Resumo: O Projeto Tuning inicialmente surgiu na Europa no contexto de reforma da Educação Superior Europeia materializado no Tratado de Bolonha em 1999. O presente trabalho de caráter exploratório discute o itinerário do Tuning no Espaço europeu e provoca algumas pontuações para reflexão sobre seu delineamento na e para as demandas do mercado, a saber: referência no estabelecimento da escala europeia de competências genéricas e especificas para formação do estudante europeu conforme suas áreas temáticas, uma metodologia de trabalho a partir dos sistema ECTS e a função da aprendizagem, docência, avaliação e rendimento em relação a garantia da qualidade. O artigo conclui que a projeção do Tuning em menor ou maior prazos, consideradas as premissas da ordem democrática e grau de autonomia das universidades, se tornará com menos legitimação se não colocar na agenda de discussões as demandas e expectativas dos cidadãos para além das solicitações do mercado.
Palavras-chave:Projeto Tuning Europeu Processo de Bolonha. Educação superior.Projeto Tuning Europeu Processo de Bolonha. Educação superior..
Abstract: The Tuning Project initially appeared in Europe in the context of the reform of European Higher Education embodied in the Treaty of Bologna in 1999. This exploratory work discusses the Tuning itinerary in the European Space and causes some scores for reflection on its design in and for the market demands, like: european scale of generic and specific competences for the training of european students according to their thematic areas, a working methodology based on the ECTS system and the function of learning, teaching, assessment and quality assurance. The article concludes that the Tuning projection in shorter or longer periods, considered the premises of the democratic order and degree of autonomy of the universities, will become less legitimized if it does not place in the agenda of discussions the demands and expectations of the citizens beyond the requests of the marketplace.
Keywords: European Tuning Project Process of Bologna. Higher education..
Resumen: El Proyecto Tuning inicialmente surgió en Europa en el contexto de la reforma de la Educación Superior Europea materializada en el Tratado de Bolonia en 1999. El presente trabajo de carácter exploratorio discute el itinerario del Tuning en el Espacio Europeo y provoca algunas puntuaciones para reflexionar sobre su delineamiento en y para las demandas del mercado, a saber: referencia en el establecimiento de la escala europea de competencias genéricas y específicas para la formación del estudiante europeo conforme a sus áreas temáticas, una metodología de trabajo a partir del sistema ECTS y la función del aprendizaje, docencia, evaluación y rendimiento en relación La garantía de la calidad. El artículo concluye que la proyección del Tuning en menor o mayor plazo, consideradas las premisas del orden democrático y grado de autonomía de las universidades, se tornará con menos legitimación si no se pone en la agenda de discusiones las demandas y expectativas de los ciudadanos más allá de las solicitudes del mercado.
Palabras clave: Proyecto Tuning Europeo Proceso de Bolonia. Educación universitária..
Dossiê Temático
Projeto Tuning europeu para a educação superior: reflexões sobre o seu delineamento
European tuning project for higher education: reflections on its design
Proyecto Tuning europeo para la educación superior: reflexiones sobre su delineamiento

Recepção: 10 Junho 2017
Aprovação: 10 Agosto 2017
A convergência do ensino superior tanto em países do bloco europeu quanto Latino-americanos, dentre outros, guiados pelas forças da globalização e suas exigências tem se tornado cada vez mais crescente na definição e efetivação de tarefas acerca da formação de mão-de-obra relacionadas ao atendimento de demandas laborais. Em um estudo sobre os diferentes papéis, propósitos e resultados dos modelos nacionais e regionais de educação, Dale (2009) problematiza tanto a anuência dos países latino-americanos quanto à orientação política, técnico-pedagógica para a educação superior quanto à pronta disposição da União Europeia em não somente “compartilhar” o seu modelo instrumental, mas robustecer tais encaminhamentos por meio de investimentos que garantam a consolidação do Projeto Alfa Tuning.
O modelo regional de educação superior europeu parece ter transcendido suas fronteiras, mesmo para regiões que tradicionalmente se distanciam de realidades econômicas tidas como consolidadas como a daquele Continente. Uma das razões que poderiam explicar isso é a instabilidade das economias nacionais que buscam não somente mais mercado, mas a difusão de um ideário que garanta a superação da ideia de bloco regional por meio de suportes que possam fortalecê-los. Igual ao caso da exportação do modelo de educação superior europeu como projeto geopolítico, batizado como Projeto Tuning Europeu que se estendeu a América Latina.
A esse respeito às recomendações depreendidas dos organismos internacionais como Banco Mundial e Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (BM e OCDE), tem ressaltado que os sistemas de educação superior para se adaptar às exigências impostas pelo mercado tendem a colocar as universidades a serviço das empresas e o papel e o exercício funcional social delas passam a ganhar questionamentos fazendo fluir novas propostas para orientar esse nível de ensino em Estados-nação (MAUÉS, 2010).
Na leitura do quadro até agora exposto, como apontam Eiró e Catani (2011) não há dúvidas de que os projetos Tuning (Europeu e Latino Americano) têm como foco prioritário a formação de uma tipologia de profissional para o mercado de trabalho, enquanto desenvolvimento de suas ações esquematizarem convergências curriculares em algumas áreas do conhecimento não só na Europa, mas também seus esforços foram estendidos a América Latina ganhando financiamento daquele Continente. Isto quer dizer que trata-se de uma expansão do modelo europeu para além dos blocos regionais. Esse texto tem como objetivo contextualizar o Projeto Tuning na Europa, sua trajetória, planejamento, inserção e recorte de áreas temáticas priorizadas para a educação superior na América Latina, ao mesmo tempo em que explicita algumas problematizações recorrentes do objeto.
Originado da assinatura e publicação dos ministros de educação da Alemanha, França, Itália e Inglaterra e da Declaração de Sorbonne, em 1998, por 29 (vinte e nove) países europeus em 1999, o Tratado de Bolonha caracteriza-se como um movimento de reforma da educação superior europeia. O Tratado de Bolonha surgiu com vistas a criar um Espaço Europeu de Ensino Superior tendo por pressupostos a coesão, competitividade e atração de docentes e alunos de países europeus que possibilitasse maior mobilidade e oferta de emprego entre seus signatários. A partir da implementação de Programas e Projetos desencadeadores de interesses e currículos comuns originou-se o Projeto Tuning no continente europeu1, estendido posteriormente ao Continente Latino Americano2. O eixo transversal do projeto centrou-se desde a sua formulação no estabelecimento e implementação de competências curriculares no contexto de reforma do Tratado de Bolonha.
