Resumo: Este artigo apresenta uma pesquisa realizada com cinco professoras alfabetizadoras da Rede Municipal de Ensino de Araucária/PR, com mais de dezoito anos de docência, desenvolvida, em sua maioria, nas classes de alfabetização do mesmo município. Nesse contexto, há a possibilidade de uma análise dialógico-responsiva de investigação dos processos de formação continuada ofertados pela Secretaria Municipal de Educação de Araucária (SMED), dos quais as professoras têm participado no decorrer de sua carreira docente. Propõe-se, pela pesquisa qualitativa, utilizar procedimentos metodológicos de Entrevista e Roda de conversa para situar e identificar as compreensões das professoras sobre a formação continuada, ressaltando, na verbalização de suas concepções e experiências, o desenvolvimento das práticas de alfabetização a partir dessa formação. Para as análises dos discursos das professoras, foram considerados os conceitos de dialogismo, enunciação e responsividade de Bakhtin (2006, 2011), buscando aproximações às teorizações de Shulman (1986, 1987), Nóvoa (1998, 2007), Kramer (2010, 2013) e Maldonado (2002), dialógicos e responsivos sobre os estilos e as práticas pedagógicas desenvolvidas, os quais decorrem da formação continuada vivida pelas alfabetizadoras.
Palavras-chave: Professoras alfabetizadorasProfessoras alfabetizadoras,Formação ContinuadaFormação Continuada,Dialogicidade e responsividadeDialogicidade e responsividade.
Abstract: This paper presents a research conducted with five literacy teachers of the Municipal Education Network of Araucária/Paraná (Brazil), with over eighteen years of teaching, mostly developed in literacy classes in the same municipality. In this context, there is the possibility of a responsive-dialogical analysis of investigation of the continuing education processes offered by the Municipal Education Department of Araucária, of which the teachers have participated during their teaching career. We propose, through a qualitative research, to use methodological procedures of interview and conversation circles to locate and identify the understandings of teachers on continuing education, emphasizing, in their conception and experience verbalization, the development of literacy practices from such training. For the analysis of the teachers' discourses, we considered the concepts of dialogism, enunciation and responsiveness of Bakhtin (1997), seeking approaches to the theories of Shulman (1987), Nóvoa (1998, 2007), Kramer (2010, 2013) and Maldonado (2002), in order to analyze the dialogical and responsive discourses about the styles and pedagogical practices, which arise from the continuing education of these literacy teachers.
Keywords: Literacy teachers, Continuing Education, Dialogicity and responsiveness.
Resumen: En este artículo se presenta un estudio con cinco maestros de alfabetización de La Red Municipal de Araucária/PR con más de dieciocho años de docencia, que se desarrolló sobre todo en las clases de alfabetización en el mismo municipio. En este contexto, existe la posibilidad de un análisis, dialógica-responsiva de los procesos de educación continua ofrecidos por el SMED (Departamento Municipal de Educación de Araucária), en los que los maestros han participado en el transcurso de su carrera docente. Se propone una investigación cualitativa, utilizando procedimientos metodológicos, entrevista y rueda de conversación, para situar e identificar las concepciones de los maestros sobre la educación continua, enfatizando verbalizar sus ideas y experiencias, el desarrollo de prácticas de alfabetización de esta formación. Para el análisis de los discursos de los maestros se tendrán en cuenta los conceptos de dialogismo, enunciación y la capacidad de respuesta de Bakhtin (1997); la búsqueda de aproximaciones a las teorías de Shulman (1987), Nóvoa (1998, 2007), Kramer (2010, 2013) y Maldonado (2002), con el fin de analizar los discursos dialógicos y responsivos que surgen de la formación continua de los maestros alfabetizadores.
Palabras clave: Maestros de Alfabetización, Educación Continua, Dialogicidad y capacidad de respuesta.
Artigos
Possibilidades e influências da formação continuada na construção da docência de professoras alfabetizadoras de Araucária/PR: uma análise dialógico-responsiva
Possibilities and influences of continuing education in the construction of literacy teachers of Araucária/ PR: a dialogical-responsive analysis
Posibilidades e influencias de educación continua en la construcción de la docencia de maestros alfabetizadores de Araucária/PR: un análisis dialogico-responsivo
Recepção: 20 Novembro 2014
Aprovação: 05 Julho 2015
As discussões e as pesquisas sobre a alfabetização no contexto da educação escolar brasileira têm sido intensificadas na última década, em busca de superações dos índices de fracasso escolar que ainda persistem nos primeiros anos escolares. Isso tem implicado em maior qualificação dos(as) alfabetizadores(as), como investimento mais significativo com relação à democratização da Escola Básica.
Com a ampliação do tempo de escolarização, desde a implantação da Proposta do Ensino Fundamental de 9 anos em 2010, as políticas oficiais para a formação docente inicial e continuada, emanadas do Ministério da Educação (MEC), têm buscado a qualificação e o desenvolvimento profissional dos professores, notadamente aqueles responsáveis pela docência nos anos iniciais escolares. Em 2012, a implementação do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) acenou com uma nova proposta de Formação Continuada aos professores(as) alfabetizadores(as). Ao implementar essa proposta, as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação passaram a reorganizar os cursos de formação continuada em suas redes de ensino.
Em função das questões suscitadas por essas propostas, como o investimento no redimensionamento da formação e da docência das alfabetizadoras1, questões fundamentais desses processos vêm sendo retomadas. São questões relacionadas ao domínio dos conhecimentos da linguística; às estratégias de ensino da leitura e da escrita, com vistas ao letramento; ao desenvolvimento infantil; e às outras linguagens presentes nos processos culturais da sociedade contemporânea, considerados desde os primeiros anos da escolarização.
A pesquisa sobre a construção das trajetórias profissionais de alfabetizadoras, durante os anos de experiência na docência, tem apontado que os processos de formação continuada constituem um tempo/espaço de discussões, de estudos, de adequações de estratégias pedagógicas, em busca de uma nova qualificação pedagógica, diante dos diferentes acessos necessários à vida em uma sociedade em processos rápidos de mudança. As intenções e as significações, dessa abordagem, voltam-se às expressões "professor alfabetizador" e "formação continuada", como eixos de estudo e de pesquisa, buscando identificar as relações que as professoras alfabetizadoras estabelecem como sujeitos de discursividade, em meio aos processos que conformam os conhecimentos e as práticas da docência na alfabetização. Como professoras alfabetizadoras, inseridas nas redes discursivas de formação, nos encontros e nos diálogos com os outros que as constituem, formam, e constroem suas posições, suas concepções e suas práticas ao alfabetizar.
Após a vivência dos processos da formação inicial na universidade, os professores recebem influências significativas da formação continuada ofertada nas redes de ensino, que direcionam o desenvolvimento da profissão e da atuação como alfabetizadores. Em suas trajetórias, são envolvidas pelos discursos, por novos significados e pelas experiências de seus pares na escola de trabalho e de todos os outros com quem convivem na sua vida pessoal e profissional. Pode-se dizer que, no momento em que o indivíduo escolhe a profissão de professor, como sujeito, não escolhe só o que fazer, mas em quem vai ser.
