e não há resistências de sua parte em deixar os alunos “criarem” e “elaborarem estratégias” para desenvolverem sua própria prática pedagógica de escrita de sinais ou de outros assuntos possíveis, ou seja, há espaço para a liberdade e responsabilidade enunciativa. Essa liberdade discursiva só pode ser dada pela compreensão de que as identidades são fluidas (BAUMAN, 2001), as culturas são diferentes (PERLIN; REIS, 2012) e por meio das orientações polifônicas, dos traços polifônicos existentes nessa prática e desse discurso surgem fontes múltiplas de informação.
A não monologização discursiva, ou seja, as indomáveis ideologias que analisam toda a prática discursiva e pedagógica, evidenciando outras verdades, é essencial para percebermos os traços polifônicos mais explicitamente. A disponibilização de materiais para uso dos alunos (como o Software disponibilizado no Qr code da Figura 16 e o E-book disponibilizado em Qr Code na Figura 17) serve de aporte teórico e prático e sinaliza para uma orientação polifônica existente na prática docente, o que une várias práticas e experiências, várias vozes para compor um arranjo final.

No E-book, o conteúdo proposto para a escrita de Sinais é de cunho mais teórico; já no caso do Software, isso se torna mais prático, mas, ambos devem ser direcionados pelo professor e executados de forma individual. PS2 também comentou a respeito das interações que realiza em sala de aula, como explicitado no Quadro 26.

Durante as atividades em grupo propostas em sala, sempre estou presente para orientá-los. Às vezes eu procuro o grupo para saber se estão conseguindo desenvolver a atividade. Ou algum aluno do grupo me procura em particular para tirar dúvidas. No momento das apresentações de trabalhos ou nas aulas expositivas, sempre abrimos para discussão. Geralmente faço perguntas como: “Qual a opinião de vocês a respeito disso? Acham que está correto ou não concordam? ” E a turma toda interage, trazendo sua contribuição a respeito do tema que está sendo abordado.
Fonte: dados da pesquisaCom base no discurso de PS2, suas vivências didático-pedagógicas demonstram ser interativas e dinâmicas não só para os alunos como também para ele. O que PS2 revela é que constantemente faz perguntas como: “Qual a opinião de vocês a respeito disso? Acham que está correto ou não concordam?” Essas vozes que PS2 busca são as vozes de Outros, os quais ele vê como escravos sem voz (BAKHTIN, 2018), mas como sujeitos livres para o discurso, mesmo que não sejam concordantes com a voz do autor/professor, indo para um mesmo objetivo de ensino-aprendizagem. Isso pressupõe que o docente mantém seu olhar atento para as necessidades de cada aluno, percebendo, portanto, a significação de vozes e as relações ideológicas e identitárias de cada sujeito (HALL, 1997; BAKHTIN, 2013).
Nesse espaço, vale ressaltar que o PS2 não sabe ao certo o que o aluno vai apontar, podendo o discurso ser discordante de metodologias, atividades e conteúdos. Mesmo assim, PS2 abre espaço para essas vozes serem ativas e até possibilitarem a modificação de suas metodologias, como já visto anteriormente.
Morson e Emerson (2008, p. 256) trazem uma análise da obra Para uma Reelaboração do Livro sobre Dostoiévski, em que Bakhtin apresenta um pensamento judaico-cristão para o discurso polifônico a partir do discurso de Jó, que mesmo tendo sido criado por Deus, discute com o Autor em vários momentos, questiona-o, discorda dele e às vezes concorda, mas em nenhum momento é acabado e restringido por quem o criou. Nesse cenário, encontramos o que Bakhtin chama de consciência viva, autônoma, de alguém. É semelhante ao que o professor faz em sala de aula quando emite a pergunta: “Qual é a opinião de vocês?”, “Vocês concordam ou discordam desse posicionamento?”, e, assim, abre um leque de possíveis respostas incontroláveis e plurais.
Partindo para outro ponto de nossa análise, após os questionários ser enviados e as respostas adquiridas, analisamos os dados (GINZBURG, 1989) e no cotejamento do Grupo de Estudos dos Gêneros do Discurso (GEGe) de 2009, percebemos que PS1 deixou questões sobre documentos institucionais e aspectos inclusivos da UFRN em aberto e não quis se pronunciar em relação a isso. PS1 afirmou que teria entrado no quadro de docentes permanentes recentemente (em período pandêmico) e pouco conhecia sobre isso. Por isso, preferiu manter o silêncio. Já o PS2 relatou que considera, por exemplo, o Projeto Político-Pedagógico (PPC, 2013), que ele chama de “antigo”, pouco condizente com a realidade. Nesse sentido, PS2 produz seus materiais didáticos com base em sua experiência de formação e do tempo que tem como docente de ensino superior, sempre precisando adaptar teoria para suas experiências.