Enquanto “versão inovadora” dos sistemas de ensino superior, teve como pressuposto a unificação dos sistemas de ensino superior no continente. Sendo introduzidas na extensão político-territorial do continente, a criação de diversos órgãos reguladores teve por papel a operacionalização de ações políticas em nível supranacional e que se deu como antecipação ao Tratado de Bolonha, como segue. A Comissão Europeia, por exemplo, foi criada em 1984, da rede dos Centros Nacionais de Informação sobre Reconhecimento Acadêmico (National Academic Recognition Information – NARIC), que teve por responsabilidade providenciar e disponibilizar informações sobre reconhecimento de diplomas, certificados e títulos, instituições e sistemas de ensino no continente (ENIC-NARIC, 2013). Os centros foram designados pelos Ministérios da Educação dos países partes como responsáveis pela emissão de declarações comprobatórias nos respectivos níveis de qualificações dos países, o que produziram informativos sobre profissões regulamentadas nos Estados da União Europeia, e a promoção e acompanhamento da aplicação da Convenção sobre Reconhecimento das Qualificações de ensino superior. Em vigência a Convenção de Lisboa, desde 1997 (ENIC-NARIC, 2013).
Em 1984 publica-se para a área da educação superior uma Resolução sobre o ensino superior e o desenvolvimento da cooperação universitária na Comunidade Europeia e a Resolução sobre o reconhecimento acadêmico de diplomas e de períodos de estudo (COMUNIDADE ECONÔMICA EUROPEIA, 1987). Deixando claras as primeiras iniciativas de reconhecimento acadêmico de diplomas nos países da Europa. Interessante ressaltar que o Sistema Europeu de Transferência de Créditos – ECTS, originado no ano de 1989 com a chancela da Comissão Europeia, formado por 145 IES constituiu-se em um recurso que possibilitou a comparação de períodos de estudos acadêmicos nas diferentes universidades e países europeus. Facilitando o reconhecimento de estudos feitos no exterior. Oferecendo ainda, transparência na descrição de atividades acadêmicas e o estabelecimento de conexões nos distintos sistemas e estruturas de ensino superior na região (COMISSÃO EUROPEIA, 2013).
A educação superior passa a assumir no momento da fundação da Universidade Moderna no século XIX (Humboldt), um ensino alinhado à produção do conhecimento, o que incide fortes questionamentos. Dias Sobrinho (2005) expõe a existência de uma crise na Universidade no tocante ao seu princípio, ao considerar o contexto que esta estava inserida, tendo por representantes a sociedade globalizada, informatizada passa a sofrer crise textual e existencial afligindo sua formação de profissionais e pesquisadores éticos (MAUÉS, 2010).
Em 1990 o Conselho Europeu ao publicar a Convenção Europeia sobre Equivalência Geral de Períodos de Estudos Universitários estabelece períodos de estudos realizados em instituição de ensino superior de um país, noutro Estado-membro equivalente a seu período. A finalidade desse encaminhamento foi a de fazer florescer acordos prévios entre as instituições de ensino. Pela necessidade do estabelecimento de diretrizes e estruturas a processos políticos e burocráticos na região, no ano de 1992 surge a União Europeia. Na sua criação, a União deu origem a várias entidades como: o Conselho da União Europeia, Parlamento Europeu, Conselho Europeu, Conselho da União Europeia, Comissão Europeia, Tribunal de Justiça da União Europeia, Tribunal de Contas e o Banco Central Europeu. Em destaque o Conselho da União Europeia, o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia por serem três entidades que representam as principais instâncias que determinam as políticas na UE. Todas as decisões a nível continental tem que passar pelos três órgãos para fins de aplicabilidade (SIEBIGER, 2013).
O Tratado de Bolonha surge “afinado” a acordos consolidados por diversos países europeus em 1999 na Itália, cidade de Bolonha, abrindo espaço à transferência de créditos acadêmicos, e tendo como propulsão o aumento da competitividade europeia no contexto mundial, evidenciando para área da educação, novas propostas de ensino, que sofre uma disputa de interesses sob a lógica burocrática estatal que parece reforçar seu controle institucional sobre a sociedade ao ter autonomia no estabelecimento de políticas frente à demanda existente, resultante do controle que exerce de enclausurar as decisões públicas, marcando seu grau de percepção e influencia na realidade, em que dependendo da história consolidada de cada Estado, reforça sua autoridade, poder político e capacidade de agir sobre os interesses em cogitação, em que os poderes políticos dos grupos interessados e das classes diretamente envolvidas dependem das estruturas e capacidades do Estado e adquirindo realce somente com uma avaliação criteriosa em especifico da autonomia de uma nação, que pode definir o grau de influência e poder político que cada Estado possui.
Parece florescer um perfil ambíguo de educação superior, guiada por discrepâncias ideológicas, oriundas de distintos interesses dos atores envolvidos nesses processos e também das instâncias que promovem fenômenos não somente nos domínios do continente em questão, mas enraizados nos alicerces de contextos de reformas em várias regiões no mundo. Assim, para o império capitalista, a universidade adquire enorme importância, pois na ótica economicista, tudo acaba se transformando em capital (capital humano, intelectual, político, etc.). Num olhar banco-mundialista, existe uma grande tendência na atualidade de serem construídos “mercado mundial de capital humano de alto nível” (DIAS SOBRINHO, 2005, p. 123).