A pesquisa realizada analisou as narrativas de cinco alfabetizadoras dos primeiros anos escolares da Rede Municipal de Araucária/PR. Como problema central, o estudo propôs constatar se há e quais são as influências da formação continuada ofertada pela Secretaria Municipal de Educação de Araucária (SMED) desse município, para identificar de que forma esses processos de formação possibilitam a aprendizagem da docência, focalizando a mobilização de conhecimentos, saberes e concepções que instigam as alfabetizadoras a desenvolver boas práticas, com base na noção de dialogicidade e responsividade preconizadas nos estudos de Bakhtin (2011).
A seleção do grupo investigado foi realizada tendo como critério a demonstração pelas alfabetizadoras de maior envolvimento e interesse, ao desenvolver boas práticas em sua atuação. Cabe esclarecer que não se trata de separar esse grupo do conjunto das alfabetizadoras de Araucária, mas de encontrar em suas compreensões, em suas iniciativas e em suas práticas as possibilidades de ressaltar e identificar pontos de interlocução, sobre as influências da formação continuada nas concepções e nas novas práticas de alfabetização e de letramento.
Para as intenções do estudo e da pesquisa aqui apresentadas, optou-se por buscar em Mikhail Bakhtin os elementos necessários à reflexão e à análise da complexidade dos processos que levam as professoras alfabetizadoras a compreender e a desenvolver as mediações pedagógicas pelas quais elas optam, a partir de concepções, de práticas e de atitudes adquiridas em suas trajetórias na alfabetização.
Bakhtin (2011) estabeleceu que são as relações sociais no contato com os outros que constituem os sujeitos em um processo dialógico entre os sujeitos sociais. Nos elementos de sua produção teórica, o autor trata das formas de alteridade e do ato da responsividade, categorias que foram adotadas como apoio teórico para a análise da construção da docência das alfabetizadoras. Nessa perspectiva, o conceito da teoria como atitude responsiva ativa, abriu a possibilidade de identificar as formas de apreensão e aplicação de conceitos, nos processos de formação continuada.
Como procedimentos metodológicos, optou-se pela aplicação de instrumentos da pesquisa qualitativa, pela utilização de questionário semiaberto e posterior entrevista semiestruturada. Realizou-se observação participante em sala de aula, como oportunidade de enunciações e interlocução propiciada às professoras alfabetizadoras. As análises finais realizadas levaram a prever e a realizar uma roda de conversa, como retorno às questões ainda por esclarecer e como espaço para outras enunciações.
Considerar a atitude responsiva na análise dos processos de aprendizagem e no ato de compreender para produzir respostas é uma forma de caracterizar um processo de compreensão que não se adquire de um dia para outro, e nem de uma formação para outra, mas faz parte da dinamicidade do ato de enunciação concreta.
Busca-se também aproximar as análises realizadas às concepções de Nóvoa (1998) e Pimenta (1999) sobre a construção da docência na alfabetização. As análises sobre os conhecimentos e os saberes docentes evidenciados levaram em conta as teorizações de Shulman (1986, 1987), Kramer (2010), Maldonado (2002), Marcelo Garcia (1999) e Soares (2011), que contribuíram com elementos de análise sobre as boas práticas enunciadas pelas alfabetizadoras.
As enunciações e as respostas das alfabetizadoras aos processos da formação continuada apontaram para interações, práticas e interlocuções com os alunos, pedagogos, formadores, autores, e todos os outros com os quais dialogam na realidade na qual se inserem, e na qual buscam novas lógicas em suas práticas alfabetizadoras.
No processo de formação e de constituição da função alfabetizadora, o professor tem várias possibilidades. Dentre elas, ele pode deixar-se invadir por toda a gama de cobranças, de concepções, de métodos e de perspectivas de mudança, levando-o a realizar a sua função sem perspectiva. Em uma outra possibilidade, o professor pode assumir uma atitude compreensiva sobre informações, mensagens e discursos que permeiam o contexto de sua formação e atuação, transformando esses processos em conhecimentos, práticas e/ou estratégias de ensino.
Em uma terceira posição, o professor pode avançar para uma tomada de consciência do mundo social, como sujeito responsivo, que se apropria dos conhecimentos da docência como alfabetizador, instigando-o a buscar respostas e novas lógicas em suas práticas ao se deparar com as necessidades da função alfabetizadora. Assim, cabe identificar nas narrativas e nas práticas docentes que posições têm adotado as alfabetizadoras ao desenvolver as aquisições da leitura, da escrita e do letramento.
Dar sentido às vozes das professoras alfabetizadoras, nas suas enunciações e nos seus discursos, possibilita localizar seus conhecimentos e seus saberes sobre sua profissão levando a detectar como interpretam a formação continuada da qual têm participado. Forneceu, ainda, elementos de percepção dos sentidos desses discursos no contexto em que são produzidos, para situar o lugar da formação continuada na construção da docência alfabetizadora. Nas palavras de Bakhtin:
[...] quanto melhor dominarmos os gêneros tanto mais livremente os empregamos, tanto mais plena e nitidamente descobrimos neles a nossa individualidade (onde isso é possível e necessário), refletimos de modo mais flexível e sutil a situação singular da comunicação; em suma, realizamos de modo mais acabado o nosso livre projeto do discurso. (BAKHTIN, 2011, p. 285).
Se a apropriação das formas dos gêneros discursivos está diretamente associada às experiências que os sujeitos vivenciam, quando mais produtivas e diversas elas forem, maiores as possibilidades discursivas desses indivíduos. Os professores falam por gêneros do discurso, e o contato com interlocutores e contextos que ampliam significativamente as suas experiências como sujeitos, que é possibilitada pela linguagem, fazem com que a professora alfabetizadora reflita sobre cada situação, posicionando-se e, nesse sentido, interagindo conscientemente.
A linguagem, nesse processo investigativo, como elemento imprescindível para a percepção das relações dialógicas e da comunicação, pelos enunciados, promove interação entre os sujeitos. Para Bakhtin (2011), quando se estuda o enunciado sem que se tenha consciência das especificidades e das variedades das formas dos gêneros discursivos em qualquer campo de investigação linguística, consiste em uma formalização e é muito abstrato. Há uma deformação da historicidade da investigação, separando a língua da vida. Nessa interação, a discursividade constrói os sentidos por meio dos outros, na esfera da comunicação humana, porque as pessoas na sociedade interagem e comunicam-se por meio dos gêneros dos discursos que refletem e refratam a realidade pertencente a uma determinada esfera social.
Para Faraco (2007), dialogismo nasce da interação verbal dos sujeitos, ligados por relações mais profundas - não se trata somente de uma simples conversa. O sujeito, portanto, é fruto de múltiplas relações e dimensões da interação socioideológica e desenvolve-se na e pela linguagem como uma atividade mental de ressignificação, que se apropria de discursos de outros para construir novos discursos, a partir dessas relações. Assim, por meio de sua enunciação, torna-se único.
Os enunciados surgem desta forma, como espaços de luta entre as vozes, sempre ligados a uma situação material concreta e unidade de análise dessas relações discursivas. É no enunciado que as palavras adquirem sentido. Por si só, elas seriam neutras, todavia adquirem valor e sentido, dependendo de quem fala e em qual situação é aplicada, ou seja, do contexto de enunciação. Portanto, ao definir sua concepção de responsividade, Bakhtin (2011) afirma que a resposta a qualquer situação discursiva em que o sujeito se depara é natural, pois todo o homem é um ser de resposta e faz parte do plano da responsividade. Para Geraldi,
[...] a responsividade abarca, contém, implica necessariamente a alteridade perante a qual o ato responsável é uma resposta. Somos cada um com o outro na irrecusável continuidade da história. Buscar nos eventos, nas singularidades, nas unicidades dos atos desta caminhada como se realizam as 'respostas responsáveis' é um modo de reencontrar os deslocamentos imperceptíveis na construção continuada de valores, dos sentidos que regem, mas que se fazem e se desfazem na existência. (GERALDI, 2004, p. 289, grifo do autor).