Nessa perspectiva e tendo como base metade dos professores Surdos que fazem o curso de Letras Libras Língua Portuguesa, percebemos um apagamento do professor Surdo na UFRN que espelha o apagamento na vida estudantil e social que perdura desde os primeiros anos. Apesar das práticas de acessibilidade desenvolvidas pela UFRN, por exemplo, laboratórios audiovisuais, intérpretes de Libras, é preciso considerar a existência desses sujeitos em espaços como os da pós-graduação, existindo, portanto, a reserva de vagas destinadas a esse público. Sugerimos, ainda que, para os que já estão na UFRN, no quadro efetivo ou substituto, pudessem existir treinamentos que visassem à adequação das práticas pedagógicas para uma metodologia mais visual, que considerasse esses sujeitos, suas comunidades, identidades e culturas; assim como se fizessem notórias as vozes desses professores Surdos, abordando como gostariam de aprender/ensinar sobre a Libras em conjunto com docentes ouvintes que irão receber alunos Surdos e formar professores Surdos.
Consideramos que o fazer didático na Universidade não poderia ser baseado apenas no avanço teórico, desconsiderando as práticas experienciadas de cada professor, as vivências docentes e experiências de vida que cada professor Surdo carrega consigo. Nesse caso, valorar apenas a produção teórica torna a universidade um espaço não convencional para as realidades diversas que existem e, de certa forma, faz o ambiente doentio para os sujeitos que exercem o fazer docente dentro dela. A teoria, que não é associada à prática, não é fundamental para o crescimento pessoal e social, visto que precisa ser vivenciada nas práticas sociais, ser experiência vivida e ser utilizada no cotidiano. Foi o que percebemos na segunda categoria.
Poderíamos, como em muitas análises realizadas, confundir o dialogismo com a polifonia, com contexto, intertextualidade. No entanto, nessa análise, nossa pretensão se estende em analisar apenas os aspectos polifônicos do corpus e o que ele tem a dizer sobre a realidade percebida em materiais didáticos, e na atuação de professores Surdos do curso de Letras Libras da UFRN.
Voltando a PS1, elencamos aspectos que dizem respeito a duas aulas gravadas na plataforma Zoom que trazem os aspectos polifônicos em voga para nossa análise. Nessa categoria, já analisamos questões percebidas com base no questionário elaborado, a seguir, analisaremos, estritamente, as aulas gravadas. O Quadro 27 mostra um recorte de uma dessas aulas.

PS1: Agora, vejam as palavras ESTACIONAMENTO e INFELIZMENTE. Vocês acham que elas derivam de alguma outra?
(PS1 repete a pergunta para motivar os alunos a responder. 18:25)
ALUNO2: a palavra ESTACIONAMENTO não tenho certeza se é ou não derivada. Mas INFELIZMENTE, acho que sim.
PS1: Ok. Mais alguém? Se houver mais alguém que deseje responder pode levantar o ícone de mãozinha que é mais fácil de localizar. Mais alguém gostaria de complementar a fala da colega? (A partir da minutagem 19:20 até o 20:00 a professora fica mudando as telas para encontrar algum aluno que esteja com a mão levantada)
ALUNO 5: eu acho que a palavra INFELIZMENTE é derivada. Mas o sinal de INFELIZMENTE não é.
PS1: a palavra ESTACIONAMENTO (a professora sinaliza 20:27) é derivacional ou não? (Professora repete a pergunta, 20:35)
ALUNO 5: não sei, respondi sobre a segunda palavra, a primeira não sei.
PS1: OK, alguém mais? ALUNO 1?
ALUNO 1: eu não levantei a mão, acho que foi outra pessoa.
PS1: melhor usarem o ícone da mãozinha virtual, facilita a visualização de quem quer participar da aula.
ALUNO 1: eu acho que a primeira palavra não é derivada. Eu acho, né?!
PS1: ok. Aluno 2?
ALUNO 1: as duas palavras são derivadas de outras.
PS1: (assente que sim com a cabeça) mais alguém?
ALUNO 6: Flexional ou derivacional? (... olha para cima como se estivesse refletindo sobre o que irá falar) acho que as duas são derivacionais.