Para fins de esclarecimento, levamos em consideração uma breve descrição da relação entre o Estado e a universidade, na constituição dos Estados-nação europeia, no início do século XIX no Continente, fundamentais para mudanças de caráter dos sistemas educacionais ao longo dos anos – que num passado privadas, passaram à incumbência do Estado tendo enquanto principal missão a formação de profissionais para a era industrial (HORTALE; MORA, 2004, p. 939), no que fora estabelecido três principais modelos:
1) Humboldtiano (Alemanha), considerou a pesquisa como o objetivo primeiro da universidade, convertendo as instituições universitárias existentes em centros de desenvolvimento cientifico sobre os cuidados do Estado;
2) Napoleônico (França), criada como serviço estatal para satisfazer a necessidade de formar funcionários públicos e impulsionar o desenvolvimento econômico da nação por intermédio do estabelecimento de uma “elite necessária” ao funcionalismo Estatal;
3) Anglo-saxão (Reino Unido), concebe universidade, como instituições públicas, e seu acesso, porém, privadas num ponto de vista jurídico.
Voltando ao fim da década de 90, período de crescente movimento de reforma da educação superior na Europa, buscando harmonizar a estrutura de diferentes modelos universitários no estabelecimento de simetrias com os sistemas de educação superior de outros continentes é viável notar que a construção de um Espaço Europeu de Educação Superior (EEES), por intermédio de Bolonha, não se iniciou a partir das declarações de Sorbonne3(1998) e Bolonha (1999), fundaram-se muito antes, por volta de meio século – desde as ações iniciais de reconstrução da Europa pós a segunda guerra mundial e suas políticas de unificação econômica, e educacional (HORTALE; MORA, 2004).
No ano de 1992 o Tratado de Maastricht4, deixa evidente alguns pressupostos à unificação dos Sistemas, ao dispor de elementos constantes de convenções e outros expedientes. Em que fazem presentes nos artigos que ressaltam sobre a educação. Em destaque o Art. 126 que trata sobre o incentivo a mobilidade estudantil, aprendizado de línguas estrangeiras, reconhecimento de diplomas, períodos de estudo, cooperação entre IES e intercambio de informação sobre programas, e sistemas de ensino superior. E o Art. 127 que indica a prioridade à educação voltada para o setor laboral, muito evidenciada na região. Na sua extensão territorial, Bolonha pode ser considerada uma reforma que detém um conjunto de medidas supranacionais, transcendendo os limites da UE, ao conduzir seus países partes a conjecturar juridicamente em suas respectivas legislações nacionais, decisões asseguradas nas conferencias ministeriais.
Visto à nova configuração da Universidade, o trabalho dos profissionais que atuam nela, com destaque ao corpo docente, vem sofrendo mudanças significativas, alinhando-se a essa configuração heterônoma, suas identidades modificam e criam uma nova cultura acadêmica. Sendo exercitados em suas esferas de atuação valores capitalistas e mercantis (MAUÉS, 2010).
Tem prevalecido o entendimento que a configuração de novos perfis profissionais e novos modelos de formação nas últimas décadas na medida em que o paradigma da produção capitalista avança resumem-se em seu formado dois aspectos a polivalência e a flexibilidade. Características essas destinadas aos trabalhos de todos os ramos e atividades, incluindo, inclusive a identificação de habilidades cognitivas e de competências sociais que requerem no exercício das distintas profissões. Visando um repensar dos perfis profissionais e dos programas de formação, qualificação e requalificação das mais distintas instituições de formação de sujeitos. Implica “na necessidade de uma melhor qualificação da força de trabalho e identifica, também, um dos paradoxos do modelo de acumulação flexível, que quanto mais se simplificam as tarefas, mais conhecimento se exige do trabalhador” decorrência disso é o aumento do processo escolar dos sujeitos, levando-os a uma formação permanente. Indicando que tais exigências geram consequências para a função escolar, como principal figura nesse processo a do professor, agente protagonista no processo formativo (CASTRO, 2005, p. 04).
Nesse sentido, outro aspecto importante a destacar é que a reforma não circunscreveu aos países que pertenciam a UE. A quantidade de Estados participantes do Processo excedeu o conjunto de seus países, considerando sua projeção de atingir um espaço político-territorial que ultrapassasse os limites fronteiriços.
Bolonha baseou-se em pressupostos da Declaração de Sorbonne, produzida no ano anterior, destacando a necessidade da criação de uma Área Europeia de Educação Superior (AEES): como desafio o estabelecimento de maior compatibilidade e comparabilidade entre os sistemas de ensino superior nos Estados-nação, e o aumento da competitividade no novo Sistema de ensino superior, enraizado em ideais de atratividade proporcionados pela tradição cultural e cientifica que a Europa apregoava, estendendo posteriormente a outros países inclusive de outros Continentes. Como princípios fundamentais expressos na Magna Charta Universitarum5 em 1988, destacam-se os seis principais (e primeiros) objetivos da reforma, na formulação da Área Europeia de Educação Superior (AEES):
· Adoção de um sistema compreendendo graus acadêmicos de fácil equivalência, concedendo também facilidade para implementação do Suplemento de Diploma;
· Estabelecimento de um sistema assentado em duas fases (ciclos) pré-licenciatura e pós-licenciatura, em que a primeira teria duração de, no mínimo 3 anos, oferecendo incluso um grau de habilitações apropriadas para ingresso no mercado de trabalho na Europa. Numa segunda fase seria equivalente aos graus de mestre e/ou doutor;
· Criação de um sistema de créditos, análogo ao ECTS, motivando a mobilidade de estudantes e o reconhecimento de estudos de maneira inclusiva até mesmo em nível de ensino não superior, no entanto, devendo ser reconhecidos pelas IES;
· Estimulação a mobilidade de estudantes, através do acesso a oportunidades de estudo e estágios, a professores, pesquisadores, pessoal técnico administrativo, reconhecendo os períodos consagrados às ações europeias letivas, de pesquisa e formação, sem ônus nos seus direitos estatutários;
· Incitação da cooperação europeia na garantia de qualidade por intermédio do desenvolvimento de critérios e metodologias comparáveis;
· E por fim tornar público a dimensão europeia de ensino superior quanto ao desenvolvimento curricular, cooperação entre instituições, circulação de pessoas e a promoção de programas integrados de estudos, além de estágios e pesquisas na região.