Nessa perspectiva, entende-se que compreender não é apenas se posicionar discursivamente sobre um fator discursivo, mas se apropriar dos discursos do outro para a constituição da enunciação; enfim, contra-argumentar o discurso do outro com suas próprias palavras. Bakhtin (2011) salienta que compreender é opor à palavra do locutor uma contrapalavra. Isso não quer dizer opor-se a determinado discurso, mas usar o discurso anterior para a formação do discurso resposta.
Nem sempre a resposta é vista como uma réplica a uma pergunta, mas a um discurso, que pode ser mediato ou imediato. Nesse sentido, compreender ativamente a teoria e as discussões sobre a docência significa ao professor alfabetizador procurar uma resposta, uma posição possível para favorecer interlocuções e novas respostas. Sobre os significados da compreensão, Bakhtin (2006) esclarece que:
Compreender a enunciação de outrem significa orientar-se em relação a ela, encontrar o seu lugar adequado no contexto correspondente. A cada palavra da enunciação que estamos em processo de compreender, fazemos corresponder uma série de palavras nossas, formando uma réplica. Quanto mais numerosas e substanciais forem, mais profunda e real é a nossa compreensão. (BAKHTIN, 2006, p. 135).
Nesse sentido, a atuação profissional docente, em uma perspectiva bakhtiniana, parte do pressuposto da dialogicidade, da alteridade e de respostas que se expressam em processos de interação social. Pelas relações sociais dialógicas, a visão do professor tende a ampliar-se e a ser desafiada a olhar, ler e ver mais, para observar, discutir e problematizar, para buscar posicionamentos, visando interagir com interlocutores reais e que possuem um conhecimento profissional de mundo para além daquele que se pode enxergar. A cada nova indagação, várias outras respostas tornam-se elementos para leituras do real e, por isso, contribuem para novas possibilidades de análise.
As necessidades da pesquisa e análise propostas implicam em uma reflexão e refração entre várias relações e visões "do outro", como exemplifica Bakhtin (2011), evocando a visão do olhar diante de um espelho. O autor esclarece que, mesmo o movimento de visualização do próprio reflexo no espelho, não possibilita um olhar de contemplação à nossa exterioridade e não se encontra no mundo que nos é sensível. Essa visão não constitui um objeto, porque "[...] eu me encontro numa espécie de na fronteira do mundo que eu vejo" (BAKHTIN, 2011, p. 49).
Nessa perspectiva, só é possível observar um reflexo de nosso aspecto físico, e esta possibilidade não contempla uma totalidade do que somos. Diante de nosso reflexo, a visão que temos de nós mesmos continua a ser mediada pelo outro, o qual tomamos como base para:
[...] encontrar uma posição axiológica em relação a nós mesmos; também aqui tentamos vivificar e enformar a nós mesmos a partir do outro; daí a expressão original e antinatural de nosso rosto que vemos no espelho [e] que não temos na vida. [...] isto é, nós a avaliamos não para nós mesmos mas para os outros e através dos outros. Por último, a esses três tipos de expressão (expressão da nossa real diretriz volitivo-emocional; da avaliação do outro possível; nossa avaliação do outro possível) ainda se pode incorporar aquela que gostaríamos de ver em nosso rosto, mais uma vez não para nós mesmos, é claro, e sim para o outro: ora, sempre chegamos quase a posar diante do espelho, fazendo a expressão que nos parece essencial e desejada. (BAKHTIN, 2011, p. 30-31, grifo do autor).
Portanto, essa consideração assenta-se na necessidade da visão exotópica, isto é, de desdobramento de olhares externos do outro, sobre alguém. Por acontecer de forma exterior ao indivíduo, ou pelo outro, delimita-nos, unifica-nos, e gera a individualidade das formas de olhar. Dessa forma, na visão bakhtiniana, as ações realizadas por nós, tal como a nossa exterioridade, são turvadas pelo futuro e pela observação dos atos dos outros, que se dirigem a nós. Ou seja, dos outros professores da faculdade, dos outros professores e pedagogos que ajudaram no início da profissão, dos outros formadores dos cursos participados, dos outros autores incorporados dos textos e dos livros lidos e discutidos nos cursos, entre tantos outros apresentados e que são apreendidos pelas vozes enunciadas pelas professoras. Estes contribuem para a representação do sujeito, mas essa não será a exterioridade do indivíduo ou não constituirá a evocação da sua ótica interna. É pressuposto à vida, ao agir no mundo, ao inacabamento, porque o acabamento implica em um fim, o que impossibilitaria a ação.
Nas análises propostas neste artigo, considera-se a concepção bakhtiniana do olhar, que possibilitou mergulhar, compreender e exemplificar, por meio da linguagem, análises e respostas possíveis à compreensão sobre o trabalho do professor alfabetizador, nas interlocuções entre os saberes que este desenvolve e a formação continuada. Também cabe compreender esse desenvolvimento a partir das visões de outros docentes, alunos, direção, coordenadores e formadores, os quais promovem o reflexo do professor alfabetizador no espelho.
Bakhtin (2011) explica que a imagem externa completa de si é inacessível e perpassa pelo olhar daqueles com os quais dialogamos, porque "[...] avaliamos a nós mesmos do ponto de vista dos outros, através do outro procuramos compreender e levar em conta os momentos transgredientes à nossa própria consciência" (BAKHTIN, 2011, p. 37). Nesse sentido, o alfabetizador que se torna tem tudo a ver com o contexto formativo em que este se situa, principalmente no encontro com o outro.
Parafraseando Bakhtin (2011), importa distinguir o autor-pessoa (sujeito físico), o autor-criador (sujeito não-físico) e a realidade que ele denomina "voz social", constituída por valores sociais heterogêneos, marcados pela diversidade de posições assumidas pelos sujeitos. Isso porque é nessa realidade, axiologicamente construída, segundo Bakhtin (2011), o autor-pessoa vai construir como valores seus, visto que é essa a instância de mundo por ele considerada, segundo seus julgamentos de valor. O professor alfabetizador, na realização de seu trabalho na escola, recorta, produz, faz e refaz as impressões que possui sobre o que ficou de sua formação, dos autores, dos interlocutores que fizeram e fazem parte de sua trajetória na alfabetização e no seu modo particular de ser professor, no qual revela quais as vozes mais significativas na sua formação.
Para refletir sobre a construção da docência na alfabetização, nos processos da formação continuada, há de se considerar suas interfaces com os saberes e a profissionalização docente. Essa reflexão requer que se situe a atuação destas professoras no tempo presente, considerando a complexidade de temáticas envolvidas, centralizando os procedimentos nas perspectivas de análise de seus interlocutores, o que se busca caracterizar a seguir.