PS1: Vi aqui no chat que a colega ALUNA 7 colocou que ESTACIONAMENTO deriva do verbo ESTACIONAR. Isso mesmo, notaram? Vi que a maioria identificou que a segunda palavra era derivacional, mas a primeira também é. Veja o verbo ESTACIONAR (22:39) como ficaria numa frase sinalizada? (PS1 sinaliza “Eu vou estacionar” 22:44m) Entenderam, significa a ação de colocar um veículo em algum lugar. E ESTACIONAMENTO, usamos a mesma configuração de mão para sinalizar um local onde se guarda muitos carros.
Palavras e sinais derivacionais podem formar novos significados e novos sinais/palavras e podem derivar de verbos, nomes, substantivos… então essas duas palavras postas no slide, são derivacionais.
Vejam a palavra ESTACIONAMENTO no slide: em vermelho está a palavra que já existe ESTACIONA que pertence a um grupo gramatical. Com o sufixo MENTO ela muda de significado e também de classe gramatical, formando uma nova palavra, um novo sinal, ESTACIONAMENTO, entendem?
Vejam agora a palavra INFELIZMENTE. Diferente da palavra ESTACIONAMENTO, essa possui prefixo e sufixo: IN prefixo que expressa a ideia de negação e MENTE sufixo. O que forma a palavra INFELIZMENTE. A partícula FELIZ chamamos de radical, pois trata-se da palavra já existe da qual deriva INFELIZMENTE.
Então prefixo e sufixo (PS1 faz o sinal dessas duas palavras 26:15), vejam prefixo IN, no início da palavra. Sufixo MENTE, no final da palavra…
Fonte: dados da pesquisaNesse excerto de aula, temos uma pequena noção de como se dá a orientação metodológica da PS1, visto que não se fala apenas sobre os alunos ou sobre o conteúdo expositivo, mas “com” os alunos, de forma que eles se sentem livres e aptos para responderem às questões. Isso reflete muito a visão sobre identidades e culturas heterogêneas (CANCLINI, 1995; HALL, 1997). O ponto analisado nesse quesito não é se o aluno acertará ou não a questão, afinal, em sala de aula, estão construindo saberes, mas o ponto crucial é identificar essa relação estabelecida no ambiente de sala de aula, onde o professor passa a ser um agente que educa de forma polifônica (BAKHTIN, 2018), trazendo valores e opiniões dos alunos como válidas para dentro de sala de aula. Mesmo que se trate de estrutura da língua, torna-se importante que o professor saiba o que esses alunos já conhecem e dominam e o que eles ainda não sabem sobre o assunto a ser ministrado, tendo em vista que, em sua turma, pode haver alunos bilíngues desde a primeira infância e alunos que passaram a utilizar a Libras mais tardiamente, como a própria docente. Isso mostra o reflexo de suas próprias experiências trazidas para sala de aula para que haja um processo mais adequado de ensino-aprendizagem.
Dessa forma, considerar as relações ideológicas, culturais e identitárias (CANCLINI, 1995; HALL, 1997; BAKHTIN, 2013) de seus alunos, sendo eles Surdos ou Ouvintes, é perceber suas particularidades e entender que todos podem participar das discussões e perceber o processo de ensino-aprendizagem de maneira mais eficiente juntos. Para ilustrar, trazemos um exemplo (Qr Code na Figura 18) de como a docente (PS1) organiza as discussões efetuadas em sala de aula. Na página 20, a docente faz o questionamento “A variação fonológica existe?”. Em seguida, ela mostra alguns nomes de sinais que podem incitar a curiosidade nos alunos.

Como a Libras é uma língua gesto-visual, podem-se comprovar as variações fonológicas a partir da prática da língua nos sinais indicados pela professora no ppt. Dessa forma, a pergunta inicial pode ser respondida pelos alunos de acordo com sua experiência de mundo e, a partir disso, comprovada ou não pelos exemplos sinalizados.
Depois disso, há a observação da professora em “Evitar o preconceito linguístico” que parte das variações fonológicas. Assim, ao desenvolver sua aula, PS1 pensa nas possíveis perguntas que podem surgir, nos possíveis sinais para a mesma palavra que os alunos podem trazer e faz essa observação. Ou seja, as aulas de PS1 possibilitam que as vozes dos alunos sejam ouvidas dentro de sala de aula, dialogando com sua prática docente. Isso abre possibilidades de práticas de ensino-aprendizagem em que o aluno tenha acesso ao discurso, não sendo esse homofônico, mas particular, não finalizável, eventivo e contendo possibilidades múltiplas e não previsíveis (BAKHTIN, 2018), evidenciando as vozes que outrora estavam na fronteira (PENNYCOOK, 2018) para o discurso de sala de aula, tornando possível o discurso entre pares (ou não) de forma transgressiva e (in) disciplinar (FABRICIO, 2018).