As próprias políticas na União Europeia acabam solicitando, (mesmo que não obriga a solicitação de adesão direta a todos os países do Continente) o alcance dos textos normativos de perímetro supranacional de ampliação das relações entre a União Europeia e outros países europeus. Enseja maior resistência ás dimensões culturais, intelectual, social, tecnológica e cientifica, baseando para alcança-los à diversidade cultural existente, de línguas, sistemas de ensino superior nacionais e autonomias institucionais dos países. Em destaque a Convenção de Lisboa6, na qual, em suma, o teor da reforma passa a alcançar alterações nas legislações dos Estados do Continente.
No que tange à construção de um espaço europeu de educação superior, mesmo que haja publicações de documentos dos organismos europeus, como a Organização Mundial do Comercio (OMC), por meio de GATS (Acordo Geral sobre Comércio de Serviços), que motivaram a configuração transnacionalizada da educação universitária em movimentos reformistas (AZEVEDO, 2007, p. 141). A UNESCO dá-se maior importância à internacionalização solidaria da educação superior. Abrindo assinatura aos Estados-membros do Conselho da Europa em 1997, na Convenção sobre o Reconhecimento das Qualificações Relativas ao Ensino Superior na Europa ao formular as diretrizes necessárias de acesso ao ensino superior.
Quanto a períodos de estudo no ensino superior, no contexto de reforma, atores políticos influenciados pelo Relatório da Comissão Pour un modèle européen d’enseignement supérieur, presidida por Jacques Attali, que recomendou a fórmula 3/5/8, isto é, a formação em nível superior com duração de três anos para a graduação (licenciatura), dois anos para o mestrado e três anos para o doutorado (3+2+3). Estabeleceram que:
Não se pode ter a livre circulação de mercadorias, de capitais, de pessoas, de ideias (...), e manter uma situação em que não é mesmo possível comparar o valor dos diplomas expedidos pelas universidades dos países membros da União Européia (...). Não se pode ter a Europa do emprego sem a Europa da Educação. Sem uniformizar seus sistemas, os países da Europa deverão decidir a respeito de uma certa harmonização dos cursos e dos diplomas e definir um modelo europeu específico, nem burocrático nem submetido ao mercado (ATTALI, 1998, p. 18-19).
Passa-se a exigir dos Ministros europeus de educação, a formulação dos seguintes passos para atingir tais resultados, (numa reunião) na Universidade de Bolonha:
· Adoção de um sistema de educação superior com normas claras (fácil compreensão) em que os cursos de graduação possam ser comparados entre si;
· Adoção de um sistema baseado em dois ciclos (graduação e pós-graduação);
· Estabelecimento de um sistema de créditos;
· Promoção da mobilidade de estudantes, docentes, pesquisadores e pessoal técnico administrativo;
· Cooperação na avaliação para a garantia da qualidade;
· Promoção da dimensão europeia do ensino superior.
· Posteriormente na reunião de Praga, em 2001, da pasta educacional, como resultado tiveram que acrescentar (além dos itens anteriores) mais três objetivos:
· Aprendizagem permanente (educação ao longo da vida);
· Esforço para que haja maior envolvimento dos estudantes nas Instituições de educação superior;
· Promoção do Espaço Europeu de Ensino Superior.
Também se ratificou o conceito de créditos ECTS (European Credits Transfer Sistem - Sistema Europeu de Transferência e Acumulação de Créditos), que originalmente constava no programa europeu de intercâmbio de estudantes universitários Erasmus-Sócrates. Realizado por mais de um milhão de alunos europeus - o ECTS pode ser considerado um sistema de equivalências e reconhecimento dos cursos que estudantes realizassem nos países europeus (AZEVEDO, 2007, p. 135). Contemporaneamente o ECTS é parâmetro para definição inclusive dos próprios currículos, o que vem rendendo muitas críticas no condicionamento das atividades acadêmicas a uma forma padronizada, implicando em mudanças de concepção dessas atividades também na docência.

Importante destacar que preocupações sobre o reconhecimento de títulos na finalidade de facilitar a mobilidade vem de contextos de reformas antecessores a Bolonha, isto é, desde 1953 quando da expedição da Convenção sobre o reconhecimento de diplomas a fim de acesso à universidade, a mobilidade é pensada tanto num ponto de vista acadêmico como profissional (SIEBIGER, 2013). E as medidas consequentes disso, vieram num sentido de reforço, aprofundamento e especificação de sua natureza, bem como suas formas de realização.
A mobilidade ao estar diretamente relacionada às questões acadêmicas como no contexto de Bolonha de alinhar suas atividades curriculares as demandas de emprego e acesso ao mercado de trabalho, essas imprescindíveis aos pressupostos de integração econômica na fundação de um mercado comum para os europeus, implicando além da circulação de bens, produtos e serviços, a circulação de sujeitos qualificados, influenciam a formulação de políticas de unificação dos sistemas educativos europeus. Em 1999 a Declaração de Bolonha7 funda o que se chama “Processo de Bolonha”, subscrita por ministros da educação das nações envolvidas na Europa como objetivo a fundação de uma “Área Europeia de Ensino Superior”, procurou reformar o sistema educacional superior na Europa. No prazo de 10 anos, tinha como objetivo realizar a estruturação de um sistema de grau reconhecível e comparável para mobilidade de estudantes, pesquisadores e docentes, no estabelecimento do EEES.
Sendo definidos na Declaração de Bolonha que para o acompanhamento dos processos reformistas, os estados signatários deveriam realizar reuniões ministeriais a cada dois anos (Comunicado emitido motivado pelas cinco Conferencia dos Ministros de Educação). Sendo os documentos originados das reuniões apresentadas a seguir, fundamentais para sustentação das declarações dos países partes, acontecidas em Praga (2001), Berlim (2003), Bergen (2005), Londres (2007) e Leuven/Louvain-la-Neuve (2009). Ainda por último de Budapeste-Viena (2010), emitida em Conferência comemorativa a Área Europeia de Educação Superior (AEES).