Diante da complexidade do ato de alfabetizar, cabe destacar que o professor alfabetizador, além das funções que exerce, é um professor de Língua Portuguesa, que utiliza diversas formas e gêneros textuais como objeto de ensino. Em sua prática e estratégias pedagógicas, é essencial que ele domine os conhecimentos necessários às compreensões sobre como essa linguagem processa-se, desenvolve-se e constrói-se, notadamente com relação às apreensões dos alunos desde o primeiro ano escolar. Nessa perspectiva, a formação continuada é entendida como um espaço de aprendizagem para o desenvolvimento da profissionalização docente, compreendida por Mizukami (2004) e Marcelo Garcia (1999), os quais apresentam visões congruentes em suas pesquisas.
Mizukami (2004) refere-se aos conhecimentos de processos de aprendizagem e de desenvolvimento profissional da docência a partir das considerações de Shulman (1986) sobre seu Paradigma perdido.2 Diante de vários programas investigativos, que nortearam os caminhos para as pesquisas sobre as mediações dos professores em suas áreas de ensino, Shulman (1986) destacou que não se aprende a partir da experiência propriamente dita, mas da reflexão que se realiza a partir e sobre ela. O autor referiu-se, ainda, à necessidade de analisar os processos de ensino e aprendizagem desenvolvidos pelos professores, a partir do que considerou um Paradigma perdido, ou que não eram levados em consideração nos vários programas de pesquisa sobre a atuação dos professores em suas áreas de ensino.
Para Shulman (1986), importava pesquisar a relação orgânica com o conhecimento de referência, e que é a fonte de exemplos, explicações e formas de lidar com os erros e as dificuldades dos alunos. Dessa forma, o autor investigou o que os professores sabem sobre os conteúdos e os processos de ensino, em que cursos e como adquiriram esses conteúdos, como e por que se transformam ao participar dos processos de formação e como são utilizados em sala de aula.
Shulman (1987, p. 14), ao teorizar sobre a ideia de compreensão, enfatizou que "[...] ensinar é antes de tudo compreender". Ao pesquisar os processos de ensino que os professores desenvolviam, Shulman (1986, p. 8) afirmou que seu objetivo era o de "[...] traçar a biografia intelectual do professor: o conjunto de saberes, concepções e orientações que constituem a fonte de sua compreensão sobre os assuntos que ensinam". Nesse sentido, ele reafirmou a valorização das compreensões dos professores, afirmando que, ao verbalizar sobre os processos de ensino, os professores evidenciam essas compreensões, ultrapassando o trabalho com os conteúdos curriculares, ao construir conhecimentos sobre novas formas de ensinar, diante de diferentes níveis, necessidades e formas de apreensão dos alunos.
Nesse sentido, as mudanças propostas aos processos de alfabetização das redes de ensino, a partir de meados dos anos 2006, principalmente com relação à proposta do Ensino Fundamental de 9 anos, levaram os alfabetizadores à necessidade de retomar, compreender e dominar os conceitos e os conhecimentos linguísticos da alfabetização e com relação ao letramento, para dar conta de uma nova estruturação do ensino na alfabetização, com implicações para a escolarização, indo além em seu papel docente, como definiu Shulman (1986).
A implementação da proposta já referida pelas Secretarias de Educação, mesmo que não suficientemente discutida pelos(as) alfabetizadores(as) quanto à sua justificativa e às suas necessidades, desencadeou, como já se referiu, programas de formação continuada, nos quais o ponto central volta-se a uma retomada da concepção de letramento, como questão preponderante na alfabetização.
Segundo Soares (2004), o letramento é uma extensão e complemento da alfabetização e refere-se à condição de quem sabe ler e escrever, utilizando-o no exercício das diferentes práticas sociais. Alfabetização e Letramento interpenetram-se e compõem um processo não apenas de aquisição do código, mas também de interações e relações que esse código propicia.
Na pesquisa realizada, as professoras expressaram a busca por práticas que acreditavam "dar certo", deixando de lado, por vezes, o significado e o compromisso de alfabetizar e formar gerações verdadeiramente letradas. A importância do conceito letramento tem sido o investimento em processos de formação continuada que leve boa parte dos alfabetizadores a diversificar suas práticas, seus planejamentos e suas atitudes relacionando o processo pedagógico da alfabetização com a prática social.
Na escola, o letramento pode ser visto como um conceito ético-político, pois formar sujeitos letrados é abrir a possibilidade da entrada de outras vozes em sua vida: modos de encarar, entender e atuar na sociedade. Ao entrar em contato de forma sistematizada com diferentes textos, os sujeitos descobrem informações relevantes e levantam hipóteses sobre a linguagem escrita, tornando-se capazes de usar a língua, em diferentes situações sócio-discursivas. As alfabetizadoras enunciaram a consciência sobre seu papel, que as têm levado a ultrapassagens quanto à sua função de levar os alunos a apropriarem-se da leitura e da escrita e a construir o letramento.
Marcelo Garcia (1999) refere-se ao desenvolvimento profissional como evolução e continuidade, processo que define como objeto da formação docente. Ele define a formação dos professores como:
[...] a área de conhecimentos, investigação teóricas e práticas que, no âmbito de Didáctica e da Organização Escolar, estuda os processos através dos quais os professores - em formação ou exercício - se implicam individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem através das quais adquirem ou melhorem os seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhes permite intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, no currículo e da escola, com o objectivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem. (MARCELO GARCIA, 1999, p. 26).
Kramer (2010) discute a urgência em superar as dicotomias ou as cristalizações com que o trabalho pedagógico vem sendo realizado, considerando que, "[...] enquanto prática social, a prática pedagógica é rica, complexa, contraditória" (KRAMER, 2010, p. 57). A autora refere-se, ainda, à tentativa de resgatar esse seu caráter dinâmico, tornando possível dar conta da multiplicidade de aspectos nela envolvidos, tanto nas dificuldades quanto nos dilemas enfrentados pelos profissionais da escola.
O saber docente revela uma dilapidação dos conhecimentos tidos como interiores ao professor, no encontro com a exteriorização desses saberes por meio da prática profissional. Assim, na perspectiva de Maldonado (2002), com base nas concepções de Agnes Heller (2000), o sujeito apropria-se dos heterogêneos saberes sociais contidos na vida diária, no seu cotidiano.
Dessa forma, não cabe classificar os saberes docentes, mas entender os processos de apropriação desses saberes e sua utilização no exercício da docência. Nesse sentido, os saberes docentes são considerados pela autora como "pluriculturais, históricos e socialmente construídos" (MALDONADO, 2002, p. 36). Por essa razão, os saberes docentes não implicam somente processos cognitivos individuais, mas formam parte do processo histórico social e cultural local, na relação cotidiana entre professores e alunos. Propõe-se, a seguir, expor os procedimentos metodológicos e os resultados preliminares da pesquisa.
A pesquisa inscreveu-se no âmbito da abordagem qualitativa e insere-se no campo da formação de professores para a Educação Básica, tendo como objeto de estudo o professor alfabetizador. Nesse sentido, houve um aprofundamento no mundo dos significados, no qual a reflexão do pesquisador tornou-se parte do processo de conhecimento em curso.
Foram realizadas entrevistas com cinco alfabetizadoras, selecionadas entre professoras com mais de dezoito anos de profissão, na mesma rede de ensino (Rede Municipal de Araucária), anos estes dedicados ao ensino em classes de alfabetização. Na terceira fase da pesquisa, foram realizadas observações de cunho participante em sala de aula, com três das professoras selecionadas, para uma comparação entre as respostas às questões que surgiram nos questionários e as práticas identificadas. Como finalização do trabalho de campo da pesquisa, foi proposto e realizado o momento que ficou definido como "Roda de Conversa", como forma de propiciar maior liberdade às alfabetizadoras para comentar os aspectos enunciados, como enriquecimento de informações, levantamento de dúvidas e identificação de novas iniciativas ou projetos.