Essa análise do que eles já dominam e do que eles ainda não dominam só pode ser dada a partir de perguntas que desafiem os alunos, que os instiguem a responder, mesmo que de forma inadequada, naquele momento. A polifonia trata da equipolência de vozes que conversam entre si, tomam partido e formam um discurso que conduz a verdades.

PS1: Agora, vejam as palavras ESTACIONAMENTO e INFELIZMENTE. Vocês acham que elas derivam de alguma outra?
Fonte: dados da pesquisaA partir dessa indagação “Vocês acham que elas derivam de alguma outra?” realizada pela professora, compreendemos a inclusão da opinião dos alunos, não centralizando falas e teorias em si, mas implicitamente remetendo ao conhecimento que eles já possuem da língua como necessário e importante. Considera-se, portanto, por essa abordagem, a independência e a equipolência de vozes dos alunos, que respondem e corroboram as aulas tanto de PS1 quanto de PS2. Os alunos e professores não se sujeitam ao acabamento, pelo contrário, eles se transformam e se performam, tornando-se únicos, responsivos e inacabados. A prática docente de cada um é diferenciada pelos métodos utilizados, pelos materiais disponibilizados e pelas relações que estabelecem com o alunado, sendo, sobretudo, práticas polifônicas, que não permitem centralizar o conhecimento, tampouco estagná-lo apenas em si, mas reverberam Outras vozes, as vozes dos alunos, de Outros docentes, de Outras práticas assertivas, da Universidade em si. Essas vozes em equipolência formam e performam professores Surdos, potentes na arte de ensinar.
O apagamento dos universos individuais, ou seja, do indivíduo como um, é característico do que é monológico, nesse caso, este tem apenas uma verdade imposta e acabada, não abrindo possibilidades para discussões. Ao analisar os romances de Dostoiévski (BAKHTIN, 2018), os materiais didáticos, as respostas e metodologias identificadas nesta pesquisa, defendemos o caráter dialógico e polifônico que possuem.
Esses traços polifônicos estão na história de vida pessoal de cada professor, nos seus materiais didáticos e em suas aulas. O caráter polifônico de uma prática de ensino-aprendizagem passa a ser valorado pelo aluno e pelo professor, bem como perpassa a Universidade e age na vida social de cada um que participa de momentos polifônicos, que possui abertura para tornar sua voz dizível e presente até nos discursos mais complexos. As relações interpessoais, identitárias e culturais que formam e performam esses sujeitos de pesquisa são o que torna os seus discursos e práticas valoradas, significativas e transgressivas. Professor como autor, alunos como heróis, sala de aula, práticas docentes e discentes, materiais produzidos e utilizados por esses docentes apontam para traços polifônicos.
CONSIDERAÇÕES INACABADAS
Com esta breve análise utilizando a teoria do Círculo de Bakhtin, encontramos aporte teórico para analisar os atos linguísticos polifônicos na LIBRAS, visto que realizamos um percurso teórico discursivo. Assim, podemos compreender que, conforme cita Wrigley (1996, p. 13), “contrário ao modo como muitos definem a surdez [...] pessoas surdas definem-se em termos culturais e linguísticos”. Ou seja, enquanto falantes da Libras (aqui incluímos surdos e ouvintes), consideramos a Libras como essencial para o desenvolvimento cultural e identitário das comunidades falantes.
Então, propomos que há traços polifônicos nesse material didático de Libras que analisamos visto as especificidades e unicidades de cada sujeito falante que sempre imprime seu posicionamento no ato discursivo, seja retomando outro discurso, seja citando direta ou indiretamente outras vozes, são equipotentes.
Assim, sempre haverá valoração discursiva do falante e essa valoração é única, tal como o enunciado. No entanto, todo enunciado e toda ideologia posta no enunciado retoma vozes outras equipotentes entre si e por isso “quanto a mim, em tudo ouço vozes” (BAKHTIN, 2019, p. 78). Mesmo que seja em uma língua gesto-visual, as vozes ideológicas e valoradas, únicas, que permeiam o discurso, são audíveis. Portanto, enfatizamos que a Libras é dialógica e polifônica, assim como as línguas orais também são, pois todo discurso é realizado por enunciados únicos, irrepetíveis, assim como por uma significação sígnica única, valorada e ideologizada por cada sujeito. No material didático da aula de Libras, conseguimos enxergar essa orientação polifônica do ato de dizer, de lecionar, de emitir e ouvir vozes.