Destaca Dias Sobrinho (2005, p. 186) que o que ganha força nas declarações (antecedentes do Processo de Bolonha) não é o sentido comercial, sim o propósito de consolidação de amplos processos interativos no agrupamento de medidas científicas, pedagógicas, culturais e globais na educação superior. Desta maneira a educação superior “[...] estaria efetivamente enriquecendo a cidadania europeia e aprofundando a consciência de que todos os europeus compartilham valores e pertencem a espaços culturais e sociais comuns [...]”. Entretanto, na realidade muitas das vezes não prevalecem os princípios democráticos e participativos. Não se tratando “[...] só de cooperação, mas também de uma forte competição, como costuma ocorrer nos âmbitos regidos pela lógica de mercado [...]”. Dando origem, a um receio ligado especialmente a mercantilização da educação superior transnacionalizada, podendo ficar regulada por (GATS)8, diretamente guiada pelas forças da (OMC)9 no que perpetuaria as forças do mercantilismo na educação. Detalhando desta maneira, a capacidade que a burocracia tem de formular e “programar” politicas, mesmo que necessite de auxilio de entidades internacionais (com poderes privilegiados sobre decisões públicas).
Entendendo os contextos de reformas educacionais superiores enquanto contextos políticos. Draibe (2001) destaca que política é o resultado de elaboração de políticas, sendo seu efeito cumulativo em ações, decisões e comportamentos de atores que fazem e “programam” uma política pública. Estudos de políticas públicas acontecem por meio de um processo de interação complexo regido pela variedade de organizações, privadas e/ou públicas, em seus contextos como esses entes se relacionam e implementam-nas. Partindo-se do pressuposto que as políticas da educação superior nas mais distintas regiões do mundo estão diretamente ligadas e consequentemente influenciadas historicamente por organismos internacionais. Infere-se que estas carregam ideologias capitalistas sabendo da natureza política de organismos internacionais no cenário educacional mundial nas últimas décadas.
A Declaração de Bolonha num primeiro momento como integrantes teve a Alemanha, Áustria, Bélgica (comunidades flamenga e francófona), Bulgária, Dinamarca, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hungria, Islândia, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Noruega, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Eslovaca, República Tcheca, Romênia, Suécia e Suíça. As finalidades principais referentes à atratividade, emprego, mobilidade, comparação dos sistemas, mercado de trabalho, parecem difusas dentre os elementos que guiam o processo. Isso leva a crer que na maioria das vezes, transformam expressões e terminologias repetitivas em sentenças que solicita algumas ações a nível supranacional (DECLARAÇÃO DE BOLONHA, 1999).
O discurso desencadeado em torno de Bolonha foi identificar um elemento central na reforma. Esse guiado a necessária recuperação econômica da Europa e do estabelecimento de sua competitividade, tanto em âmbitos regionais quanto intercontinentais. Quanto especificamente à reforma do processo de Bolonha, seus elementos (objetivos, medidas, recursos, ferramentas, dentre outros) são questões pontuais que juntas sendo ressignificadas e novamente organizadas como política de educação superior sofrem ordenamentos supranacionais.
Tentativas de integração regional da educação superior historicamente se originaram por várias motivações no mundo. Ao possuir elementos de motivação próprias cada uma delas, umas diferentes das outras, independente de quaisquer resultados iniciais pode-se considerar que a integração regional como forma de cooperação entre Estados ocasionou a necessidade de adaptação dos países às mudanças e possibilitou o estabelecimento de objetivos comuns à composição de normas e estruturas, em acordos. Facilitando a criação de consensos entre atores políticos, na promoção de maior intercâmbio de informações (MATLARY, 1994).
Nesse sentido, Bolonha visando dar origem a um espaço europeu de educação superior integrado e competitivo requereu um movimento em direção a convergências dos sistemas de educação superior. Para ganhar tal desempenho teria que ser um sistema, sujeito às mesmas orientações, regras que favoreceriam a competição interna entre os países signatários, segundo critérios comuns comparáveis entre eles. Assim, um mercado competitivo de educação superior precisaria de regulação relativa à fundação de “regras do jogo competitivo e inclusão de instâncias competidoras, da estrutura comum dos serviços a prestar, dos critérios de avaliação da sua qualidade e da informação a prestar aos consumidores” no Continente (LIMA et. al., 2008, p. 14).
Enquanto objetivo fundamental - ações em consenso acordadas pelos países partes encetaram nalgumas diretrizes: competitividade do Sistema Europeu de ensino superior na região, mobilidade e emprego, na busca de harmonizar seus sistemas universitários. De maneira que pudessem equiparar graus, diplomas, títulos universitários, currículos acadêmicos, e programas de formação continuada em todos seus Estados “Convencidos de que o estabelecimento do Espaço Europeu de Educação Superior exigia constante apoio, supervisão e adaptação às necessidades em constante evolução” (BOLONHA DECLARATION, 1999).
Ao sofrerem as primeiras iniciativas de convergência para fazer a harmonização dos sistemas em escala regional deixa “evidentes que esses setores nacionais e regionais de educação superior se tornaram mais estreitamente interligados no sistema global” que parece ter influenciado as iniciativas regionais e consequentemente as nacionais. Ainda que “a natureza e a consequência dessas relações variem em função das suas diferentes histórias, tamanho e forma das suas economias, dos interesses geopolíticos, dos arranjos políticos internos, da natureza específica do setor de educação superior” (ROBERTSON, 2009, p. 415).