A entrevista foi realizada após a aplicação de um questionário que foi elaborado com questões abertas e fechadas para a coleta de dados sobre aspectos específicos: dados pessoais, escolaridade, dados profissionais, descrição sobre o início da docência e experiências na alfabetização, concepção de Formação Continuada, relevância para a prática pedagógica dos professores alfabetizadores, entre outros.
A investigação inicial dirigiu-se a um grupo maior de alfabetizadoras, sendo formulado e aplicado, para a primeira fase ou estudo exploratório, um questionário a 50 professoras alfabetizadoras de Araucária. As perguntas tiveram a preocupação de situar, na pesquisa, os aspectos referentes à docência do professor alfabetizador, com questões que considerassem as relações de dialogicidade na formação continuada ofertada no município e as formas de desenvolvimento das práticas pedagógicas das alfabetizadoras.
Observou-se nas respostas do questionário aplicado que as alfabetizadoras com maior tempo de docência revelaram uma compreensão da formação continuada como preocupação sobre a responsabilidade das contribuições que veiculam, necessárias à sua profissão. Nesse sentido, a seleção do grupo pesquisado levou em conta os seguintes critérios: a) Professoras com mais de dezoito anos de profissão e que lecionassem em classes de alfabetização, por esse mesmo período ou mais, principalmente dedicadas ao primeiro ou segundos anos do Ensino Fundamental3, visando analisar em qual momento ou gestão política a formação continuada possibilitou a aprendizagem da docência; b) Professoras somente da Rede Municipal de Araucária; c) Professoras que passaram pela mudança da Proposta de Ensino Fundamental de nove anos e que permaneceram na docência do primeiro e segundo anos.
A análise das respostas ao primeiro questionário foi utilizada como levantamento de dados sobre todas as alfabetizadoras que participaram. Cinco alfabetizadoras foram selecionadas, as quais responderam posteriormente à entrevista semiestruturada aplicada. Na análise da pesquisa, foram consideradas as relações entre os processos da formação continuada e as narrativas sobre as influências com referência às práticas pedagógicas observadas, possibilitando analisar com mais detalhes os enunciados obtidos sobre concepções, práticas e posições das alfabetizadoras como elementos responsivos.
A Rede Municipal de Araucária/PR passou por um processo de atualização de suas Diretrizes Curriculares Municipais, no ano de 2010, buscando nortear os planejamentos e as ações pedagógicas das práticas docentes, sobretudo das professoras alfabetizadoras. Para oferecer suporte à implementação da nova proposta municipal, a SMED de Araucária organizou cursos de formação continuada, que foram realizados nas horas-atividade, com encontros mensais, orientados pelos coordenadores de áreas dessa secretaria.
Para esclarecimento sobre a identidade e a trajetória das cinco alfabetizadoras da rede municipal de Araucária4, elaborou-se o quadro 1 a seguir:

Constatou-se que, quanto à idade, as professoras alfabetizadoras incluem-se na faixa entre 40 a 51 anos, exercem o magistério há mais de 18 anos e dedicam-se às classes de alfabetização entre 15 e 33 anos, conforme tempo de serviço na rede Municipal de Araucária. Assim, adquiriram estabilidade de atuação no mesmo município e na mesma escola. Esse município conta com 89 professoras do primeiro ano e 102 professoras do segundo, divididas em 37 escolas5.
A consolidação na carreira, em uma mesma área de atuação, confere, às professoras pesquisadas, um sentimento de pertencimento a essa condição de alfabetizadoras. Mostraram a responsabilidade por essa função e em relação à posição e ao papel social do processo alfabetizador na escolarização, características que Huberman (2000, p. 40) escreve como fase da estabilização ou de maturidade que "acompanha um sentimento de "competência" pedagógica crescente" e com um sentimento de que pertencem a um grupo profissional específico.
A mediação torna-se essencial para que os conhecimentos do mundo e da sociedade em que os sujeitos se inserem, cheguem à sua consciência, como afirma Bakhtin (2011). Nesse sentido, o encontro ocorrido na Roda de conversa entre as cinco professoras alfabetizadoras, tanto deixou transparecer suas posições, suas concepções, como propiciou, para cada participante, um momento significativo de tomada de consciência, que não deixou de ser um momento de autoavaliação do seu trabalho como alfabetizadora.
Isso foi possível no confronto dos diálogos com as outras alfabetizadoras, pelo olhar "do outro", ao rememorar os processos formativos pelos quais passaram durante os anos de trabalho, nos momentos históricos significativos na profissão e em momentos importantes que mediaram o processo dialógico de aprender a docência na alfabetização. A análise das enunciações obtidas na pesquisa buscou aproximar as visões bakhtinianas das de autores e de pesquisadores que trazem compreensões e contribuições sobre a construção dos saberes e dos conhecimentos da docência na alfabetização.
As enunciações das professoras alfabetizadoras aqui apresentadas foram selecionadas buscando analisar influências dos processos de formação continuada dos quais elas participaram e expressaram em suas enunciações. Nas posições sobre as concepções, as práticas e as atitudes ao relacionarem-se com os outros -alunos, pares, formadores, autores e outros educadores -, buscou-se identificar como se conformam os processos de alfabetização desenvolvidos, considerando a complexidade do ato de alfabetizar.
Ao retomar os processos de formação continuada dos quais elas participaram na Rede Municipal de Araucária, as professoras emitiram opiniões, comparando as visões sobre as expectativas quanto à atuação do professor alfabetizador e apresentaram posições sobre os(as) formadores(as) e as aprendizagens desenvolvidas nos cursos de formação ofertados.
Nesse sentido, a professora Janine enunciou suas impressões sobre o processo vivido anteriormente na rede municipal de Araucária, comparando com sentimentos da formação continuada atual, na referida rede:
E depois a rede [Rede Municipal de Araucária] também teve cursos na época que eu entrei, muito bons na área de alfabetização. Então, tinha uma época de muitas trocas de experiências, confecção de materiais. A gente trocava muito com o grupo. [...] acho assim que a formação tem que ter a parte teórica mais a troca porque, assim, você vê que o teu problema não é só teu, [...] ninguém ficava angustiado, Meu Deus!!! O meu já tá lendo, o outro não! Então a gente sabia que era um processo [...] vinham muitas pessoas de fora também para dar cursos, que eram alfabetizadores de outros municípios e até alfabetizadores da rede nos orientavam, para baixar a ansiedade e dizer que uma hora o processo ia acontecer. (Professora Janine).
Percebeu-se nas declarações da professora que ela se sentia mais à vontade nos cursos de formação ofertados em gestões anteriores e que a generosidade da troca entre pares, além de contribuir com seu trabalho, possibilitava liberdade de expressão, tornando mais prazerosos os momentos dessa formação. Os comentários entre alfabetizadoras sobre os alunos levavam a expor as dificuldades enfrentadas, possibilitando discuti-las, mostrando que o espaço de formação continuada também pode proporcionar relações alterativas, que diminuem a ansiedade.