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ANEXO
Questionário
Caro professor, este questionário faz parte de uma pesquisa realizada por uma aluna (Hadassa Freire Gomes Rodrigues) do mestrado do PPgEL sob orientação da professora Maria da Penha Casado Alves. Por meio dele, objetivamos compreender sua opinião sobre alguns aspectos do curso de Letras Libras Língua Portuguesa da UFRN, assim como compreender alguns aspectos relevantes do ser docente neste curso, especificamente. Diante disso, contamos com sua colaboração para responder aos questionamentos a seguir.
Desde já, agradecemos sua participação!
1- O que você, enquanto professor Surdo do curso de Letras Libras/ Língua Portuguesa, compreende sobre as estratégias de ensino utilizadas e recomendadas pelo curso? Você acredita que há estratégias que suprem as expectativas de ensino-aprendizagem seja de surdos ou ouvintes? Descreva os pontos em que concorda com essas estratégias e os que não concorda.
2- Em alguns pontos, os documentos institucionais que regem o curso fazem menção ao termo “identidade” e “deficiência auditiva” entre outros termos da mesma natureza. Você se sente representado por esses documentos? e de que forma ele contribui para sua prática enquanto professor? ou não contribui?
3- Em sua opinião, quais estratégias a UFRN dispõe para incluir alunos e professores surdos?
4- O PPC traz alguns aparatos tecnológicos a fim de facilitar o ensino-aprendizagem de surdos (p.93), você faz uso desses aparatos? Se sim, explique quais e como se faz uso.
5- Você acredita que as soluções inclusivas que são trazidas pelos documentos institucionais traz são válidas para os dias atuais? Explique.
6- Sobre sua prática pedagógica, responda:
Qual é sua relação com o alunado?
0. Suas aulas são expositivas ou os alunos se sentem à vontade para colaborar? se colaboram, explique como.
0. Em seu material didático, você sempre abrange questões culturais e identitárias do sujeito surdo? Se sim, conte-me como você faz isso e quais temáticas são mais abordadas e como os alunos reagem a essas temáticas.
0. Em suas aulas, os alunos trazem experiências vividas em outros momentos? E você, leva suas experiências pessoais para sala de aula? Conte-me um pouco sobre alguma experiência que você levou para sala de aula e os alunos discursaram sobre.
0. Você sempre planeja a aula a fim de abrir espaço para fala dos alunos?
0. Você se sente incomodado se um aluno discorda de seus posicionamentos?
0. O que você entende sobre linguagem?
0. Você acredita que suas aulas, em período pandêmico, saíram como planejadas? Explique como se desenvolveu seu fazer docente nesse período.
7- Explique suas principais dificuldades e o que considera como facilidades em relação ao Ensino Superior.
8- Relate de forma escrita ou em vídeo Libras sua história até a UFRN, faça um breve relato de como foi seu caminho até ser professor da UFRN.
Notas
“a) a ausência de uma política lingüística oficial e séria de preservação da Libras, que contribua para a consolidação de seu status lingüístico e valorização nacional; b) as fortes pressões exercidas sobre os surdos para o domínio do português que, por efeito adverso, poderá ser o estopim desencadeador de movimentos segregacionistas, pelo encurralamento ideológico e lingüístico a que estão sendo submetidos; c) a necessidade de ações articuladas entre as organizações governamentais, não-governamentais, partidos políticos e comunidade em geral, para que a oficialização da Libras, em nível nacional, não seja apenas mais uma lei sem qualquer efeito prático transformador; d) a falta de uma política lingüística dentro da escola que atribua à Libras a qualidade de língua principal para o ensino - o que requereria, professores surdos e ouvintes fluentes em Libras; e) uma revisão curricular que contemplasse temas da área de Estudos Surdos, contribuindo para a constituição de identidades surdas mais sólidas e uma discussão político-ideológica da surdez; f) por força da política nacional da inclusão, alunos surdos tendo que concluir seus estudos em escolas monolíngües (nas quais todo o ensino é oferecido em língua portuguesa), sem a presença de intérpretes e sem ajustes necessários que levem em consideração a singularidade lingüística do aluno e cidadão surdo; g) a confinação da Libras a limitados espaços sociais, como associações de surdos, contribuindo para seu desconhecimento pela sociedade” (SOUZA, 1998 apud FERNANDES, 2003, p. 47).