Buscando formar o espaço econômico mais dinâmico e competitivo do mundo na contemporaneidade, o processo de Bolonha se alinhou a Agenda de Lisboa no ano 2000, tendo por objetivos até 2010, com base num conhecimento que poderia garantir crescimento econômico sustentável e acesso a empregos com inclusão social na região, nos seguintes objetivos. Pela Declaração de Bolonha, os objetivos buscados para 2010 pelos ministros da educação europeus foram os seguintes:
· Adoção de um sistema de graus de acessível leitura e comparação, também pela implementação do Suplemento ao Diploma, para promover entre os cidadãos europeus a empregabilidade e a competitividade internacional do sistema europeu do Ensino Superior;
· Adoção de um sistema essencialmente baseado em dois ciclos principais, o graduado e o pós-graduado. O acesso ao segundo ciclo vai requerer o termo com êxito dos estudos do primeiro ciclo, com a duração mínima de três anos. O grau conferido, após o primeiro ciclo, será também relevante para o mercado europeu do trabalho como nível apropriado de qualificação. O segundo ciclo deverá conduzir aos graus de mestre e/ou doutor como acontece em muitos países europeus;
· Estabelecimento de um sistema de créditos – como, por exemplo, no sistema ECTS – como um correto meio para promover a mobilidade mais alargada dos estudantes. Os créditos podem também ser adquiridos em contextos de ensino não superior, incluindo a aprendizagem ao longo da vida, desde que sejam reconhecidos pelas respectivas Universidades de acolhimento;
· Promoção da mobilidade, ultrapassando obstáculos ao efetivo exercício da livre mobilidade, com particular atenção: aos estudantes, no acesso às oportunidades de estudo e formação, bem como a serviços correlativos; aos professores, investigadores e pessoal administrativo, no reconhecimento e na valorização dos períodos passados num contexto europeu de investigação, de ensino e de formação, sem prejuízo dos seus direitos estatutários;
· Promoção da cooperação europeia na avaliação da qualidade, com vista a desenvolver critérios e metodologias comparáveis;
· Promoção das necessárias dimensões europeias do Ensino Superior, especialmente no que respeita ao desenvolvimento curricular, à cooperação interinstitucional, aos esquemas da mobilidade e aos programas integrados de estudo, de formação e de investigação.
· Comprometemo-nos, por este meio, a alcançar estes objetivos – no quadro das nossas competências institucionais, guardando um completo respeito pela diversidade de culturas, línguas, sistemas nacionais de educação e da autonomia universitária – para consolidar o espaço europeu do Ensino Superior. Com esse fim, prosseguiremos o rumo da cooperação intergovernamental, em conjunto com o das organizações europeias não governamentais com competência no Ensino Superior. Espera-se que as universidades, mais uma vez, respondam pronta e positivamente e que contribuam ativamente para o êxito das nossas diligências. Na convicção de que o estabelecimento do espaço europeu do Ensino Superior requer constante apoio, vigilância e adaptação às necessidades contínuas que se vão desenvolvendo, decidimos voltar a reunir dentro de dois anos para avaliar a progressão conseguida bem como os novos passos a dar (DECLARAÇÃO DE BOLONHA, 1999).
Para “programar” o Processo, foram construídos grupos de trabalho nos ministérios e nas universidades. Em destaque um dos acontecimentos mais relevantes foi à reunião das universidades europeias, que aconteceu em Salamanca em 2001, supondo a concordância oficial das universidades ao processo de Bolonha que não foi um mero acordo, mas sim resultado de extensas e significativas discussões relativas aos princípios e objetivos da Declaração de Bolonha.
Alguns fatores parecem ter dificultado a concordância plena das universidades participantes, como sintetiza uma frase da Declaração de Salamanca que as universidades europeias aspiravam assumir a responsabilidade de atuar num contexto competitivo de educação superior requerendo maior independência na sua gestão, com um marco regulador mais flexível com mais financiamento e autonomia. Em resposta, as universidades aceitaram o novo marco, porém pedindo maior liberdade, levando em conta um dos maiores problemas das instituições de educação superior europeias. Desta vez de rigidez estrutural que as impediam de atuar num contexto de competição, carecendo de maior liberdade e flexibilidade em seus planejamentos, distribuição de recursos, contrato de recursos humanos, regras na seleção de corpo discente e definição de cursos.
Importante destacar que na órbita dessas mudanças, a concepção de Universidade e o papel dos professores sofrem alterações. Este último, precisa ser um empreendedor que poderá trazer recursos/dinheiro para a instituição em prol de desenvolver suas pesquisas, manter em funcionamento os departamentos, a Universidade num todo (MAUÉS, 2010). Duas organizações não governamentais podem ter dado maior contribuição (até os dias atuais) para o desencadeamento de propostas elaboradas entorno das conferencias ministeriais de Bolonha: Associação das Universidades Europeias (EUA) e a Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior (ENQA). A última originada no ano 2000, em consonância a ideia gerada no âmbito do projeto europeu de 1994 - Evaluating Quality in Higher Education, representando instituições singulares de ensino em 47 países, originada em Salamanca, em 2001, por intermédio da CRE - Associação das Universidades Europeias e da Confederação das Conferências de Reitores Europeus.
Ministros da Educação ao se reunirem em Praga deram origem ao comunicado de Praga10 para fazer análise do desenvolvimento do processo de Bolonha e decidir estratégias novas. Afirmando que decorridos dois anos de Bolonha e Praga teriam que serem feitas novas reuniões a cada dois anos da última reunião realizada. O “produto” desta reunião transpôs as expectativas, ao considerar que o grande volume das discussões, muitas por divergências de fundo em Praga (2001), significou a ratificação e concordância de governos e universidades em dar seguimento ao processo sem questionamentos a respeito da pertinência do mesmo.
Depois de Praga (2001) Hortale e Mora afirmam que associações profissionais e estudantes colaboraram para implementação de Bolonha, sendo produzidos numerosos projetos, entre eles relatórios e declarações das instituições envolvidas para próxima reunião dos ministros que aconteceu em Berlim no ano de 2003. Ao reunir-se em Graz antes de Berlin em 2003, a associação europeia de Universidades, numa declaração final reafirma o pleno apoio a Bolonha, porém, com alguns diferentes matizes. Declararam que as universidades deveriam continuar sendo responsabilidade pública, o que poderia diminuir efeitos da mercantilização do setor (HORTALE; MORA, 2004, p. 948).
As universidades insistiram na ideia de que a pesquisa deveria ser parte integrante da educação superior ao considerar o estreito vinculo da pesquisa com a aprendizagem. Apontaram críticas na oportunidade, ao formato de gestão e administração que as lideranças estavam assumindo na maneira de promover as qualidades institucionais. As universidades europeias ainda, por fim, seguindo tendências oriundas de alguns países, cobraram ali, iniciativas dos responsáveis pela acreditação dos cursos de graduação em que a qualidade deveria ser um processo interno. Seguindo a gama de reuniões no ano de 2005, decorridos seis anos da Declaração de Bolonha na Conferência de Bergen houve uma preocupação com a construção do panorama do EEES, que já se apresentava com resultados reais, relacionados à estrutura de currículos universitários11, garantia da qualidade12 do ensino e recognição dos títulos13. Enfoque maior dado ao período de 2003-2005.