A professora Janine comentou que "[...] tinha uma época de muitas trocas de experiências", apontando para uma ampliação de horizontes, de relações, de práticas bem sucedidas em sala de aula, e que forneciam maior sentido para os conteúdos trabalhados com os alunos. Ao procurar no outro respostas possíveis, Bakhtin (2011, p. 334, grifo do autor) analisa que "[...] a audibilidade como tal já é uma relação dialógica. A palavra quer ser ouvida, entendida, respondida e mais uma vez responder à resposta, e assim ad infinitum".
Nessa mesma direção, Ponzio (2013), em entrevista a Boeno, interpretou as ideias bakhtinianas no que diz respeito à filosofia da linguagem, como arte da escuta. O autor esclareceu que Bakhtin toma Dostoiévski como um modelo na escuta das palavras, compreendendo-as como vozes, em suas diferenças singulares. Assim, Ponzio (2013) refere-se a essas definições:
A escuta, diz Bakhtin, é um elemento constitutivo da palavra, que não pode ser evidenciado pela linguística, a menos que ela se torne metalinguística. Para ele ("O problema do texto", 1960-1961), a palavra, "deseja sempre a escuta, procura a compreensão respondente, e quer, por sua vez, responder à resposta, e assim ad infinitum; não se limita a uma compreensão que ocorre imedia tamente, mas sempre vai além (de maneira ilimitada). A palavra faz parte de um diálogo em que o sentido nunca terá fim". (PONZIO, 2013, p. 374, grifo do autor).
Nesse contexto, os interlocutores são essenciais no processo formativo do professor, porque nesse processo de escuta e de verbalizações insere-se uma teia discursiva de apropriação de saberes, de conhecimentos, de práticas, historicamente "[...] construídos por meio de diálogos que se estabelecem entre pessoas diferentes, com experiências acumuladas e com materiais de trabalho e de estudo com os quais os professores têm contato" (ZIBETTI, 2005, p. 152). Sobre a formação dos professores, a autora utiliza as declarações de Mercado (1991) e salienta:
[...] porém, afirmar que uma parte fundamental da formação dos professores ocorre no exercício de seu trabalho não implica dizer que só se aprende na prática. Como esclarece Mercado (1991, p. 60), com a qual concordo, "implica assumir que nesse trabalho se expressam conhecimentos historicamente construídos que são articulados durante a ação pelo sujeito particular". (ZIBETTI, 2005, p. 152).
Referindo-se aos cursos de formação continuada, quanto à contribuição para a profissão do alfabetizador, a professora Renata emitiu suas opiniões:
Eu não posso pensar em ir num curso só porque eu vou ganhar certificado. Eu tenho que sempre pensar que eu vou lá pra aprender alguma coisa. E a questão da pesquisa, você tem sempre que estar pesquisando vendo coisas novas também. [...] às vezes, você vai num curso e aquela pessoa vai falar só da prática e vai jogar um monte de conteúdo ... você vai aproveitar alguma coisa, alguma coisa você não vai aproveitar. Como tem também cursos que a gente vai lá e que é só a parte teórica, da aprendizagem, como que a criança é..., consegue aprender, mas o bom é isso: teoria aliada com a prática. (Professora Renata).
A professora referiu-se à necessidade da pesquisa, como impulso à busca de novas possibilidades, o que evidencia a percepção de que há questões novas relativas aos alunos, que não podem ser tratadas nas formas tradicionais, bem como há novos interesses das crianças da escola atual. Assegurou a professora que alfabetizar uma criança é um processo a ser realizado de maneira significativa e de acordo com sua realidade e necessidades que evidencia no processo de leitura e de escrita.
A professora mencionou a importância da formação continuada como um espaço no qual se possa vivenciar atividades nas quais a teoria possa ser compreendida, para que seja aplicada às práticas reais de alfabetização. Nesse sentido, Nóvoa (2007) refere-se à preocupação com a teoria nos cursos, quando nem sempre é revertida para mudanças na prática:
A formação do professor é, por vezes, excessivamente teórica, outras vezes excessivamente metodológica, mas há um déficit de práticas, de refletir sobre as práticas, de trabalhar sobre as práticas, de saber como fazer. É desesperante ver certos professores que têm genuinamente uma enorme vontade de fazer de outro modo e não sabem como. Têm o corpo e a cabeça cheios de teoria, de livros, de teses, de autores, mas não sabem como aquilo tudo se transforma em prática, como aquilo tudo se organiza numa prática coerente. Por isso, tenho defendido, há muitos anos, a necessidade de uma formação centrada nas práticas e na análise dessas práticas. (NÓVOA, 2007, p. 14).
Pensar a formação continuada do professor alfabetizador, portanto, diz respeito ao espaço/tempo de formação voltado a vivências e a aprendizagens teórico-práticas da alfabetização, as quais possam ser enunciadas e dialogadas, agregando novas possibilidades às práticas pedagógicas das participantes. Nessa perspectiva, a professora Marina evidenciou sua preocupação quanto aos domínios que necessita em suas práticas. Ela afirmou que:
Infelizmente a gente tem várias trocas de gestão e eu acho que é aí o grande problema. Porque já aconteceu da gente ter uma gestão que traz uma contribuição muito grande. Lembro de uma gestão que trouxe a S. a B., a L. H. a A. G., que foram pessoas que realmente contribuíram para a nossa formação, trazendo o conhecimento científico mesmo da língua portuguesa. Que não faziam aquela coisa, assim, de oficinas de alfabetização [...] Elas não, elas trazem o conhecimento científico que você precisa, porque pensar na estratégia de dar aula é mais fácil. O problema é você ter o conhecimento pra montar essa aula. [...] contribuiu muito mais pra mim [...]. (Professora Marina).
O discurso da professora Marina aproxima-se ao de outras professoras do grupo das redes públicas, quando revelam a necessidade de suporte as suas iniciativas e a novas formas de tratar as aquisições da leitura e da escrita. Dessa maneira, a teoria é necessária ao aliar-se às práticas, as quais, nas trocas e nas interações entre participantes, possam contribuir com as relações de produção dos conhecimentos do processo de alfabetizar.
Pimenta (1999) complementa esse argumento ao evocar as ideias de Houssaye (1995), o qual esclarece exemplificando:
Nos cursos de formação tem se praticado o que o autor chama de "ilusões": a ilusão do fundamento do saber pedagógico no saber disciplinar - eu sei o assunto, consequentemente, eu sei o fazer da matéria; a ilusão do saber didático - eu sou especialista da compreensão do como fazer saber tal ou tal saber disciplinar, portanto, eu posso deduzir o saber-fazer do saber; a ilusão do saber das ciências do homem - eu sou capaz de compreender como funciona a situação educativa, posso, então, esclarecer o saber-fazer e suas causas; a ilusão do saber pesquisar - eu sei fazer compreender por meio de tal e tal instrumento qualitativo e quantitativo, por isso eu considero que o fazer-saber é um bom meio de descobrir o saber-fazer, mais ou menos como se a experiência se reduzisse à experimentação. (PIMENTA, 1999, p. 26, grifo da autora).