Entre 2005 a 2007 das conferencias ocorridas surgiu uma importante iniciativa por parte da Comissão Europeia a Agenda de Modernização das Universidades. Nessa constatou-se que as universidades europeias não conseguiriam atingir resultados congruentes aos potenciais que carregavam, propondo-se linhas de ação no tocante as de Bolonha na eliminação de qualquer tipo de barreira entre as universidades europeias, qualificações comparáveis (reconhecíveis), implementação de currículos flexíveis, ligação entre a comunidade acadêmica com o setor laboral e melhoria da atratividade a nível global. Foi marco no ano 2007 a adoção do “Espaço Europeu do Ensino Superior no Cenário Global”, que suscita a verificação do Processo em outras regiões do mundo, bem como a aplicação dos princípios estabelecidos na Convenção de Lisboa a qualificações aprovadas em países terceiros.
Na Conferência de 200914, realizada em Leuven e Louvain-la-neuve, 28 e 29 de Abril, por tema “The Bologna Process 2020 – The European Higher Education Area in the new decade”, o foco foi dada a dimensão social associada ao objetivo de transformar a população estudantil – em atores representantes da população europeia em ações de inclusão de grupos sub-representados. Devendo ser levado em conta critério de idade, para inclusão de faixas populacionais com idade acima de 28-30 anos, a propósitos de aprendizagem (ao longo da vida).
Em 12 de março de 2010, aconteceu em Budapest e Viena, nova reunião buscando a elaboração de “instrumentos multidimensionais de transparência”, (último encontro realizado até o momento) gerando– uma Declaração; destacando discussões em torno das políticas para o ensino superior, tendo por objetivo o lançamento oficial do Espaço Europeu do Ensino Superior. Em suas metas constando a reafirmação dos princípios básicos do Processo de Bolonha, no que diz respeito à diversidade dos sistemas educativos, liberdade acadêmica, autonomia e responsabilidade pública das instituições. A configuração pública do ensino superior apoiada na promoção da democracia e coesão social, o preparo para a vida profissional, vida democrática, desenvolvimento pessoal, dentre outros atributos compôs o documento. Foram três as metas do processo de Bolonha: aumentar a competitividade, melhorar a adaptação ao mercado de trabalho e desenvolver a mobilidade. Cabe aqui evidenciar o significado dessas metas:
· Competitividade é sinônimo de atratividade em Bolonha, sendo meta melhorar a posição estratégica da Europa em nível mundial, que esta seja mais atrativa para os próprios europeus e comunidade internacional, por intermédio de uma política de visibilidade como condição para alcançar a evidente melhoria da qualidade;
· Tem-se como propósito ser mais relevantes os processos de ensino-aprendizagem voltados às exigências do mercado de trabalho, dando respostas também às novas demandas sociais e um sistema de avaliação pertinente às demandas requeridas;
· Meta de mobilidade interna e externa para estudantes, docentes e pessoal do administrativo. Seguindo dois pressupostos formar um mercado competidor para educação superior visando melhoraria da qualidade de IES, que seria necessário o desenvolvimento de cidadania europeia através de conhecimento de outros países e culturas. E exigindo em cada país que as estruturas fossem passíveis de comparação, tornando possível o processo de reconhecimento de cursos no estabelecimento de um modelo flexível de conhecimentos básicos e qualidades padronizadas entre as IES (HORTALE; MORA, 2004, p. 948).
Antunes (2005, p. 134), afirma que o Processo de Bolonha veio inaugurar uma fase e constituir uma modalidade inédita na regulação supranacional da educação, não apenas pelo amplo alcance geográfico, mas pela “configuração organizacional, baseada em conferências ministeriais” intergovernamentais e nas estruturas e grupos de seguimento não contínuos e minimamente burocratizados; concluindo por serem atores, formalmente exteriores (outras organizações internacionais ativas no ensino superior), os autênticos motores de todo o processo.
Em linhas gerais o Processo de Bolonha se estrutura num sistema de graus legível e comparável, buscando consolidar-se por intermédio de ciclos de aprendizagens via sistema de créditos, que dê condições a mobilidade de docentes e estudantes. E cooperação entre IES ao estabelecer similares padrões de qualidade. Promovendo atratividade na conquista do EEES e do Espaço Europeu de Investigação. Quanto à mobilidade por um lado pensada para fins acadêmicos e profissionais, por outro, na promoção de emprego diretamente relacionado às demandas do mercado de trabalho. Nessa linhagem, este atendimento as demandas laborais é a tônica que guia e orienta as políticas de mobilidade e emprego na Europa de Bolonha.
Para se compreender o estágio vigente de uma política, é interessante compreender o processo de elaboração da política. Sendo mais importante reconhecer esta guiada por elementos de equilíbrio, não dando mais ênfase para um de que outro aspecto no processo de elaboração da mesma (PALUMBO, 1989).
Ultimamente o que se percebe é a constituição de cenários políticos como são as reformas da educação superior que acabam desenvolvendo estratégias políticas que dá ênfase maior a interesses somente de um grupo em seu processo de elaboração. Para Hortale e Mora (2004), um dos maiores problemas da educação superior europeia está sendo a existência de um distanciamento com as demandas do novo mercado de trabalho. Para os autores este nível de ensino tem que ser estabelecido norteado pelas demandas laborais num modelo que compreende a definição de objetivos de aprendizagem de cada curso, afunilado a competências (habilidades, atitudes e conhecimentos), necessários na idealização de uma atividade profissional e desenvolvimento pessoal que atendam as demandas do setor. Ainda, num sistema de garantia da qualidade de ensino que assegure para os sujeitos uma boa aprendizagem dos novos conhecimentos requeridos. Nesse cenário figurando quadros de qualificações15, sistemas de graus, ciclos e créditos e promoção de ações para atingir a qualidade e integração requeridas.
Quanto a termos ligados a currículo, os conhecimentos incluídos nas diferentes matérias de títulos teriam por meta estabelecer fundamentos baseados em competências, habilidades e atitudes essenciais ao exercício profissional, em atendimento as necessidades e atitudes necessárias para o exercício profissional (BOLIVAR, 2009; DIAS SOBRINHO, 2009).
Mello e Dias (2011) ressalvam que a reforma veio atender as exigências de eficácia e competitividade da economia neoliberal16, em que a formação teria que promover qualificações em atendimento aos interesses de empresas e se sobrepor a formação da cidadania. A universidade deveria estar pautada em valores de aumento da produtividade e eficiência, ao enfatizar conteúdos no fornecimento de competências no intuito de inseri-los no currículo.
Por um lado, passa a existir a privatização progressiva de espaços de formação de nível superior (geradas por concessões de acreditação de instituições privadas e transformação das públicas), assim como a redução do financiamento público nas universidades estatais. Por outro, a capacitação do estudante, orientada pelas instituições a prepará-lo como profissional e incorporá-lo no mercado (DIAS SOBRINHO, 2009).
De maneira geral o setor empresarial passando por mudanças, acaba produzindo fusões e associações a fim de favorecer as organizações com maior eficiência e eficácia frente às necessidades em curso do processo de mundialização implicando em novos cenários competitivos, ocasionando a absorção de novos formatos organizacionais. É percebido a absorção da microeletrônica, em larga escala, desde as relações travadas na indústria junto aos bancos e sistema financeiro até as infraestruturas e serviços públicos, exigindo um nível adequado de qualificação de sua mão-de-obra, qualidade do sistema de pesquisa, dentre outros. A tecnologia fator primordial no contexto da competitividade e produtividade, dogmas absolutos que traduz a luta pela sobrevivência nos negócios dos indivíduos no mundo. No ramo empresarial encontra-se grande parte das vantagens associados à qualificação dos recursos humanos e conhecimento produzido. Justifica o porquê de a formação sofrer questionamentos quanto ao que vem produzindo e a produção do conhecimento ligada fundamentalmente ao interesse empresarial, em especial as transnacionais (CATANI; OLIVEIRA; DOURADO, 2001).
Nesses termos, a origem ou extinção de especialidades poderiam ser resultantes mais tendencialmente de critérios mercantis que acadêmicos. O caráter mercantilista em questão resultaria num viés pragmatista que não tem contribuído para a qualidade da pesquisa (BIANCHETTI; MATTOS, 2011). Para os autores, uma proposta indutiva de homogeneização das universidades, preterindo peculiaridades da cultura e das instituições, à sombra do argumento de atendimento das necessidades da globalização.
Quanto ao sistema (LMD 3-2-3) de licenciatura, mestrado, doutorado, em anos, estabelecido, ao mesmo tempo em que pode estimular a mobilidade estudantil na Europa, torna inútil seu parâmetro de circulação, considerando a homogeneidade curricular que atrapalha às próprias aspirações de promoção da diversificação, diferenciação, e proteção da condição cultural. (BIANCHETTI; MATTOS, 2011).
A formação em nível superior sendo condensada num primeiro ciclo de estudos universitários como principal estratégia para atratividade e competitividade a nível internacional, é controlada por uma lógica de mercado e prestação de serviços educacionais (arena comercializável da educação). A discussão da presente temática deve avançar em próximo artigo quanto ao Projeto Tuning Europeu o seu parâmetro para o Projeto Alfa Tuning América Latina.
Estrategicamente Bolonha é a denominação usualmente adotada para designar um conjunto de medidas em prol da consolidação do que chamamos de Área Europeia de Ensino Superior. As duas “Processo de Bolonha” e “Área Europeia de Ensino Superior” formalizam expressões subjetivas que interpretam ajustes pontuais na educação superior do Continente (CACHAPUZ, 2009). Essa uniformidade processual em principio se justifica no discurso de que esses ajustamentos só poderiam ser realizados em conjunto mediante um discurso que dissolveria na pratica em que:
[…] Um dos traços do modelo de mudança seguido no processo de Bolonha é o seu caráter não sistêmico. Na verdade, ele é fortemente marcado por um modelo sequencial e segmentado. De forma sumária, e com mais ou menos variantes, em cada país: define-se em primeiro lugar a estrutura de graus, em seguida, o número de ECTS/disciplinas de cada curso, depois os currículos das disciplinas e perfis de competência dos alunos, sistemas de avaliação e acreditação e, durante esta sequência, a formação de docentes (quando há) para lidar com o novo quadro pedagógico. [...] cada etapa condiciona ou até determina a seguinte. Ignora as necessárias articulações temporais e retroatividade entre essas etapas, em particular entre a escolha da estrutura de graus, os ECTS, os curricula disciplinares e a descrição dos saberes que se deseja que os alunos aprendam. Olha para cada uma das partes e esquece o todo (CACHAPUZ, 2009, p. 23).
Isso acaba conduzindo um processo de discussões que dão ênfase a uma nova estrutura de graus, estabelecida em nível nacional, exigindo maior aprofundamento dos aspectos pedagógicos, da qualidade e questões alinhadas com a Aprendizagem ao longo da Vida (CACHAPUZ). Porém, os assuntos tratados, não fizeram menção a elementos contidos nos currículos, mas sim, à conclusão de estudos, formação acadêmica com o futuro social, econômico e profissional de estudantes para o mercado de trabalho, enquanto elementos extracurriculares.
A questão da autonomia universitária, e a participação da comunidade acadêmica transitando em maior proporção num sentido de corresponsabilização e consentimento ao inevitável nas mudanças propostas não é um assunto marginal, consequentemente a longo prazo, nos Estados democráticos de direitos tais questões necessitarão ser debatidas, ainda que em enfrentamentos com os interesses do capital.
http://www.laplageemrevista.ufscar.br/index.php/lpg/article/download/380/588 (pdf)
[Artigo corrigido , vol. 3, 74-92] http://www.laplageemrevista.ufscar.br/index.php/lpg/article/view/380/588