Percebe-se, pelas respostas das professoras, que há uma preocupação com o domínio dos saberes necessários à docência nas classes de alfabetização, sobretudo em relação à aprendizagem dos alunos menores, as crianças de seis anos. Sobre esse aspecto, Pimenta (1999) retoma a função social pedagógica docente, desde a formação inicial:
Considerar a prática social como ponto de partida e como ponto de chegada que possibilitará uma ressignificação dos saberes na formação dos professores. As consequências para a formação dos professores são que a formação inicial só pode se dar a partir da aquisição da experiência dos formados (ou seja, tornar a prática existente como referência para a formação) e refletir-se nela. O futuro profissional não pode constituir seu saber-fazer senão a partir de seu próprio fazer. Não é senão sobre essa base que o saber, enquanto elaboração teórica, se constitui. (PIMENTA, 1999, p. 27).
Percebe-se esse movimento também nas verbalizações de Marilene sobre os processos de formação continuada que vivenciou:
Uma das formas, que eu vi que deu bastante resultado, [...] foram as formações onde teve fundamentação teórica clara, objetiva, e direcionada, mas junto com essa fundamentação já apresenta como é que se faz, como é que o coloca a fundamentação teórica em prática, [...] as sugestões dos encaminhamentos, as sugestões de atividades, mas não atividade pela atividade, é um encaminhamento que veio de uma fundamentação clara, então eu faço isso por causa disso. E aí ao voltar para a escola, o professor precisaria então colocar em prática, em um momento de retorno, até porque é assim dependendo do contexto em que está inserido, das relações sociais que estão ali colocadas, cada encaminhamento, ele traduz um resultado e desse resultado ele precisa voltar para a análise, para pensar assim [...]. (Professora Marilene).
A propósito da questão evidenciada pela professora Marilene, Fiorentini (2010) salienta, em um dos seus estudos, utilizando-se das pesquisas de Freitas et al. (2005), que os professores esperam medidas para a solução dos problemas do seu dia-a-dia na união de esforços entre os pares docentes, pois sentem-se isolados em seu ofício. Ou seja, não solicitam cursos de atualizações presenciais ou a distância, eles "[...] preferem, ao contrário, ser protagonistas do processo de mudança e da produção dos saberes necessários para implementá-lo. Para isso, buscam apoio e parceiros interessados" (FIORENTINI, 2010, p. 28).
Para Fiorentini (2010), o desenvolvimento profissional de professores em um contexto de trabalho colaborativo de reflexão e investigação sobre suas práticas é propício e oportuniza trocas aos professores e os coloca diante de diferentes visões, abrindo espaço para a reflexão e a construção dos processos da docência.
A professora Janine apontou como um espaço significativo da formação continuada, as trocas de experiências, em interlocução com a professora Marilene, verbalizou:
[...] nas formações de alfabetização e letramento, quando assim se estudou determinados elementos, sugerir um encaminhamento e atividades para os professores fazer, os professores desenvolveram isso na escola, houve amostras, houve exposições, o professor olhou seu trabalho exposto. E voltar para repensar isso, eu acho que se a gente conseguisse esse movimento que a gente via, vinha numa caminhada boa é que hoje a gente não tem muito isso. Então não é fazer, não é oficina por oficina, é uma prática fundamentada pensada, do meu ponto de vista é a prática pedagógica. Faço porque sei porque estou fazendo, e eu só vou saber o que eu tenho que fazer porque eu estou fazendo se eu tiver uma fundamentação [...]. (Professora Janine).
Respondendo à sua interlocutora, a professora Marilene referiu-se à necessidade de considerar as necessidades concretas dos alfabetizadores nas atividades da formação continuada, no sentido de que cumpra um papel na construção de consciências ativas por parte dos que dela participam, e não com um fim em si mesmas. Essas opiniões aproximaram-se das ideias de Bakhtin (2011), sobre a vinculação do conhecimento ao ato ou ao agir ético. Kramer (2013, p. 41), ao discutir essas ideias, afirma que "[...] separar a razão da atividade histórica e da vontade seria pura ilusão do racionalismo", pois o conhecimento relaciona-se a mudanças. A autora esclarece ainda:
A educação como ciência humana e social, como práxis, tem uma dimensão de busca da verdade e ao mesmo tempo uma dimensão de ação. [...] Mudar é vencer a indiferença, estabelecer a diferença, alterar, se incomodar com a situação do outro, dos muitos outros. Nesse processo o conhecimento é marcado pela estética, contribuindo para pensar a vida de professores [...]. (KRAMER, 2013, p. 41).
Na condução dos cursos de formação continuada, Kramer (2013) inclui um respeito profundo pelos interlocutores participantes, considerando que estes possuem perspectivas teóricas e metodológicas distintas, dificuldades relativas à vida profissional atual e inserção em diferenciados contextos de atuação. Nessa perspectiva, os professores, no espaço de atuação que é a sua sala de aula, apossam-se de elementos para estabelecer relações que se aproximem do agir ético, de responsabilidade e de responsividade.
Quando a professora Marilene referiu-se verbalmente sobre a formação continuada como uma possibilidade de apropriação de conhecimentos, ela esclareceu que essa formação faz com que o professor consiga realizar uma prática significativa em sala, ou seja, "é uma prática fundamentada, pensada, do meu ponto de vista, é a prática pedagógica". Ainda, ao reafirmar sua opinião, a mesma professora diz: "Faço porque sei porque estou fazendo, e eu só vou saber o que eu tenho que fazer, porque eu estou fazendo se eu tiver uma fundamentação".
Dessa forma, retomou o papel do professor como "autor-criador" que, para Bakhtin (1997), é aquele que compreende o que faz, dá sentido, seleciona e organiza os signos que se revelam a ele por meio de sua consciência subjetiva. Os professores compõem, com suas opiniões, o excedente de visão, esse olhar exotópico que possibilita a organização da sua aula, ou objeto de sua criação, em uma prática que propicie uma mudança de perspectiva em seus alunos.
Percebe-se, pelas enunciações das professoras alfabetizadoras pesquisadas, que as compreensões que elas possuem sobre os processos de alfabetização e de formação continuada como espaço dialógico e responsivo são resultados de suas experiências e encontros com os outros, em interlocuções produtivas e desafiadoras.
Na análise da pesquisa selecionada para esta abordagem, fez-se necessário trazer alguns dos aspectos identificados nas observações participantes realizadas nas salas de três professoras alfabetizadoras6. Esses aspectos foram selecionados em alguns momentos nos quais as relações dialógicas e influências nas trajetórias e práticas de alfabetização ficaram evidentes.
A observação sobre o trabalho na alfabetização na sala da professora Janine evidenciou sua preocupação em estabelecer uma rotina, mas com situações e encaminhamentos contextualizados. Ao responder sobre a organização de sua aula, relativa ao trabalho com textos, ela esclareceu: "[...] consigo clareza nos encaminhamentos porque houve um tempo, aqui na Rede Municipal, em que vieram assessores que fizeram com que eu aprendesse a usar os gêneros textuais com mais propriedade". Percebeu-se, pelo excedente de visão do outro mais experiente e os diálogos e liberdade de voz e enunciações propiciados nos cursos, em momento anterior à gestão atual, que houve nas trocas entre pares, a apropriação de novas respostas para as indagações ou problemas que o professor alfabetizador tenta solucionar no dia a dia. Essa professora apresentou nos seus enunciados a concepção de língua que utiliza nas suas aulas, apreendida pela maneira com que fala aos seus alunos e à pesquisadora, pelo cuidado com que utiliza os textos, nos encaminhamentos que promove e como organiza a sala de aula para as dinâmicas das aulas. As vozes sociais presentes no seu discurso revelaram uma concepção de língua como interlocução a ser promovida pelo trabalho com os gêneros textuais e discursivos, como objetos de estudo e em suas especificidades. Percebeu-se que desde seu planejamento ela contempla a leitura e a interpretação de texto focalizando as reflexões nas linhas, nas entrelinhas e além das linhas; ela realiza uma produção relacionada ao gênero trabalhado e a uma prática de oralidade.
Na observação realizada em sala da professora Renata, percebeu-se, em seu discurso, a preocupação com as práticas de alfabetização para o letramento, o que revela sua compreensão sobre a função social do alfabetizador. Ela referiu-se à importância dos processos formativos dos quais participou, uma vez que, em cada um, a professora afirma que sempre houve algo que aproveitou em seu desenvolvimento como alfabetizadora. Ela desenvolve um trabalho com a língua portuguesa de forma mais pausada e focaliza os gêneros literários, principalmente em trabalho com quadrinhas. Ela expressou formas de "ser alfabetizadora", que assumiu em sua trajetória, ao afirmar sua atitude de escuta para com seus alunos e quando afirmou que "não deixa quebrar a magia" em sala de aula. A alfabetizadora leva em conta os interesses das crianças e valoriza uma postura afetiva nas relações que estabelece com os alunos, tratando-os como "meu filho", "querido". Percebeu-se, sobretudo, que ela leva em conta os interesses dos seus alunos ao alfabetizá-los.
Nas aulas da professora Ida, observou-se sua percepção sobre a importância dos outros na sua formação, e o quanto ela aprendeu com as professoras mais experientes e pedagogas. Ela referiu-se à importância dos momentos da formação continuada que lhe trouxeram aportes teóricos e quando as atividades ministradas previam interlocuções entre pares. A professora Ida apresentou um discurso sobre a refração das vozes sociais, que focalizam a necessidade da interlocução entre os próprios alunos, o que a leva a propor atividades em grupos e em duplas, possibilitando um trabalho permeado pela interação verbal entre os alunos, o que ela tem buscado propor entre as professoras alfabetizadoras. Sua visão sobre a importância das interações na alfabetização a levaram, por exemplo, à construção de jogos alfabéticos coletivos. Em suas atividades, há produção de gráficos, tabelas, dramatizações, dobraduras com os alunos. Nesses processos de interação significativos, a professora promove também a escuta de seus alunos, observando a promoção de relações que tem facilitado as suas compreensões na alfabetização.
Ao analisar os exemplos apresentados, percebeu-se como e quanto as experiências das professoras alfabetizadoras com a linguagem, em seus processos de interlocução, têm sido fundamentais para suas compreensões e seus discursos. Elas apresentaram posições e interpretações sobre os processos de alfabetização com clareza, principalmente quando observadas no seu oficio, e centradas em significativas experiências, de forma dialógica e responsiva. Os momentos dialógicos valorizados em suas enunciações são fundamentais na sua formação e na construção da docência como alfabetizadoras.
A construção das compreensões das professoras pesquisadas, demonstradas a partir de suas enunciações sobre os processos vividos na formação continuada ofertada pela SMED de Araucária, levou a identificar, nas análises da pesquisa, os processos de responsividade e dialogicidade sobre o ser professor alfabetizador ao constituir/construir sua função social e profissional como alfabetizadoras. Em contexto de mudança e de novas propostas de alfabetização, as alfabetizadoras encontravam-se diante de novas necessidades de compreensão sobre sua função social e com relação a um trabalho mais significativo com a língua materna, que leve os alunos ao letramento.
Na análise dos processos de dialogicidade e responsividade das alfabetizadoras, verificou-se que essas possibilidades não se concretizam sem as trocas entre participantes e a interlocução com professores formadores, durante os estudos e as atividades dos processos formativos. Na mediação com outros profissionais e com suas diferentes trajetórias, a relação dialética entre as permanências e as mudanças nas aquisições da língua levaram a constatar aprendizagens anteriores da profissão, a construção, a consolidação e o redimensionamento dos processos de alfabetização em busca do letramento. Assim, as compreensões que daí decorreram, sobre as formas de desenvolvimento de práticas, atitudes e mediações necessárias ao desenvolvimento das aquisições de alfabetização e letramento, mostraram avanços e a busca de novas formas de vivência ao participar deste tempo/espaço de formação.
No entendimento da escrita como inserção dos indivíduos nas práticas sociais, reafirmou-se a necessidade do domínio da concepção de linguagem pelo professor como essencial aos encaminhamentos que promovem na alfabetização, como compreensões sobre as formas de aprendizagem da leitura e da escrita a partir da realidade dos alunos e de suas necessidades ao aprender a ler, a escrever e a empregar essas aquisições nas suas relações sociais. No percurso profissional da alfabetização, a formação continuada (cursos, palestras, oficinas, estudos, especializações, entre outros) tem constituído uma das possibilidades de aquisição para as compreensões e para os domínios da complexa tarefa de alfabetizar, sobretudo, no sentido do letramento.
Os discursos e as respostas apresentados pelas alfabetizadoras enaltecem as vozes sociais que cada uma constitui e, delas, faz emergir qual e o que é mais evidente no seu trabalho em sala de aula, com os interlocutores reais, que são seus alunos. A formação continuada, dessa forma, demanda uma organização de atividades e relações a serem encaradas como tomada de consciência sobre os reais objetivos do processo de alfabetizar/letrar.
Nos exemplos selecionados, a compreensão sobre a concepção de língua foi essencial ao analisar as compreensões das professoras alfabetizadoras, pois é pela linguagem que o sujeito se constrói e se constitui, sendo na interação verbal, como afirmou Bakhtin (2011), que as relações dialógicas fluem com maior veracidade e consciência. Verificou-se que, no cruzamento dos discursos enunciados pelas professoras alfabetizadoras, a formação continuada constitui um dos tempos e espaços privilegiados, no qual poderão concentrar todas as esferas que agregam os processos de construção da função da alfabetização: a contextualização, os saberes, as experiências, os conhecimentos e as inter-relações que emergem dessa relação intrínseca do mediar e do alfabetizar.
A referência a momentos e/ou gestões anteriores que ofereceram maior dialogicidade e trocas entre participantes, bem como as atividades que instigam as professoras a questionamentos, à busca de compreensões e direções conscientes sobre o alfabetizar, do ponto de vista pedagógico e social, pressupõe redimensionamentos de estratégias alfabetizadoras e um "ir além" do que já dominam. Isso indica aos organizadores dos cursos ofertados atualmente na rede de ensino de Araucária revisões nessas perspectivas e maior interlocução com as alfabetizadoras.
Como um empreendimento de estudo e pesquisa sobre o conhecimento para a formação continuada de professores alfabetizadores, foi possível entender os processos de alfabetização e letramento a partir do enfoque bakhtiniano enunciativo, dialógico e responsivo, que propicia a possibilidade de identificar e constituir uma epistemologia própria da constituição da profissão dos alfabetizadores. Essa forma de desenvolvimento profissional torna-se condição fundamental para a formação continuada na rede municipal de Araucária.
Essas alfabetizadoras, ao expressarem enunciados, formas de interação com o outro e estilos próprios em suas práticas, tornaram-se únicas, como profissionais que constroem coletivamente a alfabetização na Rede Municipal de Araucária, pois expressaram apropriações significativas, interações e ações em suas práticas, em função dos sujeitos e dos contextos reais nos quais atuam.
